- Em três anos, CryptoWendyO, que posta seu programa sobre o mundo das criptomoedas semanalmente no YouTube, além de vários vídeos no TikTok diariamente, já acumulou um público considerável.
- Os vídeos vão desde tutoriais a respeito de como proteger criptomoedas offline, análises da variação de preços de um token, até o compartilhamento de diferentes técnicas de negociação.
- Assim como no final de 2017, as criptomoedas estão na moda - ou melhor, gerando ondas de oscilações repentinas de preços que alimentam um vórtice de negociação especulativa que agora inclui as chamadas ações meme de Wall Street.
(Hamza Shaban , Washington Post) – Sentada em uma cadeira gamer roxa e com um mini microfone combinando na mão, a mulher na tela analisa as notícias do mercado financeiro do dia.
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“Oi, meus amores”, ela diz animada, “vamos falar dos potenciais cenários de mercados em baixa”.
CryptoWendyO, como ela é conhecida por centenas de milhares de visualizadores no TikTok, no YouTube e em outras plataformas, prossegue com seu mais recente vídeo a respeito do mundo revolucionário da moeda digital. A atmosfera é relaxada e pragmática – parte comentarista, parte instrutora – um contraste e tanto com os barulhentos crypto bros (caras das criptomoedas) que dominam o espaço com seu evangelismo de “nunca venda” e “até a lua”.
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Nesse dia, ela avisa ao seu público – muitos investidores novatos – que as criptomoedas que eles amam podem não estar disponíveis nos próximos dias. “Só porque eles planejam mudar o mundo, não significa que tenham os recursos para de fato fazer isso.”
CryptoWendyO está entre uma nova categoria de influenciadores que fala das viradas selvagens dos mercados globais, onde personagens na rede como TheBlockchainBoy e BitBoy Crypto prometem desmistificar as criptomoedas para as massas e estão redefinindo como o público jovem tem acesso às notícias e análises do mercado financeiro.
Mas, como muitas mulheres com significativo alcance online, CryptoWendyO diz ser alvo contínuo de insultos e assédio, muitos deles movidos por sexismo e misoginia. Para se proteger, ela não usa seu nome verdadeiro em seu trabalho público, embora tenha concordado em permitir que o Washington Post use seu nome do meio, Rochelle.
A rápida ascensão dos influenciadores de criptofinanças coincide com o crescimento explosivo das criptomoedas, no qual a pressa para lucrar criou um mercado de US$ 1,3 trilhão. A semana retrasada ressaltou a extrema volatilidade do mercado, conforme centenas de bilhões de dólares em valor evaporaram com as notícias das medidas repressivas da China às operações de mineração de bitcoin, e, depois, recuperaram-se rapidamente.
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Mas ser detentor de moedas digitais envolve interesses e motivações. Alguns são atraídos pelo espírito libertário que daria fim aos intermediários financeiros centralizados, como bancos e empresas de transferência de dinheiro. Outros se identificam com as comunidades de empreendedorismo e inovação ligadas à tecnologia blockchain, os sistemas de manutenção de registros que sustentam as redes de criptomoedas.
Mas muitas figuras conhecidas do mundo financeiro, entre eles os bilionários Warren Buffett e Bill Gates, executivos corporativos e autoridades de governo permanecem céticos, citando a especulação desenfreada nos mercados de criptomoedas e os elevados requisitos de energia do ativo como motivos para se manter afastado. Ainda assim, o interesse de instituições e de indivíduos está crescendo, alimentado em parte por personalidades como o CEO da Tesla, Elon Musk, e figuras políticas como o governador do Texas, o prefeito de Miami e o presidente de El Salvador.
Vídeos são para novatos e experientes em criptomoedas
Influenciadores como Rochelle oferecem uma rampa de acesso às criptomoedas para novatos e uma análise minuciosa para investidores mais experientes. Eles funcionam como um canal de informações, um guia para negociantes e entretenimento virtual, analisando tópicos enigmáticos ou fofocando sobre o drama que se desenrola nos gráficos de preços.
Em três anos, CryptoWendyO – que posta seu programa sobre o mundo das criptomoedas semanalmente no YouTube, além de vários vídeos no TikTok diariamente – acumulou um público considerável: 146 mil seguidores no Twitter, 70 mil inscritos no YouTube e 149 mil seguidores no TikTok. Cerca de 43% de seu público no TikTok é feminino, o que demonstra sua capacidade de atrair uma audiência mais equilibrada em um espaço que tem fama de ser dominado por influenciadores do sexo masculino.
Os vídeos dela no YouTube e no TikTok vão desde tutoriais a respeito de como proteger criptomoedas offline, análises da variação de preços de um token, até o compartilhamento de diferentes técnicas de negociação. Seus seguidores dizem que apreciam sua postura e acessibilidade.
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“Ninguém é melhor do que Wendy para explicar essas ferramentas técnicas”, disse um usuário do YouTube em um comentário em relação a um vídeo sobre uma técnica de análise de preços.
Outro escreveu: “Amei essas atualizações rápidas, Wendy; sinta-se à vontade para fazer muitos mais delas, isso realmente ajuda muito, sua calma faz com que eu fique mais calmo também, parabéns.”
Ela também apresenta um noticiário diário, destacando os grandes eventos e acontecimentos do momento com uma pitada de comentário: “Nossa primeira matéria vai para a pessoa mais chata no mundo das criptomoedas: Elon Musk”, disse ela em um post recente, uma referência a capacidade dele de fazer bitcoins ou outro ativo digital subir ou cair dependendo do que tuíta.
Seu vídeo mais assistido no TikTok, com mais de 500 mil visualizações, descreve o que fazer no mercado das criptomoedas depois que um investimento cresce, foi apelidado de “moon bag”.
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“Quando você investe em algo, você retira seu investimento inicial, retira seu lucro e tem essa bolsa de tokens de criptomoedas que é sua sem ter que pagar nada a ninguém, tipo ‘dinheiro da casa”, disse ela. “Então, se essa coisa subir 1.000 vezes, você está rico. Se essa coisa cair para zero e desaparecer, o que provavelmente acontecerá porque estamos falando de criptomoedas, você não tem nenhum vínculo financeiro com isso.”
Quem é CryptoWendyO?
Nascida e criada em Los Angeles, Rochelle diz que dinheiro era uma preocupação constante enquanto ela crescia. Seu pai morreu quando ela estava no ensino fundamental, disse, e ela passou grande parte de sua infância morando em uma casa de dois quartos com sua tia-avó e avó, onde dividia um quarto com sua mãe e duas irmãs. O tema também foi uma fonte de sofrimento na escola, onde ela diz que era motivo de piada por ser pobre.
“Eu não tinha nada que as outras crianças tinham. E eu olho para trás agora e digo a mim mesma: ‘Nunca mais’ “, disse. “Meu trauma do passado é algo que me motiva porque eu nunca vou voltar a não ter controle.”
Atualmente na casa dos 30 anos e criando uma filha pequena, Rochelle vê seu trabalho como uma formação indispensável, um caminho para tornar as finanças mais inclusivas, assim como uma forma de documentar sua própria trajetória para a independência financeira.
“As criptomoedas melhoraram minha qualidade de vida e acredito que todos merecem isso”, disse ela. “Aposto sempre na tendência de alta da decência”.
Criptomoedas estão na moda
Assim como no final de 2017, as criptomoedas estão na moda – ou melhor, gerando ondas de oscilações repentinas de preços que alimentam um vórtice de negociação especulativa que agora inclui as chamadas ações meme de Wall Street. As instituições financeiras tradicionais estão avançando nos planos de parceria com trocas de criptomoedas por outros ativos e oferta de produtos financeiros relacionados às criptomoedas. O 401(k) (plano de aposentadoria adotado pelos Estados e outros países) está até permitindo que os empregadores ofereçam criptomoedas como parte de seus planos de aposentadoria.
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O número de criptomoedas quase dobrou no último ano, para mais de 10 mil. Mas o bitcoin é a mais valiosa e mais conhecida, tanto que todo o resto é categorizado como altcoin (criptomoedas alternativas lançadas após o sucesso do bitcoin), incluindo ethereum, litecoin, polkadot e dogecoin. O valor total de mercado de moeda digital mais do que quadruplicou desde o verão passado.
Mas os enormes montantes de dinheiro que trocam de mãos têm atraído um grande número de charlatões e golpistas. De outubro a março, quando o preço do bitcoin e de outros tokens subiu para preços nunca vistos, as reclamações dos consumidores dispararam, de acordo com a Federal Trade Commission (FTC).
Mais de US$ 80 milhões foram perdidos para golpes de investimento em criptomoedas nos últimos meses, afetando quase 7 mil pessoas, disse a agência em um relatório publicado no mês passado. O número de fraudes reportadas é 12 vezes maior que o reportado no mesmo período do ano anterior, e as perdas são quase 1000% maiores.
“Alguns dizem que há uma sensação de Velho Oeste na cultura das criptomoedas, e um elemento de mistério também”, disse a analista de programas da FTC, Emma Fletcher. “Os entusiastas das criptomoedas se reúnem online para conversar a respeito da paixão que compartilham. E com o valor do bitcoin disparando nos últimos meses, novos investidores talvez estejam ansiosos para entrar em ação. Tudo isso cai como uma luva nas mãos dos golpistas. ”
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Os esquemas de investimento surgem em uma variedade de formas. Alguns criminosos vendem dicas e segredos por meio de fóruns online, atraindo potenciais investidores para sites mal-intencionados, disse a FTC. Outros fingem ser pessoas famosas querendo dar tokens de presente tão logo as vítimas enviem um depósito inicial. A FTC disse que as pessoas relataram ter perdido mais de US$ 2 milhões para trapaceiros que se faziam passar por Elon Musk.
Outra categoria de trapaceiros astutos mira no coração das pessoas: os “criptofakes” têm focado em pessoas na internet com a promessa de um novo romance, mas, de repente, começam a tentar seduzi-los sobre uma grande oportunidade de investimento, disse a FTC.
CryptoWendyO viu de perto o trabalho dos impostores. Durante um tempo, sua biografia no Twitter exibiu o alerta, em letras maiúsculas, de que ela nunca enviaria mensagens diretas aos seguidores.
“Há um grande problema de pessoas se passando por outras em todas as redes sociais, mas especificamente no mundo das criptomoedas”, disse ela. “Eu não ofereço nenhum serviço pago e a maioria daqueles que fingem ser eu, quer que você entre nos grupos pagos deles e solicita chaves privadas ou dinheiro. Eles fazem isso nas menções do YouTube e enviam mensagens diretas ao meu público. É uma coisa tão terrível que faço o possível para alertar meu público. A única coisa que posso fazer de verdade é continuar lembrando isso para eles e espero que essas plataformas centralizadas cuidem melhor de seus usuários. ”
CryptoWendyO ganha dinheiro com negociações, investimentos e trabalho de consultoria. Dependendo do mercado, ela ganha de cinco a seis dígitos por ano, afirmou. Ela não oferece nenhum serviço de assinatura paga e diz que deixa claro qualquer ligação comercial ao falar de uma marca ou um produto. Como outros criadores de conteúdo sobre criptomoedas e finanças, ela ressalta que não é uma consultora financeira e que os potenciais investidores devem fazer suas próprias pesquisas.
Jovens mais interessados em investir
Jimena Huaco, que supervisiona o currículo de finanças pessoais no Champlain College em Vermont, onde educação financeira é um requisito acadêmico, disse que os jovens estão mais interessados em investir. Poucos anos atrás, disse ela, a maioria acreditava que o mercado de ações estava fora de alcance, reservado apenas para pessoas com consultores financeiros ou dezenas de milhares de dólares para investir. Mas essa percepção deu lugar à ansiedade e à curiosidade com todo o burburinho em torno dos aplicativos de negociação fáceis de usar, como o Robinhood, e das histórias de milionários da dogecoin.
“O surgimento desse fenômeno de corretores e aplicativos móveis e o avanço da tecnologia deixaram tudo muito mais fácil e conveniente”, disse Huaco. “E agora as pessoas têm a ideia de que podem ganhar muito dinheiro muito rápido, mas a educação financeira não está correspondendo e não está acompanhando”.
Ela acrescentou: “Existem prós e contras. O movimento também pode ter aumentado o acesso de populações que podiam pensar que investir não era acessível”.
Ramona Ortega, fundadora do My Money My Future, uma plataforma digital que visa ajudar millennials multiculturais a investir e construir riqueza, incentiva potenciais investidores a se empoderarem, tornando-se seus próprios especialistas. Mas ela adverte que é crucial entender os fundamentos – até mesmo compreender a própria tolerância ao risco e a criação de um portfólio diversificado de investimentos ao lado de um fundo 401 (k) e de emergência.
A pandemia do coronavírus e a volatilidade do mercado impulsionaram um surto nos investimentos. “De repente, as pessoas estão perguntando ‘O que é curto prazo?’. As pessoas estão perguntando sobre criptografia e NFTs”, disse Ortega, acrescentando que os investidores também estão procurando fontes não tradicionais de aconselhamento financeiro, já que muitas mulheres e pessoas não brancas se sentem negligenciadas pelos serviços financeiros convencionais.
“Para muitas mulheres, elas procuram conselheiros que se pareçam com elas e entendam seus comportamentos financeiros – elas não querem se sentir estúpidas, não querem se sentir envergonhadas e não querem sentir alguém olhando para elas de uma certa maneira, com uma lente de crítica”.
Erhan Korhaliller, executivo-chefe da EAK Digital, uma empresa de relações públicas e agência de talentos que gerencia influenciadores de criptografia, incluindo CryptoWendyO, disse que ela se destaca por sua ética de trabalho e sua personalidade pública acessível.
“Para os jovens, tão acostumados a essa sobrecarga de informações, a criptografia realmente preenche essa parte de nossos cérebros porque é um ciclo de notícias sem fim. E é empolgante porque tem dinheiro envolvido”, disse ele, enfatizando o ritmo rápido do desenvolvimento tecnológico. “Esses YouTubers e streamers ficam narrando tudo para você”.
Korhaliller, que mora em Londres, diz que CryptoWendyO é mais clara e comedida do que muitas das personalidades no altíssimo reino do comércio de criptografia. “Ela tem um sabor muito diferente dos crypto bros. Você sabe, aquela coisa de ‘Compre agora! Vamos chegar na lua!’”, disse ele. “Você quer ouvir as pessoas com quem você pode se identificar. É preciso haver uma voz para quem não se encaixa no perfil dos crypto bros”.
Mas, assim como outras mulheres proeminentes nas redes sociais, Rochelle precisa enfrentar uma torrente de abusos. “As ameaças e o assédio são terríveis”, disse ela. “Sofri ameaças de violência física contra mim nos eventos. Pessoas me mandaram mensagens dizendo que iriam me estuprar, que esperavam que eu morresse como meu pai, que iriam machucar minha filha”.
Ela acrescentou: “Tenho a casca muito grossa por causa do meu trauma do passado, porque sou uma sobrevivente, mas ninguém deveria ter que ouvir esse tipo de coisa”.
Apesar dos elementos venenosos de levar uma vida profissional online, ela disse que construir conexões com as pessoas por meio do streaming a faz seguir adiante. Ela também quer inspirar outras mulheres.
“Quem quiser vibrar comigo, venha comigo. Se você tem energia positiva, quer aprender, quer crescer, vamos nessa”.
Ben Armstrong, outro proeminente streamer de criptografia que opera os canais BitBoy Crypto e que conheceu Rochelle em 2018, disse que é perturbador ver uma amiga sofrer com o ódio online, mas que teve de resistir ao impulso de sair em sua defesa nas redes, o que, segundo ele, poderia agravar a situação. “É muito frustrante e você se sente meio impotente assistindo”, disse ele.
Em vez disso, Armstrong, que mora em Atlanta e tem 2,7 milhões de seguidores no TikTok e 1,1 milhão de assinantes no YouTube, diz que pode usar sua plataforma para lidar com o problema tóxico do assédio sem ter de apontar nenhum agressor em particular.
Armstrong elogia a diligência de CryptoWendyO e sua habilidade em explicar conceitos complicados para um público de massa. Sua capacidade de se relacionar com outras mulheres e mães é uma perspectiva bem-vinda e renovadora, disse ele.
“O mundo cripto por muito tempo foi um clube de garotos machistas, e é ótimo ver essas paredes desmoronando”.
Tradução de Romina Cácia e Renato Prelorentzou