- Somente em abril, os fundos de direitos creditórios (FIDCs) captaram cerca de R$ 33,7 bilhões, de acordo com dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima)
- Este é o maior volume mensal registrado pela classe desde abril de 2022, quando os FIDCs apresentaram uma entrada de R$ 51,6 bilhões
- Entretanto, nas duas ocasiões, uma única aplicação estava por trás de pelo menos 80% desses montantes: o “FIDC Não Padronizado (NP) do Sistema Petrobras”
Somente em abril, os fundos de direitos creditórios (FIDCs) captaram R$ 33,7 bilhões, de acordo com dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima). Este é o maior volume mensal registrado pela classe desde abril de 2022, quando os FIDCs apresentaram uma entrada de R$ 51,6 bilhões.
Entretanto, nas duas ocasiões, uma única aplicação estava por trás de pelo menos 80% desses montantes: o “FIDC Não Padronizado (NP) do Sistema Petrobras”. Em abril deste ano, o produto captou R$ 30,1 bilhões (89,3% do total da classe no mês). Já em abril de 2022 foram R$ 48,9 bilhões (94% do total da classe no mês). Os dados são de Einar Rivero, da Elos Ayta.
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FIDC consiste em uma aplicação que investe em direitos creditórios, como recebíveis de cartão de crédito, duplicatas, aluguéis e demais tipos de dívidas. Em outras palavras, as empresas vendem os direitos aos recebíveis aos FIDCs, em troca do adiantamento dos pagamentos que seriam feitos pelos clientes à companhia no futuro.
No caso do FIDC NP do Sistema Petrobras, a aplicação funciona como um instrumento de gestão de caixa da Petrobras e de empresas ligadas à petroleira. O fato de ele ser “não padronizado” (NP) significa que, além dos direitos creditórios tradicionais, o produto pode acessar outros ativos, como precatórios e valores em recuperação judicial – ativos com risco maior.
“É uma ferramenta para que a Petrobras acesse recursos perante as empresas do grupo. Um fundo-caixa, dinâmico, com aplicações e resgates, e como a Petrobras é muito grande, acaba sendo um fundo muito grande também. É um dos maiores FIDCs do País, se não o maior”, explica Ilan Arbetman, analista da Ativa Investimentos.
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Bruno Amadei, CIO da Cultinvest, ajudou a estruturar o FIDC do Sistema da Petrobras e reforça a utilização do fundo como instrumento de centralização de caixa. “Imagine que a Petrobras tem uma centena de empresas, com companhias superavitárias de caixa e outras deficitárias de caixa. Com o FIDC, as superavitárias disponibilizam recursos para as deficitárias por meio da antecipação das contas a receber”, diz Amadei, que foi responsável pelo primeiro FIDC lançado no mercado.
De acordo com dados da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), o fundo foi criado em novembro de 2007 e tem 151 investidores pessoas jurídicas. Entre esses, 150 possuem cotas da classe sênior, com prioridade no recebimento de amortizações e juros, além de ter uma rentabilidade prefixada, e apenas 1 tem a cota da classe subordinada, que recebe os pagamentos após as cotas seniores.
A instituição financeira que gere o FIDC do Sistema Petrobrás é a BB Asset, do Banco do Brasil. “Somente empresas participantes do Sistema Petrobras podem investir no fundo. Devido à sua natureza exclusiva, a BB Asset não comenta sobre detalhes específicos da captação ou da estratégia”, diz a gestora, ao ser questionada pelo E-Investidor.
Investir em FIDC é um bom negócio?
Não são só as empresas, como as do Sistema Petrobras, que podem ter acesso a essa classe de fundos. Desde outubro de 2023, as pessoas físicas podem investir em FIDCs conforme especifica a Resolução 175 da CVM. Antes disso, só investidores profissionais e qualificados podiam ter acesso ao produto.
Contudo, existem certas condições para o ingresso do varejo na modalidade. Por exemplo, as pessoas físicas só podem comprar cotas seniores, com prioridade de pagamento e remuneração fixa, como aquelas utilizadas pela maior parte das empresas que investem no FIDC do Sistema Petrobras.
De qualquer forma, esses fundos são apontados como uma boa maneira de investidores com perfil de risco moderado e arrojado complementarem o portfólio de renda fixa e conseguirem retornos acima do Certificado de Depósito Interbancário (CDI), o parâmetro para medir a rentabilidade na renda fixa. O principal chamariz para os FIDCs se encontra, justamente, nos retornos superiores aos demais ativos de renda fixa em função de ter uma estrutura mais complexa. Contudo, o maior retorno vem aliado a um risco também mais alto.
Segundo Alexandre Alvarenga, analista de fundos da Empiricus Research, os principais fatores de risco relacionados aos FIDCs estão associados a uma possível inadimplência dos clientes (aqueles que estão pagando os cartões de crédito, por exemplo, cujas parcelas vão para os FIDCs), além dos efeitos de mercado sobre os títulos presentes na carteira do fundo. “Não há como esperar um retorno maior do que o CDI sem um risco proporcional associado”, diz Alvarenga.
Para escolher um bom FIDC, o analista recomenda que o investidor avalie a experiência dos gestores em relação a controle e avaliação de riscos. Um ponto importante também fica com o potencial de recuperação de crédito, ou seja, em caso de um “calote”, quais são as garantias dos ativos que compõem o FIDC. “Vale ficar atento também ao prazo de resgate para os FIDCs abertos, normalmente superior a 180 dias, para a organização da sua carteira de investimentos”, complementa Alvarenga.
Robson Casagrande, especialista em mercado de capitais e sócio da GT Capital, ressalta a avaliação também da concentração dos ativos. Em tese, quanto mais correlacionados os recebíveis, maior o risco do FIDC. “Dependendo da composição da carteira do FIDC, pode ocorrer uma concentração excessiva em determinados setores, empresas ou tipos de créditos. Isso aumenta a exposição do fundo a riscos específicos associados a esses segmentos”, afirma Casagrande.
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Essa também é a visão de Cristiano Greve, sócio e head de Estruturação da Integral Investimentos. “O investidor tem que entender qual é o ativo que o fundo está investindo no final. Se ele está comprando uma carteira de direitos creditórios de contas a receber de uma indústria ou de um comércio, se ele está comprando os créditos de um banco ou de uma fintech. Ele precisa entender a natureza desse ativo, primeiro do que se trata, para saber a inadimplência esperada desse ativo”, diz.
FDICs com risco menor
Bruno Lund, gestor da Ecoagro, aponta que existem tipos de FIDCs com risco mais baixo. É o caso de fundos atrelados a recebíveis de cartões de crédito, cujos emissores são instituições financeiras robustas – que poderão cobrir a inadimplência de clientes. Os FIDCs com créditos high yield (alto retorno, em tradução livre), por outro lado, investem em ativos de maior risco atrelados a recuperações judiciais, por exemplo.
“O investidor tem que conhecer a tese e o gestor, se aquele profissional tem tradição na gestão de ativos de crédito”, diz Loud. “Precisa também prestar atenção na concentração, qual o porcentual do patrimônio líquido está em cada ativo. A primeira cota a sentir será a subordinada, depois vem a mezanino (intermediária entre a subordinada e a sênior) e, por fim, a sênior.”