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Como ficam os investimentos com a taxa Selic a 7,75%

A decisão era aguardada de perto pelo mercado, após a onda de incertezas dos últimos dias

Como ficam os investimentos com a taxa Selic a 7,75%
Banco Central do Brasil é o responsável por definir a taxa Selic, um dos principais indicadores econômicos para o rendimento de investimento de renda fixa. (Foto: Shutterstock/Jo Galvao/Reprodução)
  • A decisão era aguardada de perto pelo mercado financeiro após a onda de incertezas que atingiu o mercado nos últimos dias, com as ameaças de rompimento do teto de gastos na esteira da criação de um novo programa social do Governo, o Auxílio Brasil
  • A escala na taxa de juros favorece a renda fixa e impacta negativamente os ativos de risco. Veja como ficam os investimentos 

Nesta quarta-feira (27), o Comitê de Política Monetária (Copom) elevou a taxa básica de juros em 1,5 ponto porcentual, de 6,25% ao ano para 7,75%. Este foi o sexto aumento consecutivo da Selic.

A decisão era aguardada de perto pelos investidores, após a onda de incertezas que atingiu o mercado nos últimos dias, com as ameaças de rompimento do teto de gastos na esteira da criação de um novo programa social do Governo, o Auxílio Brasil.

Substituto do Bolsa Família, o benefício tem caráter temporário e deve vigorar apenas em 2022. O pagamento seria de R$ 400 a cada beneficiário, em duas parcelas – uma delas, de R$ 100, fora do teto de gastos. Isto resultaria em um rombo de cerca de R$ 30 bilhões ao limite fiscal. A perspectiva de um eventual descontrole nas contas promoveu uma reviravolta no cenário econômico, com a deterioração das expectativas para os juros e inflação.

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No último Boletim Focus, a mediana das expectativas apontava para uma Selic e um IPCA (indicador que mede a inflação) de 8,75% e 8,96% até o fim do ano. Há quatro semanas, os analistas apontavam para uma conjuntura mais branda, com juros em 8,25% e inflação em 8,45%. Paralelamente, as perspectivas de crescimento econômico foram atualizadas para baixo, de 5,04%, há um mês, para 4,97%.

Rodrigo Beresca, Ativa: A renda fixa volta ao jogo

Para João Beck, economista e sócio da BRA, com a ameaça ao teto, o patamar de juros terminal ficará muito mais alto do que o previsto. “Tínhamos duas grandes âncoras: uma é o BC, com a taxa de juros, e a outra era o teto de gastos, que foi rompida. Agora teremos que brigar para trazer essa âncora de volta”, afirma. “O que vai vir de alta extra nas taxas de juros, por conta dessa besteira que foi feita, vai mais do que compensar negativamente esses R$ 100 a mais que serão distribuídos. É um tiro no pé.”

De volta aos passado

Para os próximos anos, juros de dois dígitos já são esperados e precificados pelo mercado. Títulos públicos prefixados já oferecem retornos anuais de mais de 12%. Grandes bancos, como o JP Morgan, também projetam uma Selic de 11,25% no fim do ciclo de aperto monetário, que deve ocorrer em março do ano que vem. Na opinião de Beck, voltamos ao contexto de 2015 a 2016, durante o governo Dilma Rousseff.

“Nos leva de volta a uma época em que um bom fundo de renda fixa pós-fixado consegue dobrar seu capital dependendo dos anos em que o investidor deixa aplicado”, diz o sócio da BRA. “Agora podemos voltar a um cenário em que os investimentos conservadores se tornam o principal aeroporto de dinheiro para o longo prazo. Nos últimos meses, se o investidor queria deixar por mais tempo, ia para um fundo imobiliário.”

Na conjuntura de Selic mais alta, a renda fixa pós-fixada se torna um pouco mais atrativa. Com os juros em 7,5%, títulos mais conservadores como o Tesouro Selic terão rentabilidade real (descontando a inflação e imposto de renda) de cerca de 1,42% em 12 meses. A poupança, que rende apenas 70% da taxa básica de juros da economia, ganha um fôlego a mais e oferece 0,5% de retorno real no mesmo período.

Investimentos isentos de Imposto de Renda, como LCIs e LCAs, também podem ser boas opções para captar a escala dos juros. Sem a incidência dos tributos, os retornos reais dos títulos ficam em 2,71% em 12 meses.

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As projeções feitas por Rodrigo Beresca, analista da Ativa Investimentos, consideram o IPCA esperado pelo mercado no Boletim Focus para daqui um ano, de 4,9%, mantendo a taxa Selic atual constante. “A renda fixa volta ao jogo. Se olharmos s últimos 12 meses, os juros ainda perdem para a inflação. Entretanto, daqui para frente, com a Selic estável e a inflação tendendo a diminuir, o investidor de renda fixa começará a ver ganho real”, afirma o especialista.

Quando o assunto são prefixados, a indicação é de cautela. Apesar de já estarem pagando juros de dois dígitos, esses ativos são afetados pelas mudanças nas expectativas econômicas. “Quando temos aumento nas curvas de juros, o preço unitário do título acaba caindo. O preço do título é inversamente proporcional ao valor da taxa. Então pode ter um impacto negativo, caso o investidor tenha que vender antes do vencimento”, diz Beresca. Se o investidor carregar os ativos até o vencimento, não haverá impacto algum na rentabilidade.

A corretora CM Capital entende que um bom ponto de entrada em prefixados acontecerá a partir do momento em que ocorrer a ‘inversão da curva’. “Quando tivermos arrefecimento em inflação ou sinalização do Banco Central de estabilidade dos juros ou corte nessas taxas, começamos alocação em prefixados para que tenhamos oportunidades na rentabilidade do título e no ágio da operação ao investidor”, afirma Ariane Benedito, economista da casa.

Os títulos IPCA+ (que pagam a inflação do período, mais um percentual prefixado) seguem como opções interessantes para o investidor se proteger em tempos de incertezas, principalmente com a proximidade das eleições e aumento do risco fiscal. Na visão de Marcelo Mattos, CIO da Inter Asset, além de saber escolher quais títulos investir, é necessário definir os prazos.

“Quanto mais longo, maior a oscilação de preço se o investidor precisar vender antes do prazo. Então tem que saber escolher os prazos de maneira interessante. Uma opção é fazer uma escadinha de liquidez, comprar diferentes prazo para sempre ter alguma coisa vencendo e não ter que sair vendendo os recursos antes do acordado”, explica Mattos.

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Jansen Costa, sócio-fundador da Fatorial Investimentos, destaca um efeito secundário do aumento da Selic. Segundo o especialista, a partir de agora o investidor poderá ver as instituições financeiras diminuindo os prêmios em relação ao CDI (taxa próxima à Selic) nos títulos oferecidos. Se até o momento era comum ver CDBs pagando mais de 100% do CDI, por exemplo, daqui a alguns meses é esperado que esses retornos sejam gradualmente diminuídos.

Fundos de investimento

Outra classe de ativos que podem se beneficiar dessa alta são os fundos DI, de crédito privado e crédito estruturado. Esses produtos podem ser impactados positivamente porque geralmente investem em ativos que pagam remuneração atrelada a taxas pós-fixadas, como debêntures que pagam um percentual do CDI.

O mesmo não ocorre, no entanto, com os fundos imobiliários. Segundo Beck, esses produtos se prejudicam duplamente com a Selic em alta, uma vez que o setor imobiliário é muito correlacionada às taxas de juros e costuma ser afetado negativamente pelo ciclo de aperto. Além disso, acaba havendo um movimento de venda de cotas.

“É um setor muito depende de crédito e do ciclo econômico, então é impactado negativamente pelos juros. E o segundo impacto é no sentido de os dividendos distribuídos todo mês por esses fundos ficarem menos atrativos, quando comparados à taxa de juros brasileira, que tem muito menos risco”, afirma Beck.

Benedito, da CM Capital, aponta que uma estratégia importante de alocação em fundos de investimento em um cenário de incertezas é sempre pensar em produtos descorrelacionados com o ciclo econômico, como fundos multimercados macro (cuja estratégia leva em conta fatores macroeconômicos) e quantitativos (que levam em conta modelos matemáticos).

A diversificação internacional também é apontada como um fator importante para proteger o investidor. “Por mais que ainda esteja desacelerada a recuperação global, ainda há uma recuperação”, afirma Benedito. Essa também é a visão de Mattos, de CIO da Inter Asset. “É importante a diversificação de geográfica, que tem ser perene no portfólio do investidor. Não ficar dependendo 100% de um acontecimento dentro de um país ou outro”, explica.

Bolsa de Valores

A alta da Selic também respinga negativamente na Bolsa. Fora o encarecimento dos empréstimos tomados pelas empresas, juros mais altos diminuem o custo de oportunidade de investir em renda variável. Isso significa que a tendência é que haja maior migração para a renda fixa, que tem menos risco e está remunerando de forma interessante.

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Os juros e inflação mais altas já fazem preço no Ibovespa, que está em queda acumulada de 9,5% em 2021. Contudo, o rebalanceamento brusco do portfólio em ações para renda fixa não é recomendado, caso a mudança venha seja feita apenas para acompanhar o novo cenário de juros. “É quase um concurso de popularidade, com as pessoas indo atrás do investimento da moda. Geralmente dá errado, compra-se tarde e vende-se quando não deveria”, diz Mattos.

No final, a recomendação é procurar bons fundos de investimento, já que um gestor profissional estará analisando o mercado frequentemente e poderá lidar melhor e reagir mais rápido nesses períodos de volatilidade. “Os investidores não tem que fazer investimentos com base na Selic atual, é preciso muito cuidado em tomar decisões de alocação olhando apenas os juros do momento”, diz Mattos.

Orlando Bachesque, assessor da alta vista investimentos, também explica que em um momento de alta de juros os investidores tendem a optar por ganhar na renda fixa, sem risco. Entretanto, a maré baixa na Bolsa não dura para sempre e boas oportunidades sempre irão aparecer. “Com o tempo, o mercado vai se ajustando”, afirma.

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