- A renda fixa global figurou entre as principais recomendações de investimento em 2023, em um momento que os Estados Unidos atingiram a maior taxa de juros em duas décadas
- Agora, esse ciclo está perto de começar a ser revertido e o mercado espera pelo início dos cortes de juros por lá. Ainda assim, a recomendação se mantém
- A renda fixa é considerada mais atrativa até que as ações americanas, que, depois de um verdadeiro rally, estão "caras" na visão dos especialistas
A renda fixa americana foi um grande tema nos mercados em todo o ano de 2023. Se de um lado a alta da taxa de juros dos Estados Unidos ditou o apetite à renda variável de investidores globais, por outro, esse movimento abriu uma janela de oportunidade para investir em títulos que há muito tempo não tinham retornos tão expressivos. Não à toa, no início do ano passado, muitos especialistas no Brasil começaram a defender que a renda fixa dos EUA também merecia um lugar na carteira dos brasileiros.
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Como contamos nesta reportagem da época, em um momento de incertezas no cenário doméstico, analistas viam na classe de ativos uma forma de diversificar o patrimônio do “risco Brasil” e garantir retornos em dólar. Tudo isso em um momento em que a taxa de juros americana atingia seu maior patamar em duas décadas, de 5,25% a 5,5% ao ano.
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Para 2024, a perspectiva já é um pouco diferente. Na primeira reunião de política monetária do ano, realizada na quarta-feira (31), o Federal Reserve (Fed), o banco central dos EUA, manteve os juros estabilizados. No entanto, desde o fim do ano passado, a instituição deu sinais de que o aperto monetário chegou ao fim e o mercado espera que o ciclo de queda da taxa seja iniciado em breve.
Isso vai tirar a atratividade da renda fixa americana ou exigir mudanças nos portfólios de quem seguiu as recomendações e investiu nesses ativos no ano passado? Não, segundo os especialistas ouvidos pelo E-Investidor.
O entendimento é que, ainda que a curva de juros tenha se fechado, as taxas seguem atrativas e esta pode ser uma última para garantir bons rendimentos na classe de ativos. “2023 foi um ano de retornos muito bons e a pergunta era se essas condições continuariam. E a nossa interpretação é que continuam, sim”, diz Ian Caó, sócio e CIO da Gama Investimentos.
Ele explica que, do ano passado para cá, as taxas de títulos de longo prazo diminuíram, depois de um período de preços muito estressados nos ativos de renda fixa. A diferença – positiva para o investidor – é que o cenário agora parece estar menos incerto em relação ao futuro da economia nos EUA. As variações bruscas no humor do mercado, que impactaram os investimentos como um todo ao longo do ano, não devem voltar a acontecer na mesma magnitude.
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“Hoje tem menos retorno e um preço dos ativos um pouquinho mais alto, mas ainda bastante atrativo. E as expectativas do ponto de vista econômico estão ficando cada vez mais claras”, destaca Caó.
Yields altos e marcação a mercado
O mercado está esperando por maiores sinais do Federal Reserve sobre o início e a velocidade dos cortes na taxa de juros americana, sem muito consenso. Havia quem esperava pela primeira redução já no encontro de março da instituição monetária, mas essa percepção foi perdendo força depois da divulgação do Livro Bege, uma espécie de relatório sobre as atuais condições econômicas em cada um dos 12 distritos do Fed. As apostas na quantidade de cortes ao longo de 2024 também variam; há quem veja espaço para 6 reduções, outros para 4.
Isso demonstra como, ainda que a aposta geral seja na queda dos juros, a taxa americana ainda vai demorar para voltar ao patamar “padrão” dos EUA; perto de 0%.
“Ainda estamos em um contexto com os maiores juros nos EUA dos últimos 20 anos. É esperado que em algum momento a taxa comece a cair em 2024, mas o processo deverá ser gradual e provavelmente não devemos voltar para juros próximos a zero por um bom tempo”, destaca Caio Fasanella, diretor executivo e head da área de investimentos da Nomad. “Os investimentos em títulos de renda fixa nos EUA continuam sendo uma ótima alternativa para diversificação de riscos.”
Essa também é a percepção de José Maria Silva, coordenador de Alocação e Inteligência da Avenue. Ele pontua que, comparado à média dos últimos 10 anos, os atuais níveis de retorno da renda fixa, na casa de 4% para títulos públicos e de 6% para os títulos privados, ainda são elevados. “Anualizando os últimos dados de inflação, seria uma taxa de juros real de pelo menos 2% ao ano, o que ainda é um nível bastante sólido e atrativo, principalmente se comparado à média histórica e dos últimos 10 anos”, afirma.
Silva traz ainda um outro ponto, também favorável ao investidor que quiser investir na renda fixa americana: por lá, a grande maioria dos ativos é prefixada. Isso significa que quem “travar” uma taxa agora pode se beneficiar da marcação a mercado no futuro, dado que a perspectiva é de queda dos juros.
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“O investidor de renda fixa tem três opções. Pode aproveitar desta taxa de juros ainda alta, comprar um título de média ou longa duração travando um retorno que independentemente do corte da taxa de juros. E, se não quiser levar o título até ao vencimento e decidir vendê-lo daqui a 12, 18 meses, pode fazer isso com uma marcação ao mercado positiva”, explica.
Melhor que ações?
Ao contrário do Ibovespa, as Bolsas de Valores americanas começaram 2024 a todo vapor, dando sequência aos ganhos vistos na reta final do ano passado. Por causa desse movimento de valorização, o S&P 500 e a Nasdaq, dois dos principais índices de ações dos EUA, estão sendo negociados na máxima histórica. Com alguns preços já esticados, especialistas ainda veem a renda fixa como uma alternativa mais atrativa dado à menor volatilidade em relação à renda variável.
“Não existe uma resposta única para essa questão, sempre depende muito do perfil e apetite a risco do investidor. Mas ter uma parte do patrimônio em ativos de renda fixa nos EUA sempre fará sentido como estratégia de diversificação de risco”, diz Caio Fasanella, da Nomad.
Para quem tem foco no longo prazo e deseja manter uma posição estrutural de ações americanas na carteira, o momento exige uma avaliação mais criteriosa dos “riscos-retornos”. Isso porque, com as altas recentes, algumas empresas estão nas máximas, avaliadas por muitos especialistas como caras – não que não sejam bons nomes, apenas andaram muito e este pode não ser o momento ideal de entrada. Uma percepção que paira sobre o mercado americano desde o ano passado, como contamos aqui.
É o caso das Magnificent Seven, nome usado no mercado para se referir aos sete grandes nomes de tecnologia: Nvidia, Tesla, Meta, Apple, Amazon, Microsoft e Alphabet.
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“Na parte de ações americanas, há dois mundos”, explica José Maria Silva, da Avenue. “O mundo do Magnificent Seven não para de subir e está com valuation recorde. Mas se olharmos todo o resto, ainda tem muito setor que está muito descontado e aparentemente barato, como saúde, real estate, financeiro”.