- A incerteza sobre o início do ciclo de juros nos Estados Unidos deixa os investidores piora o humor dos investidores
- A expectativa gera uma volatilidade atípica no mercado norte-americano, segundo Sampaio
- Ao E-Investidor, Frederico Sampaio falou sobre o impacto do cenário externo para a bolsa brasileira
A inquietação dos investidores para o início do corte de juros nos Estados Unidos (EUA) tem deixado os ativos mais voláteis. A divulgação dos dados do mercado de trabalho em maio, o payroll, com quase 90 mil postos a mais do que se esperava, piorou o humor dos investidores com o indicativo de que os juros devem se manter no intervalo de 5,25% a 5,50% ao ano.
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Esse resultado ajuda o Federal Reserve (Fed), o banco central norte-americano, a definir os próximos passos da política monetária no país. Com a ausência de sinais de desaquecimento econômico, o Fed decidiu manter a taxa de juros pela sétima vez consecutiva, obrigando os agentes econômicos a mudarem as apostas para o primeiro corte. A previsão passou de setembro para novembro deste ano, segundo os dados da ferramenta de monitoramento do CME Group.
“Se houver uma surpresa da inflação acima do esperado, os juros futuros disparam. Se vier abaixo, as taxas desabam. A volatilidade está maior do que o normal e todos estão monitorando de perto o movimento de queda de juros”, diz Frederico Sampaio, chief investment officer (CIO) da Franklin Templeton.
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O cenário, classificado como atípico pelo gestor, mostra um certo receio dos investidores em tentar antecipar o movimento de queda dos juros. Enquanto não houver sinais consistentes para o início do ciclo de queda, o fluxo de capital estrangeiro não deve voltar para os mercados emergentes, como o Brasil.
O CIO da Franklin, gestora internacional com mais de US$ 1,3 trilhão em ativos sob gestão, falou ao E-Investidor sobre como a depreciação da bolsa oferece oportunidades de investimento ao permitir que as ações de qualidade sejam negociadas com preços descontados (abaixo do seu valor considerado ideal). Veja os principais trechos da entrevista:
E-Investidor – Com a indefinição dos juros e a renda fixa pagando IPCA+ 6%, a bolsa perdeu o protagonismo?
Frederico Sampaio – Vemos uma deterioração grande no cenário doméstico em uma velocidade rápida. Tivemos uma surpresa negativa com a despesa do precatório que deve ficar de fora do arcabouço fiscal. Ou seja, a verdade é que deveríamos estar próximo a um ponto de equilíbrio e estamos com algo de 2% do Produto Interno Bruto (PIB) de déficit primário. Há um choque de desconfiança muito grande. A bolsa de valores vem sofrendo há mais de dois anos com uma atividade de resgate contínua nos fundos de investimentos. O que está acontecendo? Um cenário de juros altos e a oferta de investimentos isentos de imposto de renda que tiram a atratividade de qualquer ativo de risco.
Mas a atratividade ainda permanece para os objetivos de longo prazo?
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Se olharmos para essa perspectiva, a bolsa está bizarramente barata. Estamos com um múltiplo preço-lucro (indicador que aponta o quanto o mercado está disposto a pagar pelo lucro apresentado ou projetado pela empresa) de cenário de absoluta volatilidade devido à ausência de previsibilidade econômica, mas não vejo o nosso cenário atual desta forma, embora esteja ruim. O múltiplo da bolsa não é compatível com o cenário econômico de curto prazo. Quem pode virar o jogo é o investidor estrangeiro, mas ele tem preferido outras geografias, embora mais caras, com perspectivas de crescimento no longo prazo. Se houver uma inversão das expectativas, a reação será como “pólvora” e a bolsa subirá absurdamente. Esse gatilho não está visível e nunca vi tantas ações de qualidade com múltiplos tão descontados.
E quais são essas ações?
Todas, como as ações da Lojas Renner (LREN3), Localiza (RENT3) e os bancos. A própria Petrobras (PETR3/PETR4) ainda paga mais de 10% de dividendos ao ano, mesmo com as recentes mudanças na condução da empresa com os dividendos extraordinários. Em um horizonte de longo prazo, acho uma excelente oportunidade. Ainda assim, não sabemos qual será o cenário do Brasil em um ano; podemos ver uma série de mudanças institucionais.
E por que os estrangeiros não estão aproveitando essas oportunidades?
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O Brasil não está fazendo o seu dever de casa. Pelo contrário, estamos trabalhando para piorar os nossos fundamentos [econômicos]. O México está em crescimento e não está destruindo as contas públicas, além de estarem se beneficiando de uma série de investimentos. Ainda assim, é uma economia menor do que a brasileira. A Índia também está crescendo mais do que o Brasil. Para investir, o estrangeiro olha para uma projeção de crescimento consistente e de longo prazo.
Que tipo de lição de casa pode virar esse jogo?
Dependemos da política. Qualquer evidência real de preocupação constatado nas contas públicas, funcionaria bem para a bolsa de valores. O mercado não precifica hoje nenhum corte adicional na taxa Selic porque o Banco Central mudou a comunicação após a revisão das metas para os anos posteriores. Basicamente, o governo falou que novos ajustes serão realizados somente na próxima gestão. A reação negativa do mercado foi instantânea. Não temos segurança fiscal e tudo depende da âncora monetária. Portanto, para manter a inflação sob controle, os juros precisam ficar mais altos. O governo criou uma agenda muito bem sucedida de aumento de impostos, mas já está próximo do seu limite político. Ninguém fala de cortes de custos ou despesas. Não é um assunto que parece estar na mesa.
O mercado precificou de forma errada a responsabilidade do governo com as contas públicas?
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O mercado nunca acreditou nos números implícitos do arcabouço fiscal, mas imaginava-se que o governo fosse tentar fazer o certo por mais tempo. Não deu nem um ano e já mexeram nas metas. Havia uma expectativa de que apenas a meta desse ano fosse ser mexida e acredito que essa tenha sido a surpresa.