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Bastidores da Light (LIGT3): como a empresa ignorou os credores por 2 meses

Debenturistas dizem ao E-Investidor que companhia elétrica não respondeu às tentativas de contato para negociação

Bastidores da Light (LIGT3): como a empresa ignorou os credores por 2 meses
Light: empresa tem dívida bilionária. Foto: Light/Divulgação
  • A Light teria ignorado as tentativas de contato de debentures por pelo menos 59 dias (1 de fevereiro a 31 de março)
  • A primeira reunião entre as assets e a companhia teria ocorrido somente em 3 de abril, cerca de 8 dias antes da medida cautelar
  • Gestor da gestor da BB Asset diz que a Light pediu na Justiça prazo para discutir, mas ainda não apresentou nenhuma proposta para discussão

Na semana passada, a Light (LIGT3) anunciou ao mercado que havia pedido à Justiça uma medida cautelar para suspensão de R$ 11 bilhões em obrigações financeiras. Entre as dívidas, estava o pagamento de R$ 6,2 bilhões em debêntures.

Fora a suspensão das obrigações, a ação incluía um requerimento de instauração de “mediação coletiva com as partes requeridas”. Tal solicitação foi recebida com espanto por Marcelo Farias, gestor da BB Asset e integrante de um grupo de 26 gestoras que possuem R$ 4,7 bilhões em debêntures da Light.

Em entrevista ao E-Investidor, Farias contou que, por pelo menos 59 dias (de 1 de fevereiro a 31 de março), a gestão da Light teria ignorado todas as tentativas de contato dos debenturistas para negociação.

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A primeira reunião entre as assets e a companhia teria ocorrido somente em 3 de abril, cerca de 8 dias antes da medida cautelar. Neste encontro, após dois meses de espera, a Light fez uma apresentação dos resultados e das dificuldades ligadas às perdas por roubo de energia.

Contudo, segundo Farias, naquela reunião a companhia não especificou se iria deixar de pagar as dívidas com vencimentos mais próximos. Até o momento, também não foi enviado nenhuma proposta aos credores, mesmo com a cautelar em vigência.

“Na reunião, fomos enfáticos em cobrar da companhia qual a sua proposta de renegociação e, de fato, até hoje não foi apresentado nada, o que aumenta a total falta de conexão da causa. Eles pedem na Justiça prazo para discutir, mas não há nenhuma proposta para discussão. Ou seja, são medidas protelatórias”, afirma Farias.

Jogo de gato e rato

Tudo começou no dia 31 de janeiro deste ano, quando veio a público a informação de que a Light havia contratado a Laplace Finanças, assessoria famosa por ajudar empresas com problemas financeiros a reestruturarem suas dívidas.

O suporte da Laplace foi publicado pelo jornal O Globo e confirmado pela Light somente após questionamentos da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), desencadeando uma onda de rebaixamento das classificações de crédito da empresa por agências de rating.

Desde a descoberta que a Light havia contratado a Laplace, os papéis da Light caíram 50% na Bolsa, passando de R$ 4,24 para os atuais R$ 2,13. Hoje, as debêntures são negociadas com um desconto de cerca de 70%. “Nos dias subsequentes à notícia, buscamos o contato com a Light, que não se manifestou. A companhia não negava, nem confirmava a situação e também não aceitava nenhum tipo de convite para uma videochamada”, afirma Farias.

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Em 9 de fevereiro, o grupo de gestoras conseguiu uma reunião com a Laplace, que já era formalmente representante da companhia de energia. Os dirigentes da Light, entretanto, não compareceram ao encontro.

A assessoria financeira teria reforçado, na ocasião, que estava trabalhando em um projeto de reestruturação de dívida. “Buscamos entender o que significava essa reestruturação de dívida e eles disseram que estavam avaliando o caso, porque a Light iria passar por um período de renovação da concessão. Eles fizeram uma conversa meio evasiva e disseram que em um momento oportuno comunicariam ao mercado”, afirma Farias.

A concessão da controlada Light SESA, a distribuidora de energia elétrica do grupo, vencerá em junho de 2026. Porém, em junho deste ano a empresa já precisa sinalizar à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) se pretende renovar o contrato – que é algo considerado essencial para a perpetuidade da companhia.

O pool de gestoras afirma ter mantido as tentativas de contato com a Light após a reunião com a Laplace, sem sucesso. A situação escalou até o dia 7 de março, data em que o comitê de credores enviou uma carta privada à companhia, cobrando explicações e informações.

“A companhia não respondeu. Aliás, a Light sequer respondeu se havia recebido a carta”, afirma Farias. No dia 14 de março, sete dias após o envio da carta, a Light teria enviado finalmente uma resposta. “Disseram que estavam em período de silêncio por conta da divulgação dos resultados do dia 28 de março, por isso não poderiam se manifestar.”

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O período de silêncio corresponde aos 15 dias anteriores à divulgação de resultados trimestrais. Portanto, esse prazo se iniciou somente no dia 14 de março, quando a Light respondeu à carta.

“Ou seja, a Light esperou esse tempo para nos dizer que não poderia dizer nada”, diz Farias. “Não é o que se espera de uma companhia aberta, não é o padrão de governança que entendemos como aceitável.”

No final, a primeira reunião teria ocorrido em 3 de abril, como relatado acima, mas sem informações claras. Agora, o grupo de gestoras trabalha para reverter a cautelar na Justiça e conseguir negociar com a Light. “Queremos uma conversa formal, entender o que a empresa deseja. É um waver (licença) para pagamento de juros? Alongamento de dívida?”, indaga o Farias.

Grandes perguntas

A situação da Light gera questionamentos. O fato de, pela Lei 12.767, de dezembro de 2012, concessionárias de energia não poderem entrar em recuperação judicial torna o instrumento da cautelar para suspensão e negociação com credores algo inédito – e como toda novidade, o desfecho também é pouco previsível.

Outra grande questão que o grupo de gestoras busca entende, é o motivo que levou a gestão da empresa a ignorar o contato dos credores por 59 dias para, depois, instaurar uma cautelar com requisição de mediação e suspensão de pagamentos.

Para Farias, a companhia utilizou de uma estratégia errônea para conduzir a situação financeira e garantir condições para renovar as concessões. Já outro gestor de mercado, que não quis se identificar, aponta motivos mais dolosos para a situação.

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No próximo dia 28 de abril, a Light promoverá uma Assembleia que, entre outros assuntos, votará o plano de remuneração à diretoria da companhia. Diretores estatutários e não-estatutários da concessionária são elegíveis para o pagamento, que inclui a possibilidade de subscrever 1 mil ações e até 18,6 mil opções.

O repasse total pode chegar até 5% do valor de mercado da empresa. Se considerado o valuation atual, de cerca de R$ 790 milhões, a remuneração seria de até R$ 39,5 milhões. Duas das quatro condições para o exercício das opções são a renovação da concessão e reestruturação de capital da companhia. Este último tópico chamou a atenção.

“Para nós ficou muito claro. A administração da empresa tem um incentivo muito grande para produzir essa renegociação. Eles agiram deliberadamente no sentido de forçar essa situação da medida cautelar, forçar uma mediação pela Justiça e, no final, produzir uma renegociação da dívida que vai muito em benefício próprio”, afirma o gestor. Ele ressalta que Carlos Alberto Sicupira, acionista de referência da Americanas, varejista que pediu recuperação judicial em janeiro (após a descoberta de um rombo bilionário), também possui uma grande participação na Light.

Questionada, a Light não se pronunciou sobre o assunto até o fechamento desta reportagem. O espaço segue aberto para posicionamento.

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