Educação Financeira

“Perdi R$ 1 milhão no day trade”. Conheça a história de Alex Martins

O investidor perdeu tudo durante um evento que ficou conhecido como Flash Crash, em 2010

“Perdi R$ 1 milhão no day trade”. Conheça a história de Alex Martins
(FOTO:mstandret)
  • Segundo um estudo feito pela FGV, 97% das pessoas que fazem day trade perdem dinheiro
  • Estima-se que o mercado de ações dos EUA tenha perdido US$ 1 trilhão no Flash Crash, evento que quebrou Alex Martins
  • Engana-se, porém, quem pensa que Martins parou com o day trade por conta do R$ 1 milhão perdido. Veja os detalhes da história do investidor

Ter R$ 1 milhão na conta bancária é a meta de muitos investidores. Mas já imaginou perder tudo o que construiu ao longo de anos de uma hora para outra? Essa é a história de Alex Martins, analista CNPI da Fenix Traders, que em vez de compartilhar apenas os ganhos, contou a história sobre como perdeu todo o dinheiro para os seus seguidores no Twitter.

O relato de Martins não é isolado. Um estudo feito pela FGV, encomendado pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), analisou os dados de 19,6 mil investidores que começaram a operar com day trade ,entre 2012 e 2017, e constatou que 97% das pessoas que especularam na bolsa perderam dinheiro. Os que conseguiram algum resultado, levantaram menos de R$ 300 reais por dia.

Outro ponto interessante é que o número de traders aumentou de 8 mil, em 2017, para 30 mil, em 2019. Desses, 92,1% abandonaram o barco em menos de um ano. Entre os que continuaram operando diariamente por mais de 300 pregões, 97% perderam dinheiro. Os 3% que conseguiram fechar no azul tiveram lucro inferior a R$ 300 por dia, o equivalente a R$ 6 mil reais no mês.

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“Tirando o dinheiro, uma das coisas em que o day trade mais me prejudicou foi o fato de me tornar muito imediatista. A prática do day trade tem essa característica por conta da facilidade de ver o dinheiro na conta, aspectos que tanto o swing trade como position trade não têm”, diz Martins

O E-Investidor conversou com Alex Martins para ouvir as lições que ele tirou do episódio.

A História

Martins conta que começou a operar no mercado financeiro nos anos 2000. “Não tinha muita opção além do day trade. As margens de garantia cobradas pelas corretoras eram muito altas. Até hoje são”, diz. Ao fazer day trade, o valor pago para operar no dia é muito menor do que se você passar a sua posição de um dia para o outro.

“A visão que eu tinha era que se um dia acontecesse algum fenômeno desse tipo, eu estaria na ponta vencedora

“Tem corretora que te cobra R$ 60 por lote de minicontrato, só que se você dormir com a posição de um dia para ou outro, isso vira R$ 5 mil”, explica. Naquela época, lembra o analista, não existiam os sistemas de zeragem automática, instrumentos que liquidam a sua posição quando o investidor está perto de zerar a conta.

Um dos fatores que levaram Martins a começar no day trade, além do acesso ser facilitado pelas corretoras com um custo mais baixo, foi o imediatismo. “O minidólar e o mini-índice têm aquele sentimento de resultado financeiro muito mais rápido”, diz.

O dia D

O ano era 2010. Martins operava os contratos de minidólar e mini-índice, como normalmente fazia. O que ele não poderia prever é que o 6 de maio de 2010 entraria para a história como o dia do Flash Crash.

Leia também: Day traders jogam com ações da GameStop, que alcança recorde

Um erro cometido por um operador desencadeou uma movimentação brusca no mercado norte-americano. Estima-se que o mercado de ações dos EUA perdeu US$ 1 trilhão e rapidamente se recuperou. “Como foi um erro interno, a notícia não vazou para o mercado. Quem estava de fora começou a especular o que podia ser. Eu, inclusive, cogitei a hipótese de ser um atentado terrorista”, diz.

O investidor explica que o fato de não saber o que tinha acontecido e a movimentação dos HFT (High Frequency Trading), robôs de Negociação de Alta Frequência, criaram um efeito manada sem fim.

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“O dólar subiu 6% no dia. Não que eu achasse que isso nunca poderia acontecer, mas eu não imaginava que o erro de um único operador pudesse desencadear um efeito negativo para tantos investidores. A visão que eu tinha era que se um dia acontecesse algum fenômeno desse tipo, eu estaria na ponta vencedora”, diz Martins.

Não demorou muito até as autoridades descobrirem o responsável: Navinder Sarao, um operador autodidata que causou tudo isso dentro do seu quarto em Londres, no Reino Unido.

Sarao fez uma pequena fortuna lançando ordens milionárias e fazendo cancelamentos rapidamente por meio de softwares de investimentos. Seu objetivo era enganar os robôs de Negociação de Alta Frequência, criando uma demanda artificial inexistente.

Por conta de seus crimes, Sarao foi preso na casa de seus pais, em Londres. Apesar da condenação, não se sabe ao certo quanto as negociações do operador contribuíram para o Flash Crash de 2010.

Lições que custaram R$ 1 milhão

“Vejo muitas pessoas que ficam viciadas. Day trade não quer dizer que eu tenho que operar todo dia, mas sim que eu comprei hoje e vou vender hoje. Não é preciso fazer isso diariamente. Há ciclos em que o mercado fica mais difícil

Assim como muitas pessoas, o trader aproveitou o momento para refletir e aprender várias lições. Hoje, além de investidor, Martins é educador e analista de investimentos CNPI.

Dentre as lições aprendidas pela bagatela de R$ 1 milhão, o destaque é um clássico: o mercado é sempre soberano. “Nem sempre aquilo que você acha que pode acontecer é o que realmente acontece”, diz.

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Como investidor, Martins aprendeu que, para quem não tem conhecimento do ativo que está operando, as probabilidades de errar mais e acertar menos são maiores.

“Tirando o dinheiro, uma das coisas em que o day trade mais me prejudicou foi o fato de me tornar muito imediatista. A prática tem essa característica por conta da facilidade de ver o dinheiro na conta, aspectos que não vemos no swing trade e position trade”, afirma.

Na visão de Martins, o maior problema do imediatismo é que ele transparece para outros aspectos da vida pessoal do indivíduo. “Você quer chegar em casa e deseja que o jantar esteja na mesa logo. Quando você sai com a família, quer que todos se aprontem rápido. Tudo isso começa a ficar enraizado em você”, diz.

Outro ponto levantado pelo analista é o fato de nunca se desligar do trabalho, perdendo importantes momentos de descanso e lazer com amigos e familiares. Antigamente, só era possível acompanhar as oscilações do mercado pelo celular. Nos dias atuais, você pode operar como se estivesse em frente ao computador de qualquer lugar do mundo.

“É muito mais fácil ficar trabalhando mesmo estando longe, como por exemplo, em uma viagem com a família. Quando você está em um momento de lazer, faz uma operação e dá certo, é o melhor dos mundos. Mas, quando dá errado, muda todo o ambiente. Todos ao seu redor percebem, o que acaba com os almoços de família”, diz Martins.

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Engana-se, porém, quem pensa que Martins parou com o day trade por conta do R$ 1 milhão perdido. O que o levou a abandonar o barco foi o fato de ter observado uma demanda latente em suas redes sociais perguntando se ministrava algum curso ou ensinava as pessoas de alguma forma. “No começo eu não tinha interesse, até que se tornou uma crescente surreal. Eu sempre tive vontade de ser educador e dei muitas palestras, então resolvi absorver essa demanda e montar uma turma”, conta.

Vai encarar?

“Não é todo mundo que terá a predisposição de aguentar o risco que esses ativos oferecem

Para quem deseja surfar na onda do day trade, Martins oferece uma série de dicas. A primeira delas é que existem diversos tipos de ativos que podem ser operados na modalidade, como, por exemplo, ações e opções, além dos derivativos, como minidólar e mini-índice. Os dois últimos são os mais complicados . “Não é todo mundo que terá a predisposição de aguentar o risco que esses ativos oferecem”, diz.

Segundo o analista, é melhor começar com ativos que têm uma volatilidade menor e que, em termos de educação financeira, ofereçam lições valiosas sobre como investir. “As ações, por exemplo. Para investir é preciso estudar o balanço da empresa, o DRE, o fluxo de caixa, o segmento em que atua, entre outros. Em termos de educação financeira, o segmento ações te oferece um leque muito maior de aprendizado”, explica.

O analista faz um alerta para os novos investidores: tudo que envolve o mercado de derivativos tem seus riscos potencializados. “Os derivativos foram criados para diluir risco, mas combinados com uma estratégia e por um profissional. Não é um segmento fácil em que qualquer um pode ter o domínio”, diz.

Para não quebrar, Martins conta que é preciso duas coisas. Primeiro é o gerenciamento de risco, ou seja, saber o quanto você está disposto a perder. Além disso, deve-se ter pleno conhecimento do mercado e dos ativos que estão operando.

“Só saber o quanto está disposto a correr de risco não é o suficiente. Se a pessoa não tem conhecimento do ativo e nem do mercado que está operando, nem adianta separar mil reais, pois vai perder isso em um segundo”, diz.

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Martins também separa os investidores do day trade em duas categorias: os que não querem perder dinheiro, mas têm outra profissão, os que não querem quebrar, mas querem viver do mercado financeiro. “A situação deste segundo grupo exige ainda mais educação e comprometimento”, diz.

“Vejo muitas pessoas que ficam viciadas. Day trade não quer dizer que eu tenho que operar todo dia, mas sim que eu comprei hoje e vou vender hoje. Não é preciso fazer isso diariamente. Há ciclos em que o mercado fica mais difícil”, conclui Martins.

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