Valorização das ações refletiu correção de preços e melhora nas expectativas do mercado. Foto: AdobeStock
O principal índice de ações da Bolsa brasileira, o Ibovespa, caminha para fechar 2025 com uma valorização superior a 30%, com a maioria dos 82 papéis que fazem parte do benchmark acumulando ganhos de dois dígitos. O bom desempenho reflete o fechamento da curva de juros longa no Brasil e o movimento de entrada de capital global em mercados emergentes.
Por outro lado, esse processo pressionou o câmbio, valorizando o real e derrubando a cotação do dólar, hoje na casa dos R$ 5,50, num cenário mais desafiador para empresas com receitas na moeda americana. Foram justamente essas companhias que registraram algumas das piores performances do Ibovespa no ano.
Para Filipe Ferreira, professor do Insper e sócio da CTW consultoria, o ano de 2025 na Bolsa não pode ser lido como de expansão, mas de correção. A expectativa de queda de juros beneficiou operações estranguladas pelas altas taxas.
“Não é um movimento de euforia. É um contra-ajuste. Muitas empresas tinham sido penalizadas além do razoável e passaram a se beneficiar de uma melhora marginal nas expectativas”, diz o consultor.
Isso explica, para ele, nomes de incorporadoras no topo da lista das melhores performances da Bolsa (incluindo empresas fora do Ibovespa), a exemplo de Cyrela (CYRE3) , Direcional (DIRR3) e Cury (CURY3), além de outras ligadas ao varejo como Magazine Luiza (MGLU3) , C&A (CEAB3) e Vivara (VIVA3).
Queda dos juros explica boa parte da alta da Bolsa
Ferreira lembra que o ano começou com uma expectativa de juros longos (com vencimentos em 2034) em mais de 15% ao ano, o que foi caindo para algo em torno dos 13% ao ano agora em dezembro.
Embora seja um nível alto para um País com meta de inflação de 3%, a queda de juros futuros fez toda a diferença para empresas que consomem caixa através de dívidas para rodar seus negócios.
“A gente está falando de uma redução de 2 pontos percentuais ao ano. Numa perpetuidade, dá uma diferença gigantesca no valor presente”, comenta o especialista.
Marcelo Nantes, head de renda variável do ASA, lembra que as empresas de construção civil também foram beneficiadas pelos incentivos estatais à habitação popular, funding via Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e regras favoráveis, que ajudaram a sustentar as performances, mesmo num ambiente de juros elevados. “O setor vem surfando uma onda de incentivos do governo”, comentou.
Fator
Impacto no Ibovespa em 2025
Queda dos juros longos
Reprecificação de empresas alavancadas
Entrada de capital estrangeiro
Alta generalizada das ações
Valorização do real
Pressão sobre empresas dolarizadas
Incentivos habitacionais
Benefício às construtoras
Turnarounds operacionais
Destaque para Cogna e varejo
Commodities e estatais
Desempenho negativo
O custo financeiro mais elevado, por outro lado, dificulta o desempenho. “O lucro das empresas piorou ao longo do ano, mas a Bolsa subiu mesmo assim”, observa Nantes.
Na sua visão, o Brasil foi beneficiado não por mérito próprio, mas por estar barato, líquido e ser um mercado relativamente pequeno diante do volume de recursos que buscou novos destinos. “O investidor estrangeiro procurou algo melhor que os Estados Unidos”, diz.
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Essa leitura ajuda a explicar por que mais da metade das ações do Ibovespa em 2025 subiu dois dígitos.
Turnarounds e gestão explicam altas específicas
Gustavo Harada, head de alocação da Blackbird, pondera que entre as principais altas do ano também aparecem resultados de boas gestões que priorizaram a redução de endividamento e recuperação de margem de lucro. Um exemplo seria a Cogna (COGN3), o papel que mais subiu este ano, com uma valorização na casa de 250%.
“A Cogna vem num turnaround forte. Revertendo perdas, saiu de prejuízo para lucro que, no acumulado do ano, está em R$ 405 milhões. Tem apresentado bons resultados, com redução de endividamento e ganho de eficiência operacional”, comenta.
A melhora dos balanços foi a tônica entre as líderes do varejo. “A C&A apresentou recuperação na margem, assim como Grupo Soma (AZZA3), Alpargatas (ALPA4) e Vivara, que mostraram resultados bons e tiveram uma revisão positiva dos analistas”, diz.
Bancos e ações defensivas sustentam o índice
O setor bancário e financeiro também teve forte desempenho, com destaque para Itaú (ITUB4), Bradesco (BBDC4) e B3 (B3SA3).
Ferreira ressalta que os bancos brasileiros aprenderam a operar em ambientes de juros altos e em mudanças de cenários, com exceção do Banco do Brasil (BBAS3), que foi penalizado por fatores contábeis e por sua exposição ao agro.
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Ainda no segmento financeiro, o consultor destaca a performance do BTG (BPAC11). “Essa é uma empresa com histórico consistente de crescimento de lucros, independente do ciclo econômico. BTG não é projeção, é histórico”, afirma.
Cotado na casa dos R$ 50, o banco dobrou seu valor de mercado este ano embalado por recordes em receitas, além de um ROE (retorno sobre patrimônio) elevado, chegando a 28,1% no 3T25.
O Ibovespa em 2025 também foi puxado pelas companhias “defensivas”, aquelas que tendem a apresentar menor volatilidade e maior previsibilidade de receita, como as empresas de telecomunicações, saneamento e elétricas.
“O mercado foi atrás de empresas com boa conversão de caixa, baixo risco de inadimplência e visibilidade de resultados. Um bom exemplo é a TIM, que o mercado segue vendo como uma ação defensiva de qualidade”, diz Harada, da Blackbird.
Nantes chama atenção para os resultados de Eletrobras (que agora é Axia, AXIA3) e Eneva (ENEV3), que tiveram exposição direta ao aumento do preço de energia, ganho que outras geradoras, travadas em contratos antigos, não tiveram.
Commodities, estatais e problemas internos pesam
Entre as decepções do ano, estão as empresas de commodities, estatais e aquelas que passaram por problemas internos.
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No setor de petróleo, Petrobras (PETR3, PETR4), Brava (BRAV3), PetroReconcavo (RECV3) e Braskem (BRKM5) combinam a volatilidade do preço do produto no mercado internacional, marcado por tendência de queda e estabilidade em patamares mais baixos, por excesso de oferta e desaceleração na demanda.
No caso da Petrobras, há ainda o desconto estrutural por ser uma companhia estatal, mesmo que o preço do petróleo volte a subir. “Ela acaba ficando com essa alcunha de que se der errado eu perco, mas se der certo eu não ganho”, resume Ferreira, da CTW.
Em relação à Braskem, pesaram também os riscos ambientais e jurídicos relacionados ao caso de Alagoas, após o afundamento do solo causado pela extração de sal-gema na capital Maceió, lembra Harada.
O dólar mais fraco globalmente pressionou de forma geral as empresas de commodities, incluindo também as empresas de papel e celulose.
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“A gente tem que lembrar que no fim do quarto trimestre de 2024, o dólar estava a R$ 6,20. O ponto de partida é um pouco mais estressado, diz Nantes. “Suzano (SUZB3) se beneficia da alta do dólar, mas agora está na ponta contrária. A mesma coisa para Klabin (KLBN11)”, resume Ferreira.
Embora o ambiente macroeconômico ajude a explicar parte das perdas do ano, algumas das piores performances do Ibovespa em 2025 tiveram origem em fatores internos às companhias.
Raízen, Hapvida e Natura sofrem com execução
No caso da Raízen (RAIZ4), a origem da decepção está em decisões tomadas no momento do IPO. A companhia assumiu um plano de investimentos muito agressivo, elevando significativamente o endividamento em um ambiente de juros altos.
“Foi uma decisão que a empresa tomou e agora está fazendo o preço”, analisa Nantes. Ele diz ainda que a queda da Cosan (CSAN3) reflete sua exposição à Raízen e à Vale (VALE3), cuja performance ficou abaixo do esperado após a aquisição de participação pela holding.
A Hapvida (HAPV3) seguiu caminho semelhante. Após a fusão com a Intermédica, há três anos, o mercado passou a esperar a integração das operações, o que envolve sistemas, processos e estruturas complexas. No entanto, os resultados recentes vêm frustrando expectativas.
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“Natura (NATU3) também é um papel que decepcionou bastante, vem há algum tempo fazendo uma reestruturação, vendeu vários ativos, cortou na carne, mas acho que o mercado esperava uma transformação mais rápida e menos dolorosa”, observa o executivo do ASA.
A WEG (WEGE3) é outra que aparece entre os piores desempenhos do ano, mas, segundo Ferreira, o movimento foi mais de correção por ser uma empresa que já vinha muito valorizada e que não conseguiu reverter os ganhos com o fechamento da curva de juros. “Cair 12% é ruim, mas ela não foi muito mal. Ela só caiu um pouco no ano que estava todo mundo subindo”, observa.