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- O Federal Reserve (Fed), o banco central americano, deixou bem claras as suas intenções de combate à inflação
- O mercado de trabalho ainda está aquecido e o público vê o combate à inflação como uma prioridade. Tudo isso mudará à medida que os esforços do Fed para controlar a inflação começarem a surtir efeito, aumentando o desemprego
- Mas o que acontecerá quando as pessoas se derem conta de que conseguir um emprego será mais difícil e o sofrimento será maior do que o Fed tem sinalizado?
O Federal Reserve (Fed), o banco central americano, deixou bem claras as suas intenções de combate à inflação. Agora vem a parte difícil: seguir fiel a esse compromisso enquanto uma política monetária mais severa freia a economia e deixa milhões de pessoas sem trabalho.
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O Fed vai manter o plano? Espero que sim, mas será um caminho longo e difícil, que suscita dúvidas.
As autoridades do Fed demonstraram sistematicamente a determinação para fazer recuar a inflação até a meta de 2%. O presidente da instituição, Jerome Powell, chamou o compromisso de “incondicional”. O Comitê Federal de Mercado Aberto (FOMC, na sigla em inglês) votou por unanimidade a favor de um aumento da taxa de juros de 0,75 ponto percentual, e as projeções do FOMC mostram que a taxa deve atingir a meta de 4,25% a 4,50% até o final deste ano e continuar elevada até 2023.
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Dito isto, é fácil ser coeso quando estamos nos recuperando depois de demorar bastante a reagir, quando o mercado de trabalho ainda está aquecido e o público vê o combate à inflação como uma prioridade. Tudo isso mudará à medida que os esforços do Fed para controlar a inflação começarem a surtir efeito, aumentando o desemprego e provavelmente levando a economia a entrar em recessão.
No entanto, a julgar por suas próprias projeções, as autoridades do Fed ainda não foram totalmente francas em relação a essas consequências.
A previsão mediana de setembro do FOMC: após uma forte desaceleração este ano (a maior parte já aconteceu), o crescimento será retomado nos próximos três anos, com a produção crescendo apenas 0,6 ponto percentual a menos do que o seu potencial durante esse período. O aumento resultante da taxa de desemprego é muito modesto – para 4,4%, em 2023 e 2024, acima dos 3,7% atuais e apenas ligeiramente acima da estimativa de 4% do Fed da taxa de longo prazo consistente com a inflação de 2%.
Entretanto, isso de alguma forma se mostra suficiente para reduzir repentinamente a inflação para 2,3% até 2024.
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Embora mais plausível que as fantasias de “desinflação impecável” de março e junho, esta perspectiva ainda é excessivamente otimista. Por um lado, a taxa de desemprego terá de aumentar: Larry Summers, ex-secretário do Tesouro dos EUA, comentou que ela pode ter que ficar 2 pontos percentuais acima de seu nível de equilíbrio a longo prazo apenas para reduzir a inflação latente em 1 ponto percentual por ano.
Em segundo lugar, a relação entre as vagas de emprego e a taxa de desemprego, conhecida como curva de Beveridge, sugere que o nível de equilíbrio é, na verdade, cerca de 5%. Isso indica que seria necessária uma taxa de desemprego muito mais elevada para reduzir consideravelmente a inflação. Em terceiro lugar, as projeções do Fed não têm precedentes: a taxa de desemprego nunca aumentou 0,5% ou mais sem levar a uma recessão (como bem observou a economista Claudia Sahm), e nunca na história do pós-guerra ela aumentou apenas 0,9 ponto percentual (depois de 0,5; o próximo registro é de 2 pontos percentuais).
Outro sinal preocupante: os integrantes do FOMC parecem discordar em relação a quanto tempo o banco central americano manterá seu combate à inflação. Todos eles, exceto um, esperam que a taxa de juros alvo seja alcançada em 2023, em algum ponto entre 4,25% e 5%, mas a faixa aumenta para 2,5% a 4,75% no final de 2024. E isso não tem relação com as expectativas de que a inflação será derrotada até 2024. Apenas alguns preveem que ela terá caído para 2% até lá.
Até o momento, as pessoas parecem acreditar na promessa de Powell de que o Fed “seguirá em frente” [com os esforços] até que o objetivo seja alcançado. As expectativas de inflação a longo prazo parecem bem ancoradas perto de 2%.
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Os preços no mercado do Tesouro americano, por exemplo, sugerem uma taxa de inflação anual de 2,4% entre cinco e dez anos no futuro. As pesquisas também sugerem que as expectativas dos consumidores em relação à inflação de longo prazo recuaram para seus limites anteriores à pandemia.
Mas o que acontecerá quando as pessoas se derem conta de que conseguir um emprego será mais difícil e o sofrimento será maior do que o Fed tem sinalizado? O apoio às políticas do banco central americano provavelmente irá diminuir e a instituição perderá credibilidade – algo crucial a se manter para controlar a inflação.
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Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários. Bill Dudley é colunista da Bloomberg Opinion e consultor sênior da Bloomberg Economics. Pesquisador sênior da Universidade Princeton, ele atuou como presidente do Federal Reserve de Nova York e como vice-presidente do Comitê Federal de Mercado Aberto (FOMC, na sigla em inglês).
Tradução de Romina Cácia
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