- Foi no primeiro dia após o Carnaval do ano passado que a Bolsa brasileira começou a sentir os efeitos da pandemia do coronavírus
- O Ibovespa despencou, assim como outras classes de ativos, como os fundos imobiliários. A renda fixa também sofreu com os cortes na Selic.
- Agora, um Carnaval depois, as perspectivas para os investimentos se atualizam. Especialistas enxergam oportunidades na Bolsa, renda fixa atrelada à inflação e prefixados, e nos fundos imobiliários
Há quem diga que no Brasil as coisas só acontecem após o carnaval. De fato, os primeiros efeitos da pandemia do coronavírus na bolsa brasileira só foram sentidos no primeiro pregão após o feriado, em 26 de fevereiro de 2020. Naquela data, o Ibovespa, principal índice de ações da B3, caiu 7% e deu o pontapé inicial para a sequência de baixas que faria o indicador fechar o mês seguinte com uma queda histórica de 29,9%, aos 73.019,80 pontos.
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E não foi só o Ibov que teve seu desempenho afetado. A maior crise sanitária da história recente da humanidade puxou para baixo a performance dos fundos imobiliários e até da renda fixa pós-fixada, que sofreu com os cortes na Selic, taxa básica de juros da economia, atualmente em 2%. As exceções foram as moedas fortes e os metais, que dispararam mais de 30% com os investidores buscando maior proteção em meio a um cenário de tanta incerteza.
Hoje, no Carnaval de um ano depois, muitos indicadores conseguiram se recuperar do tombo. O Ibovespa é um deles, com alta de 5,06% no acumulado dos últimos 12 meses. Euro, ouro e dólar também não perderam a majestade e continuaram com retornos expressivos no período, de 36,84%, 32,41% e 22,52%, respectivamente, segundo dados da Economatica. Na ponta negativa está apenas o IFIX, índice referente ao desempenho dos fundos mobiliários, que segue em queda de 3,99%.
Classe de Ativos | Retorno entre 21/02/2020 a 12/02/2021 |
Euro/Real | 36,84% |
Ouro | 32,41% |
Dólar Ptax Venda | 22,52% |
Ibovespa | 5,06% |
IMA-B | 4,46% |
IRF-M | 4,02% |
CDI | 2,34% |
IFIX | -3,99% |
*Retorno do CDI considera o fechamento de 11/02 |
Com o início ‘extraoficial’ do ano de 2021 após este feriado carnavalesco diferente (a Bolsa só volta na quarta-feira, às 13 horas), os investidores têm de ficar atentos, já que o cenário para as diversas classes de ativos pode mudar. Aliás, balancear o risco é uma das grandes lições de investimentos que a crise do coronavírus deixou.
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“A experiência recente com o coronavírus nos leva a dar mais importância à administração de risco do que a busca por rentabilidade, até porque esses ‘cisnes negros’ estão voando por aí . Temos que estar preparados para esses riscos inimagináveis, mas que podem acontecer”, afirma Luiz Fernando Carvalho, estrategista da Ativa Investimentos. “Esse é o grande aprendizado, para quem não tinha.”
Veja as perspectivas para cada categoria de investimentos.
Moedas e Metais
Crises econômicas sempre motivam uma migração em massa de investidores atrás de moedas fortes ou metais. O dólar, por exemplo, chegou a bater os R$ 5,99 em 8 de maio de 2020, em uma valorização de 49,7% em relação a cotação em 1º de janeiro daquele ano, de R$ 4. Já euro chegou ao pico de R$ 6,78 em outubro – nove meses antes, o patamar era de R$ 4,50.
De acordo com Leonardo Milane, sócio e economista da VLG, o objetivo é buscar proteção em economias que, provavelmente, se recuperarão mais rápido da crise. Além disso, outras questões fizeram com que o real se tornasse a moeda que mais se depreciou em 2020.
“Tiveram uma série de fatores: o externo, com o euro e o dólar ganhando valor em relação às moedas de países emergentes, e o interno, já que a situação fiscal do Brasil é mais crítica do que outros emergentes, o que fez com que o real sofresse mais”, explica Leonardo Milane, sócio e economista da VLG.
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Em relação aos metais, o ouro, como era de se esperar, também foi um dos protagonistas durante a crise. Considerado ‘reserva de valor’, ou seja, pouco sujeito à desvalorização já que é um recurso escasso, a pedra dourada foi amplamente buscada por investidores que queriam preservar o poder de compra.
“As moedas podem se apreciar ou depreciar conforme as emissões, mas 01 grama de ouro sempre será 01 grama de ouro”, avalia Carvalho. Segundo o estrategista da Ativa, a demanda pelo ouro e até por outros metais, como a prata, deve continuar durante os próximos meses. “Ouro e prata não rendem nada, mas são reservas de valor que superam qualquer crise. Em toda a história da humanidade, você vê quem preservou fortunas, conseguiu isso com ativos reais, como os metais. Acredito que pode continuar se valorizando.”
Apesar do salto em 2020, a valorização das moedas em 2021 vai depender principalmente do cenário político no Brasil. “Se no âmbito político as reformas estruturais não forem endereçadas, o mercado vai entender que a questão está sem solução e o real pode se depreciar ainda mais”, afirma Milane.
Bolsa de valores
Apesar de ter sofrido durante o ano passado com o coronavírus se espalhando pelo mundo, o Ibovespa conseguiu superar os impactos da pandemia e já está na casa dos 120 mil pontos – nível em que estava no início de 2020. Mas o investidor ainda precisa ter cautela.
“A Bolsa é reflexo da economia real. Se a economia real está indo bem, as empresas estão faturando bastante, gerando lucro e pagando mais dividendos. Isso atrai o investidor a aplicar na B3, assim como a dinâmica do juro baixo e do ambiente externo, com o PIB global”, diz Milane. “O PIB global aparentemente continua em recuperação, o juro baixo deve permanecer por um tempo, a grande pegunta é o cenário doméstico, economia real.”
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Para o especialista, o fator doméstico será a grande âncora para a B3. “O Natal não foi maravilhoso e em janeiro e fevereiro, segundo o presidente do Banco Central, a economia desacelerou. Nesse sentido não teria motivo para a Bolsa continuar explodindo. Lembrando que o Ibovespa é muito contaminado por empresas ligadas a commodities, que pesam muito no índice e estão indo bem. Se você pega shoppings, bancos e varejo, a história é bem diferente.”
Na opinião de Gustavo Bertotti, head de renda variável da Messem Investimentos, a Bolsa ainda está recheada de oportunidades. “Há muitas empresas abrindo capital, companhias desvalorizadas e ativos que ainda não se recuperaram. Na minha visão, tem muita coisa para crescer”, explica.
Renda fixa
Um dos motores para a Bolsa chegar aos 3,2 milhões de CPFs foram os cortes na taxa Selic, que permanece em 2% ao ano, na mínima histórica, desde agosto de 2020. Dessa forma, a renda fixa indexada à Selic, como o Tesouro Selic, teve a rentabilidade drasticamente reduzida. Para a poupança, que só rende 70% da taxa básica, os cortes foram a última pá de cal na aplicação – e o nível baixo dos juros deve continuar nesse ano.
“Com a retomada gradual da economia, as empresas devem recompor suas margens [elevar os preços], para reconquistar a saúde financeira dos negócios, capital de giro e o caixa básico. Então espera-se uma pressão inflacionária, mas que não deve ser seguida de um aumento de juros, para sustentar a recuperação”, afirma Carvalho.
De acordo com o Relatório Focus do Banco Central, a Selic deve terminar 2021 em 3,5% – mas isso não significa que a renda fixa esteja enterrada. Títulos atrelados justamente à inflação e a prefixados mais longos podem entregar bons resultados.
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“A renda fixa que rende 2% é a pós-fixada com liquidez, mas existem os títulos prefixados mais longos que pagam entre 9% a 10% ao ano, e tem os títulos que pagam Inflação+4,5%, basta o investidor se habituar ao que já realidade nos países desenvolvidos”, afirma Milane. “Para ter retornos mais altos na renda fixa, o investidor terá que abdicar da liquidez.”
Fundos Imobiliários
Em um levantamento feito pela Economatica, o IFIX aparece como o único indicador que continua no vermelho, – 3,99. Com ativos ligados à economia real, muitos fundos imobiliários sofreram baixas em 2020, em decorrência, principalmente, da redução da receita vindo dos aluguéis e venda dos imóveis. O investimento, entretanto, é unanimidade entre os especialistas.
“Pode ser o momento de compra ou de aumentar a posição, uma vez que tem muito fundo imobiliário com ativos muito bons. Talvez nem faça sentido eles ainda estarem desvalorizados, porque o imóvel está lá e se está bem conservado e localizado, com bons inquilinos, não tem razão ele valer menos do que antes de crise”, afirma Milane.
Para Carvalho, o setor imobiliário é um mercado-chave no mundo desenvolvido. “A rentabilidade está interessante nessa época de inflação e ainda pode subir. Eles ficam mais protegidos, porque muitas vezes os alugueis são reajustados pelo IPCA. Além disso, esses são ativos reais: prédios, fazendas, galpões e etc”, diz o especialista. “Acredito que esse mercado tem um bom futuro no Brasil.”