As mudanças fazem parte do pacote alternativo proposto pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, ao aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). No último domingo (8), o chefe da pasta econômica se reuniu por quase seis horas com lideranças do Congresso para encontrar saídas para compensar a perda de arrecadação prevista pela proposta anterior – da qual o governo se viu obrigado a voltar atrás após repercussão negativa no mercado.
A nova proposta ainda precisa ser aprovada pelo Congresso. Se passar, começa a valer para títulos emitidos a partir de 2026.
Com a ajuda de Júlio César Soares, especialista em direito tributário e sócio da Advocacia Dias de Souza; Gilberto Ayres Moreira, sócio do escritório Ayres Westin Advogados e membro da Associação Brasileira de Direito Financeiro (ABDF); e Jeff Patzlaff, planejador financeiro e especialista em investimentos, o E-Investidor resumiu as principais mudanças que afetam os investimentos.
Veja:
Ativos isentos como LCIs, LCAs e debêntures
- Como é: isento de imposto de renda;
- Como pode ficar: 5% de imposto de renda.
A proposta do governo é cobrar 5% de IR sobre os ativos que hoje são isentos. São eles:
- Letras Hipotecárias;
- Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRI);
- Letras de Crédito Imobiliário (LCI);
- Certificado de Depósito Agropecuário (CDA);
- Warrant Agropecuário (WA);
- Certificado de Direitos Creditórios do Agronegócio (CDCA);
- Letra de Crédito do Agronegócio (LCA);
- Certificado de Recebíveis do Agronegócio (CRA);
- Cédula de Produto Rural (CPR);
- Letras Imobiliárias Garantidas (LIG);
- Letras de Crédito do Desenvolvimento (LCD);
- Títulos e valores mobiliários relacionados a projetos de infraestrutura (Lei nº 12.431, de 2011); as debêntures incentivadas.
Fundos Imobiliários (FIIs) e Fiagros
- Como é: 20% de IR sobre o ganho de capital e isenção sobre dividendos;
- Como pode ficar: 17,5% de IR sobre o ganho de capital e 5% sobre dividendos.
Os FIIs e fiagros terão duas mudanças com a MP. O ganho de capital das cotas já é tributado atualmente, mas a alíquota do IR vai mudar de 20% para 17,5%. Já os dividendos pagos pelos ativos, que hoje são isentos para o investidor pessoa física, passam a ser tributados em 5%.
Na prática, quem recebe hoje R$ 1000 em dividendos passaria a receber R$ 950 a partir de 2026. Essa alíquota de 5% será aplicada de forma uniforme para todos os tipos de FIIs, sejam eles de papel, tijolo ou fundos de fundos.
O texto da MP destaca ainda que não haverá bitributação. FIIs de papel têm na carteira CRIs que agora também serão tributados. O receio era que o investidor fosse cobrado “duas vezes”.
“O CRI, mesmo com a isenção sendo revista para investidores pessoa física, permanece isento dentro da estrutura do FII. Ou seja, o fundo continua comprando CRIs sem pagar imposto na origem. A tributação ocorrerá apenas na distribuição dos proventos ao cotista, com retenção de 5% na fonte”, explica Carol Borges, head e analista de FIIs da EQI Research.
FI-Infras
- Como é: ganho de capital e dividendos isentos para o pessoa física;
- Como pode ficar: 5% de IR sobre o ganho de capital e sobre os dividendos.
Os fundos Incentivados de Investimento em Infraestrutura, FI-Infras, hoje são isentos para o investidor pessoa física. A MP propõe que esses fundos sejam tributados em 5% no ganho de capital e no rendimento.
CDBs, Tesouro Direto e fundos
- Como é: 22,5% de IR em ativos com vencimento até 180 dias (até seis meses); 20% sobre o lucro de aplicações de 181 a 360 dias (até um ano); 17,5% entre 361 e 720 dias (até dois anos); e 15% para prazos acima de 720 dias (mais de dois anos);
- Como pode ficar: 17,5% para todos os vencimentos.
A MP propõe a unificação das alíquotas sobre produtos financeiros que hoje são cobrados em uma tabela regressiva, que varia de 22,5% a 15% a depender do prazo do investimento. No lugar, entraria uma cobrança uniforme de 17,5% sobre o ganho de capital, independentemente do tempo que o investidor mantenha os recursos aplicados. São eles:
- Certificados de Depósito Bancário (CDBs);
- Títulos do Tesouro Direto;
- Fundos de investimentos;
- Recibo de depósito bancário (RDB);
- Letras de Câmbio (LC);
- Letras Financeiras (LF);
- Debêntures comuns.
Importante destacar que, dessa lista, os fundos de investimento ainda têm a cobrança de come-cotas, que não foi alterada.
Ações
- Como é: IR de 15% sobre o lucro da venda de ações em operações que superem R$ 20 mil por mês;
- Como pode ficar: IR de 17,5% sobre o lucro da venda de ações em operações que superem R$ 60 mil no trimestre.
Os lucros em operações na Bolsa de Valores e no mercado de balcão organizados são tributados hoje em 15% de IR somente se o ganho líquido – ou seja, o resultado positivo da venda de uma ação e de opções – superar R$ 20 mil por mês. Com a proposta do governo, a alíquota sobe para 17,5% para ganhos maiores a R$ 60 mil no trimestre.
A regra atual permite que o investidor compense prejuízos no cálculo do imposto, sem limite de tempo. Com a MP, a compensação fica limitada a cinco trimestres subsequentes da operação que rendeu a perda.
Day trade
- Como é: IR de 20% sobre o lucro de operações mensais de qualquer valor;
- Como pode ficar: IR de 17,5% sobre o lucro.
As operações de day trade já não tinham isenção de imposto de renda para a pessoa física. Hoje, ganhos mensais na venda das ações são tributados em 20% independentemente do valor. Com a MP, a alíquota cai para 17,5%.
Assim como na venda comum de ações, a compensação de perdas fica limitada aos cinco trimestres subsequentes.
Previdência privada
- Como é: alíquota regressiva de 35% (até dois anos) a 10% (acima de 10 anos) de IR a depender do prazo do investimento e isento de IOF;
- Como pode ficar: tributação de IR não se altera, IOF de 5% para aportes anuais maiores que R$ 600 mil por CPF.
No caso da previdência privada, a MP não muda o regime de cobrança do imposto de renda, que hoje permite a alíquota mínima de 10% para aplicações superiores a 10 anos. A mudança é na cobrança de IOF. Hoje, os aportes e rendimentos não estão sujeitos ao tributo.
Com a MP, investimentos anuais superiores a R$ 600 mil em planos da modalidade VGBL serão cobrados em 5% de IOF. A regra vale por CPF e não por instituição, ou seja, se o investidor faz aportes em seguradores distintas, o limite de R$ 600 mil considera a soma dos valores totais investidos.
Criptomoedas
- Como é: alíquota progressiva de 15% a 22,5% sobre ganhos e rendimentos para operações superiores a R$ 35 mil por mês;
- Como pode ficar: 17,5% de IR sobre ganhos e rendimentos para a pessoa física independentemente do valor do investimento.
A principal mudança da MP em relação a criptoativos é o fim da isenção para operações mensais acima de R$ 35 mil. Agora, todo investidor pessoa física vai pagar 17,5% de IR sobre os ganhos e rendimentos, independentemente do valor que tenha investido.
A MP determina ainda a apuração obrigatória trimestral mesmo para valores menores. Há ainda a possibilidade de compensação de perdas entre ativos virtuais.
Juros sobre Capital Próprio (JCP)
- Como é: 15% de imposto de renda;
- Como pode ficar: 20% de imposto de renda.
A proposta é subir as alíquotas de IR cobradas sobre o JCP pago pelas empresas de capital aberto de 15% para 20%. Essa não é uma novidade: o governo Lula fez essa proposta pela primeira vez em 2024, mas foi barrado pelo Congresso. A gestão anterior, do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), também tentou pautar o tema.
Quando começa a valer?
A MP do governo não vai afetar os títulos que o investidor já tem na carteira. Se as medidas forem aprovadas no Congresso, não afetam o estoque nem emissões realizadas até 31 de dezembro de 2025. Ou seja, o novo modelo de tributação passaria a valer para ativos emitidos a partir de 2026.