- Pelo projeto, há um centro de meta para o resultado em cada ano, com bandas de tolerância acima ou abaixo do valor
- Ao ficar dentro da margem, o governo pode aumentar os seus gastos em 70% do crescimento das receitas primárias no exercício seguinte
- O superávit das contas públicas é um saldo positivo entre as receitas e despesas; o contrário de um déficit
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, anunciou nesta segunda-feira (10) que o texto do novo arcabouço fiscal deve ser entregue ao Congresso junto com a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), que tem prazo limite de entrega na sexta-feira (15). Com o início das discussões nas casas legislativas, os termos “superávit” e “déficit” devem tomar espaço na discussão pública.
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Isso porque o governo estabeleceu um compromisso com os resultados primário das contas públicas para cada ano até 2026. Pelo projeto apresentado pela Fazenda, que ainda será discutido, há um centro de meta para o resultado em cada ano, com bandas de tolerância acima ou abaixo do valor.
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No ano de 2024, por exemplo, a meta é zerar o resultado primário, com uma margem que vai até um superávit de 0,25% ou um déficit de 0,25% do Produto Interno Bruto (PIB). Já no ano de 2025, o centro da meta estabelece um superávit de 0,5%, que pode variar para 0,25% ou 0,75%.
Em 2026 a expectativa é de que o superávit seja equivalente a 1% do PIB. Ao ficar dentro dessa margem, o governo pode aumentar os seus gastos em 70% do crescimento das receitas primárias no exercício seguinte. Se o resultado for inferior ao piso da banda, o aumento dos gastos fica limitado a apenas 50% do aumento das receitas.
Mas o que é um superávit?
Em economia, superávit significa ter um resultado positivo em uma conta; o seu oposto, quando há um resultado negativo, se chama déficit.
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Estes termos são empregados frequentemente para falar da balança comercial de um país. Quando as exportações feitas por ele são maiores do que as importações, por exemplo, se diz que houve um superávit.
Mas a ideia por trás do novo arcabouço fiscal não diz respeito a esse tipo de superávit. “São dois conceitos diferentes e, normalmente, o que a gente encontra é uma sobreposição desses conceitos, então as pessoas acabam não entendendo direito”, diz a professora de economia da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM), Cristina Helena de Mello.
As metas do novo arcabouço se referem ao resultado fiscal primário do governo central — a diferença entre receitas e despesas em um determinado período. Nesse caso, quando as receitas são superiores às despesas, há um superávit.
Receitas são os recursos financeiros que o governo central arrecadou em determinado período por meios como impostos, taxas e contribuições. Essa arrecadação se destina ao pagamento de dois tipos de despesas: as obrigatórias e as não obrigatórias.
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A economista e professora da FGV, Carla Beni explica que as despesas obrigatórias são aquelas fixadas na lei, como o percentual da saúde, da educação, salário de funcionário público na ativa, aposentados e pensionistas. “E depois nós temos as despesas não obrigatórias, que normalmente são de custeio ou investimento. Essas contas são passíveis de corte ou contingenciamento”, explica.
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O saldo final dessa conta é chamado de “primário” porque não inclui o pagamento de juros da dívida pública. O resultado obtido a partir da subtração desses juros do resultado primário se chama de “nominal”. Carla explica que o resultado fiscal nominal também pode ser positivo ou negativo. “Ou um país pode ter superávit nominal ou déficit nominal.”
E o que ocorre quando há um déficit?
Em cenários de déficit, o governo central precisa pegar recursos emprestados, já que não conseguiu arrecadar o suficiente para cumprir com suas despesas. Para isso, são emitidos títulos de dívida pública que normalmente são comprados por bancos ou investidores.
“O grande problema é que quando o governo faz isso recorrentemente, você vai pegando muito dinheiro emprestado, os agentes econômicos começam a olhar pra isso com muita preocupação”, explica Cristina. Segundo a economista, o limite desse processo se dá quando a percepção de risco dos agentes leva à uma exigência de condições de juros mais altas para empresar recursos ao governo.
Os efeitos desse tipo de cenário são a incerteza econômica, instabilidade e maiores taxas de juros. O arcabouço fiscal lançado pelo Governo Federal busca melhor as expectativas em relação a esses pontos.
Resultado primário e novo arcabouço fiscal
Segundo Mello, o problema para reverter um cenário de aumento de dívida e déficit é fazer um ajuste fiscal instantâneo, já que isso dependeria de um grande aumento de arrecadação para lidar com as despesas que já estão ocorrendo ou um corte alto dessas despesas, que são importantes para prestar serviços públicos à população e garantir o investimento em infraestrutura.
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“Para evitar um aumento na arrecadação muito grande e pra evitar um corte de despesas muito grande, que poderiam ter um impacto muito negativo sobre a economia, é que veio este arcabouço fiscal”, explica Cristina. De acordo com ela, as regras apresentadas propõem que, para cada aumento de receita que houver, as despesas só podem subir em 70% desse valor.
Entre as regras definidas pelo novo arcabouço fiscal, está o compromisso de resultado primário, aquele obtido antes do pagamento de juros, para cada um dos próximos anos até 2026. Esse compromisso não significa afirmar que haverá aumento, mas se comprometer com as regras estabelecidas caso ele aconteça.
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“Dentro de qualquer economia, que a base do sistema todo é fiduciária, ou seja, a base é a confiança. Se você não cumpre as regra propostas ou cria artifícios pra burlar as regras, você descredibiliza o todo”, aponta Beni.
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A economista da FGV explica ainda que, para mensurar tanto déficits quanto superávits, costuma-se utilizar o PIB como parâmetro devido aos grandes valores envolvidos. Por essa razão, as metas de resultado primário do novo arcabouço fiscal são apresentadas como um determinado percentual do PIB. “Fica mais fácil, depois, você fazer um comparativo com anos anteriores e as projeções futuras”, afirma.