- Pela regra CVM 497, de 2011, os agentes autônomos de investimento só podem distribuir valores mobiliários, como ações e títulos de dívida, de uma única corretora
- O fim dessa exclusividade é uma pauta antiga da categoria, já que a situação representa tanto um entrave para o crescimento dos agentes, como uma limitação à oferta de produtos aos clientes
- Na visão da CVM, a multivinculação teria que ser decidida em comum acordo entre todas as partes envolvidas
Imagine que você é dono de um mercado, mas só pode vender produtos de um único fornecedor, não importa se existam mercadorias melhores: esta é a realidade dos agentes autônomos de investimentos, também conhecidos como assessores de investimentos. Pela regra CVM 497, de 2011, esses profissionais só podem distribuir valores mobiliários, como ações e títulos de dívida, de uma única corretora.
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O fim dessa exclusividade é uma pauta antiga da categoria, já que a situação representa não só um entrave para o crescimento dos próprios agentes autônomos, como tende a afetar o cliente final, com a restrição dos produtos disponíveis. “O discurso de vendas dos AAIs acaba sendo enfraquecido”, explica Alfredo Sequeira Filho, do grupo AAIs Livres. “Afinal, qual a diferença entre um agente autônomo, que trabalha com uma única corretora, e um gerente de banco, que trabalha só em uma instituição?”, questiona.
A limitação é, ainda, uma fonte de insegurança para os profissionais. “Reduz muito o poder de barganha dos assessores de investimento junto às corretoras”, diz Sequeira Filho. “Hoje, se uma corretora quiser desligar o agente autônomo do dia para noite, ela pode fazer isso, e o agente vai ter que começar a vida dele do zero”.
Com nova recomendação, exclusividade pode até crescer
De olho nessas demandas, a Assessoria de Análise Econômica e Gestão de Riscos (ASA) da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), divulgou na última segunda-feira (23) um estudo em que recomenda o fim da exclusividade dos AAIs. Entretanto, na visão da CVM, a multivinculação teria que ser decidida em comum acordo entre todas as partes envolvidas – o que significa que, sem o aval das corretoras, os AAIs continuariam a ser ‘exclusivos’.
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O relatório também gerou dúvidas sobre os escritórios que atuam com a distribuição de cotas de fundos, produto sobre o qual não há imposição de exclusividade. Existe a preocupação de as cotas de fundos também passarem a precisar da cooperação das instituições, caso seja seguida essa nova recomendação.
“Na prática, isso pode representar até um aumento de exclusividade, não a queda. E o agente autônomo ainda pode ser punido internamente por ter a vontade de trabalhar com outros players”, explica João Guilherme Penteado, CEO da Apollo Investimentos, primeiro escritório vinculado ao Safra. “Isso abriu uma brecha que pode ser muito negativa no mercado”.
Segundo Penteado, esse modelo de cooperação só vai deixar os agentes autônomos presos à primeira corretora em que estabelecerem contrato. “Ficou ambíguo o modelo da CVM, porque cria reservas de mercado”, diz Penteado. “Por exemplo, se a corretora 1 negar cooperação, o AAI vai ter que encerrar o vínculo caso queira migrar para a corretora 2, ou desistir da migração”.
Essa também é a visão de Juliano Custódio, da EQI Investimentos, escritório que recentemente migrou da XP Investimentos para o BTG Pactual e está em processo de se tornar uma corretora de valores.
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“Estamos nas duas peles ao mesmo tempo, pois somos escritório de AAI em busca de nos tornarmos uma corretora”, explica Custódio. “Isso é até um pequeno passo em direção à liberdade, mas não é a própria liberdade. A CVM teve uma boa iniciativa, ficamos felizes, mas eu acho que essa parte merece revisão.”
Para Filipe Portella, sócio-fundador da Monte Bravo Investimentos, escritório parte do G20 da XP, a decisão sobre cooperação com o multivínculo não pode estar na mão das corretoras. “Esse é um papel de CVM. Se for o caso, o regulador que crie níveis de agentes autônomos, que podem ou não ser exclusivos”, diz.
Agente autônomo é elo mais fraco
Com o caminho ainda incerto sobre a exclusividade, os agentes autônomos seguem na ponta mais fraca da relação. De acordo com Penteado, até mesmo os escritórios que tentam trabalhar com distribuição de cotas de fundos de outros players – modelo liberado hoje – acabam sofrendo retaliação por parte das corretoras.
“Em algumas casas, isto é visto como falta de ‘engajamento’ no modelo da corretora, que começa a cortar oportunidades para aquele escritório. O mercado acaba sendo um pouco sujo nesse sentido”, disse o CEO da Apollo Investimentos. “E o parecer da CVM parece colocar a corretora como o elo fraco do modelo, e não o AAI.”
Em comunicado, a CVM afirmou que os AAIs que fazem distribuição de fundos não são afetados pela nova recomendação. “Hoje eles não têm que ter concordância dos dois ou mais intermediários para se mulvincularem. Isso continua o mesmo, a não ser que o Colegiado da CVM resolva interferir nessa questão que, se fosse o caso, se daria no âmbito da Audiência Pública.”
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