“O custo para reduzir o desemprego é aumentar a inflação. A teoria de Phillips tem toda uma curva que explica isso, entendeu?”, explicou o participante. “Por exemplo, a emissão de moeda gera um custo para a sociedade e esse custo da geração da moeda é a inflação“, complementou.
Gil reforçou que muitas pessoas pensam da seguinte forma: “Quando eu for presidente da República, vou emitir moeda no Banco Central, dar dinheiro para todo mundo e todo mundo vai ficar rico. Bora, Brasil! Vai, Banco Central, emite moeda! Adoro! Vai!”, disse.
Mas, afinal, Gil fez o dever de casa e acertou nos conceitos? O E-Investidor conversou com três economistas para saber se a fala do participante do BBB está correta.
Vladimir Maciel, coordenador do Centro Mackenzie de Liberdade Econômica
“Em linhas gerais, Gil foi muito didático e fez uma coisa que não é trivial: explicar o trade-off entre inflação e desemprego para leigos e ressaltar a importância da estabilidade monetária e do controle da emissão de moeda por parte do Banco Central.
O conceito é correto, mas como ele mesmo disse no vídeo, há outras vertentes sobre papel do Banco Central. Gil não foi preciso em demasia, mas não está errado. A relação empírica entre inflação e desemprego foi inicialmente diagnosticada pelo economista neozelandês William Phillips. Quem explorou com muita profundidade a validade dessa relação foi o economista norte-americano Milton Friedman (pai da “Escola de Chicago”).
O que o Gil tentou dizer é que pode haver uma certa “troca” no curto prazo entre inflação e desemprego – BC abaixa a taxa de juros para estimular a economia – injetando mais liquidez (moeda) – e o desemprego pode cair. Porém, se o Governo explorar isso sistematicamente, a tendência é aumentar a inflação e o efeito sobre a redução do desemprego se tornará nulo. No final das contas, só restará inflação elevada e perda de poder aquisitivo da população.”
Gilberto Braga, economista do Ibmec-RJ
“O participante Gil falou de maneira informal. Não era uma fala de caráter científico e tinha alguns conceitos errados. Na realidade, essa ideia que ele coloca da “Curva de Phillips” é correta sobre determinadas condições, quando a economia está em plena capacidade, ou seja, quando tem a sua capacidade produtiva sem as circunstâncias de expansão.
O problema é que o momento atual da economia brasileira não é esse, ao contrário, estamos longe de ocupar nossa capacidade produtiva. Temos, por conta da pandemia da covid-19, a chamada capacidade ociosa, que permite que você possa ter expansão econômica ocupando o espaço de produção que não vem sendo utilizado, de uma forma ampla, pela indústria e demais segmentos.
Uma outra questão é que a emissão de dinheiro está sempre relacionada a um equilíbrio. Na verdade, o dinheiro é expressão monetária do lado real, ou seja, a moeda é apenas um meio de troca. Em tese, a quantidade de moeda deve estar atrelada ao tamanho da economia real. Quando você, de fato, emite moeda além deste tamanho, tem inflação. É mais ou menos como você entrar em um parque de diversões com aquele brinquedo de espelhos que deformam a pessoa.
Quando você emite muita moeda além do lado real, você gera inflação, pois está engordando a pessoa além daquilo que ela realmente precisa.”
Alexandre Espirito Santo, Economista-Chefe da Órama e professor de Economia IBMEC-RJ
“A fala faz sentido. Me parece que ele quis explicar para um leigo a relação entre inflação e desemprego e o papel da moeda em uma economia. Muitos se perguntavam como podiam coexistir (inflação e desemprego) e foi isso que levou o economista Neozelandês, Willian Phillips, a estudar o comportamento dessas variáveis na década de 1950, usando como referência a economia do Reino Unido.
Ele notou que existia uma correlação negativa entre ambas. Esse estudo originou a teoria chamada Curva de Phillips. Nas décadas de 1970 e 1980, outros economistas aprimoraram o conceito, pois aquela correlação passou a ser questionada empiricamente.
Na macroeconomia moderna há teorias que aprimoram essa tese, inclusive por conta do papel das expectativas inflacionárias sobre os agentes econômicos e de choques de preços, como alta de petróleo, quebra de safra agrícola, etc.
De qualquer forma, a ideia de que a emissão desmedida de moeda por parte do Banco Central traz um custo para sociedade na forma de inflação me parece muito adequada e é a minha forma de pensar também. Sair emitindo moeda com a cabeça de que todos serão ricos só criará um processo hiper inflacionário.”
Gesner Oliveira , economista e coordenador do Centro de Estudos de Infraestrutura e Soluções Ambientais, da FGV
A explicação sobre a curva de Phillips está correta em sua essência. Essa teoria foi desenvolvida como um estudo empírico, mostrando que quando você tenta baixar a inflação, aumenta a taxa de desemprego, e ao tentar aquecer a economia e baixar a taxa de desemprego, aumenta-se a inflação.
Este trabalho foi desenvolvido em meados do século passado, mas depois outros estudos mostraram que você sempre deve levar em consideração as expectativas. Então, a história que foi contada por Gilberto não está completa, já que além da curva de Phillips tradicional, deve-se levar em conta as expectativas de inflação.
Por isso, é muito importante que haja uma política econômica consistente para que as expectativas estejam adequadas, porque, muitas vezes, até tentamos fazer uma política anti-inflacionária, mas se o Banco Central não tem independência e se a política econômica não tem consistência, ela não funciona.
Uma outra circunstância que caracteriza a pandemia é a situação de grande desaquecimento, como ocorreu em 2020 com a economia em função das restrições e da crise sanitária. Neste caso, você pode ter uma política monetária mais expansionista, sem tanto impacto na inflação.
Então, o que foi dito nessa conversa informal não está errado, mas faltam esses dois componentes: expectativas e a situação da economia.