- Os sinais de início de uma flexibilização monetária nos Estados Unidos ajudam a tornar o Brasil um dos principais destinos para os investidores estrangeiros
- Desde dados da B3, desde julho até o dia 7 de agosto, o fluxo de capital gringo segue positivo na bolsa brasileira. Caso ganhe mais força, deve garantir uma recuperação do mercado brasileiro
- Celson Placido tem mais de 25 anos de experiência em mercado financeiro e atua como CEO da Asset Management da Warren
A esperança de uma recuperação da Bolsa de Valores ao longo do segundo semestre ganha força à medida que a narrativa de uma recessão dos Estados Unidos se torna menos factível para os investidores. Com esse risco cada vez mais distante do radar, a tendência é que o fluxo de estrangeiro siga em direção aos mercados emergentes, como o Brasil, em meio a sinalizações de que o Federal Reserve (Fed, o banco central norte-americano) dará início ao corte de juros nos EUA na sua próxima reunião, marcada para setembro. Até lá, a discussão que paira no mercado é saber o quanto a maior economia do mundo está disposta a reduzir as taxas.
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Independente da magnitude, os sinais de início de uma flexibilização monetária na economia norte-americana ajudam a tornar o Brasil um dos principais destinos para os investidores estrangeiros. De julho até o dia 7 de agosto deste ano, a captação líquida do capital gringo se encontra positiva na Bolsa brasileira, segundo os dados mais recentes da B3. Em julho, o mercado encerrou com um saldo positivo de R$ 7,4 bilhões. Já nos primeiros sete dias de agosto, a Bolsa registra uma entrada de R$ 674,6 milhões. Dado a esse movimento, Celson Placido, CEO da Asset Management da Warren (AMW), acredita que esse fluxo será o grande responsável por uma apreciação da Bolsa brasileiras no curto prazo.
“Podemos ver que chegamos ao fim da nossa desvalorização e isso pode fazer o Ibovespa avançar em agosto porque temos a Bolsa mais barata entre os mercados emergentes”, diz Placido. A percepção ficou ainda mais evidente, para o especialista, quando o principal índice da B3 apresentou uma queda de 0,46% no dia 5 de agosto em meio ao temor do mercado de uma recessão nos Estados Unidos e repercussão de alta de juros no Japão. A título de comparação, Ibovespa se mostrou mais resiliente ao estresse global do que o índice norte-americano S&P500 e o japonês Nikkei 225, que encerraram o dia com perdas de 3% e de 12,4%, respectivamente.
- Veja: Caos na bolsa do Japão deixa mercado no escuro e coloca país no mapa de riscos para a economia global
Apesar dessa expectativa positiva para o mercado brasileiro, a AMW decidiu zerar posições em ativos de risco diante da alta volatilidade que as bolsas globais enfrentaram no início de agosto. A decisão visa minimizar os prejuízos e entender os recentes movimentos econômicos antes de adotar qualquer decisão de investimento. “Quando temos uma volatilidade muito grande, perde-se os fundamentos e os investimentos vão para um patamar que não se pode controlar. Então, tivemos que zerar posição (em ativos de risco)”, afirma Placido. Agora, com um grande volume em caixa, a gestora observa onde estão as melhores oportunidades de investimento do mercado.
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Ao E-Investidor, o CEO da AMW, que possui R$ 2 bilhões sob gestão, falou ainda sobre o impacto das eleições nos Estados Unidos para o mercado brasileiro e como os investidores pessoa física devem olhar para a Bolsa em dias com alta volatilidade. Confira!
E-Investidor – O temor dos mercados internacionais em relação aos Estados Unidos, Japão e Oriente Médio põe um fim a qualquer esperança de recuperação do Ibovespa em 2024?
Celson Placido – Vejo que o Ibovespa está mais interligado à queda de juros nos Estados Unidos e às eleições presidenciais para a Casa Branca. Antes, a discussão era quando as taxas de juros iriam reduzir nos EUA. Agora, a pergunta é se o Fed vai acelerar o processo de queda de juros ou não. A próxima reunião do Fed será no dia 18 de setembro. Se ele reduzir as taxas, como o mercado acredita, vamos ter um cenário motivador para os ativos de risco. Agora, observo com preocupação as eleições nos Estados Unidos. A candidata pelo Partido Democrata Kamala Harris adota uma política expansionista, enquanto o candidato do Partido Republicano Donald Trump prefere medidas de aumentos das tarifas de importação, redução de impostos e uma política voltada para o crescimento interno. Ou seja, uma política mais inflacionária.
Olhando para o mercado brasileiro, a vitória de Trump pode afetar o Brasil porque os juros norte-americanos podem ficar elevados por mais tempo devido a uma alta da inflação. Então, vejo que precisamos observar esses dois assuntos. Acredito que o Fed pode acelerar mais a queda de juros e isso beneficiaria a Bolsa brasileira porque iria atrair mais dinheiro para cá. A Bolsa brasileira é a mais barata entre os emergentes. E não vejo isso como um problema. Agora, se os Estados Unidos entrarem em recessão, aí mudo a minha opinião. Vejo que os ativos de risco vão sofrer muito, mas não acredito que esse seja o cenário.
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O dia 5 de agosto foi marcado por uma tensão global devido à repercussão da alta de juros no Japão e risco de recessão na economia norte-americana. O que a Asset Management da Warren fez para se proteger?
Não sabemos até hoje o tamanho desse problema, mas o que fizemos foi zerar posição. A nossa área de risco é soberana em relação a tudo aqui na Asset. Quando temos uma volatilidade muito grande, perdem-se os fundamentos e os investimentos vão para um patamar que não se pode controlar. Então, tivemos que zerar posição (em ativos de risco). Não tem jeito porque seguimos um nível de avaliação de risco. Por isso, sempre olhamos o índice de volatilidade, o VIX, que mede a aversão a riscos dos investidores. Quanto mais elevado, maior será a volatilidade. Qual é um grande questionamento que ainda não tenho resposta sobre esse episódio? É saber se foi algo pontual ou não. Acredito que boa parte já foi.
Onde a AMW está investindo agora?
Hoje, temos um grande volume em caixa para aproveitar esses momentos de queda. O problema é que, quando vemos algumas ações caindo 10% a 15%, questionamos se não seria o momento de voltar a comprar. Mas estamos mais céticos em relação aos mercados e achamos que pode haver uma realização de lucro maior dos ativos da bolsa norte-americana, especialmente, as ações de tecnologia. Já estamos há algum tempo vendendo esses ativos, mas vemos que algumas ações de big techs vão sofrer um pouco mais do que outras.
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O que investidor pessoa física deve fazer quando se depara com um mercado extremamente volátil como ocorreu no dia 5 de agosto?
Nesses momentos, é preciso ter calma e não ficar olhando para o preço de tela. Quando observamos o comportamento da bolsa brasileira, ela caiu menos de 0,5% no dia 5 de agosto. Isso demonstra que estamos muito baratos, mas ao investir em bolsa é preciso pensar no longo prazo. Isso porque os juros reais no Brasil competem de forma desleal com o mercado acionário. Temos juros de 6% e o investidor vai correr risco na bolsa? Eu tenho uma parcela relevante em bolsa, mas é um risco que o brasileiro comum não precisa correr com esses juros reais elevados. Infelizmente, essa é a verdade. A bolsa não bateu o CDI nos últimos três anos – veja mais sobre isso aqui.
Qual é o sentido de investir na Bolsa para um investidor pessoa física?
Quando olhamos o Tesouro pagando IPCA+6%, temos ativos na Bolsa que pagam dividendos de 10%. O investidor tem a oportunidade de carregar ações que sejam capazes de gerar uma taxa interna de retorno superior ao Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Mas se olharmos momentaneamente, estamos perdendo dinheiro. Investimento em bolsa, tem que olhar no longo prazo e o brasileiro comum não tem esse pensamento. Só olha para o longo prazo quando investe em uma previdência privada. Aí o investidor pode pensar assim: “quando os juros reais caírem, vou para a Bolsa”. Não! Quando os juros reais fecharem, a Bolsa já foi. O investidor pessoa física que investe em bolsa precisa olhar com um prazo mínimo de dez anos.
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Se os EUA não entrarem em recessão, agosto terá um saldo positivo de fluxo estrangeiro assim como aconteceu em julho?
Hoje temos uma expectativa de uma redução de juros dos EUA de 0,50 pontos-base, mas o problema é que só teremos uma decisão do Fed no dia 18 de setembro. Até lá, novos dados econômicos vão ser divulgados. Se os indicadores mostrarem uma desaceleração e não uma recessão como chegou a ser cogitado, acho que teremos um fluxo de capital estrangeiro vindo para o Brasil. Mas vamos viver muito mais na ansiedade em agosto do que em qualquer outra coisa.
Podemos dizer que estamos prestes a ver uma valorização da Bolsa de Valores?
Acreditamos que sim. Já vimos uma valorização em julho como a expectativa de queda de juros nos Estados Unidos que se acentuou. Vale destacar que, no dia 5 de agosto, a bolsa do Japão caiu 12,4% e os mercados norte-americanos caíram mais de 2%, enquanto o Ibovespa caiu apenas 0,46%. Então, podemos ver que chegamos ao fim da nossa desvalorização e isso pode fazer a Bolsa brasileira avançar porque é a mais barata entre os mercados emergentes. A ata do Comitê de Política Monetária (Copom) também foi extremamente interessante porque o colegiado comunicou que se o cenário (de projeção de alta da inflação) persistir vai ser preciso subir os juros para controlar a inflação.
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Ou seja, os títulos IPCA não devem atrapalhar a Bolsa de Valores. Hoje, qual é o receio? Vamos ter mudança na presidência do Banco Central (BC). Há um receio no mercado que volte à era de Alexandre Tombini (ex-presidente do BC durante o governo de Dilma Rousseff) que reduziu os juros na marra. Não acredito que isso aconteça com Gabriel Galípolo (diretor de política monetária do BC e principal nome a ser indicado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva) caso ele seja indicado pelo governo. Em resumo, o Banco Central continuando independente e os juros dos EUA reduzindo, podemos ver um fluxo estrangeiro positivo vindo para o Brasil. Isso se não tiver recessão nos Estados Unidos. Agora, se tiver, esqueça tudo que eu falei. O dólar vai subir e vamos ter uma inflação ainda maior.
Os balanços corporativos das grandes empresas de tecnologia (Big Techs) decepcionaram os investidores e as ações contribuíram para o tombo das bolsas dos EUA. O encanto com essas ações chegou ao fim?
Eu vejo que os números foram bons, mas a expectativa para essas empresas estava muito elevada. E quanto há uma expectativa muito alta, mesmo que haja uma boa entrega de resultados, causa uma decepção entre os investimentos quando os números ficam abaixo das estimativas. Por isso, estamos vendo as ações na bolsa de valores caírem. Mas acho difícil estarmos vivendo uma bolha semelhante ao dos anos 2000 com a chegada da internet. Temos muito mais informações do que naquela época. Só acho que colocaram muita expectativa em cima da inteligência artificial. Será uma tecnologia que vai fazer muita coisa, mas não vai fazer tudo sozinha.