Existe uma filosofia popular entre os investidores de dividendos: o melhor momento para comprar uma ação ocorre quando todo mundo está vendendo. Mas, claro, há ressalvas. O ativo precisa ter um bom histórico e fundamentos sólidos. Quando uma empresa tradicional enfrenta uma fase ruim, o mercado financeiro costuma reagir de forma imediatista. Nem todos os investidores e instituições estão dispostos a aguardar alguns trimestres ou anos por uma retomada, mesmo com fundamentos ainda robustos. Começa então o efeito manada, com grandes bancos, corretoras e analistas indicando venda ou rebaixando a recomendação dos papéis.
Megainvestidores como Luiz Barsi Filho, conhecido como Rei dos Dividendos, já foram na contramão da manada em momentos assim, aproveitando os descontos das “ações desprezadas” para reforçar posições. Mas, além de sangue frio, a estratégia exige uma paciência de monge, afinal, não há como prever quando a ação vai se recuperar.
O agronegócio segue como pedra no sapato do BB. Analistas projetam que o resultado do segundo trimestre — a ser divulgado em agosto, conforme o calendário completo de balanços corporativos do 2T25 — ainda apresentará um cenário fraco. Também pesam os ajustes às exigências da resolução 4966, que aumentou as provisões para calotes. Com inadimplência em alta, suspensão das projeções (guidance) para lucro, custo de crédito e margem financeira, e os juros (Selic) ainda a 15% ao ano, diversas instituições cortaram suas estimativas ou retiraram recomendações para BBAS3, como mostra esta reportagem.
O movimento chegou às gestoras. A Legacy, com R$ 20 bilhões sob gestão, afirmou em relatório que aposta na queda do papel. Segundo a casa, os problemas do agro devem continuar por conta do modelo de concessão de crédito do BB, que ainda utiliza garantias via penhor de safra. Se nada mudar, o banco pode ver seus resultados futuros e dividendos comprometidos, com cortes de até 50% na remuneração dos acionistas, segundo a gestora. Desde o balanço do 1T25, as ações BBAS3 acumulam queda de 27,59% e recuam 9,85% no ano.
Nesta reportagem, o E-Investidor mostra o que pensam os poucos que vão na contramão do mercado e se mostram otimistas – ou resilientes – com as ações do Banco do Brasil.
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Banco do Brasil (BBAS3) |
Ibovespa |
Retorno desde balanço do 1°TRI25 (15/05/25 – 15/07/25) |
-27,59% |
-2,93% |
Retorno nos últimos 5 anos |
88,98% |
32,87% |
Retorno acumulado em 2025 |
-9,85% |
12,44% |
Dividend yield nos últimos 12 meses |
8,83% |
— |
Dividend yield no 1° semestre de 2025 |
4,39% |
— |
Patamar mínimo da ação desde balanço do 1° TRI25 |
R$ 20,68 em 14/07/2025 |
135.250 pontos em 15/07/2025 |
Fonte: Elos Ayta Consultoria. Dados até 15/07/2025
5 motivos para segurar BBAS3, segundo analistas
1. Histórico resiliente e de solidez de 200 anos diante da turbulência
O Banco do Brasil tem mais de 200 anos de história e já enfrentou diversas crises, como o subprime em 2008, o impeachment de Dilma Rousseff e a pandemia de covid-19, saindo fortalecido, lembra Regis Chinchila, head de Research da Terra Investimentos. “Não é uma empresa que quebra ou perde relevância da noite para o dia”, pontua.
Bruno Oliveira, analista do Vida de Acionista, destaca a capacidade do banco de se adaptar a desafios macroeconômicos e internos. Segundo ele, só nos últimos 100 anos, o BB enfrentou a hiperinflação da ditadura militar e sucessivas mudanças de moeda até chegar ao real, sempre com resiliência.
A partir de 2016, com a Lei das Estatais, os mecanismos de governança corporativa foram aprimorados, blindando a estratégia do banco contra interferências políticas, independentemente do governo. “Depois de 200 anos, o Banco do Brasil segue como uma das instituições financeiras mais sólidas do País, com histórico de lucros consistentes e distribuição de proventos”, diz Oliveira.
2. Está absurdamente barato, abaixo da média histórica
Chinchila observa que o banco negocia a múltiplos de lucro e patrimônio abaixo da média histórica e dos concorrentes. No indicador preço sobre lucro (P/L), BBAS3 está em 4,82, enquanto Bradesco, Santander e Itaú apresentam P/L de 8,93, 7,68 e 9,05, respectivamente. Nos últimos cinco anos, a média do P/L do BB foi de 6,42. “Isso já precifica os riscos, oferecendo uma margem de segurança rara para ativos de grande porte”, afirma Chinchila.
Jayme Simão, sócio-fundador do Hub do Investidor, destaca que, com esse P/L, investidores do passado obtiveram retornos expressivos em três a cinco anos. “O mercado exagera no curto prazo, mas os ciclos viram e o BB costuma recompensar quem tem paciência”, diz.
Para Milton Rabelo, analista da VG Research, mesmo com uma possível piora nos resultados nos próximos trimestres, o valuation (valor do ativo) atual oferece margem de segurança para o médio e longo prazo. “A compra periódica e fracionada das ações BBAS3 nos preços atuais pode ser um ótimo investimento para o longo prazo”, avalia.
Desde o primeiro trimestre de 2025, BBAS3 caiu 27,59%, o que Rabelo considera exagero. Segundo ele, o mercado precifica uma deterioração aguda nos resultados que não se confirmará. “O mercado tem tendência de perpetuar os últimos resultados, mas a trajetória dos balanços não é tão linear”, reforça.
3. Apesar da crise, dividendos e dividend yield seguem atrativos
Mesmo com um payout (parcela do lucro destinada a proventos) menor neste ano, estimado em 40%, analistas ainda enxergam o Banco do Brasil como uma alternativa sólida para quem busca proventos consistentes, previsíveis e recorrentes (distribuídos oito vezes ao ano). O dividend yield (retorno em dividendos) projetado para os próximos 12 meses varia de 7,90% a 10%, segundo especialistas consultados pelo E-Investidor.
Ação |
Dividend yield projetado para os próximos 12 meses |
Preço-teto de compra |
Recomendação |
Quem recomenda? |
Banco do Brasil (BBAS3) |
7,90% |
R$ 20,63 |
Neutra ou manter |
Vida de Acionista |
Banco do Brasil (BBAS3) |
9,50% |
R$ 27 |
Compra |
VG Research |
Banco do Brasil (BBAS3) |
8% |
R$ 22 |
Compra |
Hub do Investidor |
Banco do Brasil (BBAS3) |
8% até 9% |
R$ 26,00 |
Compra |
Terra Investimentos |
Banco do Brasil (BBAS3) |
8% até 10% |
R$ 28 |
Compra |
MSX Invest |
Fonte: levantamento E-Investidor com analistas. Preço-teto = preço máximo de compra para garantir bons dividendos e espaço para valorização
Marco Saravalle, analista e fundador da MSX Invest, acredita que o lucro do segundo trimestre deve seguir na faixa mínima, o que pode pressionar novamente as ações. No entanto, com BBAS3 em patamar atrativo, o dividend yield tende a subir, garantindo bom retorno ao investidor. “Mesmo com resultados fracos, os dividendos do Banco do Brasil ainda são muito bons”, afirma.
Saravalle destaca que o banco continua gerando valor aos acionistas. “Mesmo na crise, o BB não destruiu fundamentos, o ROE está em 11,97%, não em 5% ou 3%.”
4. O agro já se recuperou de outras crises e segue como potência global
A pressão da inadimplência no crédito rural ainda deve ser sentida por mais alguns meses, segundo analistas. No entanto, isso não diminui o papel estratégico do Banco do Brasil no agronegócio como agente de fomento. “O banco tem mais de 200 anos de história, já atravessou muitas crises e em todas o agronegócio retomou e o BB voltou junto”, afirma Simão.
Na projeção dele, o segundo trimestre ainda deve registrar aumento da inadimplência no agro, com pico previsto até o fim de 2025. A reversão só deve ocorrer entre o final de 2025 e o início de 2026, com avanço das renegociações e normalização das operações.
Sob o olhar de médio e longo prazo, Simão destaca que agronegócio e crédito são elementos cíclicos. “O BB continua sendo o maior financiador do agro no País, com uma posição de liderança que dificilmente será desafiada no curto prazo. É inegável sua relevância local e global no setor”, diz. Para ele, seria impossível o banco não se recuperar.
No começo de julho, o Banco do Brasil anunciou que destinará R$ 230 bilhões para o financiamento do Plano Safra 2025/2026, um aumento de 2% em relação à safra anterior. Do total, R$ 54 bilhões serão voltados a pequenos e médios produtores.
Para Rabelo, da VG, a medida é positiva, mas não altera estruturalmente o ciclo de crédito do agronegócio. “Não é possível concluir uma recuperação mais rápida em função disso. Os desafios com o setor ainda continuam”, comenta.
5. Sempre foi mais volátil que os concorrentes, mas está fazendo o dever de casa
Para quem se preocupa com a volatilidade do Banco do Brasil, Oliveira lembra que a estatal apresenta há anos a maior volatilidade de lucro trimestral entre grandes bancos como Itaú, Bradesco e Santander. Essa oscilação reflete a natureza do negócio e a exposição a riscos operacionais, regulatórios e políticos. “A volatilidade atual não é um fenômeno novo”, afirma.
Chinchila destaca a proatividade da gestão, que vem rotacionando a carteira do agronegócio, fortalecendo a cobrança, diversificando crédito e avançando no consignado privado. “Esses movimentos devem melhorar a rentabilidade nos próximos trimestres”, complementa.
Uma montanha-russa com tendência de alta no longo prazo
Em momentos de crise, é essencial analisar o histórico da empresa para entender sua reação e impacto nos dividendos. O E-Investidor solicitou a Bruno Oliveira, analista do Vida de Acionista, uma análise exclusiva do lucro líquido anual e do dividend yield do Banco do Brasil nos últimos dez anos (2014-2024).
Mesmo com solavancos, o lucro líquido do BB apresenta tendência de crescimento no longo prazo: saiu de R$ 11 bilhões em 2014 para R$ 35 bilhões em 2024, triplicando.
As principais crises ocorreram em 2015-2016, com a instabilidade política do impeachment da ex-presidente Dilma, que derrubou o lucro de R$ 14,4 bilhões em 2015 para R$ 8 bilhões em 2016, queda de cerca de 44,4%. Outra crise veio na pandemia, com queda do lucro de R$ 18,1 bilhões em 2019 para R$ 12,6 bilhões em 2020 (-30,4%), seguida de rápida recuperação. “Fica evidente que o lucro líquido do Banco do Brasil apresenta quedas expressivas diante de crises robustas”, comenta Oliveira.
Curiosamente, o dividend yield não acompanha a volatilidade dos lucros. Na crise de 2015, caiu de 15,30% para 7,20% em 2016, mas nos anos seguintes ficou entre 3,7% e 5,10% (2017-2019). Na pandemia, permaneceu estável entre 5,10% e 6,30% (2019-2020). Desde 2022, os retornos em dividendos se mantêm robustos, em média 10% ao ano.
Para Oliveira, o dividend yield se mantém minimamente adequado mesmo em crises porque o mercado penaliza a ação BBAS3 exageradamente, ampliando o desconto e abrindo a possibilidade de retorno elevado aos investidores, mesmo diante de uma redução do proventos por ação. “O dividendo não vai ser nulo ou pífio, é apenas uma crise, mas o Banco do Brasil segue como investimento interessante”, diz.
Além disso, ele destaca a forte capacidade de recuperação do banco estatal: entre 2016 e 2019, os lucros mais que dobraram, e de 2020 a 2024, no pós-pandemia, cresceram quase 200%.
Período |
Lucro Líquido do ano da crise |
Lucro líquido dos anos subsequentes |
Variação |
2016-2019 |
R$ 8.03 bilhões (2016) |
R$ 18.16 bilhões (2019) |
+226% |
2020-2024 |
R$ 12.70 bilhões (2020) |
R$ 35.44 bilhões (2024) |
+279% |
Fonte: Vida de Acionista/ site de RI do Banco do Brasil
Para o analista do Vida de Acionista, esses dados mostram que a capacidade de recuperação do BB às crises é sólida, reforçando sua importância como investimento de longo prazo para quem respeita ciclos econômicos.
Quem largou mão do Banco do Brasil?
Instituição |
Recomendação anterior |
Preço-alvo anterior |
Recomendação atual |
Preço-alvo atual |
Dividend Yield projetado para
2025 |
XP |
Compra |
R$ 41 |
Manter (Neutra) |
R$32 |
9,13% |
BTG |
Compra |
R$ 34 |
Manter (Neutra) |
R$ 30 |
8,71% |
Santander |
Compra |
R$ 45 |
Manter (Neutra) |
R$ 26 |
2,30% |
Itaú BBA |
— |
— |
Manter (Neutra) |
R$ 25 |
5,80% |
Ágora/Bradesco BBI |
Compra |
R$ 37 |
Manter (Neutra) |
R$ 31 |
13% |
Ativa |
Compra |
R$37,5 |
Compra |
R$ 37,5 |
8,57% |
Terra |
Compra |
R$ 35 |
Compra |
R$30 |
8,50% |
Genial |
Compra |
R$ 40,3 |
Manter (neutra) |
R$ 31,4 |
—- |
PagBank |
Compra |
R$ 34,66 |
Compra |
R$ 34,66 |
9,13% |
Fonte: levantamento E-Investidor com TradeMap