- Os pacotes fiscais e injeção de liquidez que foram colocados aguentam mais dois meses.
- Com um patamar mais baixo de juros, ativos indexados à inflação são atrativos
- A seleção de ativos na volta será fundamental na retomada do mercado
Em agosto do ano passado, o grupo suíço Julius Baer preparava uma estreia de peso no Brasil: o lançamento de uma nova marca de gestão de patrimônio no país, a Julius Baer Family Office. Hoje com R$ 55 bilhões em ativos sob gestão, a gestora de fortunas nasceu da integração das empresas GPS Investimentos e Reliance Asset Management e promete uma operação independente e isenta de conflitos de interesse.
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A decisão de criar uma operação unificada de “wealth management” no Brasil fazia sentido. Em dezembro de 2019, o valor administrado por 86 gestoras do segmento chegou a dezembro com R$ 209 bilhões, segundo dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiros e de Capitais (Anbima), entidade que representa o mercado de capitais.
Mas o cenário de ‘vacas gordas’ para os mais endinheirados não deixou de ser alvo da crise gerada pelo coronavírus. Em entrevista ao E-Investidor, Paulo Miguel, sócio do Julius Baer Family Office, relata a estratégia da gestora para sobreviver ao estresse e o impacto para os investidores de grandes fortunas.
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Como o avanço da crise do coronavírus afetou a Julius Baer?
A natureza dessa crise é inédita. A sua velocidade generalizou as movimentações econômicas e desencadeou um processo de busca por liquidez a qualquer preço. O resultado foi um deslocamento no mercado que não se via desde 1929. As movimentações não funcionaram e os ativos de categorias seguras também tiveram um comportamento atípico de bolsa de valores. Esse fenômeno se traduziu em marcações negativas nas nossas carteiras.
Quando deve vir a retomada?
A maior dúvida é sobre o timing do relaxamento da quarentena. O tamanho dos pacotes fiscais e injeção de liquidez que foram colocados aguentam mais dois meses. A partir disso, tudo vai depender se as restrições serem relaxadas ou não.
Já vimos uma recuperação importante em outras regiões do mundo, mas os países emergentes estão mais atrasados. Já começamos uma reversão do momento nos ativos de renda fixa aqui no Brasil. Estamos em expectativa das próximas etapas. Vamos recuperar como o resto do mundo, mas agora o vírus é que dá as cartas.
Qual é o impacto para os investidores de grandes fortunas?
As marcações negativas de março foram as maiores da história em um período tão concentrado. Foi tão grave que atingiu classes de ativos como debêntures, que performaram muito bem no ano passado.
Quando o grau de incerteza é alto, é necessário ter paciência no rebalanceamento das carteiras. Estamos cautelosos em relação às realocações e temos uma postura defensiva nos ativos que vemos uma visibilidade menor no curto prazo.
Que tipo de intervenção vocês fizeram para proteger o patrimônio das famílias?
Posicionamos a carteira em renda fixa, encurtamos alguns prazos e aumentamos a alocação nesse universo de juros reais. Já na renda variável, aumentamos a nossa posição e fizemos algumas proteções. Nesse campo, há um viés de compra que foi implementado ao longo de março.
Houve reação de levar os recursos para o exterior?
Apenas um movimento tímido. O patamar do câmbio não é convidativo. Se fosse mais favorável, talvez houvesse mais remessas nessa direção.
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O coronavírus afetou a confiança do investidor?
Em termos de confiança, o Brasil já estava em um cenário conservador. O País estava saindo de uma crise e é natural que os investidores fiquem mais cautelosos agora. O movimento de poupar será maior no pós-crise, tanto do lado das famílias, como das empresas.
Quais classes de ativos podem ganhar escala esse ano?
Com um patamar mais baixo de juros, ativos indexados à inflação são atrativos nesse momento, principalmente com a ideia de um novo corte da Selic em função da crise. O universo de debêntures de alta qualidade [ou seja, títulos com bom risco de crédito] também são interessantes.
Na renda variável ainda vai depender do impacto econômico. Há uma incerteza muito grande em relação ao lucro e resultados das empresas. Embora seja atrativo no médio e longo prazos, temos desafios para enfrentar no curto prazo.
O ano de 2020 previa um número recorde de IPOs. Esse cenário ainda pode se concretizar?
É difícil fazer essa projeção porque o deslocamento do mercado foi muito grande. A gente pode ter uma surpresa positiva no segundo semestre por conta do tamanho do estímulo fiscal que está em vigor.
As medidas do Banco Central são suficientes?
As medidas de estímulo fiscal têm sido muito maior ao redor do mundo em relação ao que foi feito em 2008. Os pacotes estão montados, mas devem durar no máximo dois meses. A partir disso, alguma liberação deveria acontecer. Do contrário, o dano econômico pode crescer. O risco está na mesa.
O cenário político pode atrapalhar?
Há riscos porque o Brasil tem as suas particularidades com a política. É um desafio, mas o realmente que vai definir o cenário é a velocidade de combate ao vírus. Por ora, estamos passando no teste de fazer uma gestão razoavelmente responsável. Se houver sucesso, andaremos junto com os outros países, independente da situação política.
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Qual é o diferencial da Julius em relação às Casas que trabalham com o segmento private?
O fator mais relevante do Julius Baer é não ter conflito de interesse entre áreas diferentes. Não somos um banco e trabalhamos como uma gestora de patrimônio. Esse é o nosso DNA.
Quais são os planos para 2020?
Olhamos o momento como uma oportunidade porque essa crise tem um elemento deflacionário importante que vai significar juros menores no Brasil. Ao longo de março, a gente aumentou as alocações no segmento de renda fixa indexada à inflação na premissa de que haverá mais redução de juro. Ainda estamos resistentes em aumentar posição em renda variável, apesar de alguns movimentos táticos nessa direção.
Qual será o desafio na hora da retomada?
A seleção de ativos na volta será fundamental no sentido de identificar quais setores voltam e quais terão mais dificuldade. Além do desafio de saber onde privilegiar as alocações em renda variável. Em momento de crise, priorizamos o elemento de diversificação porque é isso o que faz a diferença no portfólio e o que será mais determinante na retomada do mercado.