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Comportamento

Como lidar com o maior risco de todos: a incerteza

Os últimos dois anos nos lembraram que não importa o quanto minimizemos os riscos: não podemos planejar tudo

Como lidar com o maior risco de todos: a incerteza
Foto: Evanto Elements
  • A sociedade tornou-se muito adepta à medida e à gestão de riscos com a ajuda de dados e da tecnologia. Vemos isso no mercado de ações, no mercado imobiliário e até mesmo em nossa cultura
  • Tivemos a sorte de nesses últimos 50 anos vivermos em um mundo com excepcionais poucos riscos na maior parte do tempo. Mas isso também nos tornou mais vulneráveis de outras maneiras

Allison Schrager, WP Bloomberg – Esses são tempos incertos, mas nunca vivemos com menos risco. Isso talvez pareça loucura em meio a uma pandemia que interrompeu nossas vidas de inúmeras maneiras – e agora podemos estar à beira de uma Terceira Guerra Mundial. Mas há uma grande diferença entre risco e incerteza, e cada um exige estratégias de enfrentamento diferentes. O risco pode ser gerenciado com seguro e proteções; a incerteza requer flexibilidade.

É importante saber disso ao tomar grandes decisões na vida, como comprar uma casa, mudar de emprego, ter um filho, se aposentar ou mesmo ajustar sua carteira de investimentos.

O risco inclui coisas que podemos medir e ver se aproximando, a incerteza é consequência de coisas que surgem de forma inesperada. A sociedade tornou-se muito adepta à medida e à gestão de riscos com a ajuda de dados e da tecnologia. Vemos isso no mercado de ações, no mercado imobiliário e até mesmo em nossa cultura, onde os dados podem aumentar as chances de vermos um filme na Netflix ou escutarmos uma música no Spotify. Quando se trata de coisas que podemos medir, pouquíssimo é deixado ao acaso. E se não somos capazes de eliminar o risco, podemos nos proteger contra ele: usando opções de ações como uma proteção contra a queda do valor delas, por exemplo.

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Desde a década de 1970, temos mais maneiras do que nunca de gerenciar ou eliminar riscos nos mercados, na economia e, em muitos aspectos, no nosso dia a dia. As recompensas foram mercados em crescimento, inflação baixa (até bem pouco tempo), além de salários e empregos estáveis. Por isso ficamos atônitos quando somos atingidos por algo que não esperávamos – como pandemias e guerras que impactam todo o mundo.

Durante a maior parte da história da humanidade, as pessoas viveram com incertezas e riscos que não podiam gerenciar. Guerras violentas e surtos de doenças mortais eram parte do cotidiano. Isso mudou no século 20, quando o governo passou a assumir mais dos nossos riscos. Os programas sociais atenuaram as dificuldades, os países cooperaram por meio de organizações internacionais e mais comércio, e a tecnologia nos deu mais ferramentas para nos proteger contra riscos. Na década de 1970, a palavra “risco” passou a ser associada a algo que você poderia gerenciar ou evitar.

Mas os últimos dois anos talvez indiquem uma nova era. Ainda podemos gerenciar riscos e ter ferramentas melhores para isso, mas a nova ordem mundial é sobre gerenciar a incerteza – uma proposta muito mais difícil. Você não pode planejar o imprevisível.

Ainda é possível gerenciar os riscos decorrentes de tempos incertos, mas isso exige uma estratégia diferente – é preciso resiliência. Governos e bancos centrais tiveram a flexibilidade que tornou a pandemia menos prejudicial do que poderia ter sido. Eles tinham espaço fiscal e credibilidade para gastar muito dinheiro com benefícios de desemprego maiores, auxílios financeiros para estimular a economia e compras maciças de dívidas durante a pandemia. A tecnologia de RNA mensageiro é incrivelmente flexível e os cientistas a usaram para desenvolver uma vacina em tempo recorde.

Agora, a invasão da Ucrânia pela Rússia representa uma nova fonte de incerteza: economia da Guerra Fria, armas nucleares, escassez de alimentos, ataques cibernéticos, a reação da China à atual situação – tudo é impossível de se prever. Temos ferramentas de gestão de risco na política fiscal e na reestruturação de mercados globais, como o de energia, e isso ajudará a tornar a crise menos perigosa. No entanto, como os últimos dois anos mostraram, o controle de risco não pode impedir a incerteza. E os indivíduos devem descobrir como dar conta de suas próprias vidas.

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Nosso primeiro instinto quando nos deparamos com mais incertezas é evitar tomar decisões, acumular dinheiro, não sair do local onde estamos, esperar a aposentadoria e evitar novas dívidas. Mas a incerteza cada vez maior talvez dure muito tempo e não se pode simplesmente continuar deixando a vida para depois. O dinheiro costuma ser sedutor quando os tempos são incertos, mas com a inflação de hoje, ele também não é uma estratégia segura. Ainda precisamos investir em ativos de risco e, se você postergar uma casa, um filho ou uma mudança de emprego, talvez acabe esperando por muito tempo.

Portanto, para gerenciar a incerteza, a melhor coisa que você pode fazer é favorecer a resiliência não assumindo riscos excessivos e fomentando a flexibilidade em sua vida. Invista em ações, mas evite ativos que são ilíquidos ou excessivamente voláteis. Se você está pensando em se aposentar, não precisa esperar: basta manter as opções em aberto para um possível retorno ao trabalho em meio período.

O mesmo princípio se aplica se você estiver pensando em comprar uma casa ou mudar de emprego. Em vez de ir para aquele imóvel grande que precisa de muitos reparos em um bairro que começa a ganhar destaque, compre uma casa menor em um bairro melhor e que não terá dificuldades para ser revendida caso o mercado imobiliário azede. É possível planejar um trabalho de meio período se você vai voltar a estudar, ou outras atividades para ganhar dinheiro além do seu emprego principal, caso ele não seja tão estável. Ou, quando se trata de risco cibernético, guarde cópias em papel de seus extratos bancários e verifique se o backup do seu computador está na nuvem ou em um HD externo.

Tivemos a sorte de nesses últimos 50 anos vivermos em um mundo com excepcionais poucos riscos na maior parte do tempo. Mas isso também nos tornou mais vulneráveis de outras maneiras. Desconsideramos o inesperado porque raramente experimentamos o preço de crises ruins. As empresas mantêm menos estoques quando não se preocupam com transtornos nas cadeias de suprimentos globais; assumimos mais dívidas quando não esperamos perder nossos empregos ou podemos reservar uma viagem sem direito a reembolso quando não conseguimos imaginar uma pandemia interrompendo nossos planos.

Os últimos dois anos nos lembraram que não importa o quanto minimizemos os riscos, não podemos nos planejar para tudo. Devemos criar mais opções em nossas vidas para que nos sintamos menos desamparados quando algo grande der errado.
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Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e seus proprietários.

Allison Schrager é colunista da Bloomberg Opinion. Ela é pesquisadora sênior do Instituto Manhattan. // TRADUÇÃO DE ROMINA CÁCIA

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