Para o investidor focado em renda passiva – que gosta de comprar ações que paguem bons dividendos, a bons preços -, eventos como a queda recente da Bolsa de Valores brasileira abrem espaço para que ele possa encontrar oportunidades no mercado.
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No entanto, não se trata de sair comprando tudo o que está com desconto na bolsa. É muito importante que, além do preço, o investidor olhe para os fundamentos das empresas e a capacidade de as companhias continuarem gerando renda futura elevada aos seus investidores. Mas, afinal, qual seria um rendimento adequado para carregar uma ação para o longo prazo?
No mercado, existe uma métrica de que uma ação deveria entregar pelo menos um dividend yield (retorno em dividendos) de 6% para ser considerada interessante para o longo prazo.
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Mas por que 6%? Gabriel Duarte, analista da Ticker Research, destaca que este patamar tem relação com as taxas oferecidas pelos títulos públicos atrelados à inflação em momentos de estresse, que na sua média também entregam inflação mais 6%.
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Segundo o analista, isso é um consenso de mercado. “Uma empresa para gerar valor, para que justifique o investimento deve ter um dividend yield em torno de 6% e crescer acima da inflação”, explica Duarte. Não é apenas nas ações que essa métrica é utilizada, muitos gestores de fundos de pensão, por exemplo, tem como meta bater inflação mais 6%.
Bruno Oliveira, analista da plataforma AGF, aponta que a meta dos 6% já foi utilizada por grandes investidores em nível nacional e internacional. Jeremy Siegel, no seu livro “Investindo em ações no longo prazo”, já utilizava a taxa anualizada de 6% para o investimento em ações.
No Brasil, o megainvestidor Luiz Barsi Filho, que fez a sua fortuna com ações pagadoras de dividendos, também usa os 6% como condição mínima para escolher papéis há mais de 50 anos. Na década dos anos 1990, o jornalista e investidor Décio Bazin, autor do livro “Faça fortuna com ações, antes que seja tarde”, também lançava mão desse critério para os acionistas de empresas que pagam proventos.
Diante disso, nós também seguimos o padrão do mercado e identificamos 24 ações baratas que podem pagar dividendos de 6% ou mais nos próximos 12 meses, de acordo com levantamento exclusivo de Fábio Sobreira, sócio e analista da Rocha Opções de Investimentos, para o E-investidor. Foi calculado também quanto o investidor deveria pagar nestes papéis para garantir, no mínimo, o retorno de 6%. Veja abaixo:
Ação | DY Projetado próximos 12 meses | Payout Médio | P/L Médio | P/L Projetado | Status | Preço-teto para garantir DY de 6% |
Petrobras (PETR4) | 22,00% | 86,00% | 4,74 | 3,97 | Barato | R$ 135,5 |
Metal Leve (LEVE3) | 18,00% | 111,00% | 7,33 | 6,25 | Barato | R$ 91,33 |
Metalúrgica Gerdau (GOAU4) | 17,00% | 50,00% | 3,94 | 2,9 | Barato | R$ 28,67 |
Unipar (UNIP6) | 16,00% | 72,00% | 5,65 | 4,33 | Barato | R$ 130,5 |
Gerdau (GGBR4) | 12,00% | 40,00% | 4,48 | 3,25 | Barato | R$ 34,83 |
Brasilagro (AGRO3) | 12,00% | 88,00% | 7,55 | 7,39 | Barato | R$ 49,5 |
Copasa (CSMG3) | 11,00% | 75,00% | 7,11 | 6,63 | Barato | R$ 37,33 |
Usiminas (USIM5) | 11,00% | 26,00% | 3,37 | 2,44 | Barato | R$ 12,5 |
Isa Cteep (TRPL4) | 10,00% | 52,00% | 5,5 | 5,26 | Barato | R$ 41,17 |
CPFL Energia (CPFE3) | 9,00% | 66,00% | 7,52 | 6,9 | Barato | R$ 52,67 |
Vibra (VBBR3) | 9,00% | 52,00% | 6,47 | 5,77 | Barato | R$ 32,17 |
Ferbasa (FESA4) | 9,00% | 45,00% | 5,38 | 5,06 | Barato | R$ 11,33 |
Cemig (CMIG4) | 9,00% | 51,00% | 6,3 | 5,87 | Barato | R$ 14,67 |
Cyrela (CYRE3) | 8,00% | 49,00% | 6,69 | 5,93 | Barato | R$ 26,5 |
Kepler Weber (KEPL3) | 8,00% | 48,00% | 8,45 | 6,23 | Barato | R$ 12,67 |
Itaúsa (ITSA4) | 8,00% | 58,00% | 7,52 | 7,46 | Barato | R$ 12,33 |
Randon (RAPT4) | 7,00% | 39,00% | 5,75 | 5,51 | Barato | R$ 10,67 |
Banco do Brasil (BBAS3) | 7,00% | 37,00% | 5,68 | 5,29 | Barato | R$ 31,67 |
Banco ABC (ABCB4) | 6,00% | 40,00% | 6,35 | 6,1 | Barato | R$ 22,5 |
B3 (B3SA3) | 6,00% | 87,00% | 13,99 | 13,45 | Barato | R$ 11,33 |
Engie (EGIE3) | 6,00% | 66,00% | 11,32 | 10,98 | Barato | R$ 43,17 |
SLC Agrícola (SLCE3) | 6,00% | 46,00% | 9,26 | 7,83 | Barato | R$ 16,67 |
Itaú (ITUB4) | 6,00% | 58,00% | 10,4 | 10,06 | Barato | R$ 29,83 |
Santos Brasil (STBP3) | 6,00% | 99% | 32,53 | 17,74 | Barato | R$ 11 |
Fonte: Fábio Sobreira/Rocha Opções de Investimentos
DY= dividend yield= retorno em dividendos
Preço teto: preço máximo a pagar por uma ação
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P/L = preço/lucro
*Foram consideradas apenas ações que pagaram dividendos todos os anos nos últimos 5 anos ou desde a abertura de capital
Premissas do levantamento
Para identificar quais ações teriam capacidade de entregar um dividend yield de 6% ou mais nos próximos 12 meses, de acordo com o seu histórico, Sobreira utilizou o lucro por ação médio dos últimos cinco anos destas empresas, corrigidos pela inflação, e comparou com o dividendo médio por ação pago nos últimos cinco anos, também corrigido pela inflação. Foi desta forma que chegou ao payout (parcela do lucro líquido destinado a proventos) médio da empresa.
Depois, o analista calculou o lucro projetado para os próximos 12 meses, com base no lucro médio e o crescimento anual composto. Logo, multiplicou esse lucro projetado pelo payout médio da empresa, obtendo assim o dividendo projetado para os próximos 12 meses. Para obter o dividend yield projetado nos próximos 12 meses, bastou dividir este dividendo pelo preço da ação, chegando assim à lista final de ativos.
Sobreira considerou na amostra apenas ações que tivessem remunerado o acionista nos últimos cinco anos ou desde sua abertura de capital – ou seja, ações com histórico de pagar proventos.
O analista também sinalizou se as ações estavam caras ou baratas, para isso utilizou dois múltiplos: o preço/lucro (P/L) médio de cinco anos e o projetado para os próximos 12 meses. A lógica é que se o P/L projetado é inferior ao médio, o papel pode ser considerado barato.
O analista calculou também o preço-teto, ou seja, o preço limite de compra para garantir no mínimo um dividend yield de 6% com as ações.
Ações para o longo prazo
Entre as 24 ações que integram o levantamento, os analistas destacaram aquelas que possuem bons fundamentos para uma estratégia de dividendos no longo prazo. Veja a seguir:
Copasa (CSMG3)
A Copasa (CSMG3) pertence ao setor de saneamento, segmento perene com alta previsibilidade na geração de receitas.
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Segundo Sergio Biz, analista focado em dividendos e sócio do GuiaInvest, apesar da Copasa estar enfrentando um ciclo de investimentos elevado, a boa rentabilidade que vem entregando junto a geração de caixa atual permite uma distribuição de proventos interessante para os acionistas da companhia.
Eurico Rodrigues, analista da Desmistificando Research, lembra que a Copasa gerou muito caixa também nos últimos anos e possui uma dívida controlada de 1,5 vezes dívida líquida/Ebitda (Lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização). Com as elevadas distribuições, ele enxerga que a companhia seja capaz de entregar um dividend yield superior a 9%.
Mas há riscos que devem ser observados pelos investidores e que são inerentes ao negócio, por exemplo, uma crise hídrica. Rodrigues lembra também o fato de a companhia ser estatal e poder ser usada para abater uma dívida que o estado de Minas Gerais tem com a União, mudando de controle. “Tenho receio dessa possibilidade”, diz.
Renato Reis, analista da Blue3 Research, cita também entre os riscos a possibilidade de ocorrerem reajustes tarifários abaixo da inflação, o que não seria bom para os acionistas da empresa. Isso acabaria reduzindo as margens da companhia, gerando lucros menores, justifica o analista.
Banco do Brasil (BBSA3)
Oliveira, do AGF, destaca que o Banco do Brasil possui uma das maiores rentabilidades entre os grandes bancos, por conta de sua carteira de crédito bem equilibrada, exposta de maneira estratégica e preservando os índices de inadimplência em patamares abaixo do Sistema Financeiro Nacional.
Além disso, segundo o analista, o Banco do Brasil cumpriu com todas as projeções divulgadas ao mercado nos últimos anos, o que trouxe credibilidade e competência para a gestão atual. “O Banco do Brasil remunera o investidor oito vezes ao ano, divulgando com muita antecedência as datas de corte e pagamento para o investidor”, diz Oliveira. Essa estratégia traz mais segurança ao investidor que sabe exatamente quando será remunerado.
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Duarte, da Ticker, cita também como vantagem a exposição do banco ao agronegócio, uma carteira de baixo risco. Já entre as desvantagens estaria a governança, por se tratar de uma instituição com 50% de controle estatal. Duarte acrescenta também o impacto da tragédia no Rio Grande do Sul, que embora possa ser limitado, só será conhecido no 2° trimestre. “Fora esses aspectos, acredito que o banco vai pagar um yield entre 8% e 10%, que é bem razoável”, avalia.
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Reis, da Blue3 Research, considera que o Banco do Brasil está sempre muito barato, por conta de ser uma companhia estatal, no entanto como a sua rentabilidade é elevada, com Retorno Sobre Patrimônio Líquido (ROE) acima de 15%, o retorno em dividendos é alto. “Como o resultado é forte e o preço da ação baixo, o dividend yield (retorno em dividendos) acaba sendo mais elevado do que os pares”, afirma.
Entre os riscos Reis enxerga o segmento agro, que não teve uma boa safra de grãos neste ano e pode contribuir negativamente com os resultados do Banco do Brasil. O analista menciona também os riscos do crédito consignado, caso houvesse um calote para funcionários públicos, embora a possibilidade seja praticamente inviável.
Metal Leve (LEVE3)
Em relação à Metal Leve (LEVE3), Biz, do GuiaInvest, aponta que é uma companhia com forte histórico de pagamentos e que geralmente trabalha com um payout (parcela do lucro destinada a proventos) próximo de 100%. “Isso sinaliza a capacidade e a intenção da companhia em distribuir praticamente todo seu lucro para os acionistas em forma de proventos”, afirma.
Biz faz a ressalva de que os últimos pagamentos feitos pela empresa foram turbinados por efeitos não recorrentes. Mantendo desta forma as suas margens operacionais, o analista acredita que a companhia teria capacidade de entregar dividendos acima de 6% em 2024.
Já Rodrigues, da Desmistificando Research, lembra que a companhia gera muito caixa e tem pouco investimento em reposições para fazer, o que permitiu distribuir todo o seu lucro em proventos nos últimos anos. Para ele, a companhia vai entregar pelo menos um dividend yield de 13% nos próximos 12 meses.
Entre os fatores negativos, Rodrigues cita o follow-on (oferta subsequente) que a companhia fez recentemente para a redução de participação dos controladores. Além disso, houve um acréscimo no lucro não recorrente por conta do aumento desproporcional do preço dos carros usados.
Sobre o risco de obsolescência da companhia, Rodrigues manifesta que o movimento não é tão agressivo como precifica o mercado. “Certamente, a Metal Leve coexistiria com o avanço dos carros elétricos”, pontua.
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Além destas companhias, os analistas citaram Isa Cteep (TRPL4), Itaúsa (ITSA4), Engie (EGIE3), Vibra (VBBR3), Banco ABC (ABCB4), CPFL Energia (CPFE3), Cemig (CMIG4) e Itaú (ITUB4), como algumas alternativas que podem continuar entregando dividendos elevados no longo prazo.
Já entre as companhias que seria importante ter uma certa cautela, os analistas apontaram as empresas de commodities, que costumam ser mais voláteis nos seus lucros, como Petrobras (PETR4), Unipar (UNIP6), Gerdau (GGBR4), Metalúrgica Gerdau (GOAU4), Usiminas (USIM5). A Ferbasa (FESA4) também foi citada entre as companhias que requerem atenção.
As empresas do agro também foram contempladas entre as empresas mais arriscadas para uma estratégia de longo prazo, porque também possuem características cíclicas nos seus negócios. Brasilagro (AGRO3), Kepler Weber (KEPL3), SLC Agrícola (SLCE3) integram a lista.