- O 4T21 foi um período de escalada na taxa básica de juros, como tentativa de conter a também em alta inflação; alta do dólar e queda no preço das commodities
- Dado este cenário, os resultados seguiram, em parte, as expectativas do mercado, com empresas do setor de varejo e construção, mas analistas veem algumas discrepâncias dentro dos próprios setores
- Para os investidores que acompanham a temporada de balanços para avaliar suas carteiras de ativos, alguns indicativos para a performance das companhias em 2022 já foram colocados na mesa
Na última semana de março, foi encerrada a temporada de balanços do quarto trimestre de 2021 das companhias listadas na Bolsa de Valores brasileira. Além de impactar nos preços das ações, os resultados revelam pontos que ajudam a entender os fatores que pressionam o mercado e as empresas no curto prazo.
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O quarto trimestre de 2021 refletiu exatamente isso: o período foi marcado pela escalada na taxa básica de juros, como tenativa de conter a queda no preço das commodities e a alta na inflação e dólar.
“Fatores internos e externos influenciaram o desempenho das empresas. Vemos, do lado doméstico, inflação, juros e dólar mais altos, o que impactou as empresas de formas diferentes. Além dos fatores externos, como o setor de commodities que se destacou muito”, afirma Alexandre Masuda, sócio da SFA Investimentos.
Diferenças entre os setores
Os resultados seguiram as expectativas do mercado, com empresas do setor de varejo e construção – que costumam ser mais afetadas pela piora dos indicadores macroeconômicos – entre as mais penalizadas. Mas houveram algumas distorções dentro do setor.
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No varejo, as empresas “queridinhas” decepcionaram: Via Varejo (VIIA3) reportou queda de 91,4% no lucro acumulado do ano, enquanto Magazine Luiza (MGLU3) perdeu 57,6% no trimestre. Vitorio Galindo, analista de investimentos CNPI e head de análise fundamentalista da Quantzed, empresa de tecnologia e educação financeira para investidores, destaca que as duas companhias tiveram restrição na margem de lucro por causa dos fatores macroeconômicos.
Na outra ponta, varejistas voltada ao público de alta renda não sofreram tanto. “Arezzo, Soma e Vivara já entregaram resultados razoáveis e algumas até acima das expectativas. O mercado estava imaginando um impacto que não aconteceu. São empresas que conseguiram repassar a alta dos custos e ter um crescimento da receita, ainda que pequeno”, diz Galindo.
Victor Bueno, analista da Nord Research, também destaca o balanço da Petz (PETZ3). A empresa conseguiu se descolar dos resultados negativos dos pares do setor de varejo e viu o lucro saltar 16,2% no quatro trimestre.
“A Petz se beneficia de uma mudança de comportamento da população, acelerada pela pandemia, que é essa humanização dos pets, com famílias postergando os planos de terem filhos. Além disso, essa é uma empresa com uma estratégia de crescimento muito agressiva, focada em expandir o número de lojas e com aquisições pontuais. Assim ela tem entregado crescimento, mesmo em um cenário delicado”, diz Bueno.
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Outro setor que reportou diferenças nos resultados foi a construção civil. Assim como no varejo, empresas destinadas ao público de alta renda não sofreram os mesmos impactos dos fatores macroeconômicos do que os pares cujo público é considerado popular.
“Tenda é o destaque mais negativo, talvez até da temporada. A ação caiu muito e já era esperado que o resultado seria ruim, mas não tanto. No outro lado, entre as que não sofreram, há aquelas voltadas para alta e altíssima renda. Foi o caso da JHSF, que não só não sofreu, mas melhorou sua rentabilidade, com um resultado muito forte no tri e no ano”, pontua Galindo.
Nos grandes bancos, também: Itaú (ITUB4) e Bradesco (BBDC4), por exemplo, são empresas similares em tamanho e alcance de mercado, mas, enquanto o lucro BBDC4 caiu 2,8% no 4T21, o do ITUB4 subiu 32,87% no período.
Outros destaques
Os analistas destacam ainda outros resultados positivos. Para Bueno, da Nord, o setor aéreo não correspondeu às expectativas de queda.
“Era previsto, mas não tão ruim. No último trimestre de 2021 houve uma maior demanda nas companhias, em resposta à desaceleração da pandemia da covid-19. No entanto, as despesas são maiores entre as empresas de grande porte. Tanto a Gol, como a Azul, possuem dívidas financeiras altas, o que acaba comprimindo as margens das companhias”, diz.
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O analista destaca também o resultado da Taurus (TASA3). Apesar de queda de 26% no lucro do 4T21, a fabricante de armas de fogo apresentou uma expansão no consolidado do ano. “É uma companhia com 80% das receitas dolarizadas, portanto, reportou queda no lucro por questões tributárias, mas conseguiu aumentar as receitas e vai pagar um dividend yield de 6,5%. A Taurus é uma empresa que os investidores acabam colocando em carteira de crescimento, mas, com os resultados de 2021, vai pagar um bom dividendo para os acionistas”, afirma Bueno.
Alexandre Masuda, da SFA, ressalta os resultados da Totvs (TOTS3). Na contramão dos pares do setor tech, a companhia aumentou o lucro em 30,9% no quatro trimestre do ano passado. “No próprio setor de techs, muitas que fizeram o IPO ano passado foram muito mal, como Mosaico e Méliuz. Mas empresas como a Totvs entregaram um bom crescimento de receita e margem”.
O analista acrescenta ainda a Porto Seguro (PSSA3), que, apesar de não ter apresentado um resultado “tão bom”, deu indicativos de melhora para 2022; e a Sinqia (SQIA3), que “continua entregando crescimento de receita forte e com uma margem de lucro, coisa que muitas empresas do setor não entregam”, diz Masuda.
O que fica para 2022
Para os investidores que acompanham a temporada de balanços para avaliar o portfólio, alguns indicativos para a performance das companhias em 2022 já foram colocados na mesa. Com a guerra na Ucrânia, o setor de commodities tende a se destacar, enquanto as empresas cujas receitas são dolarizadas podem sofrer um impacto frente a recente queda no câmbio.
“O resultado fala do passado, mas muitas empresas dão indicativos de como será a performance esse ano. Sabemos que 2022 tem muitos fatores na bolsa descolados dos resultados, mas que acabam pesando no preço das ações. É um momento de taxa de juros nos Estados Unidos, eleição presidencial e a inflação no Brasil segue difícil de ceder mesmo com a taxa de juros em alta”, afirma Alexandre Masuda, da SFA.
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Na avaliação de Bueno, da Nord, o investidor deve manter cautela. “O cenário ainda é delicado, de atenção. Vimos empresas crescendo também por conta de uma base comparativa mais fraca, referente ao ano de 2020. Agora a tendência é de normalização nos resultados”, diz.
Além dos fatores macroeconômicos, os analistas recomendam olhar para os fundamentos das empresas, investindo naquelas que, independente do cenário, apresentam maior potencial de geração de valor mais longa. “O investidor que quiser entrar na bolsa nesse momento precisa da perspectiva de longo prazo”, afirma Masuda, da SFA.
Galindo, da Quantzed, acredita que existem oportunidades para o investidor que olha para fora dos setores considerados tradicionais, como varejo e construção. “Busque empresas com fluxo de caixa mais previsível”, diz.