O professor Lu Zhang participou do XXII Encontro Brasileiro de Finanças. (Divulgação/Fisher College of Business)
Na última semana de agosto, todos os olhares do mercado estavam voltados para a participação de Jerome Powell, presidente do Federal Reserve (Fed, o banco central norte-americano), no simpósio Jackson Hole. O evento de política econômica acontece anualmente e reúne autoridades do banco central dos Estados Unidos e economistas.
A expectativa era que a reunião desse indícios dos próximos passos da política monetária na maior economia do mundo. E não decepcionou. Powell afirmou que o compromisso com a estabilidade de preços nos EUA é “incondicional”. Veja os destaques.
A alta na taxa de juros nos Estados Unidos, iniciada no final de março, é um dos principais fatores jogando volatilidade nos mercados globais desde o segundo trimestre do ano. O maior receio é que os esforços para combater a maior inflação em 40 anos no país acabem levando a economia a uma recessão. Cenário cada vez mais provável, na visão de Lu Zhang, professor da Fisher College of Business da Universidade de Ohio.
“Esse é o cenário mais provável e parece ser o consenso entre os economistas. A pergunta não é mais se a recessão vai acontecer, mas o quão profunda ela será”, diz o professor.
Zhang participou do XXII Encontro Brasileiro de Finanças, realizado no fim de julho, e conversou com o E-Investidor sobre o cenário atual. Confira:
E-Investidor – Em 2022, o preço dos ativos caiu bastante, pressionados pelo cenário macroeconômico. Qual a sua leitura do movimento?
Lu Zhang – Eu diria que inflação está muito alta agora e os bancos centrais precisam fazer o melhor que podem para controlá-la, com todos os choques nas cadeias de suprimento, guerra na Ucrânia e outras coisas afetando as economias. O BEA (Bureau of Economic Analysis, na sigla em inglês) anunciou que os Estados Unidos tiveram o segundo trimestre de contração do PIB seguido, o que significaria oficialmente uma recessão. A pergunta não é mais se ela vai acontecer ou não, mas o quão profunda será.
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Mas não terá uma pausa repentina como foi na pandemia, vai ser uma recessão econômica tradicional. Esse é o cenário mais provável e o preço dos ativos deve se ajustar para isso. Essa é a minha leitura geral da situação – e parece ser o consenso.
Como isso impacta os investimentos?
Zhang – Os preços dos ativos vão cair. Acho que estamos apenas no início desse ciclo, mas não espero que a recessão seja como na pandemia da covid-19 que literalmente parou a economia. Vai ser de forma gradual como nas recessões tradicionais, o que também significa que vai durar mais. Durante a última crise, entre 2007 e 2009, o Fed fez tudo que podia para impedir que a economia literalmente caísse do penhasco, com um monte de medidas.
Ninguém pode cravar com certeza quando a inflação vai acabar, mas talvez estejamos apenas no início disso. É um problema complexo, por isso os preços vão continuar caindo por um tempo.
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Muitos especialistas defendem que o atual patamar de preço é uma oportunidade para investimentos. O Sr. concorda?
Zhang – Se você está me perguntando se agora é a hora de comprar, não posso responder, porque isso é prever o futuro. Mas digo que é hora de ser mais cauteloso. Eu sou naturalmente avesso a risco e acredito que estamos apenas no começo da recessão, ainda não chegamos no fundo do poço.
Pensando no investidor, quais são as melhores oportunidades?
Zhang – A inflação vai continuar por um tempo, então o risco para a economia real está se materializando. E, nesse cenário, o entendimento padrão é desacelerar e considerar reduzir as posições em ações, aumentando a de títulos de renda fixa. Eu teria cautela quanto ao investimento em ações, porque a quantidade de risco na economia vai continuar aumentando.
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O Fed conseguiria subir os juros nos EUA sem que isso signifique necessariamente uma recessão?
Zhang – Não. Na economia existe um conceito chamado de mecanismo de transmissão monetária, que diz que sempre que um banco central sobe a taxa de juros, o custo das empresas também sobe. Isso faz com que elas façam menos novos investimentos em projetos; e, se estão investindo menos, contratam menos trabalhadores. É assim que a máquina da economia funciona. E nós estamos entrando em uma recessão. O Fed vai tentar ao máximo não causar mais danos do que o necessário à economia. Mas, nesse ponto do ciclo econômico, a prioridade é controlar a inflação, a maior em décadas. É isso que eu espero que eles façam.
Essa pressão nos EUA poderia levar a uma recessão global?
Zhang – Há 25 anos, a economia global era menos integrada do que é hoje. Então acredito que as chances são altas. A quantidade de risco não é trivial e a Europa também está passando por isso. Vamos ver como o cenário vai caminhar, mas tradicionalmente sempre que as taxas globais de juros subiram, a economia passa por uma recessão. Nós estamos caminhando para isso. É difícil de prever como vai ser, depende de muitos elementos. Depende da guerra na Ucrânia, da cadeia de suprimentos.