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Mudar o prazo de resgate de fundo de investimento é ilegal?

Prazo para o resgate da cota no Esh Theta 18 pulou de 18 dias para 2 anos; gestor lembra que houve aprovação em assembleia

Mudar o prazo de resgate de fundo de investimento é ilegal?
Mudança de prazo de resgate e fechamento para aplicações de fundos seguem regras diferentes.(Foto: Envato Elements)
  • Rodrigo Figueiredo, sócio do escritório RVF Advogados, diz que modificações em prazos de resgate só podem ser feitas via Assembleia de Cotistas
  • Advogado alerta que é importante conceder um período para a saída de investidores após a alteração
  • No caso do gestor decidir fechar completamente a aplicação para resgates, não há necessidade de assembleia prévia

Os cotistas do fundo multimercado Esh Theta 18 tem até esta quinta-feira (22) para retirar seu dinheiro investido caso não desejem se submeter à nova regra que ampliou o prazo de resgate 18 dias para 2 anos. A alteração, aprovada em assembleia e que está relacionada a disputas jurídicas e de bastidores – conforme o caso relatado em detalhes aqui –, busca estancar a fuga de cotistas e dar tranquilidade para o gestor do ativo.

Diante da situação, o E-Investidor consultou especialistas para entender sobre como devem ser feitas mudanças significativas em regulamentos de fundos. Eles reforçam que esse tipo de alteração precisa ser realizada com cuidado e com período adequado para a saída de investidores após a alteração no regulamento. Leia mais abaixo.

De acordo com Rodrigo Figueiredo, sócio do escritório RVF Advogados, modificações em prazos de resgate só podem ser feitas via Assembleia de Cotistas. “A assembleia deve ser convocada no prazo previsto no regulamento do fundo para deliberar especificamente sobre a mudança das regras de resgate, sob pena de nulidade da deliberação. A alteração somente ocorre se a aprovação respeitar o quórum estabelecido no regulamento”, afirma Figueiredo. “O gestor, portanto, não pode unilateralmente estabelecer tal mudança.”

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No caso do fundo Esh Theta 18, por exemplo, o regulamento estipula que uma assembleia só pode ser convocada com uma antecedência mínima de dez dias da sua realização e sua instalação independe do número de cotistas votantes. As deliberações são decididas por maioria de votos.

“O que se percebe é que o gestor do fundo (da Esh Capital) tomou a devida ação ao requerer previamente uma assembleia, na qual a maioria dos cotistas presentes votaram pela modificação da ampliação do prazo de resgate. Subtende-se que a decisão está de acordo com as regras estabelecidas”, diz Mozar Carvalho, fundador da Carvalho de Machado Advocacia.

O gestor do Esh Theta 18, Vladimir Timerman, disse ao E-Investidor que a nova regra de resgates foi aprovada em Assembleia de Cotistas realizada em 16 de janeiro deste ano. A administradora do fundo e responsável pela convocação dos investidores e organização da reunião, a Intrag, respondeu que seguiu todos os ritos legais para o processo e que a ata da assembleia e o novo regulamento do fundo serão disponibilizados no site da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) nesta sexta-feira (23).

O que advogados dizem sobre as alterações

Carvalho também ressalta que, além da realização da Assembleia de Cotistas, é importante conceder um período para a saída de investidores após a alteração no regulamento. “Importante medida que se presume pela licitude, se traduz na possibilidade de o cotista que não concorda com a mudança possa resgatar seus valores com base nas condições anteriores, dentro do prazo estabelecido na Assembleia.”

Outro ponto é a necessidade de que a comunicação com os cotistas seja clara e eficiente. Ou seja, todos os investidores devem estar cientes da alteração para decidirem permanecer, ou não, no fundo. “Está em jogo a diferença na tributação (de 22,5% para resgates até 180 dias versus 15% para resgates após 720 dias ou mais, sobre os ganhos patrimoniais), além da necessidade de liquidez do investidor e rentabilidade”, afirma Pedro Afonso Gomes, economista e presidente do Conselho Regional de Economia de São Paulo (Corecon-SP).

Portanto, se algum investidor eventualmente perder o prazo de resgate com a liquidez antiga por não ter, de alguma forma, recebido a informação da mudança, poderá caber ação judicial. É o que indica Gabriel de Britto Silva, diretor jurídico do Ibraci.

“Pela expressividade e relevância para o patrimônio do investidor, porque uma mudança de 18 dias para 2 anos é violentamente desproporcional, a informação precisa chegar individualmente a cada investidor. Não só com publicação no site”, diz Silva. “Se não for assim, caberá ao investidor ingressar com ação judicial em face ao administrador do fundo ou até mesmo ao próprio fundo.”

Um fundo pode bloquear resgates?

Quando um gestor deseja ampliar o prazo de resgate de um fundo, os cotistas precisam aprovar a alteração em assembleia antes de sua efetivação. Entretanto, o mesmo não acontece quando um gestor decide fechar completamente a aplicação para resgates. Nessa situação, não há necessidade de aprovação prévia dos cotistas e os investidores ficam impedidos de sacar o capital por prazo determinado.

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Segundo a CVM, o fechamento de um fundo de investimentos para resgates só deve acontecer em situação emergencial, como quando um gestor percebe risco de saques em massa, cujo volume é incompatível com a liquidez do fundo. Caso permaneça fechado por mais de cinco dias consecutivos, a autarquia estabelece que uma assembleia geral extraordinária (AGE) de cotistas seja convocada para deliberar sobre:

  • Substituição do administrador, do gestor ou de ambos;
  • Reabertura ou manutenção do fechamento do fundo para resgate;
  • Possibilidade do pagamento de resgate em ativos financeiros;
  • Cisão do fundo;
  • Liquidação do fundo.

No ano passado, gestoras como Infinity Asset, CTM e Empírica, por exemplo, utilizaram esse mecanismo e fecharam fundos de investimentos para resgates. A primeira casa congelou os resgates de três aplicações de renda fixa, em fevereiro de 2023, após ser descredenciada da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima) e sofrer com saques. Depois, os produtos, hoje geridos pela Vanquish Asset, perderam milhões de reais em função de uma operação incomum com derivativos e calote da contraparte. Procuradas, Vanquish e Empírica preferiram não comentar. A CTM não respondeu aos questionamentos do E-Investidor até a publicação desta reportagem.

A CTM, por sua vez, chegou a fechar três fundos (CTM Estratégia FIA, Ultra Performance e o Hedge Multimercado) em julho de 2023, por iliquidez dos ativos. O fechamento ocorreu após acusações da Esh Capital de manipulação de mercado com ações da Mobly (MBLY3), conforme publicado pela imprensa na época. Pelo menos dois dos fundos, o Estratégia FIA e o Hedge Multimercado, passaram por cisão e já reabriram para resgates, segundo comunicados da CVM.

Em agosto de 2023 foi a vez da Empírica fechar os fundos Empírica Lótus para resgates, em reação à onda de resgates e baixa liquidez dos ativos. “Caso algum cotista não esteja de acordo com o fechamento do fundo ou sinta-se prejudicado, é recomendado buscar orientação jurídica para avaliar possíveis ações a serem tomadas. É fundamental que o gestor do fundo atue de forma transparente e cumpra todas as obrigações legais e regulatórias durante esse processo”, diz Carvalho, da Carvalho de Machado Advocacia.

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