- As principais casas do mercado financeiro não acreditam que o governo vai conseguir ter déficit primário zero em 2024
- Elas estão com o freio de mão puxado em relação às expectativas de cumprimento da meta por parte do governo. E isso, com certeza, reflete na segurança e no humor dos investidores institucionais na bolsa
O governo Lula deve encaminhar até quinta-feira (31) as medidas saneadoras que têm como foco principal o aumento da arrecadação e o cumprimento da meta de déficit primário zero, em 2024.
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Entre as medidas previstas estão taxação das offshores, taxação dos fundos exclusivos, fim da JCP e a regulamentação da decisão do Superior Tribunal de Justiça ( STJ) em relação à tributação de benefícios fiscais concedidos pelos Estados no ICMS.
Também estão em discussões no Congresso a taxação das apostas esportivas (Bets) e a que trata da regra do desempate a favor do governo nos julgamentos do Carf. Essa última proposta deve ter a sua votação concluída até quarta-feira (30), no Senado. Depois, segue para sanção presidencial.
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Somando-se a todo esse pacote, mais as novas regras para preço de transferência, o governo acredita que chegará a R$ 130 bi de receita extra. Em tese, isso seria o necessário para fechar a conta e atingir a meta de déficit primário zero, em 2024.
Hoje, dentro das principais casas do mercado financeiro, o que se percebe é que a ampla maioria não acredita que o governo vai conseguir fechar essa conta. Elas estão com o freio de mão puxado em relação às expectativas de cumprimento da meta por parte do governo. E isso, com certeza, reflete na segurança e no humor dos investidores institucionais na bolsa.
Por que ainda permeia essa desconfiança?
Primeiro, porque os números de arrecadação são bastantes incertos. Pegando apenas um exemplo, sobre a taxação das “bets”: há declarações de representantes do governo que afirmam que a taxação pode gerar R$ 2 bi.
Ao mesmo tempo, há outras declarações que defendem que a taxação pode chegar a R$ 12 bi em 2024. Essa discrepância permeia não apenas os valores referentes à arrecadação, mas também o volume necessário de receita extra para o governo cumprir a meta zero de déficit em 2024. Há valores que variam de 110 bi a 160 bi.
Em segundo lugar, porque ainda há uma descrença de que o Congresso (Câmara e Senado) irá aprovar todas essas medidas. Como mostramos em nossos artigos anteriores, a taxação da renda não é um tabu na Câmara. Ela avançou em 2021, na gestão de Bolsonaro. Nesses últimos dias, o presidente da Casa, Arthur Lira, deu declarações de que não vê problema nenhum na agenda.
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Por outro lado, a Reforma Tributária da Renda foi totalmente escanteada no Senado. Consequentemente, não houve a conclusão da votação da proposta no Congresso.
A reforma ministerial significará a senha para o governo ter maioria necessária no Congresso?
Hoje, o foco da dança das cadeiras são dois partidos do Centrão: Progressistas e Republicanos. A expectativa é que o destino deles seja revelado por Lula nos próximos dias.
Entretanto, pegando como base as votações da Reforma Tributária do Consumo e o PL do Carf, percebe-se que uma ampla maioria (entre 80% a 90%) dos deputados do Progressistas e do Republicanos já vinham ajudando na votação de interesses do Palácio do Planalto.
Até então, essa pré-disposição dos dois partidos em colaborar tinha como base a liberação do chamado “bônus de coalizão”, que se traduz em distribuição de emendas e algumas acomodações no segundo e terceiro escalão do governo.
De acordo com alguns integrantes do governo, que estão no front das negociações, a expectativa com a Reforma Ministerial é a de que a base continue a flutuar nas votações, mas dentro de uma margem de 338 dos 513 votos na Câmara.
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Com o avanço do PP e do Republicanos no primeiro escalão, considero que aumentará o grau de governabilidade do atual governo Lula. E acredito que a maior parte do pacote de Haddad vai ser aprovado. A questão, porém, vai ser observar qual será o texto final de cada uma das propostas, porque nem todas serão aprovadas como o governo quer.
Mudanças foram feitas em várias propostas encampadas pelo Executivo, como Marco Fiscal, Carf, Reforma Tributária do Consumo. E já estamos vendo isso acontecer na prévia do debate da taxação das offshores. O governo tem defendido uma alíquota de 10% e a turma da Câmara tem sinalizado que topa apenas 6%. Ou seja, o potencial de arrecadação previsto inicialmente no projeto ainda não está assegurado.
De forma geral, isso contribui para reforçar o que destacamos acima, quando citamos que a maioria das casas do mercado financeiro ainda tem dúvidas sobre os cenários econômicos que permeiam 2024.
Impacto na Bolsa
Essas dúvidas podem ser dirimidas ao longo dos próximos meses, com o avançar das propostas. Acredito que se ficar claro, até novembro, que o governo não vai fechar a conta, teremos um impacto negativo na Bolsa.
Mas o contrário também pode acontecer. Se o Congresso atender boa parte das expectativas do governo, poderemos ter um impacto positivo no mercado. Vimos isso acontecer com o Marco Fiscal. Não é a proposta dos sonhos dos agentes do mercado, mas também não se transformou num pesadelo.
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Hoje, acredito no meio termo. Em um cenário que ficará entre o céu e o inferno. Mas se você é um investidor, é válido monitorar e acompanhar de perto essas agendas.
Qual seria o deadline para a discussão do pacote de Haddad?
Acredito que o governo tem até maio de 2024 para concluir as discussões da agenda de novas receitas. Essa data tem como base dois episódios que já estão precificado no calendário político:
- A disputa municipal do próximo ano que irá parar as duas Casas de junho a outubro.
- A disputa pela sucessão na presidência da Câmara e Senado, que também deve travar as propostas de interesse do governo entre outubro e dezembro de 2024.
Vamos acompanhando.