O Departamento do Trabalho dos Estados Unidos divulgou nesta sexta-feira (5) o relatório de empregos do país, conhecido como payroll. O total de vagas criadas em junho ficou um pouco acima das expectativas, embora o desemprego tenha avançado. Esses números são importantes porque dão pistas sobre a força da economia americana e sua inflação. Seus reflexos não ficam limitados às fronteiras norte-americanas: eles também influenciam no Brasil.
Segundo os analistas consultados pelo Projeções Broadcast, era prevista uma mediana de 200 mil postos de trabalho, mas o resultado fechou em 206 mil empregos em junho. Por outro lado, a taxa de desemprego dos EUA aumentou para 4,1% em junho, ante 4% em maio. A previsão era de que a taxa permaneceria em 4% no mês passado.
Na avaliação de André Valério, economista sênior do Inter, mesmo com esses números há sinais de que está ocorrendo uma desaceleração do mercado de trabalho americano. “Com o resultado de junho e as revisões dos resultados prévios, a média móvel de 3 meses de adição de novos empregos ficou abaixo dos 200 mil empregos pela primeira vez em mais de 2 anos”, aponta.
Vale lembrar que esses dados, juntamente ao Índice de Preços para Gastos de Consumo Pessoal (PCE), estão sendo observados com atenção pelo Federal Reserve (Fed, o banco central americano) para entender quando será o momento oportuno para o início do ciclo de cortes nos juros. Para Valério, o payroll desta sexta-feira deve ser visto com bons olhos. “O Comitê Federal de Mercado Aberto (Fomc) tem se mostrado mais sensível a dados negativos de atividade do que de inflação. Mantida essa tendência, esperamos que o Fed dê início ao ciclo de cortes na reunião de setembro.”
Qual a relação entre o mercado de trabalho e a inflação?
Pode parecer difícil de entender, mas existe uma relação entre o mercado de trabalho e a inflação. Não só nos EUA, mas em todos os países. Isso porque quando há um mercado de trabalho aquecido e com baixo desemprego, uma consequência disso é o aumento dos salários já que os trabalhadores têm maior poder de barganha. Consequentemente, podem haver a elevação dos custos de produção e o aumento dos preços dos produtos e serviços, o que gera uma inflação de oferta.
E, quando há mais pessoas empregadas e com renda disponível, haverá um aumento na demanda de bens e serviços. Nesse caso, se a oferta não conseguir acompanhar a procura, haverá a inflação de demanda.
Essa é a razão pela qual os bancos centrais também monitoram os dados do mercado de trabalho na condução da sua política monetária. É possível que as taxas de juros sejam elevadas a fim de controlar a inflação em um mercado de trabalho aquecido. Por outro lado, ele também pode reduzir as taxas para estimular a economia e o consumo em períodos de alto desemprego.
Em um relatório enviado ao Congresso americano, o Fed destacou que o mercado de trabalho voltou à situação “apertada”, mas não superaquecida como antes da pandemia, e que a inflação “diminuiu notavelmente no ano passado e mostrou um progresso modesto até agora neste ano”. Por lá, os juros são mantidos no intervalo 5,25% e 5,5%, o maior patamar em mais de 20 anos.
E o que a economia brasileira tem a ver com isso?
A perspectiva de juros mais baixos nos EUA deve refletir nas economias emergentes, como a brasileira. Felipe Vasconcellos, sócio da Equss Capital, explica que enquanto eles estiverem elevados, o fluxo de capital de investimentos vai continuar indo para a economia mais segura do mundo. “Isso pressiona a valorização do dólar e impacta a nossa inflação, que consequentemente dificulta a queda da taxa Selic.”
Já Graziela Ariosi, estrategista-chefe da Swiss Capital Invest, também menciona o fortalecimento da moeda americana enquanto os juros permanecerem altos por lá. “O resultado pode encarecer as importações e aumentar os custos de empresas brasileiras com dívida em dólar”, diz. Além disso, ela explica que a alta dos juros nos EUA pode forçar o Banco Central do Brasil a manter ou até aumentar a Selic: “O que pode impactar o crescimento econômico.”