- O Ibovespa fechou o período com alta de 3,22% e 111.350,51 pontos, mostrando resiliência frente aos gatilhos macroeconômicos que ainda persistem nos mercados globais
- A China começou a reabrir parcialmente as cidades interditadas pela política de covid zero, fator que pressionou o Ibov em abril
- Para junho, além dos fatores macroeconômicos, analistas acreditam que as eleições vão entrar no radar do mercado de vez
(Jenne Andrade e Luíza Lanza) – Depois de um abril difícil para a bolsa brasileira, com a pior queda mensal acumulada desde o início da pandemia, o mês de maio trouxe alívio ao investidor.
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O Ibovespa fechou o período em alta de 3,22% em relação ao mês anterior, aos 111.350,51 pontos, mostrando resiliência frente aos gatilhos macroeconômicos que ainda pesam nos mercados globais.
O mercado começou a digerir melhor o aperto monetário nos Estados Unidos, depois que o Federal Reserve indicou um ritmo de aumento em 0,5 ponto percentual na taxa de juros americana para as próximas duas reuniões – um alívio frente às expectativas mais pessimistas que previam um reajuste de 0,75 ponto percentual já no próximo encontro.
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Em paralelo, a China começou iniciou o processo de reabertura parcial das cidades interditadas pela política de covid zero no país, o que também aumentou o apetite ao risco dos investidores globais e reacendeu a demanda por commodities. Esse movimento favorece o Brasil.
Como a bolsa brasileira tem uma grande representação de empresas do setor, a alta dos preços dos insumos ajuda a segurar o Ibovespa mesmo em um cenário desfavorável em Nova York; como aconteceu em boa parte do mês.
“O mercado brasileiro conseguiu se descolar das bolsas de Nova York, com uma performance melhor motivada por alguns fatores. As commodities, que continuaram em um bom momento, e a boa performance dos bancos na temporada de balanços”, diz Ricardo França, analista da Ágora Investimentos.
Na visão do analista, ainda é cedo para dizer se os gatilhos de curto prazo vão dar trégua ao investidor, principalmente em função da continuidade da guerra na Ucrânia e a pressão inflacionária que atinge diferentes países desenvolvidos. “Ainda temos riscos relevantes pela frente e muitos deles vindos do exterior. Mas a B3 reúne algumas características que o investidor global tem procurado e isso permitiu um mês de recuperação”, diz França.
Para Filipe Villegas, estrategista de ações da Genial Investimentos, maio foi uma amostra dos assuntos que têm movimentado 2022: um ano marcado pela inflação mundial e o desafio dos Bancos Centrais de retirar liquidez do mercado, além das surpresas como o conflito no Leste europeu e a situação da covid na China. “Apesar desses indicadores ainda estarem persistentes, vemos uma recuperação dos ativos globais, o que influenciou na demanda por ativos brasileiros”, afirma.
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Mesmo com a alta volatilidade, resiliência representou a bolsa brasileira em maio. Depois de alguns pregões lutando para se manter acima dos 100 mil pontos, o Ibovespa conseguiu arrancar uma recuperação apesar do cenário de incertezas. “O Brasil acaba se destacando porque o preço faz diferença para o mercado, dado o tipo de ações que temos por aqui – commodities e empresas grandes geradoras de caixa. Como o Brasil já subiu os juros, estamos um passo à frente de um movimento que é esperado que aconteça no mundo desenvolvido”, destaca Villegas.
O dólar, que havia encerrado abril com alta de 3,29%, voltou a cair em maio. No quinto mês do ano, a moeda americana desvalorizou 3,85%, fechando aos R$ 4,75.
Estatais no radar
Outro destaque que marcou o mês foram as movimentação nas estatais. No dia 18, o Tribunal de Contas da União (TCU) aprovou a segunda parte do processo de privatização da Eletrobras, que agora pode ir à bolsa ofertar suas ações aos investidores. Para atrair os investidores, o TCU liberou que os trabalhadores utilizem até 50% dos recursos do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) para comprar as ações da companhia – permissão que também aconteceu durante a capitalização da Petrobras e da Vale.
Leia também: Vale a pena usar o FGTS para comprar as ações da Eletrobras?
O negócio foi bem visto pelo mercado, que entende que a mudança na gestão pode gerar um ganho de eficiência e redução dos custos operacionais, ajudando a valorizar ainda mais os papéis. “É um projeto que começou lá atrás e agora parece estar chegando ao capítulo final. Não é perfeito, muita coisa aconteceu no meio do caminho, mas no final das contas é melhor do que se manter estatal. Essa é uma empresa que precisa investir”, diz Pedro Serra, chefe de pesquisas da Ativa Investimentos.
Se de um lado a Eletrobras caminhou para a desestatização, do outro, a volatilidade política voltou a tomar conta das ações da Petrobras. No dia 25, José Mauro Ferreira Coelho foi demitido do comando da estatal após pouco mais de quarenta dias no cargo. A demissão aconteceu depois que a empresa se recusou a vender combustíveis com desconto aos consumidores, alertando o governo federal que isso poderia causar uma escassez de diesel.
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A preocupação do governo com o alto nível de preços deixou apreensivo o mercado, que teme uma interferência na atual política de preços da companhia. Por causa disso, a Petrobras sofreu com bastante volatilidade no final de maio, reduzindo parte dos ganhos que os papéis teriam diante da alta do preço do petróleo no mercado internacional. Porém, PETR3 encerrou o mês com alta de 9,73%, enquanto a PETR4 subiu 10,39%.
Apesar dos riscos, na visão de Serra, a terceira troca no comando da estatal no ano acaba sendo ‘mais do mesmo’. “É a Petrobras sofrendo mais uma vez com essa pressão política. Mesmo que a empresa não repasse o aumento do petróleo no preço dos combustíveis até as eleições, vemos uma certa blindagem da estatal. São testes de fogo para a governança e a companhia tem se saído bem até aqui, o que é positivo”, afirma Serra.
Mario Goulart, analista da 02Research, destaca que a interferência acabou neutralizando os bons números que a estatal divulgou no primeiro trimestre do ano, com lucro líquido de R$ 44,5 bilhões – o melhor resultado histórico em um trimestre entre todas as empresas da bolsa brasileira. “A Petrobras teria mais um desempenho super positivo com o resultado do trimestre, mas acabou ficando no zero a zero”, diz.
O que esperar de junho
Com juros altos, inflação nas alturas e risco de desaceleração da atividade econômica ainda em jogo, junho deve dar sequência à volatilidade vista em maio. Entre os próximos dias 14 e 15, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central se reúne para decidir o futuro da taxa Selic no País – considerando o nível de aperto nos EUA, há uma certa expectativa se esse será o último aumento do atual ciclo de alta nos juros.
O investidor precisa manter esses indicadores no radar. “Se os níveis de inflação permanecerem altos, com a atividade econômica desacelerando, entraríamos em um cenário de estagflação, péssimo para qualquer ativo de risco. Nesse cenário, mesmo com preços atrativos, o Brasil não conseguiria se sobressair. Se começarmos a ver índices de inflação global desacelerando e um nível de atividade positivo, o cenário é favorável ao investidor”, afirma Villegas, da Genial.
Essa não é a única pressão que o mercado deve enfrentar no próximo mês. Na visão dos especialistas, a aproximação do período eleitoral deve começar a fazer preço nos investimentos. Para Vitorio Galindo, analista de investimentos CNPI da Quantzed, empresa de tecnologia e educação financeira para investidores, o melhor caminho é “ficar um pouco perto da porta” à medida que a volatilidade política for se acentuando. “A partir de agora podem vir solavancos mais fortes. Com juros, inflação e eleições, as oscilações em junho podem ser bem altas”, diz.
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Na Inv, o analista de investimentos Nícolas Merola destaca que até então o ruído político não interferiu na dinâmica do mercado. Mas isso pode estar prestes à mudar. “Com a diminuição da importância dos assuntos macro, esse final de maio marcou o início das tensões eleitorais. Qualquer coisa daqui para frente pode sim refletir nos preços, coisa que há um tempo não estava acontecendo”, diz.
Mas, para o analista, o Brasil está bem posicionado para atravessar o período, principalmente em comparação às bolsas globais.”Claro que ainda temos muita incerteza pela frente, justamente por conta das eleições, mas estamos muito bem posicionados tanto em relação aos emergentes, quanto aos desenvolvidos. No relativo, só ficando parado já estamos bem, pois todas as outras bolsas não estão conseguindo reagir da mesma forma a todas essas incertezas”, diz.
Mesmo que o cenário de curto prazo não indique uma recuperação imediata, o investidor que olha para prazos mais longos continua com boas alternativas à disposição. “A bolsa brasileira continua descontada em uma avaliação de preço e lucros. No curto prazo, devem prevalecer nos portfólios as empresas de maior qualidade, exposição a commodities, blue chips e companhias com alavancagem baixa. As mais sensíveis à curva de juros seguem voláteis, então ainda não é o momento delas”, destaca Ricardo França, da Ágora.