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- IGP-DI tem composição e comportamento idênticos aos do IGP-M, mas com período de apuração diverso. Grande sensibilidade a variação do dólar explica a alta recente do índice, assim como aquecimento da demanda por commodities
- Mercado não oferece produtos de investimento indexados ao IGP-DI. Quem mais tem que se preocupar com a disparada são as pessoas que contraíram empréstimos ou outras obrigações atreladas ao índice
- Por outro lado, caso o dólar não recue, a persistência do IGP-DI alto pode provocar alta da inflação no varejo e até precipitar a volta da elevação da taxa básica de juros
- E ainda que não tenha obrigações atreladas ao IGP-DI, o investidor pode sentir no bolso a alta do índice, já que ele reflete o aumento de preços praticados no mercado
O IGP-DI (Índice Geral de Preços – Disponibilidade Interna) tem apresentado altas expressivas nos últimos meses. Somente em agosto, ele registrou inflação de 3,87%, a maior variação mensal desde novembro de 2002. A variação em 12 meses, de 15,23%, é a maior desde 2003. A título de comparação, o IPCA acumulou alta de apenas 2,31% no mesmo período.
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Para o investidor, porém, esse não é um dado a se acompanhar com tanta atenção. Hoje em dia, o índice de inflação usado mais amplamente nos investimentos é o IPCA. O IGP-M aparece principalmente em contratos de locação e também em um antigo título público, a NTN-C, que parou de ser oferecido em 2006. Já o IGP-DI é ainda mais raro.
“Não há hoje um único produto que o investidor possa comprar que tenha como indexador o IGP-DI. A quantidade de contratos de locação atrelados a ele é muito pequena”, diz José Raymundo de Faria Júnior, planejador financeiro CFP pela Planejar. “Mas ele tem composição e comportamento idênticos aos do IGP-M, a única diferença é a data de coleta.”
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Por outro lado, caso o dólar não recue, persistência do IGP-DI alto pode provocar alta da inflação no varejo e até precipitar a volta da elevação da taxa básica de juros
Entretanto, ainda que não tenha obrigações atreladas ao IGP-DI, o investidor pode sentir no bolso a alta do índice. Afinal, ele reflete o aumento de preços praticados no mercado.
“O IGP-DI é um acompanhamento do que está acontecendo na ponta, com os preços do atacado, do varejo e da construção civil. Se o investidor vai comprar um imóvel, por exemplo, o preço irá refletir a variação do custo da construção civil, a menos que a empresa tenha gordura para queimar e não repasse a ele esse ônus”, explica o professor Ricardo Teixeira, coordenador do MBA de Gestão Financeira da FGV.
Na cesta do IGP-DI, o maior peso, de 60%, fica com o IPA, que capta os preços do atacado. A inflação do varejo é representada pelos 30% do IPC e a da construção civil, consolidada no INCC, que completa os 10% restantes.
Essa composição explica a alta recente do índice. Isso porque a sua maior parcela, do atacado, foi duplamente impactada: pela alta do dólar e pelo aquecimento da demanda por commodities.
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“O que puxou bastante o IGP-DI foi o minério de ferro, que subiu 17%, a demanda externa por produtos agrícolas brasileiros e também o câmbio”, afirma Guilherme Artmann, head de renda fixa da Easynvest.
Volatilidade explica pouco uso do índice
A sensibilidade às oscilações da moeda norte-americana torna o IGP-DI muito volátil. Isso também explica o seu pouco uso em investimentos e também em contratos.
“O IGP-DI é câmbio na veia. Se o dólar dispara, ele dispara, e se a moeda desaba, ele desaba. Já o IPCA, que reflete o consumo das famílias, é mais estável, e por isso é mais usado”, diz Artmann.
Outra vantagem do IPCA sobre o IGP-DI é a disponibilidade de investimentos atrelados a ele, que podem ser usados como forma de proteção. “O investidor pode usar a NTN-b ou contratos de IPCA futuro para travar a taxa. Já no IGP-DI, não há um título público ou um contrato que ele possa usar para fazer hedge”, compara o head da Easynvest.
Assim, quem deve se preocupar com a disparada do IGP-DI são os investidores que eventualmente tenham passivos atrelados ao índice, como empréstimos. E, nesse caso, não há muito o que fazer.
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“Vai ser difícil renegociar um contrato referenciado ao IGP-M agora, porque o credor vai querer aproveitar o bom momento do índice”, afirma Artmann.
Pressão inflacionária merece atenção
Artmann destaca que a inflação do atacado, que tem grande peso no IGP-DI, pode se irradiar para o varejo, sensível à falta dos alimentos, respingando no IPCA. “O resultado disso seria uma elevação precoce da taxa básica de juros Selic, na tentativa de conter a pressão inflacionária”, diz.
Para Faria Júnior, da Planejar, caso não haja uma queda na cotação da moeda norte-americana, IGP-M e IGP-DI continuarão à frente do IPCA, com consequências preocupantes.
“O IGP pressionado indica que há uma inflação contratada, sobretudo no setor de alimentos, por conta do peso das commodities agrícolas”, diz o planejador financeiro. “Para o orçamento das famílias, essa é uma dinâmica perversa, com o IGP pressionando o preço dos alimentos e o custo do aluguel, enquanto salários, pensões e aposentadorias são corrigidos apenas pelo INPC. A renda não cresce no nível do IGP.”