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Investimento estrangeiro encolhe 77% na B3: entenda a saída dos gringos

Entenda a saída de capital externo da Bolsa brasileira

Investimento estrangeiro encolhe 77% na B3: entenda a saída dos gringos
Tesouro Americano atrai investidores com rendimentos recordes. Foto: Envato Elements
  • Nos últimos dois meses, o saldo de investimento estrangeiro na B3 ficou negativo em R$ 12 bilhões
  • Essa conta considera as compras e as vendas de ações feitas no mercado secundário (ações já listadas) e a participação deste investidor em novas ofertas de capital
  • Essa fuga de capital externo preocupa, já que os estrangeiros representam cerca de 53% dos investidores da B3

Nos últimos dois meses, o saldo de investimento estrangeiro na B3 ficou negativo em R$ 12 bilhões. Essa conta considera as compras e as vendas de ações feitas no mercado secundário (ações já listadas) e a participação deste investidor em novas ofertas de capital, sejam elas iniciais (IPO) ou subsequentes (follow on).

Em agosto, o fluxo ficou negativo em R$ 10,4 bilhões, contra R$ 1,5 bilhão de setembro. Já no acumulado de 2023, a movimentação está positiva em R$ 20 bilhões – um montante ainda 77% menor do que o registrado no mesmo período do ano passado.

A situação fica mais delicada quando isolados os números referentes apenas ao mercado secundário, ou seja, de ações já listadas em Bolsa. Nesta seara, o fluxo está negativo em R$ 14,8 bilhões nos últimos dois meses e positivo em apenas R$ 9,2 bilhões no acumulado de 2023, volume 86,8% mais baixo do que no mesmo período de 2022.

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A fuga de capital externo preocupa, já que os estrangeiros representam cerca de 53% dos investidores da B3. “Eles têm uma grande participação no mercado local, são muito relevantes e as movimentações deles acabam fazendo preço (impactando o Ibovespa), tanto para o bem quanto para o mal”, afirma Ricardo Jorge, especialista em renda fixa e sócio da Quantzed, casa de análise e empresa de tecnologia e educação para investidores.

Desde o início de agosto, quando o fluxo estrangeiro começou a inverter para o negativo, o Ibovespa vem devolvendo boa parte da valorização do ano. Entre janeiro e julho, o principal índice de ações subia 11%, aos 121,9 mil pontos.

Entretanto, no oitavo mês de 2023, o IBOV fechou em queda de 5,09%. Em setembro, o indicador ficou quase no zero a zero, com uma leve alta de 0,71%. E somente entre a última segunda-feira (2) e terça-feira (3), dois primeiros pregões de outubro, o Ibov acumula uma desvalorização de 2,7%, aos 113,4 mil pontos.

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Até a última sexta-feira (6), porém, a alta acumulada no ano foi reduzida para 4,04%.

Gringos na caça ao tesouro (americano)

A principal explicação para a saída dos gringos da Bolsa brasileira é a situação dos EUA, principal economia do mundo. Por lá, ainda há uma grande incerteza em relação aos rumos da política monetária. A inflação americana medida pelo Consumer Price Index (CPI), chegou a apresentar uma alta 9,1% em 12 meses no ano passado (junho de 2021 a junho de 2022), a maior em mais de 40 anos.

Para conter o avanço recorde dos preços, o Federal Reserve (Fed, banco central americano) passou a subir os juros no país. Até março do ano passado, a taxa alvo era de 0,25%. Hoje, está no intervalo entre 5,25% e 5,5% ao ano, maior nível em 22 anos, e pode não parar por aí.

Apesar de ter caído para uma alta de 3,7% nos últimos 12 meses (agosto de 2022 a agosto de 2023), a inflação não é considerada como um tema resolvido e ainda está fora da meta, de 2%. Na última reunião do Comitê Federal de Mercado Aberto (Fomc, equivalente ao Comitê de Política Monetária brasileiro), realizada no dia 20 de setembro, a autoridade monetária norte-americana deixou clara a possibilidade de novas elevações nos juros.

Com a alta das taxas, os rendimentos dos títulos do tesouro dos EUA ficaram maiores. A “treasury” de 10 anos, por exemplo, está oferecendo a maior rentabilidade desde 2007. Historicamente, quando os títulos americanos estão mais atrativos, há uma saída de investidores de mercados emergentes, como o Brasil, para a renda fixa americana.

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Esse fenômeno é conhecido como “fly to quality” ou “fuga para a qualidade”, em português. “Esse movimento de saída do estrangeiro de Bolsa não é uma particularidade só do Brasil. Temos vivido um movimento de ‘risk-off’ (grandes investidores saindo do risco) muito grande, em diferentes economias, principalmente por conta da dificuldade de leitura que o mercado tem tido sobre política monetária, inflação e política fiscal nos EUA”, afirma Jorge, da Quantzed.

Quando vão voltar?

Para que esse investidor estrangeiro volte a apostar na Bolsa brasileira, é preciso que o mercado tenha uma visibilidade melhor sobre o curso da política monetária americana - mas não só isso. Na visão de Fernando Rossignoli, economista e analista de dados econômicos do TradeMap, o Brasil precisa fazer a “lição de casa” enquanto as incertezas não se dissipam no exterior.

“O mercado precisa entender e confiar que a inflação está controlada nos EUA e que novas altas de juros não serão necessárias”, afirma Rossignoli. “E quando passar essa tempestade lá fora, o investidor estrangeiro precisa encontrar um Brasil que avançou com a reforma tributária, administrativa e com o aumento da sintonia entre Ministério da Fazenda e Banco Central.”

Na visão do analista do TradeMap, o Brasil está no caminho certo para capturar esse fluxo de capital quando os EUA superarem as instabilidades. Ele relembra que a taxa de desemprego brasileira ficou em 7,8% no trimestre encerrado em agosto, menor patamar do índice desde fevereiro de 2015. “Internamente, se o mercado brasileiro retomar a sua força, o investidor estrangeiro voltará”, afirma.

Já Christian Lupinacci, head de gestão da Nova Futura Asset, não está tão otimista com o cenário econômico interno. O especialista ressalta que não se sabe, ainda, se a meta de décit zero projetada para o no ano que vem será atingida.

“É complicado, porque todo o plano fiscal do Governo está totalmente voltado para aumento de arrecadação. Só que a queda da inflação diminui a arrecadação”, afirma Lupinacci. “Isso acaba colocando o plano fiscal em xeque, o governo fica assustado e o resultado é o aumento da carga tributária.”

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Para Lupinacci, a volta do investidor estrangeiro está mais ligada ao cenário de renda fixa global do que a qualquer outra coisa. “A renda fixa (americana) precisa estar com uma volatilidade menor. Se a renda fixa acalmar, eu acho que a Bolsa brasileira melhora e, quem sabe, tenhamos até um rali no final do ano”, diz.

Investidor local também está fora

A culpa pelo atual marasmo do Ibovespa nos últimos meses não é só do investidor estrangeiro, que atraído pelos rendimentos em dólar na renda fixa dos EUA, retiraram capital da B3. Lupinacci aponta que a saída de investidores brasileiros institucionais e pessoas físicas também pesa, e muito, neste cenário.

De acordo com dados de agosto da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), os fundos de ações acumulam uma perda de R$ 39,7 bilhões em 2023. Em nenhum mês até agora, houve captação líquida positiva na classe.

“Esse é um movimento muito maior do que a saída do estrangeiro e a principal razão para que o mercado aqui continue mais parado. Então, por incrível que pareça, a falta do investidor local está sendo muito mais dolorosa para o mercado do que a do estrangeiro”, diz Lupinacci.

 

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