- O bitcoin registrou um salto de 29,5% desde o dia 10 de março, quando o Silicon Valley Bank (SVB) faliu, até a última terça-feira (21)
- Depois do SVB, algumas outras instituições financeiras também embarcaram em direção à quebra. Foi o caso do Signature Bank, também americano, e do gigante Credit Suisse, que entrou em colapso na semana passada
- Ainda assim, especialistas divergem sobre o bitcoin realmente ser uma alternativa à atual crise bancária, ou seja, um ativo de proteção como o ouro
O herói dos quadrinhos Superman foi criado em 1938 durante a Grande Depressão, uma grave crise financeira que provocou a quebra da Bolsa de Valores dos Estados Unidos e persistiu de 1929 ao final dos anos 1930. Rapidamente, o personagem ganhou popularidade e gerou identificação entre os norte-americanos, que necessitavam de “força” e “esperança” em meio à recessão.
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E no contexto de crise internacional e descrença no sistema financeiro tradicional em meados de 2008, nasceu o bitcoin (BTC). À época, o mundo lidava com as consequências da Crise do Subprime – o estouro de uma bolha imobiliária nos EUA que levou à derrocada do mercado financeiro em nível global.
O sistema descentralizado (ou seja, sem um banco central conduzindo a política monetária) do bitcoin aparecia como uma alternativa às crises financeiras. Além disso, a criptomoeda já nasceu com a previsão de um volume limitado em 21 milhões, diferentemente das moedas tradicionais, cujos bancos centrais podem expandir a base monetária e causar inflação. Na prática, o sobe e desce no preço do bitcoin é determinado puramente por uma equação de oferta e demanda no mercado.
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Nesta toada, há uma tese ventilada pelo mercado de que o bitcoin pode servir como refúgio em tempos de crise. O ativo digital saltou 29,5% entre 10 de março até a última terça-feira (21), aos US$ 28,1 mil (R$ 147,9 mil, na conversão atual). O recorte de tempo não foi escolhido aleatoriamente: a segunda sexta feira do mês de março marcou a falência do Silicon Valley Bank (SVB), banco de startups de tecnologia do Vale do Silício e 16ª maior instituição financeira dos EUA.
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Depois do SVB, algumas outras instituições financeiras também tiveram o mesmo destino ou entraram em crise. Foi o caso do Signature Bank, também norte-americano, e do gigante Credit Suisse, que entrou em colapso na semana passada e foi socorrido às pressas pelas autoridades suíças por meio de uma aquisição “imposta” ao banco UBS. O ambiente de juros e inflação altos, aliado a uma possível má gestão, são os propulsores para as falências.
Ainda tendo os fundamentos como álibi para a alta recente do bitcoin, especialistas divergem sobre a maior criptomoeda em valor de mercado realmente ser uma alternativa à atual crise bancária, ou seja, um ativo de proteção como o ouro.
Bitcoin x crise bancária de 2023
A tese de que o bitcoin seria uma reserva de valor como o ouro ou o dólar começou a ser questionada no ano passado, quando o “inverno cripto” começou. O BTC terminou 2022 no campo negativo (-66,43%, segundo dados levantados pelo Trademap), assim como as Bolsas americanas Dow Jones (-8,93%) e Nasdaq (-33,41%) e o índice S&P 500 (-19,65%).
Para Vinicius Bazan, head de Criptoativos da Empiricus Research, o bitcoin é uma espécie de ouro digital, já que não sofre impactos das políticas monetárias praticadas pelos governos.
Com a atual crise bancária, a tese do bitcoin como principal alternativa ao sistema financeiro sai fortalecida – pelo menos na visão de Bazan. Prova disso é o BTC ter se valorizado muito mais do que outras criptomoedas após a falência do SVB. “Isso mostra que o mercado quer comprar bitcoin, não outras moedas”, diz o especialista.
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Além disso, a injeção de liquidez promovida pelos bancos centrais para salvar as instituições financeiras em colapso joga a favor de todos os ativos de risco, inclusive o bitcoin. “É uma oportunidade de compra. Não acho que essa recuperação recente seja apenas fogo de palha”, diz Bazan, que recomenda a alocação de até 5% da carteira em criptos.
Essa também é a visão de Alexandre Ludolf, diretor de investimentos da QR Asset. Ele acredita que as instituições tradicionais ainda possuem um longo caminho até a recuperação. Ludolf ainda pontua que as injeções de liquidez feitas pelos bancos centrais mundiais resultarão em endividamento dos países e inflação, aos moldes do que ocorreu na Crise do Subprime.
“Vemos um setor financeiro frágil e economias ainda machucadas no cenário pós-pandemia. Paralelamente, observamos a diminuição da correlação do bitcoin com as classes de ativos tradicionais (BTC sobe, enquanto as bolsas de valores estão em queda), o que sugere que ter um pouco de bitcoin na carteira faz muito mais sentido do que não ter”, diz.
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Por outro lado, há quem desconfie que essa guinada do BTC pode indicar mais especulação do que concretude. Isac Costa, professor de pós-graduação em Direito do IBMEC, afirma que faltam elementos para que a tese do bitcoin como reserva de valor seja chancelada.
“O ouro tem sido testado há anos como reserva de valor. A volatilidade do bitcoin e sua curta vida fazem com que os economistas discordem da tese de investimento como proteção contra efemérides financeiras”, diz Costa. “Não é possível prever a racionalidade ou não do mercado, então não dá pra saber o quanto de gás essa alta do bitcoin ainda terá.”
Costa ressalta que o investidor só deve colocar no mercado cripto a quantia que aceita perder na totalidade. “É um mercado que ainda tem muito a provar sobre sua capacidade de financiar empresas e projetos. Por ora, ainda é dominado por ondas especulativas que o aproximam de um mercado de apostas, infelizmente”, diz o professor do IBMEC. “Quem está de fora, tem medo de perder a festa. Quem está dentro, pode perder o controle da percepção de risco e deixar os ganhos na mesa se o mercado virar.”
Halving à vista
Se o bitcoin como ativo de proteção contra crises bancárias ainda suscita dúvidas, a aproximação do halving traz um horizonte mais certeiro a respeito da cripto. Este é um dos eventos mais importantes do universo cripto e acontece de quatro em quatro anos. O próximo está previsto para o ano que vem.
Em resumo, a quantidade de BTC que remunera os mineradores (agentes que registram e validam as transações na rede, já que o sistema das criptomoedas não contam com um controle central) cai pela metade no halving. Este é um mecanismo que visa manter a ideia de que a criptomoeda possui oferta limitada. Geralmente, os preços do ativo digital começam a subir antes do evento acontecer e continuam em ascensão meses depois.
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“A adoção das criptos está muito forte, com a capacidade de processamento da rede em níveis historicamente altos”, afirma Ludolf. “Todos esses fatores são indicadores antecedentes significativos para aumento de preço. Portanto, acredito que temos um cenário favorável para a alta nos próximos meses e anos.”
De acordo com Bazan, o bitcoin começa a deixar para trás o bear market (mercado de baixa) que se instalou no ano passado e se prepara para entrar em um bull market (mercado de alta). “A cripto deve se valorizar tanto num cenário de crise, como agora, quanto em um cenário de melhora econômica nos próximos anos.” Enquanto isso, o mercado aguarda as confirmações.