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MMX: credores querem processo de falência em Minas e Eike, no Rio

O conglomerado da MMX ingressou com dois processos de recuperação judicial e ambos tiveram falência decretada

MMX: credores querem processo de falência em Minas e Eike, no Rio
Eike Batista em evento de empreendedorismo em Florianópolis, em 2019 (Foto: Fabrício de Almeida/Imagem e Arte/Estadão Conteúdo)
  • O caso da MMX Sudeste, subsidiária responsável pelas operações produtivas, ficou no TJ-MG
  • Eike e seu filho Thor Batista preferem o Tribunal de Justiça do Rio (TJ-RJ)
  • A cooperação entre Eike e o TJ-MG foi colocada em xeque após duas tentativas frustradas de vender os títulos da Anglo

Na novela do processo de falência da MMX (MMXM3), mineradora do antigo império empresarial de Eike Batista, a disputa de interesses divergentes é marcada por alinhamentos e realinhamentos. No início do mês, antes de uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) congelar tudo, Eike e os credores estavam do mesmo lado. Agora, divergem.

Credores e o administrador judicial do processo de falência que corre no Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJ-MG) defendem a permanência do caso na comarca mineira. Já Eike e seu filho Thor Batista, também envolvido no processo, preferem o Tribunal de Justiça do Rio (TJ-RJ). Em conversa com administrador judicial de Minas, Bernardo Bicalho, Thor afirma que, no Rio, o processo poderia voltar atrás na decisão de acessar seu patrimônio pessoal.

Antes da decisão do STJ, Eike e os credores ficaram do mesmo lado, contra os termos definidos pelo administrador judicial e pelo TJ-MG para uma nova tentativa de vender o ativo mais valioso da massa falida, os títulos de dívida da mineradora Anglo American.

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No ano passado, os papéis, que pertencem a Eike, foram incluídos na massa falida do caso do TJ-MG. São um dos últimos ativos de maior valor do ex-bilionário, na casa de centenas de milhões. O TJ-MG já fez quatro tentativas de venda, todas frustradas.

O conglomerado da MMX ingressou com dois processos de recuperação judicial, em 2014. O caso da holding ficou no TJ-RJ. O caso da MMX Sudeste, subsidiária responsável pelas operações produtivas, ficou no TJ-MG. Muitos dos credores são os mesmos e boa parte das dívidas inseridas em cada processo se sobrepõe. Nos dois casos, a MMX teve a falência decretada.

No último dia 14, o STJ suspendeu os processos da MMX, a pedido dos advogados de Eike, enquanto a corte decide sobre manter os casos separados ou concentrar tudo num dos dois Estados. A decisão paralisou a novela, mas bagunçou o alinhamento de interesses entre o dono da mineradora, os credores e as autoridades judiciais.

Em recurso apresentado na semana passada ao STJ, o administrador judicial de Minas defendeu a permanência do caso na comarca mineira. Seria a melhor forma de garantir os interesses dos credores, dando continuidade à venda dos ativos remanescentes. Procurado, Bicalho disse que se manifestará apenas nos autos.

A posição é a mesma dos principais credores. Na terça-feira (27) oito empresas credoras da massa falida da mineradora ingressaram no STJ com três pedidos: inclusão como “terceiros interessados” no caso, acessar as partes sigilosas dos autos e sustentar que os processos do TJ-MG e do TJ-RJ devem seguir separados.

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Segundo Daniel Guariento, do escritório Machado Meyer Advogados, que defende quatro dos principais credores da MMX, o principal problema de concentrar os processos no TJ-RJ está na visão de que o caso fluminense é deficitário. Isso porque há uma cobrança de dívida tributária da União contra a holding. Embora os valores cobrados possam ser questionados, somam nada menos do que R$ 3,6 bilhões.

“Os credores (do processo no TJ-MG) basearam a decisão de aprovar ou não o plano de recuperação da empresa em função do plano e dos créditos da MMX Sudeste. O tema (de qual tribunal deve sediar os processos) surgiu depois que as duas empresas já tinham falido”, afirmou Guariento.

Eike tem posição contrária. Seus advogados resolveram questionar no STJ a manutenção de dois processos separados, defendendo a concentração no Rio por considerarem que a mais recente tentativa de vender os títulos da Anglo levantaria valores bem abaixo do potencial.

Conversa por WhatsApp

Numa conversa por mensagens com o administrador Bicalho, Thor Batista sinaliza que poderá apostar na concentração da falência no Rio. O filho mais velho do empresário acabou incluído nos processos da MMX e teve bens bloqueados. As conversas foram divulgadas pelo próprio administrador judicial, que as registrou em ata notarial no 9º Ofício de Notas de Belo Horizonte – o documento, conforme apurou o Estadão, foi incluído no processo no STJ.

No último dia 15, quando já havia sido tomada a decisão do STJ de suspender todos os processos de falência, Thor e Bicalho tratam da manutenção da cooperação, da qual o primogênito participou, ao lado do pai. O objetivo de Thor é marcar uma audiência com a juíza Claudia Helena Batista, que cuida do caso no TJ-MG. “Havendo demora, aí faz mais sentido eu esperar, porque, pelo visto, vai migrar tudo para o Rio e aqui o juiz (do processo de falência no TJ-RJ) e o administrador judicial são contra a existência do IDPJ”, escreve Thor.

O “IDPJ” é o Incidente de Desconsideração de Personalidade Jurídica, mecanismo previsto na Lei de Falências e Recuperação Judicial, usado para levar ativos do patrimônio pessoal dos sócios para os processos de empresas em dificuldade. No caso da MMX, o IDPJ contra Eike e Thor foi autorizado pelo TJ-MG em 2021, mas os advogados do empresário criticam a decisão e veem espaço para recorrer dela.

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Nos diálogos, Thor parece preocupado em liberar bens bloqueados por decisões judiciais. Em 30 de agosto, o filho de Eike escreve que a juíza “está dizendo que, assim que qualquer dinheiro entrar, vai me liberar”. No mesmo dia, diz a Bicalho que “poderia chegar até 400 mil (reais) de destinação para a companhia” e que não se oporia a “destinar isso para a gestão judicial como verba alimentícia”. “Há honorários em atraso e existe muito trabalho feito e ainda por fazer”, diz Thor.

Em nota, a defesa de Eike criticou o registro dos diálogos pelo administrador judicial. “É lamentável que o administrador judicial, Bernado Bicalho, tenha produzido uma ata de uma conversa de whatsapp, agora graciosamente vazada para a imprensa, para atingir um dos filhos de Eike Batista e, com isso, enfraquecer a defesa empresário. Este é mais um indicativo do despreparo do administrador judicial, que se comporta como se fosse parte interessada e não representante do Estado”, diz um trecho da nota.

Cooperação

Desde o início deste ano, Eike estava alinhado com o administrador judicial. Tanto que chegou a firmar acordos de colaboração com Bicalho e a 1ª Vara Empresarial de Belo Horizonte, onde corre o processo no TJ-MG. Pelos acordos, o empresário desistiria de recorrer de decisões envolvendo o bloqueio de bens e a arrecadação dos títulos da Anglo pela massa falida da MMX.

Em troca, poderia influenciar nas decisões sobre a destinação dos recursos levantados com a venda dos papéis. Toda essa parte do processo corre sob sigilo, o que vinha gerando reclamações dos credores. Para eles, a falta de transparência dificulta sua participação.

A cooperação entre Eike e o TJ-MG foi colocada em xeque após duas tentativas frustradas de vender os títulos da Anglo sob os acordos – uma primeira tentativa foi feita no fim de 2021, sem a cooperação. O problema está na decisão do administrador judicial, autorizada pela juíza Batista, de vender os papéis da Anglo por meio de um processo de venda direta – a quarta tentativa. O processo foi anunciado no início do mês, usando como referência de valor uma nova proposta, do BTG Pactual, de R$ 360 milhões.

O valor é bem abaixo dos mínimos das duas tentativas anteriores de venda, por meio de leilão, de US$ 350 milhões e de R$ 1,250 bilhão, o que fez Eike se insurgir contra a decisão. Nesse ponto, o ex-bilionário se alinhou com os credores. Os advogados de Eike classificaram o processo de venda direta de “depreciação descabida” dos títulos da Anglo.

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Numa petição inserida no processo de falência no TJ-MG no último dia 12, o grupo dos oito principais credores ressalta que a decisão de vender diretamente os títulos da Anglo, “estranhamente” fixou o valor mínimo “em meros R$ 360 milhões, muito inferior” aos de outras propostas mencionadas no processo.

Ao criticar a divulgações das conversas com Thor, a defesa do empresário voltou a atacar essa decisão. “Esperamos ainda que Bernardo Bicalho revele as conversas que resultaram na escolha, em 24 horas, do BTG Pactual para atuar como ‘stalking horse’ da venda das debêntures de Eike Batista. A troca de mensagens entre um dos filhos de Eike e o administrador judicial nada tem especial. O filho do empresário apenas reafirmou pedido para liberação de seus recursos já desbloqueados pela juíza da 1ª Vara Empresarial de Belo Horizonte. Em contrapartida, o filho do empresário abriria mão de parte dos valores para custear despesas processuais”, diz outro trecho da nota.

Divisão dos recursos

Na petição do último dia 12, os credores também criticaram a divisão dos recursos que serão levantados com a venda dos títulos da Anglo e o pagamento das taxas de remuneração de assessores financeiros e advogados, credores e o administrador judicial estão em lados opostos.

Os advogados de Eike atacaram esse ponto. “Esperamos que o administrador judicial apresente também as atas das conversas que resultaram na contratação de um escritório privado de advocacia para perseguir bens pessoais de Eike Batista com descabida remuneração de 30% sobre o valor dos bens da massa falida da MMX”, diz a nota.

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