Se aposentar com mais de um salário mínimo no Brasil é para poucos. Segundo dados do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) cerca de 27,3 milhões de brasileiros recebem até um salário mínimo de aposentadoria, o equivalente a 69,5% dos 39,3 milhões de aposentados em 2024. Ou seja, apenas 30,5% dos aposentados no Brasil, ou 12 milhões de pessoas, ganham acima de R$ 1.412 em 2024.
Os anos avançados de vida geram mais despesa com convênio médico e até com passeios, a depender do estilo de vida de cada aposentado. Assim, como instrumento de planejamento da aposentadoria, o Tesouro Nacional lançou em fevereiro do ano passado o título Tesouro RendA+, que teve sua primeira semana de negociação em fevereiro de 2023.
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A proposta do título consiste em aportes até uma data pré-estabelecida, chamado período de acumulação ou capitalização. Atualmente existem títulos com vencimento em 2045, 2055 ou 2065. Tudo vai depender de quando o investidor planeja se aposentar. Também não há uma obrigatoriedade de investir no título todo mês.
Quando a data de vencimento chega, o investidor passa a receber mensalmente, por 20 anos, o montante gerado por esse investimento. “A conversão do período de capitalização para o período de recebimento de pagamentos é automática, garantindo que o investidor mantenha a rentabilidade contratada (inflação + taxa real contratada) ao longo dos 20 anos de recebimentos mensais, até o vencimento do título”, diz o Tesouro Direto, em nota enviada ao E-Investidor nesta terça-feira (27).
Esses fatores de facilidade de gestão e correção pela inflação são dois pontos que chamam a atenção dos analistas. Segundo Martin Iglesias, líder de investimentos e alocação de ativos do Itaú Unibanco, o RendA+ é muito bem desenhando para a pessoa física. “Todo o fluxo de caixa está claramente voltado para a aposentadoria da pessoa física. Com ele, o investidor consegue ter uma previsibilidade da renda que se irá receber no futuro, além de uma boa rentabilidade com um juros reais atuais, que estão por volta de 5% ao ano”, explica.
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Atualmente, o Tesouro RendA+ com o fim dos aportes e início de pagamento da aposentadoria previsto para 2065 está pagando IPCA + 5,83% ao ano. O título de 2055 remunera IPCA + 5,81% ao ano e o Tesouro RendA+ 2045 paga IPCA + 5,77% ao ano.
Quanto o investidor precisa aportar no Renda+?
O E-Investidor consultou tanto o Tesouro Nacional quanto os especialistas do mercado financeiro para saber o valor que um brasileiro teria que aportar para receber um salário mínimo por mês do título durante a aposentadoria.
De acordo com o Tesouro Nacional, para um jovem de 24 anos que planeja se aposentar aos 65 anos precisa comprar 0,17 título por mês (aproximadamente R$ 43,00 atualmente) para receber o equivalente a um salário-mínimo mensal a partir de 2065. Já um indivíduo 34 anos que planeja se aposentar aos 65 anos necessita comprar 0,22 título por mês (aproximadamente R$ 99,00) para receber o mínimo por mês a partir de 2055.
Para um cidadão de 44 anos que também planeja se aposentar aos 65 anos, é necessário comprar 0,32 título por mês (aproximadamente R$ 255,00 hoje) para receber o equivalente a um salário mínimo a partir de 2045, segundo o Tesouro Nacional.
Os valores do Tesouro Nacional estipulam um pedaço de título para cada caso que, no fim, vai remunerar o aposentado com o salário mínimo. Atualmente, um título custa entre R$ 253,12 e R$ 799,55, quanto maior o prazo de vencimento, mais barato é esse título, quanto menor o prazo, mais caro ele é.
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Por isso, o valor de cada título pode ficar mais caro ao longo dos anos. É possível que em 2050 o título que custa R$ 253,12 hoje possa valer R$ 800, ou seja, nesse exemplo a quantia mensal investida subiria de R$ 43 mensais em 2024 para R$ 136 por mês em 2050. Esse reajuste é para manter a compra de 0,17 títulos por mês. Vale lembrar que o valor de R$ 800 para cada título de 2065 no ano de 2050 é um mero exemplo da reportagem, visto que é impossível prever quanto cada título vai custar daqui a 26 anos.
Por isso, a simulação do Tesouro indica que o investidor deve focar na fração de título a ser comprada por mês para se aposentar. Seja ela a compra de 0,17 título por mês para o jovem de 24 anos que vai se aposentar em 2065 ou a compra de 0,32 título por mês para o cidadão de 44 anos que vai se aposentar em 2045.
Nessa simulação do Tesouro, a quantia mensal em reais a ser aportada tende a aumentar ao longo dos anos, sem saber qual será o teto. No entanto, um levantamento feito por Antônio Sanches, analista da Rico, mostra um valor preciso por mês que dispensa a necessidade de reajuste dos aportes para investir até o vencimento do ativo.
O motivo para essa diferença é que o valor inicial do aporte é muito maior que o estipulado pelo Tesouro, o que aumenta a rentabilidade inicial de uma forma mais rápida. Ele recomenda que para cada salário mínimo a ser recolhido a partir de 2065, o investidor deve aportar hoje R$ 176 por mês. No caso do RendA + de 2055, o ideal é colocar R$ 338 por mês no título. E para o título de 2045, é importante aportar R$ 709 mensalmente.
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Variação da rentabilidade do RendA+
Paulo Gala, economista-chefe do Banco Master, lembra que embora o investimento seja totalmente seguro, o investidor deve saber que o RendA+ é um título atrelado à inflação com uma taxa de juro real, o que faz com que esse ativo sofra marcação a mercado – veja aqui o que é. Ele lembra que no ano passado o RendA+ pagava 6,3% ao ano e hoje o título remunera entre 5,83% e 5,77% ao ano, ou seja, houve uma queda nos juros reais do título.
"Essa rentabilidade é um espelho do que está acontecendo no mercado de títulos públicos, em que vemos a taxa de juros cair e subir todos os dias. Agora, a visão do mercado é a de que a inflação vai cair junto com os juros, por isso que as taxas futuras estão cedendo", afirma Gala.
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Segundo o mais recente boletim Focus, o mercado espera que a taxa básica de juros da economia, a Selic, recue dos atuais 11,25% ao ano para encerrar 2024 em 9% ao ano. A inflação deve caminhar para 3,8% ao ano. Com isso, os juros reais podem ficar no patamar de 5,2% ao ano no fim de 2024, um número próximo dos 5,8% pagos atualmente pelo RendA+.
Porém, a expectativa do mercado é de um juro menor, de 8,5%, para 2025 com um inflação de 3,51% ao ano, o que pode gerar um juro real de 4,99%, um pouco menor que o estimado para 2024. Isso também deve puxar os títulos do Tesouro para baixo.
Segundo Gala, a grande questão do RendA+ passa a ser o longo prazo, visto que não é possível prever qual será o patamar dos juros nas próximas décadas. "A gente não consegue ter uma visão clara do que vai acontecer nos próximos 20 anos em relação a essas taxas de juros", detalha Gala. Ainda assim, ele lembra que essa flutuação não mexe com a rentabilidade do dinheiro já aportado no título.
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Se o investidor tem o título com vencimento em 2065 e fez um investimento de R$ 500 no ano passado com a rentabilidade acima de 6% e uma outra injeção de capital nesta semana de R$ 1 mil – com taxa atual ao redor de 5,8% –, ele receberá o juro relativo a cada período rendendo até o fim sem mudanças. "Os R$ 500 vão render acima dos 6% ao ano até o vencimento e os R$ 1 mil vão render os 5,83% até o vencimento", explica Gala.
Martin Iglesias, do Itaú, conta que se o investidor precisar resgatar o dinheiro antes do vencimento, ele pode até lucrar na venda do título. Isso pode acontecer caso tivesse adquirido o RendA+ com uma taxa de juro real acima da que seria praticada no mercado no momento da venda. "O momento atual é um bom exemplo, se o investidor comprou um título que estava pagando 6,3% ao ano e hoje ele paga menos, ela terá um lucro na hora de vender esse ativo", explica.
O inverso, no entanto, também acontece. Se o investidor comprasse um título com juros de 6% ao ano e meses depois o mercado tivesse precificado um juro real de 8% ao ano, a venda acarretaria em perda.
RendA+ é a melhor opção para planejar a aposentadoria?
De modo geral, os analistas comentam que o RendA+ se apresenta como a melhor opção para investidor pessoa física que não tem grande domínio do mundo dos investimentos. Na visão de Antônio Sanches, analista da Rico, o título consegue ser melhor que muitos fundos de previdência por não ter uma taxa de administração, que é de 0% se o investidor não resgatar o dinheiro e deixar o ativo pagar os salários de forma correta.
"Além da taxa 0%, ele vai oferecer mais previsibilidade de rentabilidade, já que há fundos de previdência que não apresentam crescimento linear de rentabilidade, como os atrelados ao crédito privado e aos fundos de ações", relata Sanches.
Por outro lado, ele explica que a tributação dos fundos de previdência Vida Gerador de Benefício Livre (VGBL) pode ser ligeiramente menor que a do RendA+. "O investidor vai ter uma alíquota de só 10% sobre o rendimento no VGBL, enquanto do título do Tesouro o imposto é de 15%. Então tem essa diferença, às vezes é importante o investidor colocar na ponta do lápis para calcular o que é realmente o ideal para ele", argumenta.
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Todavia, Paulo Gala, do Banco Master, afirma que mesmo com o fundo VGBL cobrando menos imposto o RendA+ tem vantagem pelo fato dele não pagar nenhuma taxa de administração. "O investidor até pode economizar esses 5% de imposto no final da aplicação, mas se ele for para um fundo de previdência vai ter que pagar uma taxa de administração anual para o gestor, que no acumulado de 20 ou 40 anos se torna um quantia muito maior que os 5% que seriam pagos de imposto", explica Gala.
Alocação de recursos para a aposentadoria
O economista do Banco Master recomenda o investidor leigo aportar 100% do seu dinheiro voltado para a aposentadoria no Tesouro RendA+. "Se o investidor tiver um perfil mais agressivo e entender mais do mundo das finanças, o recomendável é aportar 80% no Tesouro RendA+, 10% em ações que pagam dividendos e 10% em fundos de investimentos imobiliários (FIIs) com foco em renda", diz Gala.
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Iglesias, do Itaú, tem uma visão mais ousada. Na carteira para previdência, ele indica que 85% dos investimentos do perfil conservador devem ir para um título de juros pós-fixado atrelado ao Certificado de Depósito Interbancário (CDI), o principal parâmetro para medir os rendimentos nos investimentos. Ele indica também que apenas 5% da carteira deve ter exposição a títulos atrelados à inflação, caso do RendA+. Também recomenda o perfil conservador a aplicar 4% do montante em fundos de renda fixa e outros 6% em fundos multimercado.
Para o perfil moderado, ele indica aportar 58% em ativos pós-fixados, 8% em ativos prefixados, 13% em ativos atrelados à inflação, 4% do montante em fundos de renda fixa, 10% em fundos de multimercado e 7% do valor em ações. Para o perfil arrojado, Iglesias indica 21% do dinheiro em títulos pós-fixados, 15% no prefixado, 25% em títulos atrelados à inflação, 4% do montante em fundos de renda fixa, 21% em fundos de multimercado e 14% em ações que pagam bons dividendos.
Por fim, ele diz acreditar que para o investidor agressivo, o mais arriscado dos perfis do Itaú, o investidor deve ter apenas 1% em títulos pós-fixados, 21% em títulos prefixados, 3% do montante em fundos de renda fixa, 21% em fundos de multimercado e 19% em ações. "Eu acredito que o Tesouro RendA+ deve ser utilizado para cobrir gastos fixos do aposentando, como alimentação, saúde e moradia. O restante do dinheiro poderia vir de dividendos de ações ou fundos imobiliários. O ideal é montar uma boa carteira geradora de renda", conclui Iglesias.