- “Eu não gosto da bolsa. Eu não gosto de gerar riqueza sem produzir nada para o mundo”, disse Felipe em um vídeo no seu canal no Youtube
- Fontes do mercado financeiro lamentaram a declaração e lembram o risco da desinformação em escala, considerando a influência do youtuber com o público jovem
Aos 32 anos, Felipe Neto é um dos brasileiros mais populares na internet. Qualquer declaração feita por ele ganha uma outra dimensão dado o amplo alcance de suas postagens. Em 25 de junho, Felipe Neto, que é empreendedor, surpreendeu ao opinar sobre a bolsa de valores.
Leia também
“Eu não gosto da Bolsa. Eu não gosto de gerar riqueza sem produzir nada para o mundo”, disse ele em um vídeo no seu canal no YouTube, com mais de 38,8 milhões de inscritos e mais de 10 bilhões de visualizações.
Fontes próximas ao mercado financeiro lamentaram a declaração e lembram o risco da desinformação em escala, considerando a influência do youtuber com o público jovem. Só no Twitter, Felipe Neto soma 12 milhões de seguidores e fica à frente de nomes populares, como a cantora Anitta (11,4 milhões), o ex-presidente Lula (1,9 milhão) e o atual presidente da República, Jair Bolsonaro (6,6 milhões).
Publicidade
Conteúdos e análises exclusivas para ajudar você a investir. Faça seu cadastro na Ágora Investimentos
A declaração, que começou a viralizar na segunda-feira (13), é um recorte dos diversos comentários que Felipe Neto faz sobre a impressão de seus seguidores sobre ele. “Com certeza você [Felipe] é um investidor. Só fica no computador olhando as ações na bolsa”, escreveu um seguidor. Felipe, então, ri e faz sua crítica aos investimentos na B3.
No vídeo, ele também afirma que não investe na bolsa, mas que esse é o seu entendimento atual. “Não sei se um dia eu vou mudar de opinião a respeito disso”, disse. E mudou rapidamente. Em resposta aos questionamentos do E-investidor, Felipe Neto defendeu que a frase foi retirada de contexto e, por isso, houve polêmica (leia as respostas dele abaixo, na íntegra).
Após a repercussão, ele diz ter pesquisado sobre o assunto e consultado economistas, “de direita e esquerda”, e entendeu, por exemplo, a importância da Bolsa para a oferta inicial de ações (IPO, sigla em inglês). “Mudei de ideia sim, porque fui estudar mais e entendi a principal função da bolsa de valores: viabilizar os IPOs. Sem a bolsa, não existiria IPO, então essa justificativa, para mim, é suficiente [para mudar de opinião].”
Ainda assim, o influenciador manteve suas ressalvas sobre quem vive apenas de operações na Bolsa, não só pelo que ela representa, mas por “tudo o que sabemos que ocorre nos bastidores”, disse sem especificar o quê. Na nota, ele volta a falar que a Bolsa não chega a produzir nada para o mundo, e que o mercado especulativo se assemelha ao mercado de apostas.
Publicidade
“O que percebi é que é quase unânime a opinião de que o mercado especulativo em si é, de fato, muito semelhante ao mercado de apostas e não chega a produzir algo para o mundo. Contudo, a justificativa de sua existência para a validação dos IPOs é extremamente válida”, diz Neto.
Falta de educação financeira no Brasil
A professora e economista-chefe da Reag Investimentos, Simone Pasianotto, lê a declaração como um retrato do atraso na educação financeira, acumulado ao longo de gerações. Para ela, o País precisa avançar e ensinar mais e melhor às pessoas não só sobre mercado de ações, mas também economia, gestão orçamentária particular e familiar, por exemplo.
“Essa ideia pré-concebida de que o mercado de capitais é uma grande Las Vegas é um equívoco. No ambiente de bolsas nós investimentos em empresas. E quer algo mais produtivo e gerador de riqueza, provedor de PIB, do que as empresas brasileiras?”, questiona Simone.
A economista lembra que é preciso entender e diferenciar para o que serve cada tipo de investimento, já que os recursos aportados são utilizados com objetivos distintos. “Se você investir em Tesouro Direto está ajudando a financiar o investimento público. Se comprar fundo cambial, ajuda a financiar as exportações. É preciso entender o que está por trás de cada aplicação financeira no mercado, seja de renda variável ou fixa.”
Quando uma empresa anuncia sua entrada na bolsa, ela está buscando acionistas, ou seja, pessoas que possam oferecer seus recursos em troca de participação na companhia. É comum as empresas buscarem a abertura de capital para pagar dívidas ou realizar planos de expansão.
Publicidade
“Ao comprar uma ação, o investidor compra um pedaço da empresa acreditando que ela vai se valorizar. E como ela se valoriza? Pelos seus resultados, que vêm de uma boa gestão, de boas ideias e geração de emprego. Comprar ação é uma forma de você ajudar na economia do País”, diz Alan Gandelman, CEO da Planner.
Atualmente, há mais de 350 companhias listadas na B3, de diversos setores, como turismo, siderurgia, construção civil, entre outros. E vale lembrar que esse ambiente é regulado, ou seja, diversas instituições atuam para dar segurança e transparência às operações, como o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e a Comissão de Valores Mobiliários (CVM).
Cresce a participação popular na bolsa
Gandelman reconhece que existem os casos de pessoas que compram e vendem ações, conseguindo lucros muito altos e rápidos na bolsa. Mas o gestor também lembra que cada vez mais tem aumentado a participação de pessoas físicas na bolsa brasileira. Em maio deste ano, a B3 tinha 2,48 milhões de investidores pessoa física, que, juntos, somavam um montante de mais de R$ 303 bilhões. A maior parte desses investidores é formada por jovens.
“Manter dinheiro parado ou em uma renda fixa já não é tão atrativo quanto era tempos atrás. Isso faz com que as pessoas procurem novos investimentos, e a bolsa passa a ser uma das grandes opções. Rejeito a frase de que ela é um investimento opaco.”
O educador financeiro e fundador da Academia do Dinheiro, Mauro Calil, defende que em países com alto Índice de Desenvolvimento Humano, o ambiente de bolsa também é avançado. “Na Alemanha, grandes empresas como Bayer, SAP, Merck, têm como controladores não um sócio, mas fundos de pensão, que pagam as aposentadorias com dividendos (recursos) que vêm através das ações negociadas em bolsas de valores”, diz.
Mercado primário depende do secundário
A crítica de Felipe Neto é mais direcionada aos investidores do mercado secundário, onde se ganha dinheiro com a compra e venda de ações de empresas que já estão na Bolsa. O mercado primário é formado pela negociação de novas ações que chegam à bolsa por meio de IPOs e follow on.
Publicidade
O professor e head de Educação do C6 Bank, Liao Yu Chieh, explica que o desconhecimento leva à essa falsa impressão de que esse tipo de negociação no mercado secundário não produziria nada para a sociedade.
“Sem o mercado de ações com liquidez (mercado secundário), dificilmente o investidor compraria uma ação no IPO de uma empresa, sabendo que nunca mais você poderá vendê-la. Aí não teria mais o mercado de capitais.”
Trocando em miúdos, um investidor compra a ação de outro que emprestou o seu dinheiro diretamente para a empresa. O professor explica que, se eliminado o mercado secundário (de ações que já existem), elimina-se por consequência o mercado primário, de ações novas.
“Se não tivesse investidor comprando no mercado secundário não existiria o mercado primário de ações. Não existiria o IPO de ações e, dessa forma, as empresas teriam uma fonte a menos de recurso para crescer, para poder investir, gerar emprego”, conclui.
Publicidade
Nossos editores indicam este conteúdo para você investir cada vez melhor:
30 cursos gratuitos de educação financeira para fazer na quarentena
Procurado pelo E-Investidor, Felipe Neto encaminhou, via assessoria de imprensa, estas respostas para a reportagem:
Você ainda concorda com a colocação? Se sim, por quê?
Não da maneira como falei. Aliás, é incrível como as pessoas cortam o trecho em que eu digo que “não entendo do assunto, sou amador” e em seguida afirmo que “é possível que mude de opinião sobre isso”. Eu continuo tendo ressalvas sobre viver de apenas operar na bolsa de valores. Tenho críticas não só ao que representa, mas a tudo que sabemos que ocorre nos bastidores. Torço para que não seja maioria. Contudo, mudei de ideia sim, porque fui estudar mais a respeito e entendi a principal função da bolsa de valores: viabilizar os IPOs. Sem a bolsa, não existiria IPO, então essa justificativa, pra mim, é suficiente.
Publicidade
Se mudou de ideia, como mencionou no vídeo essa possibilidade, ao que se deveu a mudança de opinião?
Pesquisei mais sobre o assunto, li mais e consultei amigos economistas, tanto de direita quanto de esquerda. O que percebi é que é quase unânime a opinião de que o mercado especulativo em si é, de fato, muito semelhante ao mercado de apostas e não chega a produzir algo para o mundo. Contudo, a justificativa de sua existência para a validação dos IPOs é extremamente válida.
Passou a investir na bolsa ou passaria a investir? Em que tipo ação?
Não é um mundo que eu conheça, então não tenho intenções de investir, hoje.
Em que contexto foi dada aquela fala?
Foi apenas respondendo uma fã, que perguntou se eu passava meus dias sentado olhando meu dinheiro se multiplicar na bolsa de valores. Nada demais, em absoluto. Algumas pessoas criam polêmicas com qualquer frase minha fora de contexto.