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Educação Financeira

‘Com reservas, ninguém é explorado’, diz criador de plataforma de previdência popular

O economista Daniel Fuks fala sobre o lançamento da Poupare, que oferece fundo com aportes de R$ 100

‘Com reservas, ninguém é explorado’, diz criador de plataforma de previdência popular
Daniel Fuks, criador da plataforma Poupare (Crédito: Divulgação)
O que este conteúdo fez por você?
  • Para o economista, o brasileiro não forma uma reserva financeira porque o acesso fácil a cartões de crédito o induz a fazer compras parceladas sem que haja um controle efetivo de seu nível de endividamento
  • Ele diz que é preciso separar o quanto se quer economizar assim que o dinheiro entra na conta. E prestar atenção aos pequenos gastos, que podem consumir uma fatia expressiva do orçamento
  • A previdência privada não é o único caminho para a formação da reserva, mas os benefícios fiscais a ajudam a entregar um rendimento líquido mais vantajoso que os de outros tipos de investimento

O hábito de poupar e formar uma reserva financeira não faz parte da rotina de um grande número de brasileiros. As explicações para isso passam por questões culturais e comportamentais, mas também esbarram na dificuldade de acesso das classes mais baixas a produtos de previdência com taxas que sejam viáveis.

Para ajudar esse público a dar o primeiro passo, o economista Daniel Fuks está lançando neste mês a plataforma de investimentos Poupare. Por meio de um aplicativo, ela oferece um fundo de previdência de renda fixa gerido pela Icatu, com taxa de administração de 0,80% e aportes mensais de R$ 100. A ideia, diz ele, é estimular as pessoas a assumir as rédeas de sua vida financeira, trocando o endividamento por investimentos de longo prazo com custos menores.

Fuks pode falar com propriedade sobre o assunto. Em 2008, ele desenvolveu a área de previdência privada da Gávea Investimentos, onde permaneceu até 2012, quando fundou a consultoria financeira Skuf. Em paralelo, ele realiza desde 2009 um trabalho voluntário em que ministra palestras de educação financeira a estagiários do programa Jovem Aprendiz.

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Ao E-Investidor, ele diz que o principal inimigo da reserva financeira do brasileiro é o cartão de crédito e dá conselhos para quem ainda não começou a poupar.

E-Investidor – Dois terços dos brasileiros começam o mês com dívidas e não têm reserva alguma. Qual é o principal motivo para isso?

Daniel Fuks – Na minha opinião, isso acontece porque o Brasil permite que as pessoas tenham quantos cartões de crédito desejarem e parcelem as compras em mais de 12 vezes. Que eu saiba, somente no Brasil e na Argentina você entra em uma loja e compra a prazo com um cartão de crédito. O que está por trás disso é uma iniciativa do governo para facilitar o consumo. A população fica descontente quando não tem poder de consumo. Então, quando ela pode consumir, mesmo que por meio de dívida, as coisas ficam mais fáceis para quem está no poder. Isso ajuda muito a indústria e o comércio.

Nos países desenvolvidos, é diferente. Os varejistas na Europa e nos Estados Unidos não vendem a prazo, nem o cartão de crédito pode fazer isso. Se quiser comprar, o consumidor precisa contrair um empréstimo em uma instituição financeira, e pagar pelo bem à vista. E, para pegar esse empréstimo, ele terá que oferecer uma garantia para pagar juros menores e mitigar o risco da operação. Isso tem um impacto enorme na capacidade de poupança. Quando a pessoa gastou e já está devendo, se ela pede mais crédito, a instituição financeira não concede.

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Já no Brasil, com o cartão de crédito, você vai parcelando, vai pedalando como se não houvesse amanhã. Não passou uma lei que obrigaria as administradoras de cartões a informar quanto o consumidor deve. Quando ele liga para saber o saldo, só ouve os lançamentos do mês. Ele precisa olhar sozinho no extrato quais foram as compras parceladas, somar e descobrir o quanto deve. Tudo conspira para que ele tenha menos controle e maior propensão ao consumo, incorrendo em uma dívida com juros mais altos. A administradora quer que o cliente se esqueça do pagamento, atrase, pague mais juros.

Tudo isso explica por que o brasileiro não forma uma reserva financeira. O Brasil é o único país em que se vê anúncio de banco oferecendo crédito para a pessoa fazer festa, viajar, gastar. Quem pega um empréstimo que não é para fazer um investimento muito provavelmente vai morrer quebrado, com aquela dívida. Se a pessoa já não conseguiu acumular o que precisa para pagar, tem que ter muito cuidado ao tomar o crédito, porque o salário dela não vai aumentar, não vai entrar mais dinheiro.

Que conselhos você daria para quem ainda não começou a formar essa reserva? Como começar?

O melhor conselho que eu posso dar para quem ainda não começou é se perguntar: eu posso largar esse emprego chato até encontrar um novo emprego? Eu posso empreender? Eu posso viajar? Nas minhas palestras, vejo muita gente insatisfeita no trabalho, que não consegue fazer o que quer, porque não constituiu uma reserva. Quem tem uma poupança não precisa se sujeitar a ser explorado. Você precisa ter dinheiro, para empreender e para tomar decisões de forma mais racional.

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Comece assim que o dinheiro entra e não apenas com o que sobrar. A primeira coisa que você deve fazer é separar o quanto quer economizar. Não espere até o fim do mês, porque dinheiro na mão é vendaval. Qualquer valor já vale.

Nas palestras eu digo para as pessoas fazerem mais contas. “Eu sei que vocês moram longe, faz um calor infernal no Rio e vocês compram uma garrafinha de água no ônibus. Ela custa R$ 5. Isso dá R$ 15 na semana, R$ 60 no mês. Vocês ganham R$ 1 mil e vão gastar 6% do salário em água? É por isso que o americano anda com a garrafinha dele.”

Se você tomar um café e uma água por dia na rua, são R$ 100, são 10% de um salário de R$ 1 mil. As pessoas ‘choram’ um desconto de 10% numa compra de R$ 10 mil, mas gastam 10% do salário com água. Tudo são 10%, veja como isso pesa.

Depois que acumular 30% do seu salário, você fica viciado e começa a querer economizar e poupar. É como fazer ginástica: se parar antes do 22º dia, você não entra na rotina. E a rotina é ver o saldo crescer. Quero ver as pessoas motivadas.

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Como surgiu a ideia do projeto Poupare? A intenção é que ele seja apenas a porta de entrada para outros investimentos de longo prazo?

A ideia é trazer educação financeira para as classes mais baixas que acumulam dívidas. Quis dar a elas um produto com taxas que só são oferecidas no segmento private. Com taxa de administração de 0,8%, a Icatu não ganha dinheiro com o projeto. Ela perde até mandando correspondência para o cliente. Mas é importante criar esse incentivo para essas pessoas investirem com as mesmas taxas dos mais ricos, se motivarem e se educarem financeiramente.

Eu sonho que as taxas de administração dos fundos de investimento no varejo caiam muito. O cara do varejo paga 3%. Quanto mais baixo o tíquete, mais ele é penalizado. Eu acho que o mundo está mudando, e esses caras ainda não mudaram.

Em uma relação bancária, quem não chora, não mama. Pense em você. Em um mundo de juros baixos, qualquer diferença no percentual tem um impacto elevado.

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A previdência privada não é o único caminho para o investidor formar uma reserva financeira para a velhice. Qual é a vantagem dela sobre outros tipos de aplicação?

A melhor poupança de longo prazo é aquela que você consegue fazer no presente. O motivo pelo qual acredito que a previdência privada é um bom veículo são os benefícios fiscais. Por ter menos impostos, o retorno líquido na hora do resgate é maior que em um outro investimento com retorno bruto similar. O fato de não ter o come-cotas dos fundos e pagar 10% [no regime de tributação regressivo, após 10 anos] pode dar diferenças enormes no longo prazo, de 30%, 40%.

Se o investidor comprou ações da Vale (VALE3) a R$ 10 e elas subiram para R$ 20, ele vai pagar um ganho de capital de 15% sobre a diferença. Mas se ele comprar um fundo de previdência que é 100% alocado em Vale, ele vai pagar os mesmos 10% de imposto. É um terço a menos, é muito dinheiro. E hoje, dentro da categoria Previdência, há produtos que atendem a todos os perfis de risco, desde 100% renda fixa soberana até 100% bolsa.

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