As notícias “positivas” da economia americana têm trazido turbulência para os mercados em todo o mundo com desvalorização das moedas e das bolsas de valores.
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O leitor deve estar estranhando as aspas que coloquei nas notícias positivas. Afinal, como é possível ter notícias positivas com toda a turbulência que levou a desvalorização dos ativos de risco?
Isso ocorre porque novos dados de atividade econômica americana têm mostrado bastante resiliência, com diversos números vindo acima das expectativas de mercado. Na última semana, dados de vendas no varejo mostraram crescimento de 0,7% em setembro, enquanto as expectativas eram de 0,3%.
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Essas surpresas altistas têm reancorado as expectativas de crescimento da economia americana. O Fed (Federal Reserve, o banco central dos EUA) de Atlanta, por exemplo, revisou sua projeção de crescimento para o terceiro trimestre 2023 de 5,1% para 5,4%.
Todos esses sinais apontam para uma economia em aceleração, diferente daquilo que se imaginava há alguns meses, que seria o início de uma recessão no final deste ano.
Apesar de mais vendas e mais crescimento parecerem boas notícias, por outro lado mostra a dificuldade da política monetária americana fazer o seu trabalho de controle da inflação, ficando cada vez mais desafiador com uma economia em aceleração.
Vale lembrar a origem do processo inflacionário que ocorreu no mundo inteiro, resultado de políticas fiscais e monetárias expansionistas adotadas durante a pandemia como instrumento de gestão da crise por parte dos governos.
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O resultado foi uma inflação alta em todo o mundo, e o aumento dos juros é a ferramenta utilizada pelos bancos centrais para lidar com esse problema, o que aconteceu de forma sincronizada.
Esse processo de elevação dos juros, que vai desde o final de 2021 para alguns países, sendo o Brasil o primeiro deles, até hoje traz resultados positivos no controle da inflação, mas esse problema não está completamente solucionado.
A primeira parte do processo de desinflação já ocorreu com índices de inflação cedendo de algo em torno de 10% para níveis como 4% ou 5%. O desafio agora está relacionado a sua fase final de convergência para a meta. Emergentes como Brasil e Chile já começaram seus ciclos de redução de juros, porém, a maioria dos países tem previsão de corte apenas a partir de 2024, quando veremos um movimento sincronizado de afrouxamento monetário em todo o mundo.
Essa visão era consenso até há pouco tempo, inclusive para a economia americana, com projeções de redução de taxa a partir do segundo ou terceiro trimestre de 2024. Esse cenário tem mudado à medida que novos números de atividade são divulgados.
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Na última reunião do Fed, foi reforçado o fato de que a atividade econômica vem se expandindo em um ritmo sólido, que os ganhos de emprego diminuíram, mas permanecem fortes, e a inflação continua elevada.
Essa mensagem vem sendo reforçada em cada fala dos seus representantes e tem apontado para uma chance cada vez maior de um aumento adicional nos juros americanos ainda em 2023, com o início da redução de juros cada vez mais para frente, entre o último trimestre de 2024 e o início de 2025.
A economia americana, traz grande volatilidade nos mercados a cada notícia de mais juros, incentivando movimentos de capitais que buscam juros mais altos em economias seguras. É isso que temos observado nas últimas semanas, desde quando a economia americana se mostra ainda em aceleração, com o dólar se fortalecendo frente às demais moedas, juros futuros subindo e bolsas em queda.
O Brasil é um exemplo disso, apesar de todos nossos desafios locais o ambiente internacional tem contribuído de forma contundente para um ambiente mais volátil.
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O efeito não é apenas nos ativos de risco que vem sofrendo nesse cenário. Esse movimento de mais juros nos Estados Unidos pode ser um grande influenciador da dinâmica da política monetária dos demais países, principalmente os emergentes que já começaram ou estão em vias de começar seu ciclo de corte de juros.
Esse é um dos riscos para a velocidade de queda de juros no Brasil, estimado em 0,5% pelo Banco Central nas próximas duas reuniões. A manutenção de juros mais altos nos Estados Unidos e o risco do menor diferencial de juros afetar nossa taxa de câmbio, como ocorreu no Chile recentemente, podem influenciar futuras decisões de corte do nosso Banco Central.