- Ascensão do Bitcoin faz parte de uma euforia mais ampla com os mercados de ações e de criptomoedas, desafiando o pessimismo da recessão que veio a reboque da pandemia
- Este salto mais recente do Bitcoin é diferente do seu último recorde em 2017, estimulado na época por investidores da Ásia que acabavam de conhecer as criptomoedas
- Em vez de apenas comprar e vender a moeda, em uma tacada rápida, mais investidores a utilizam para alocar parte dos seus recursos - fora da influência de governos e do sistema financeiro tradicional
(Nathaniel Popper/The New York Times) – O Bitcoin está de volta. De novo. Quase três anos depois de uma subida oscilante, em que atingiu o pico de US$ 19.783, o valor da moeda ficou acima disto pela primeira vez na segunda-feira (30), segundo informações da CoinDesk. O valor da criptomoeda disparou desde março, depois de despencar para menos de US$ 4 mil no início da pandemia.
Leia também
Este salto mais recente do Bitcoin é diferente do seu último recorde em 2017, que na época foi estimulado em grande parte por investidores da Ásia que acabavam de tomar conhecimento das criptomoedas. Mas o token digital logo perdeu ímpeto, à medida em que as pessoas começaram a se perguntar para que ela serviria – além de ser um produto para uma fácil especulação on-line e pagamentos de drogas e resgates.
Embora tais dúvidas permaneçam, o Bitcoin agora é alimentado por uma febre menos especulativa. Os compradores – liderados por investidores americanos, incluindo aqueles tradicionais e muitas companhias – estão tratando o Bitcoin como um ativo alternativo, como o ouro, segundo a empresa de análise de dados Chainalysis. Em vez de apenas comprar e vender a moeda, em uma tacada rápida, mais investidores a utilizam para alocar parte dos seus recursos – fora da influência de governos e do sistema financeiro tradicional.
Publicidade
“Um grupo bem diferente de pessoas vem adquirindo Bitcoins recentemente”, disse Philip Gradwell, economista chefe da Chainalysis. “Elas estão acumulando um volume maior durante períodos mais prolongados de tempo, mantendo a moeda como investimento”.
A empolgação tem sido respaldada pelos órgãos reguladores e empresas financeiras tradicionais que procuram tornar as criptomoedas mais seguras e mais acessíveis. O Office of the Comptroller of the Currency (órgão regulador da moeda, dentro do Federal Reserve), informou há alguns meses que passaria a autorizar os clientes a ter criptomoedas em seu portfólio. E o PayPal anunciou em outubro que seguirá a sua concorrente, Square, e permitirá que as pessoas adquirem e guardem Bitcoins e algumas outras criptomoedas.
“Nossa decisão foi resultado de conversas com autoridades governamentais e o fato de estarmos vendo uma mudança impressionante para os pagamentos digitais, resultado da pandemia”, afirmou Dan Schulman, diretor executivo do PayPal. Mais de 1 milhão de pessoas – volume três a quatro vezes superior ao que a companhia esperava – entraram na lista de espera para usar criptomoedas, antes mesmo de o recurso ser lançado, disse.
Euforia
A ascensão do Bitcoin faz parte de uma euforia mais ampla com os mercados de ações e de criptomoedas que vem desafiando o pessimismo de uma recessão induzida pela pandemia. O Down Jones, o índice S&P 500 e a Nasdaq registraram altas recordes em novembro, com Wall Street animado diante da eleição presidencial e notícias de vacinas potenciais contra o coronavírus.
O Bitcoin é uma moeda digital com software e regras que foram emitidas em 2009 por um criador anônimo, usando o pseudônimo Satoshi Nakamoto. O código de computador estabelecia que a oferta total da moeda seria limitada. Somente 21 milhões de tokens foram criados, distribuídos em pequenos blocos diariamente por meio de um processo conhecido como mineração, para alguns computadores que mantêm a infraestrutura on-line da moeda.
Como o ouro, o Bitcoin pode ser criado, movido e armazenado fora do alcance de qualquer governo ou instituição financeira. Os bitcoins possuem um livro contábil conhecido como Blockchain, que é mantido e atualizado por uma rede voluntária de pessoas, operando milhares de computadores em todo o mundo. O sistema busca assegurar que nenhum computador ou instituição consiga mudar as regras ou controlar a rede.
Natureza apátrida
A natureza aberta do sistema e o fato de uma pessoa participar dele e criar uma carteira sem ter que fornecer dados como nome ou número de telefone o tornou popular junto àqueles que desejam se esquivar do sistema financeiro tradicional. Entre os interessados estão terroristas, traficantes de drogas e países como Coreia do Norte, Venezuela e Irã, que buscam escapar das sanções financeiras impostas pelos Estados Unidos.
Publicidade
Mas esse caráter apátrida do Bitcoin também conquistou investidores interessados em usos legítimos da tecnologia. Alguns têm sido motivados por uma desconfiança nos governos. Outros, menos ideológicos, consideram a moeda uma alternativa ao sistema financeiro.
O Bitcoin é sustentado apenas pela sua rede de computador e a fé dos investidores que agrega valor à moeda nas trocas. Muitas dessas pessoas apostam que alguém estará disposto a pagar mais por seu Bitcoin no futuro.
Isto tem provocado uma volatilidade nos preços da moeda, que caiu para seu valor mais baixo em março, quando o temor da pandemia afetou os mercados globais. Logo depois, porém, os investidores começaram a falar do Bitcoin como beneficiário da desaceleração global.
Em maio, Paul Tudor Jones, um dos mais conhecidos gestores de fundos hedge de Wall Street, disse que quase 2% do seu portfólio era constituído de bitcoins. E que o limite na produção da moeda a tornam uma alternativa atraente diante da desvalorização de moedas tradicionais – algo que, na sua opinião, é inevitável, uma vez que os bancos centrais imprimem mais dinheiro para estimular a recuperação econômica.
“A cada dia que passa e o Bitcoin sobrevive, a confiança aumenta”, disse Jones, na entrevista que concedeu à CNBC na época.
Publicidade
Algumas empresas com ações negociadas em bolsa também mergulharam no Bitcoin, preocupadas com o valor do dólar. Em agosto, a MicroStrategy, empresa de software da Virgínia, anunciou a compra de US$ 250 milhões em bitcoins para armazenar parte do caixa que possuía.
Michael Saylor, diretor executivo da companhia, disse em uma entrevista que, no início do ano, não sabia quase nada sobre o Bitcoin, mas depois começou a acreditar que o limite codificado do número de tokens ajudaria a manter o valor da moeda no decorrer do tempo. E ficou tão entusiasmado que aplicou US$ 175 milhões do seu caixa pessoal na moeda. E mais tarde a MicroStrategy adquiriu mais US$ 175 milhões em bitcoins.
“Para quem pensa em investir com vistas a uma reserva de valor, ao que parece, o melhor é começar a operar com o Bitcoin”, disse Saylor.
(Tradução de Terezinha Martino)