- O especialista, baseado na Escócia, foi convidado pela gestora americana para gerenciar o projeto Franklin Templeton Institute
- O 'Institute’ é um grupo formado para fornecer insights e ajudar os investidores a resolverem questões complexas, identificar oportunidades e avaliar riscos
- Em entrevista exclusiva ao E-Investidor, Catechis fala sobre a criação do instituto e anuncia uma novidade em primeira mão: os conteúdos organizados pelo grupo agora serão fornecidos para os investidores do Brasi
Há pelo menos cinco tendências que devem afetar a carteira dos investidores na próxima década e que precisam entrar no radar do mercado.
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Aceleradas pela covid-19, as mudanças climáticas, tensões geopolíticas, a inovação tecnológica, o endividamento dos países e o crescimento da população mundial devem nortear uma nova perspectiva para a alocação de ativos. A avaliação é de Kim Catechis, estrategista de Investimentos do Franklin Templeton Institute.
O especialista, baseado na Escócia, tem 34 anos de experiência em ações e investimentos de mercados desenvolvidos e emergentes e foi convidado para chefiar um projeto lançado em abril pela gestora americana. O ‘Institute’ é um grupo formado para fornecer insights e ajudar os investidores a resolverem questões complexas, identificar oportunidades e avaliar riscos.
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Em entrevista exclusiva ao E-Investidor, Catechis e Marcus Gonçalves, diretor presidente da Franklin no Brasil, falam sobre a criação do instituto e anunciam uma novidade em primeira mão: os conteúdos organizados pelo grupo agora serão fornecidos para os investidores do Brasil.
“A necessidade de informação nunca foi tão grande. A grande diferença que estamos vendo agora é a importância de consolidar todo esse conteúdo de uma maneira que seja mais objetiva para o investidor”, diz Catechis. “O Institute atende essa demanda por oferecer informação em um formato profundo, mas interessante de ler.”
Veja os principais trechos da entrevista:
E-Investidor – A gestora vai oferecer para os clientes do Brasil a expertise da Franklin Templeton Investment Institute. O Sr. pode explicar mais sobre esse lançamento?
Marcus Gonçalves – Somos um grupo global com times especializados em ações em mercados emergentes, renda fixa, mercado imobiliário e assim por diante. O Institute funciona como um elo de ligação entre todo esse conteúdo e inteligência do grupo. Ele consolida tudo isso e transforma em materiais com uma profundidade da análise da pesquisa que todo o grupo Franklin Templeton faz ao redor do mundo.
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E-Investidor – O Institute foi criado em janeiro deste ano. Qual foi o fator motivador por trás da iniciativa?
Kim Catechis – Como indústria, o asset management tem vários desafios na próxima década. O fato é que hoje eu acho que não é suficiente ser o gestor. Precisamos criar relacionamento com os clientes. Se um investidor tem alguma dúvida ou problema, eu gostaria que ele pensasse no nome da Franklin Templeton como um solucionador.
E-Investidor – Por que a Franklin sentiu a necessidade de oferecer esse serviço para os investidores brasileiros em um momento de instabilidade tão forte no país?
Gonçalves – A necessidade de informação nunca foi tão grande. A grande diferença que estamos vendo agora é a importância de consolidar todo esse conteúdo de uma maneira que seja mais objetiva para o investidor. No Brasil, temos investidores de diferentes perfis e percebemos que as pessoas estão se internacionalizando e querem fazer aplicações no exterior, principalmente por conta da regulação que tem evoluído e da taxa de juros que caiu. O Institute atende essa demanda por oferecer informação em um formato profundo, mas interessante de ler. O grande trabalho do Institute é dar mais subsídios ao investidor para que ele possa tomar melhores decisões.
E-Investidor – A Franklin investe em ativos brasileiros desde a década de 1980, por meio de fundos internacionais. Quais são as principais estratégias da gestora para o Brasil hoje?
Gonçalves – Trabalhamos com três estratégias: clientes brasileiros que investem no mercado doméstico, outros que investem fora do Brasil e estratégias para clientes externos que investem aqui. Nosso carro chefe aqui é ações. Na parte de renda fixa, temos a nossa estrutura parceira Western, que está embaixo do guarda-chuva do grupo. Temos aumentado também o nosso leque de produtos internacionais. Criamos aqui no Brasil fundos que investem lá fora para os investidores qualificados, mas esperamos que isso seja aberto para o público geral. A demanda dos investidores brasileiros por alocações globais é crescente e nesse aspecto nós ainda vamos lançar mais novidades.
E-Investidor – Diante do atual cenário de alta da inflação e incertezas políticas, onde estão as grandes oportunidades para os investidores brasileiros?
Catechis – Eu comecei a investir no Brasil em 1996 e tenho visto diferentes ciclos na Bolsa. Neste momento, a situação é interessante no sentido de que existe uma boa perspectiva construtiva no país, mas temos uma incerteza política que torna difícil ter convicções mais fortes no curto prazo. O fato é que há certas tendências muito importantes, com oportunidades no setor de tecnologia, empresas do setor financeiro e industrial, mas cada uma depende da perspectiva dos próximos dois anos. Pessoalmente, acho que falta transparência para ter uma condição mais clara.
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E-Investidor – Estamos a um ano das eleições presidenciais no Brasil, com uma disputa que deve ser focada em dois candidatos: Jair Bolsonaro e Luiz Inácio Lula da Silva. Com a vasta experiência que o Sr. tem no mercado internacional, e o conhecimento que possui do mercado brasileiro, qual resultado deve provocar um movimento mais forte de venda de ativos por parte de investidores estrangeiros
Catechis – Infelizmente, o Brasil conta muito pouco no mercado global e tem ficado muito atrás em relação aos outros países emergentes. Neste momento, a triste realidade é que o investidor global não pensa muito no Brasil. Qualquer que seja o próximo presidente, ele vai ter que fazer frente às mesmas limitações e desafios estruturais do país. Eu acho que o investidor estrangeiro estará ausente quando chegar as eleições, com pousa exposição no Brasil. Isso deixa uma possibilidade de recuo forte após as urnas. Perversamente, esse recuo pode chegar independentemente do vencedor. O mercado não gosta de incertezas.
Leia também: Vender ou manter? O que fazer com os investimentos a 1 ano da eleição
E-Investidor – Qual é a visão que o investidor estrangeiro tem sobre o Brasil hoje?
Catechis – O que me preocupa mais hoje do que em qualquer outro momento da minha carreira de 34 anos é a questão ambiental. O Brasil saiu de um lugar onde a governança ambiental era fantástica, para uma situação onde todos acham que o país está queimando a Amazônia inteira. Evidentemente que essa não é a realidade, mas a percepção que existe é essa. A outra coisa que também é preocupante é que o país tem o pior sistema fiscal do mundo. Esses são alguns exemplos. O Brasil tem um grande potencial, mas a percepção generalizada hoje não é boa.
E-Investidor – Então o que precisaria acontecer para que o investimento externo viesse em peso?
Catechis – O Brasil é um país que todo mundo gosta, reconhece, mas sabe quais são os seus desafios. É necessário que certas reformas estruturais aconteçam. Evidentemente, um problema que temos é que os políticos trabalham com uma agenda que não é a mesma do investidor. O investidor financeiro não tem paciência. Os estrangeiros voltam quando acham que o panorama tem mudado. Para o Brasil ser popular outra vez é necessário ter um reconhecimento de que a valorização média das empresas é atrativa. Neste momento elas não são. O mercado tem que ser mais barato. Segunda coisa, tem que haver uma certeza generalizada do programa econômico e de reformas estruturais da próxima administração.
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E-Investidor – Ainda há certa resistência de entender que a agenda ESG entrega retornos altos aos investidores. Por que o fator sustentável ainda é visto como pouco atraente?
Catechis – Quem não vê a agenda ESG como atraente ou é mal informado ou não reconhece o fato de que o mundo está mudando. Uma empresa que tem um bom recorde de retorno sobre capital hoje não é suficiente. Há dez anos atrás isso era suficiente. No futuro, além disso, a companhia precisará ser líder em ESG.
Gonçalves – As pessoas ainda não identificam isso como um atributo. Muitos ainda relacionam ESG com caridade e acham que investir nesse setor tem mais a ver com o aspecto de fazer o bem. Uma coisa é ser bom cidadão e outra é ganhar dinheiro. As duas coisas convergem, na verdade.
E-Investidor – O investidor de países de baixa renda deveria se preocupar mais com os impactos das mudanças climáticas?
Catechis – Qualquer investidor deve se preocupar com esses impactos. Uma coisa que temos visto nos últimos anos é que as mudanças climáticas não respeitam fronteiras e tem resultados negativos para todos os países, independentemente de sua riqueza.
O investidor busca uma oportunidade de ganhar bons retornos para o seu cliente. Quando você investe em países com menos riquezas isso não é tão importante como fator. O fator número um é a qualidade das instituições daquele país, se são bem respeitadas, e se há uma equipe com o conhecimento adequado sobre o assunto.
Uruguai é um bom exemplo de país pequeno, que não é exatamente rico e tem tido uma trajetória muito correta em relação a pandemia. Não importa o problema, é preciso ter instituições fortes, que funcionam bem e com um bom marco legal, e o mais importante de tudo é ter o benefício de ter a confiança de sua população. Os problemas chegam quando não há essa confiança generalizada ou se ela está sendo afetada negativamente por outras conjunturas.
E-Investidor – E qual é a melhor forma de o investidor se proteger nesses casos?
Catechis – Primeiro com conhecimento. É importante aceitar que um determinado problema existe, assim como a sua potencialidade. O investidor tem que ser sério na hora de elaborar os conhecimentos e na hora de investir. É importante ter uma boa ideia de como quantificar o risco potencial no longo prazo. O risco sempre é uma variável potencial até o dia em que ele realmente se produz.
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E-Investidor – A sua pesquisa também concluiu que a geopolítica deve se tornar cada vez mais inerente aos investimentos à medida que a tensão entre os EUA e a China cresce. Como a pressão por escolher um dos lados pode interferir no balanceamento das carteiras?
Catechis – Muitos investidores no mundo não consideravam essa eventualidade entre os dois países mais importantes do mundo, economicamente falando. Os EUA acha que a China é o adversário mais perigoso que eles têm e querem limitar a China em todos os níveis, priorizando a área de tecnologia, principalmente por conta das aplicações militares. Por outro lado, os americanos pediam para que a China copiasse modelo econômico anglo-saxão capitalista, algo que não está no panorama de Beijing. A China não quer ser a número um, mas o país deseja a permanência no poder do partido comunista. A segunda prioridade é alinhar esse objetivo com a melhoria da qualidade de vida do cidadão chinês. Eles acham que a forma de estender o sistema de governo deles é deixar que o cidadão médio sinta que a sua vida está melhorando em termos materiais, que o ar que ele respira é cada vez mais limpo e que ele tem mais acesso à água potável e de qualidade. É uma alienação de objetivos que para o investidor não é ruim. O problema chega quando você tenta combinar essas duas visões. Os EUA já abandonaram a ideia de que a China pode mudar e já estão com uma visão de que devem parar com os financiamentos e bloquear o acesso às tecnologias. A China quer demonstrar que o seu comunismo funciona e pode dar certo para muitos países. Eles alegam que o sistema pode oferecer infraestrutura física, nível econômico melhor e pode ser uma influência positiva no meio ambiente.
E-Investidor – O investidor americano ficou mais limitado?
Catechis – Um investidor americano já tem dificuldades para investir na China. Com os acontecimentos do ano passado, com cada vez mais obstáculos para as empresas chinesas atuarem na bolsa de Nova York, era lógico esperar um momento onde a grande maioria das empresas da China não seriam negociadas em NY. Para um fundo de pensão, por exemplo, ou para o investidor pessoa física, isso já bloqueia efetivamente o seu alcance para investir na China. Em 34 anos de carreira eu nunca achei que a nacionalidade de um investidor poderia limitar o seu universo de oportunidades.
E-Investidor – Qual seria a melhor estratégia de balanceamento das carteiras para o investidor brasileiro que deseja se manter neutro?
Catechis – A definição de neutro vai depender da nacionalidade do cliente. O Brasil tem uma vantagem porque não está em uma linha direta entre os dois países. O País também não depende muito do comércio global e tem uma boa relação de fornecedor de matéria prima com a China. O problema vai chegar somente se um investidor brasileiro quiser investir seu dinheiro que está domiciliado nos Estados Unidos. Lá sim pode ser um problema. Não há uma solução única para proteger a carteira. Você sempre tem que ter um olho na questão do clima geopolítico do país para não ficar preso em situações desagradáveis.
E-Investidor – E quais são os maiores riscos geopolíticos que devem entrar no radar do investidor global?
Catechis – Há dois. Uma política econômica e industrial que não funciona é um risco para o investidor. A segunda coisa que é necessário considerar é a segurança mundial, como uma segunda pandemia. Provavelmente haverá outra desse tipo nos próximos anos. O nível de preparação de cada país é fundamental nessa equação, como já sabemos. Nessa mesma categoria de segurança, o cálculo não adequado das relações entre países vizinhos em regiões fronteiriças, onde não há uma relação muito positiva e é visto um histórico de problemas não solucionados. Essas relações também precisam ser monitoradas.
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E-Investidor – A inflação global entra nessa conta?
Catechis – O risco mais provável deve ser uma inflação que se mantenha forte, provavelmente puxada pelo setor de alimentação, e que possa durar mais tempo do que o previsto. Seis meses atrás, falava-se de uma inflação transitória. E é um processo lógico, saindo de uma pandemia. Mas qual é a definição de transitório? Seis meses? A cada dia que se estende esses dados de inflação, é um dia em que se eleva o risco para os investidores, pelo menos no curto prazo.
E-Investidor – O panorama geral é mais pessimista para o curto e médio prazos?
Catechis – Eu falo sobre os riscos, mas há muitos caminhos. Ninguém pode trabalhar como investidor profissional há 34 anos como eu e não ser otimista. Vivemos décadas de um boom de investimentos em tecnologia e isso já é um exemplo bem claro de grande oportunidade. Ainda vamos ter muita inteligência artificial e outras coisas nos próximos anos. Falar sobre isso hoje parece chocante, mas até lá será um trajeto de muitas oportunidades. Isso não quer dizer que elas serão óbvias. Você pode ter mais sucesso investindo na segunda empresa que irá implementar essas tecnologias no futuro, por exemplo.