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CVM multa gestora e ex-diretor em R$ 490 milhões por fraude em fundos

Segundo a autarquia, Manoel Carvalho, diretor da Silverado Gestão, usava empresas de fachada para desviar dinheiro dos investidores

CVM multa gestora e ex-diretor em R$ 490 milhões por fraude em fundos
CVM condenou envolvidos a multas que somam quase R$ 500 milhões (Foto: Adobe Stock)
  • A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) condenou a Florim Consultoria (antiga Silverado Gestão) e o fundador da casa, Manoel Teixeira de Carvalho, a multas de R$ 245 milhões cada um
  • O julgamento ocorreu na última terça-feira (15) e foi um dos maiores casos da autarquia no ano
  • Segundo a investigação, Carvalho operou uma grande fraude nos fundos de direitos creditórios (FIDCs) Maximum, Maximum II e Petro, geridos pela então Silverado Gestão até meados de 2016

A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) condenou a Florim Consultoria (antiga Silverado Gestão) e o diretor da casa, Manoel Teixeira de Carvalho, a multas de R$ 245 milhões cada um. Ou seja, quase meio bilhão de reais. O julgamento ocorreu na última terça-feira (15) e foi um dos maiores casos da autarquia no ano.

Segundo a investigação, Carvalho operou uma grande fraude nos fundos de direitos creditórios (FIDCs) Maximum, Maximum II e Petro, geridos pela então Silverado Gestão até meados de 2016. A descoberta foi de que os cedentes desses fundos, na verdade, eram empresas de fachada ligadas ao executivo. Algumas dessas companhias compartilhavam até o mesmo endereço físico e e-mails, segundo relatório da CVM.

Para quem não conhece, um FIDC compra os direitos de receber uma dívida. Por exemplo, uma loja de roupas pode vender os direitos de receber as dívidas de cartão de crédito dos clientes a um FIDC. Desta forma, a varejista (cedente) adianta o recebimento dos recursos, enquanto o fundo deve receber esses créditos ao longo do tempo, com juros. No caso dos FIDCs da Silverado, o problema era que algumas das empresas que cederam o crédito (a “varejista” do exemplo acima) eram ligadas ao gestor dos fundos. Enquanto os devedores (por exemplo, os clientes que tinham a dívida de cartão de crédito), também chamados de “sacados”, não sabiam da existência do débito com aquelas companhia. Segundo a CVM, a maioria das operações nem existia. Eram falsas.

Em resumo, é como se o dinheiro dos investidores fosse desviado para a conta de Carvalho ou pessoas relacionadas a ele, sem lastro real. “A Área Técnica concluiu que tais cedentes seriam ’empresas de fachada’ e que grande parte das operações que originaram os créditos constantes nas carteiras dos FIDCs sequer ocorreram”, afirma a autarquia, em relatório. “Conforme apurado, diversos sacados sequer reconheceram os supostos cedentes em seu cadastro de fornecedores ou prestadores de serviço.”

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As irregularidades começaram a vir à tona em janeiro de 2016, após a agência de classificação de risco Standard & Poor’s (S&P) retirar as avaliações de rating sobre as três aplicações, sob a justificativa de que faltavam “informações suficientes de qualidade satisfatória” para atribuir qualquer nota aos FIDCs. No final, os recebíveis entraram em inadimplência e o patrimônio líquido dos fundos — dinheiro dos cotistas — foi destruído. Segundo a área técnica da CVM, o prejuízo total dos investidores foi de R$ 460 milhões.

As administradoras fiduciárias e custodiantes dos fundos, BNY Mellon Serviços Financeiros DTVM S.A, Gradual CCTVM S/A e Santander Caceis Brasil, também foram condenadas. O entendimento da CVM é de que as instituições tinham condições de identificar a fraude e não foram diligentes. A BNY foi multada em R$ 1,2 milhão, a Gradual em R$ 1,7 milhão e o Santander Caceis, em R$ 2,7 milhões. Por fim, o banco alemão Deutsche Bank SA, custodiante do FIDC Maximum, foi condenado à multa de R$ 500 mil por permitir que a Silverado, na qualidade de gestora e agente de cobrança, controlasse a conta do fundo.

Os diretores responsáveis pela administração das carteiras de valores mobiliários das instituições acima também foram responsabilizados: Carlos Augusto Salamonde, da BNY Mellon, foi multado em R$ 510 mil; Fernanda Ferraz, da Gradual, em R$ 850 mil; Marcio Pinto Ferreira, do Santander, deverá desembolsar R$ 510 mil.

“Os efeitos negativos à credibilidade, transparência e integridade do mercado de valores mobiliários ficaram amplamente demonstrados pela Área Técnica. Cabe à CVM prevenir e reprimir com rigor esta fraude dos FIDCs Silverado, que é um caso paradigmático na indústria de fundos”, afirma João Pedro Nascimento, presidente da CVM, no voto sobre o caso.

As defesas no processo

Em defesa no processo, a Gradual afirmou que estava em regime especial de liquidação judicial desde maio de 2018. Por isso, a massa falida não poderia ser condenada pelas práticas irregulares da Gradual, quando ainda era ativa no mercado.

“As irregularidades apontadas transcorreram em período anterior não só ao regime falimentar, mas também ao regime especial de liquidação extrajudicial, de modo que eventual condenação da Massa Falida apenas fará agravar sua condição, vindo a prejudicar ainda mais seus credores”, afirma a Gradual.

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O Santander Securities e Marcio Ferreira ressaltaram, na defesa, que “falhas procedimentais pontuais” não podem ser usadas para construir a impressão de que a administradora e o diretor teriam atuado de forma determinante para o desfecho do caso Silverado. Também afirmam que, conforme foi apurado pela CVM, as práticas irregulares dos fundos acontecem desde a constituição dos FIDCs e que não foram identificadas de imediato em razão da “simulação de entrega”, pelo gestor, dos documentos relacionados aos negócios – mas que depois se mostraram irregulares. A defesa aponta ainda que o ex-diretor tinha um histórico “reduzidíssimo” de inadimplências.

“Somente alterado a partir do afastamento do gestor das suas funções, por decorrência do rebaixamento do rating, o qual, cumpre destacar, conforme reconhecido no termo de acusação, teve origem em questionamento de operações específicas pela própria Santander Securities (e seu diretor Márcio)”, afirmam as defesas.

As defesas de BNY Mellon e Carlos Salamonde apontaram que a contratação da Silverado como gestora do fundo foi precedida de análise documental que não apontou qualquer informação negativa em relação a ela e a seus sócios. “Os quais, aliás, gozavam do respeito do mercado e de outros profissionais do setor financeiro”, afirmam as defesas, que ressaltam ainda que a seleção do banco Deutsche Bank para atuar como custodiante do fundo baseou-se, à época, na notória reputação da instituição, não apenas no mercado local, como também na indústria internacional.

O Deutsche Bank, por sua vez, afirmou que sempre que verificou questões não conformes, informou o Administrador, tendo sempre agido diligentemente. “A acusação extrapola a competência, função e responsabilidade de um custodiante em um FIDC”, diz.

Já Manoel Carvalho e Florim argumentaram na peça, em caráter preliminar, que os direitos creditórios que os fundos adquiriam, representados por duplicatas e por contratos de compra e venda de locação e de prestação de serviços, não se enquadram no conceito de “valores mobiliários”. Logo, requisitaram a extinção do processo já que, na visão da defesa, ainda que fosse comprovada eventual autoria e materialidade das infrações, estas não teriam sido cometidas no mercado de valores mobiliários.

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No final, apesar da Gradual, Santander Securities, BNY Mellon, e as pessoas físicas Fernanda Ferraz, Marcio Ferreira e Carlos Salamonde, terem sido condenados à multa por não possuir ou não executar procedimentos e rotinas básicas que permitissem identificar as irregularidades que vinham sendo praticadas pela Silverado, foram inocentados de acusações relacionadas ao delegarem à Silverado autorização para movimentar contas. Já o Deutsche Bank SA foi absolvido da acusação de supostamente não verificar, de forma adequada, o lastro dos direitos creditórios do fundo.

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