De olho nos fundos de investimento

Dan Kawa é economista e especialista em fundos de investimento. Graduado em Ciências Econômicas pela PUC-Rio, atua no mercado financeiro desde 2003. Dan foi sócio da TAG Investimentos e atuou nas maiores gestores independentes do País como Gap Asset Management, Bank of New York Mellon ARX Investimentos, FLAG Asset Management e Icatu Vanguarda.

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Dan Kawa

O que muda nos investimentos com a alta na Taxa Selic?

Devemos fazer ajustes em nossos portfólios e estarmos atentos às oportunidades que estão sendo criadas

Reunião do Comitê de Política Econômica (Copom) do Banco Central (BC) (Foto: Beto Nociti/BCB)
  • O Brasil sempre foi um país onde as taxas de juros eram estruturalmente elevadas, por diversos fatores locais e históricos
  • As reformas econômicas implementadas nos últimos anos, além de um contexto internacional de juros baixos, e um contexto cíclico de inflação baixa no país, nos permitiram conviver com uma Taxa Selic de apenas 2% por alguns meses
  • Nos últimos meses, contudo, observamos o começo de um processo de alta e espalhamento da inflação, derivada de uma melhora do crescimento pós pandemia, da depreciação cambial, da quebra da cadeia produtiva devido a pandemia global, entre outros

Na semana passada, o Banco Central do Brasil (BCB) anunciou uma alta de 75bps na Taxa Selic, a taxa básica de juros da economia. Além da alta, o BCB sinalizou que pretende elevar a taxa em mais 75bps em sua próxima reunião, dentro de 45 dias, para 3,5%.

O que isso muda para os seus investimentos? O que isso significa para o país?

A Taxa Selic é o instrumento utilizado pelo BCB para controlar o nível de inflação da economia, com impactos primários e secundários sobre o crescimento do país. Uma taxa de juros mais baixa, leva a um ambiente de mais estímulos. Consequentemente, mais crescimento e maior pressão altista sobre a inflação.

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Quando a inflação está alta e/ou o crescimento está excessivamente elevado, causando expectativa de alta na inflação, o Banco Central eleva a taxa de juros, com o intuito de reduzir os estímulos econômicos e conter a escalada de preços, com efeitos primários e secundários sobre o crescimento, neste caso, com potencial de conter uma alta excessiva do crescimento e evitar pressões altistas na inflação.

Obviamente que as relações aqui não são perfeitas e muitos outros efeitos secundários, muitas vezes indesejáveis e inesperados, podem entrar nessa equação. Todavia, a título de simplificação, podemos tomar essas relações como verdadeiras.

O Brasil sempre foi um país onde as taxas de juros eram estruturalmente elevadas, por diversos fatores locais e históricos. As reformas econômicas implementadas nos últimos anos, além de um contexto internacional de juros baixos, e um contexto cíclico de inflação baixa no país, nos permitiram conviver com uma Taxa Selic de apenas 2% por alguns meses.

Este patamar era compatível com os juros de países desenvolvidos, uma taxa considerada bastante baixa e estimulativa para a economia e o crescimento.

Nos últimos meses, contudo, observamos o começo de um processo de alta e espalhamento da inflação, derivada de uma melhora do crescimento pós pandemia, da depreciação cambial, da quebra da cadeia produtiva devido a pandemia global, entre outros.

Diante deste contexto, os juros de 2% já não eram mais compatíveis com a realidade de inflação do país. Foi com este pano de fundo que o BCB optou, acertadamente, em iniciar um processo de normalização monetária, ou alta de juros.

É importante ressaltar que este processo não precisa ser visto como necessariamente negativo. Ele faz parte dos ciclos econômicos. Na realidade, o mercado de juros futuros, já previa o início deste processo. O “mercado” já trabalhava com uma perspectiva de altas bastante acentuadas nas taxas de juros, com a Selic chegando a patamares superiores a 8% nos próximos 5-6 anos.

Do ponto de vista dos nossos investimentos, dado que parte relevante deste processo já vinha sendo precificado, pouca coisa muda nas perspectivas de alocação.

No mercado de ações, devemos entender e identificar os setores mais sensíveis ao mercado de juros, não para evitá-los, mas para termos a realidade se há ali oportunidades de alocação ou riscos embutidos.

No mercado de crédito, muitos ativos atrelados ao CDI, sejam em percentual do CDI ou CDI+, poderemos voltar a identificar boas oportunidades de retorno ajustados aos riscos com um CDI mais elevado.

No mercado de renda fixa, dos títulos soberanos, já existem oportunidades de alocação com retornos que pareciam distantes há poucos meses. A velha máxima que começava a imperar de que “a renda fixa morreu” parece ter ficado para trás.

Mesmo com as taxas de juros mais elevadas, ainda teremos uma Selic historicamente baixa para os padrões locais. Isso não irá inviabilizar a diversificação dos investimentos para ativos menos líquidos, porém com excelentes perspectivas de retornos, como Venture Capital, Private Equity, ativos de Infraestrutura e afins.

Os Fundos Imobiliários continuarão crescendo e sendo excelentes oportunidades de alocação e investimento.

O ano de 2021 mal começou e os desafios que encontramos já se acumulam. A pandemia ainda é um problema global, mas, em especial, uma enorme tragédia para o país. O aumento da taxa de juros no mundo é um outro vetor que precisa ser monitorado, mesmo para nossos investimentos locais.

De todo modo, são nos desafios e nas adversidades que as oportunidades de investimento são criadas. Não devemos ver a alta de juros que irá ocorrer no Brasil como um divisor de águas para os nossos investimentos.

Continuamos em um processo de queda estrutural das taxas de juros no país. Devemos sim fazer ajustes pontuais em nossos portfólios e estarmos atentos às oportunidades que estão sendo criadas.

Continuo com uma visão construtiva para a normalização social e econômica que o Brasil e o mundo poderão atingir ao longo do ano, mas ciente das dificuldades e das cicatrizes que os eventos recentes irão deixar em nossa sociedade.