As LCIs e LCAs são títulos de renda fixa isentos de IR (Foto: Adobe Stock)
As Letras de Crédito Imobiliário (LCI) e do Agronegócio (LCA) podem perder atratividade no mercado com o fim da isenção do Imposto de Renda (IR). A possibilidade faz parte da proposta anunciada neste domingo (8) pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que comunicou a cobrança de 5% sobre todos os títulos de renda fixa que hoje são isentos de IR. A medida é uma alternativa ao aumento das alíquotas do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), anunciado no fim de maio, que enfrentou forte resistência do mercado financeiro.
Hoje, a isenção do imposto de renda é concedida às LCIs e LCAs porque são títulos que buscam captar recursos no mercado financeiro para financiar projetos do agronegócio ou do setor imobiliário. Na prática, o investidor compra essa “dívida” emitida por algum banco e, depois de um determinado prazo, recebe a restituição do valor com acréscimos de uma rentabilidade. Os títulos contam ainda com a garantia do Fundo Garantidor de Crédito (FGC) que arca com o prejuízo de até R$ 250 mil por investidor caso o emissor venha à falência.
Por esses fatores, as letras de crédito, assim como os Certificado de Depósito Bancário (CDBs), costumam fazer parte do portfólio dos investidores que buscam boas rentabilidades sem abrir mão da segurança. Dados mais recentes da B3 mostram que 4,5 milhões de investidores pessoa física investem nas LCIs e nas LCAs. Esse público movimenta junto cerca de R$ 973 bilhões no mercado financeiro. No entanto, caso a proposta de tributação dos títulos avance e se torne uma realidade, a tendência é de que haja uma queda no interesse por esses ativos com o recuo na rentabilidade final.
Veja quantos investidores pessoa física investem em LCIs e em LCAs
Investimento
Número de investidores
Posição total
LCI
2,4 milhões
R$ 430,9 bilhões
LCA
2,1 milhões
R$ 543,7 bilhões
Fonte: B3/Dados até março de 2025
Uma simulação de Rafael Haddad, planejador financeiro do C6 Bank, mostra que hoje uma aplicação de R$ 1.000 em uma LCI ou LCA de 90% do CDI com um vencimento de um ano resultaria em um retorno final de R$ 1.132,80. Com a aplicação da alíquota de 5%, proposta pelo governo, se aprovada, esse rendimento cairia para R$ 1.126,16. Apesar da queda do retorno, as letras de créditos continuariam mais vantajosas em termos de rentabilidade em comparação a outros ativos de renda fixa. Isso porque, se o investidor decidir aplicar o mesmo valor em um CDB 102% do CDI, teria um retorno final de R$ 1.124,16 após 12 meses.
Veja quanto uma aplicação de R$ 1 mil em um ano nas LCIs e LCAs
Título de investimento
Valor bruto
Rentabilidade bruta
Valor líquido
Rentabilidade líquida
CDB 102% do CDI (Liquidez Diária)
R$ 1.150,50
15,05%
R$ 1.124,16
12,42%
LCI/LCA 90% do CDI (Liquidez Diária) – Isento
R$ 1.132,80
13,28%
R$ 1.132,80
13,28%
LCI/LCA 90% do CDI (Liquidez Diária) – IR de 5%
R$ 1.132,80
13,28%
R$ 1.126,16
12,62%
Fonte: C6 Bank
Essa vantagem, no entanto, desaparece à medida que os prazos de vencimentos das letras de crédito ficam mais longos. Ainda de acordo com o planejador financeiro do C6 Bank, um aporte de R$ 1.000 no mesmo CDB entregaria ao investidor um retorno líquido de R$ 1.409,63 em três anos, contra os R$ 1.397,65 entregues pelas LCIs e LCAs de 90% do CDI. Os dados da simulação , no entanto, consideram as condições atuais de mercado em que há a vigência da isenção do IR.
Mas, se o benefício tributário cair, Marília Fontes, sócia-fundadora da Nord Research e colunista do E-Investidor, avalia que haverá uma repreficação desses ativos com a cobrança dos investidores por taxas de retornos mais elevadas para justificar o investimento. “Quando se tributa esses títulos, você desestimula o financiamento desses setores. Então, por esse sentido é ruim. Seria muito melhor cortar gastos do que desestimular setores importantes para a economia. O que vai acontecer é que o custo de financiamento vai ficar mais caro porque os bancos vão aumentar as taxas de retorno desses títulos”, afirma Fontes.
Veja quanto uma aplicação de R$ 1 mil em três anos nas LCIs e LCAs
Título de investimento
Valor bruto
Rentabilidade bruta
Valor líquido
Rentabilidade líquida
CDB 102% do CDI (Liquidez Diária)
R$ 1.481,92
48,19%
R$ 1.409,63
40,96%
LCI/LCA 90% do CDI (Liquidez Diária) – Isento
R$ 1.418,58
41,86%
R$ 1.418,58
41,86%
LCI/LCA 90% do CDI (Liquidez Diária) – IR de 5%
R$ 1.418,58
41,86%
R$ 1.397,65
39,76%
Fonte: C6 Bank
O outro efeito esperado é que haja uma reorganização no fluxo de capital. Marcelo Michaluá, CO-CEO da RB Asset, acredita que os investidores devem priorizar fundos imobiliários, fiagros e fundos de infraestruturas na carteira dado que a vigência da isenção de IR continua. Contudo, isso não representaria uma mudança estrutural visto que a alíquota proposta pelo governo é inferior à cobrança inicial de 22% dos outros títulos não isentos. “O ponto que precisa ser confirmado pelo governo é se o investidor que comprou esses títulos antes da proposta será tributado ao resgatar o dinheiro na data de vencimento”, diz Michaluá.
Quais são as chances da proposta ser aprovada?
As medidas alternativas ao aumento doIOF devem ser apresentadas ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nesta terça-feira (10) que avaliará a proposta. Caso sejam aprovadas, o texto deve ser submetido para a aprovação do Congresso. Erich Decat, head do time de Análise Política da Warren Rena, avalia que o texto pode enfrentar dificuldades de aceitação dos deputados e senadores. Segundo ele, em 2015, a ex-presidente Dilma Rousseff tentou aprovar a tributação de 5% sobre as LCIs e LCAs por meio de uma medida provisória.
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A iniciativa, no entanto, foi barrada pela comissão mista que tratou da MP. “A questão da taxação dos títulos LCI, LCA e demais títulos enfrenta resistência dentro do Congresso. O tema ainda precisará ser levado para discussão nas bancadas. Destacamos que não ficou claro qual seria o tamanho da participação dessa taxação para a compensação do IOF e para o equilíbrio das contas do governo”, diz Decat. Já na manhã desta segunda-feira (9), segundo informações do Broadcast, o presidente da Câmara, Hugo Motta, afirmou que não houve um compromisso dos parlamentares de aprovar os textos que saírem da Palácio do Planalto.