- Das seis construtoras e incorporadoras que realizaram oferta inicial de ações (IPO, na sigla em inglês) em 2020, cinco têm queda no preço do papel
- Para analistas do mercado, apesar de não ter sido o mais afetado pela pandemia, o setor imobiliário ainda sofre com o cenário macroeconômico, marcado pelas incertezas da crise global
- Apenas os papéis da Cury têm alta de 8,45% desde a entrada no mercado de capitais até o pregão desta terça-feira (22)
Estrear na B3 não foi uma decisão muito acertada para o setor da construção civil em 2020, ao menos do ponto de vista de performance das ações. Das seis construtoras e incorporadoras que realizaram oferta inicial de ações (IPO, na sigla em inglês), cinco têm queda no preço do papel desde então. Para analistas do mercado, apesar de não ter sido o mais afetado pela pandemia, o setor imobiliário ainda sofre com o cenário macroeconômico, marcado pelas incertezas da crise global.
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Mitre (MTRE3), Moura Dubeux (MDNE3), Lavvi (LAVV3), Plano & Plano (PLPL3), Cury (CURY3) e Melnik (MELK3) foram as companhias que estrearam neste ano na B3. Dessas, apenas os papéis da Cury têm alta de 8,45% desde a entrada no mercado de capitais até o pregão desta terça-feira (22).
A Moura Dubeux tem a queda mais profunda entre as novatas: 41,05%. O papel MDNE3 foi precificado em R$ 19 no IPO, em 12 de fevereiro, e nesta terça (22) fechou negociado a R$ 11,20. A construtora conseguiu capitalizar R$ 1,250 bilhão na oferta, com a ação precificada no meio da faixa indicativa, que ia de R$ 17 a R$ 21.
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Com a segunda queda mais expressiva, a Mitre acumula perda de 22,28% desde o IPO, em 4 de fevereiro, quando a ação MTRE3 foi precificada em R$ 19,30, no topo da faixa indicativa. No pregão desta terça (22), o papel fechou cotado em R$ 15,00.
“A pandemia pegou muitas empresas de calça curta”, diz Ricardo Vasconcellos, líder de mercado de capitais da Easynvest. “Elas estavam planejando uma expansão considerável, veio a crise e não teve jeito”. Segundo o especialista, o cenário macroeconômico não está favorável para o setor.
Na sequência de perdas acumuladas, aparecem Plano & Plano, Melnik e Lavvi, com queda de 15,43%, 10,82% e 3,16%, respectivamente. No caso destas, cujas ofertas ocorreram em setembro, Matheus Jaconeli, economista da Nova Futura Investimentos, chama a atenção para o segmento de atuação.
“Elas estão mais relacionadas a um público de baixa renda. Quando você tem a queda no preço dos imóveis, no momento de crise, quem começa a comprar são agentes que têm caixa, geralmente pessoas com um poder aquisitivo um pouco maior”, observa Jaconeli.
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Porém, Moura Dubeux e Mitre, que por esta lógica poderiam se beneficiar, possuem concorrentes vistos como de maior peso no setor: Cyrela e EZ Tech, que têm mais liquidez. Vasconcellos, da Easy, também observa que, por conta da crise, essas companhias acabaram tomando atitudes mais conservadoras, como a interrupção de lançamentos.
“Em vez de lançar e correr o risco de não ter sucesso, cancelaram os lançamentos e focaram na vazão do estoque. Ou seja, em aumentar o caixa, liberar estoque e conseguir passar bem por esse momento turbulento”, diz o líder de mercado de capitais da Easynvest.
No caso da Moura, Vasconcellos observa que mais de 80% do valor captado no IPO foi usado para amortização de dívidas, o que nem sempre é bem visto pelos investidores.
“O mercado não gosta desse movimento de só quitar dívida. Os investidores observam onde a empresa vai investir, se fará lançamentos. E os bancos com os quais tinham dívida eram os mesmos que estavam coordenando a oferta. Então, o mercado não leu muito bem”, acrescenta.
Pedágio na bolsa
Com tanta empresa chegando à B3 em um período de alta volatilidade, Mario Mariante, analista-chefe da Planner Investimentos, entende que essas companhias têm um custo a pagar para disputar o mercado.
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“Como há um excesso de ofertas em um momento em que a Bolsa está oscilando bastante, é natural que alguns papéis, não só os das construtoras novatas, paguem um ‘pedágio’”, diz Mariante.
Para ele, os preços das ações foram colocados com múltiplos altos e, por isso, estão sendo descontados. “Se uma empresa nova chega com múltiplos elevados, com bastante concorrência, o mercado tende a descontar esses papéis. Várias delas saíram abaixo da faixa mínima estabelecida nos prospectos, porque o mercado percebeu que não dava para pagar os preços previstos”, afirma Mariante.
De fato, entre os papéis estreantes, apenas a Mitre teve a precificação acima do topo da faixa indicativa, e a Moura Dubeux ficou no meio da faixa. A Melnik teve ação precificada no piso da faixa indicativa, a R$ 8,50 – o topo era R$ 12,50.
As demais tiveram o preço abaixo do piso. A ação da Lavvi saiu a R$ 9,50 na oferta, quando a faixa indicativa era de R$ 11 a R$ 14,50.
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A Plano & Plano teve o papel precificado em R$ 9,40, abaixo do piso da faixa indicativa, que começava em R$ 11,75 e ia até R$ 15,25. Já a ação da Cury saiu no IPO custando R$ 9,35. A faixa indicativa ia de R$ 11 a R$ 14,30 por ação.
Os analistas também observam que o boom de incorporadoras é o primeiro em anos desde a onda de construtoras na Bolsa, entre 2005 e 2009. Porém, o saldo daqueles tempos foi trágico, com muitas empresas diminuindo de tamanho e algumas chegando a desaparecer. Vale lembrar que entre 2007 e 2008 o mundo sofreu com uma crise iniciada no setor imobiliário norte-americano.
Esperança em 2021
Os analistas avaliam que em 2021, com uma possível recuperação da economia, o setor possa retomar o ritmo de crescimento, com oportunidades para algumas ações. “Elas terão seu momento mais à frente. As perspectivas são positivas”, diz Mariante.
Para Vasconcellos, as próximas empresas do setor a se aventurarem na Bolsa podem aprender com os erros deste ano. Ele acredita que, se a expectativa de IPOs no setor imobiliário se confirmar, as companhias devem evitar direcionar os recursos apenas para quitar dívida.
“Vamos ver o ciclo virtuoso do mercado imobiliário. Nada de excepcional, como em outros anos, mas numa tendência mais consistente de crescimento e, com isso, novos IPOs”, afirma.
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