- Pouco mais de oito meses após o lançamento, o “LFTS11”, ETF que replica o Tesouro Selic, teve as negociações suspensas na plataforma da XP após uma grande confusão tributária
- Agentes de mercado apontam que a tributação diferenciada do ETF, de 15% no momento do resgate, leva em conta um cálculo errado. Na verdade, essa alíquota deveria ser bem maior, em 25%
- Em fato relevante, a Investo afirma que a metodologia de cálculo está correta e devidamente fundamentada em relatórios do Banco Central e em “pareceres técnicos e jurídicos de consultorias renomadas”
Pouco mais de oito meses após o lançamento, o “LFTS11”, ETF que replica o Tesouro Selic, teve as negociações suspensas na plataforma da XP após uma grande confusão tributária. A paralisação ocorreu na terça-feira (18) e resultou em uma desvalorização de 0,18% das cotas do fundo na sessão seguinte e saída de 219 cotistas. Os dados são da Status Invest.
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Um ETF é um fundo que acompanha um índice ou ativo, cujas cotas são negociadas na Bolsa na forma de ações comuns. Lançado pela gestora Investo, o LFTS11 é tido como o primeiro da modalidade a replicar os LFTs, como também são chamados os títulos públicos atrelados à Selic.
As vantagens do produto seriam principalmente tributárias, já que o ETF teria uma alíquota fixa para resgates de 15%, sem come-cotas ou incidência de Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) para resgates feitos em até 30 dias após o aporte.
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Já os títulos do Tesouro Direto são sujeitos à tabela regressiva de IR, de 15% a 22,5%, a depender do prazo do investimento, além de também ter incidência de IOF. Para ser tributado em 15% no resgate, o investidor do Tesouro Selic deveria manter o investimento por mais de dois anos. A taxa de administração do ETF, de 0,19% ao ano, também é abaixo dos 0,2% ao anos cobrados pelo Tesouro na custódia.
Pode não ser bem assim
A ideia de que o LFTS11 poderia ser tributado em apenas 15% vem de uma interpretação da portaria 163/2016 do Ministério da Fazenda, que estabelece a metodologia de apuração de impostos sobre os rendimentos de cotistas de fundos de investimento por meio do cálculo do “Prazo Médio de Repactuação da Carteira” (PRC).
O prazo médio dos títulos na carteira do LFTS11 são longos, de mais de 720 dias, por isso a tributação seria a menor possível.
Alíquota IRRF |
Prazo Médio de Repactuação da Carteira (“PMRC”)
|
25% | PMRC igual ou inferior a 180 dias; |
20% |
PMRC superior a 180 dias e igual ou inferior a 720 dias;
|
15% | PMRC superior a 720 dias |
Entretanto, no artigo 2º da Lei, há um detalhe relevante: o texto aponta que o prazo médio a ser considerado em ativos indexados a taxas de juros flutuantes, como é o caso da Selic, não deve ser a duração dos títulos a ser considerada no cálculo, mas o prazo de repactuação da taxa.
No caso da Selic, essa repactuação é diária, o que elevaria a tributação para resgates para 25% e tornaria o ETF desvantajoso em relação a investir de forma direta no Tesouro Selic. É isso que explica Leandro Siqueira, co-fundador da Varos , que começou a estudar essa questão no início de abril e emitiu, ainda naquele mês, um relatório retirando a recomendação de compra para o ETF. “Agora as corretoras estão parando de distribuir esse ETF, por temor de ocorrerem problemas jurídicos no futuro ou de ficarem encrencados com a Receita Federal”, aponta Siqueira.
Em fato relevante, a Investo afirma que a metodologia de cálculo do PMRC está correta e devidamente fundamentada em relatórios do Banco Central e em “pareceres técnicos e jurídicos de consultorias renomadas”.
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“Desconhecemos qualquer comunicação expedida pela Anbima, no âmbito de sua autorregulação, que pudesse permitir a conclusão da alegada divergência”, afirma a Investo. A Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), por sua vez, afirma que não é da competência do órgão supervisionar regras fiscais de fundos de investimento.
“As normas que regem a tributação dos ETFs são de responsabilidade do Ministério da Fazenda, conforme a Portaria 163, e da Receita Federal, de acordo com a Lei 13.043”, afirma a Anbima, em nota à imprensa.
Fim da atratividade?
Com o questionamento relacionados à tributação do ETF, o consenso dos analistas é de que o ativo pode perder sua principal fonte de atratividade, que é justamente a tributação menor em relação aos títulos do Tesouro Direto.
“Não compensa. Fica pior que a tributação regressiva dos títulos”, afirma Pedro Menin, sócio-fundador da Quantzed, casa de análise e empresa de tecnologia e educação financeira para investidores. “Comprar o ETF com tributação a 25% não faz sentido, o ativo perde o sentido de existir.”
Essa também é a visão de Gustavo Cruz, estrategista chefe da RB Investimentos. “Em qualquer corretora é possível comprar Tesouro sem quase nenhuma taxa, se é pra acompanhar a Selic, é bem simples de fazer”, afirma.
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