- Ruth Walter é uma das painelistas do Young Women Summit, fórum brasileiro realizado pela Fin4She, com apoio editorial exclusivo do E-Investidor, voltado à promoção da diversidade na carreira de jovens no mercado financeiro
- Nesta entrevista, a especialista detalha a lógica por trás dos investimentos ESG aos principais desafios que as gestoras enfrentam no país
(Murilo Basso, especial para o E-Investidor) – Empresas com boas práticas ambientais, sociais e de governança corporativa – que formam o famoso tripé ESG – são as que irão sobreviver no longo prazo e devem estar no radar dos investidores.
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A afirmação é da head de ESG e Inovação da Bradesco Asset Management (Bram), Ruth Walter. Ela é uma das painelistas do Young Women Summit, fórum brasileiro realizado pela Fin4She, com apoio editorial exclusivo do E-Investidor, voltado à promoção da diversidade na carreira de jovens no mercado financeiro e que ocorrerá nos dias 29 e 30 de junho.
Nesta entrevista, a especialista detalha a lógica por trás dos investimentos ESG aos principais desafios que as gestoras enfrentam no país em relação à análise da classe de ativos e a necessidade de se ter mais mulheres atuando no mercado financeiro. Veja os principais trechos da conversa:
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E-Investidor – O que precisamos ter em mente quando falamos em investimentos ESG?
Ruth Walter – É um movimento que começou mais forte na Europa. Já no Brasil, ganhou tração, coincidentemente ou não, no ano da covid, em 2020. A lógica por trás do ESG é do lucro não apenas pelo lucro, a qualquer custo. Não é abrir mão do retorno financeiro, mas investir em empresas que tenham boas práticas ambientais, sociais e de governança corporativa, empresas éticas e transparentes, que, no fim do dia, são as organizações que irão permanecer por mais tempo. Já vimos vários casos de companhias que estão saudáveis financeiramente, mas, quando se veem envolvidas em algum escândalo, despencam. O mercado está começando a precificar essas boas práticas.
E como as práticas sustentáveis afetam os ativos?
Walter – Uma empresa está barata, por exemplo, pode ter um risco de governança muito alto, então o melhor é não investir. Há 10 anos, os riscos climáticos e sociais não eram levados tão em conta na hora de selecionar investimentos, mas os gestores estão começando a incorporar essas questões nos processos. Por exemplo, fala-se muito em aquecimento global, emissões de gases poluentes, efeito estufa, créditos de carbono. Se eventualmente o governo começar a taxar as emissões de carbono, essa empresa que estava com um lucro aparente vai ter uma despesa a mais que não estava prevista, então é esperado que o gestor do fundo de investimento esteja ciente desse risco.
A mentalidade do investimento ESG é a de que você não vai deixar de investir em uma empresa boa, mas evitar uma companhia que traz mais risco. A tendência é deixar a carteira mais “defensiva”, protegida de quedas mais acentuadas, porque as empresas com boas práticas ESG tendem a se perpetuar mais.
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O ESG é uma tendência que veio para ficar ou ainda é visto como um interesse passageiro?
Walter – Entendo que o mercado oscila nesse sentido de interesse, mas penso que é uma tendência que veio para ficar. Para o bem ou para o mal, temos visto cada vez mais exemplos de empresas que têm quedas em função de alguma controvérsia, seja ambiental, social ou de governança. Isso não vai desaparecer de uma hora para outra, até porque na Europa a regulação está avançando, especialmente para evitar o greenwashing. Aqui no Brasil também está começando uma maior regulamentação, para que o investidor entenda melhor no que está investindo, já que ESG é um termo muito amplo.
O que vemos atualmente é uma tendência de integração do ESG no processo de investimento, que funciona mais ou menos assim: uma determinada empresa polui muito, a “fotografia” atual está péssima, mas eu vou investir e ajudar essa companhia para que ela melhore em suas práticas ambientais. Importante ressaltar que as empresas listadas na bolsa recebem um olhar maior não só dos investidores, mas da mídia e, consequentemente, da sociedade em geral. Já vi casos de organizações que, simplesmente, fecham capital, porque aí vai ter menos gente em cima, e continuam poluindo.
O ESG é um tripé e, em tese, deveria ser equilibrado. A prática, porém, é diferente. Há algum pilar que se destaca?
Walter – A governança sempre foi um ponto de preocupação tradicional dos investidores no Brasil. Hoje, o destaque vai mais para o lado ambiental, um reflexo da influência europeia, porque lá as preocupações ambientais são bem maiores do que as sociais. Eu penso que no Brasil deveria ser o oposto, porque temos bem mais problemas sociais do que na Europa, como a pobreza, desigualdade. O problema é que o pilar social é difícil de quantificar, colocar em números. No caso ambiental, conseguimos colocar um preço para o crédito de carbono. Já no âmbito social, como iremos mensurar o risco de uma empresa, traduzir uma controvérsia em valores? É muito difícil precificar o risco social ou a oportunidade.
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E qual o efeito financeiro de uma empresa investir na melhoria dos processos?
Quando falamos de ESG, falamos mais de risco (e não tanto de oportunidade), mas o ESG traz potenciais de ganho. Uma empresa que se torna mais sustentável e melhora sua eficiência vai aumentar seu lucro, pois reduzirá custos. Ao melhorar o processo de produção e reduzir o impacto ambiental, há um claro benefício financeiro. Só que quando miramos o social temos dificuldade em fazer essa analogia.
O quão avançado – ou atrasado – está o Brasil em produtos ESG?
Walter – Estamos atrasados, sim, principalmente em relação à Europa, o que dificulta a vida das gestoras de investimentos, porque para fazer análises voltadas a ESG é fundamental ter dados. Se a empresa não divulga esses dados, o gestor vai ter que dedicar um tempo muito grande na busca por eles. As empresas de capital aberto têm balanços auditáveis, mas os relatórios de sustentabilidade não passam pela mesma auditoria, o que significa que eles podem ser maquiados e ter alguma divergência de informação.
Eu sou a favor de mais transparência, mas é preciso tomar cuidado para não encarecer para as pequenas e médias empresas. Companhias grandes, maduras, têm equipes para isso, mas PMEs, não. Esse é um ponto de atenção: um eventual custo regulatório bastante alto.
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Tradicionalmente, o mercado financeiro é um ambiente muito masculino. Como atrair mulheres para a área e por que é importante que esse espaço seja diverso?
Walter – Diversos estudos apontam que empresas com maior diversidade – de um modo geral, não apenas gênero – têm melhores resultados. De forma resumida, isso ocorre porque a diversidade traz perspectivas diversas, olhares críticos diferentes e tudo isso agrega e gera valor. Ou seja, atrair mais mulheres para o mercado financeiro promove um acréscimo em termos de contribuição e pluralidade de perfis. Mas como melhorar esse cenário? Algumas iniciativas apontam um caminho, como o Young Women in Investment, da CFA Society Brazil, que promove cursos para universitárias e tem parceria com algumas instituições financeiras para programas de estágio, para citar um exemplo. O que as mulheres precisam é se sentir incentivadas a participar.