

A Vale (VALE3) passa por três incertezas que fazem o investidor questionar se a empresa tende a continuar com uma distribuição de dividendos robusta.
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A Vale (VALE3) passa por três incertezas que fazem o investidor questionar se a empresa tende a continuar com uma distribuição de dividendos robusta.
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A primeira envolve a escolha do novo presidente da companhia, já que o governo tenta emplacar um nome para comandar a mineradora, mesmo a empresa sendo uma organização privada. A segunda diz respeito ao acordo de Mariana (MG), no qual a Vale se propôs a pagar R$ 140 bilhões em conjunto com a BHP e a Samarco. Por fim, o preço do minério de ferro também vem testando a tese de investimentos na empresa.
O minério de ferro encerrou o pregão de terça-feira (18) em US$ 107,05 por tonelada. A commodity chegou a US$ 122,49 por tonelada em 26 de janeiro de 2023 – recuo de 12,6% de lá para cá, segundo dados de levantamento de Einar Rivero, CEO da Elos Ayta Consultoria.
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O papel da Vale atingiu sua máxima histórica em valores ajustados por proventos no mesmo dia, a R$ 88,43. Desde então, a ação da companhia recua 31,4% após encerrar o pregão da última terça-feira (18) em R$ 60,66. Parte dessa queda vem da variação do preço do minério de ferro no período.
O recuo no preço da commodity ocorre devido à desaceleração da economia chinesa, o principal cliente da Vale. O mercado estava acostumado a ver a China crescer por volta de 10% ao ano nos últimos anos. No entanto, o país desacelerou.
Em 2023, o Produto Interno Bruto (PIB) da China cresceu 5,2% em relação a 2022. Já no primeiro trimestre de 2024, o PIB chinês avançou 5,3% em relação ao mesmo período do ano anterior.
Esses fatores acabam pesando sobre a ação da Vale, que leva o investidor a se perguntar se o papel da companhia seguirá atrativo para uma estratégia de dividendos, principalmente para o longo prazo, como uma carteira previdenciária com foco em renda para os próximos 30 anos.
Na visão de João Abdouni, analista da Levante Inside Corp, a Vale sofre da desconfiança do mercado principalmente devido à queda do preço do minério de ferro.
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Ainda assim, ele comenta que a companhia deve entregar um resultado interessante no ponto de vista de dividendos no curto prazo, com dividend yield (rendimento de dividendos) anual de 9%, o equivalente ao pagamento entre R$ 25 e R$ 30 bilhões em proventos.
“Atualmente, VALE3 está sendo negociada a cerca de 4 vezes EV/EBITDA (valor da empresa sobre lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização) e apresenta um retorno aos acionistas de cerca de 17% ao ano, pensando em um minério de ferro de médio longo prazo de US$ 90. Neste sentido, seguimos com recomendação de compra para as ações da Vale”, diz Abdouni.
No entanto, para o longo prazo, o especialista diz que o investidor deve ser mais cauteloso. Ele diz ser muito difícil estimar o volume de produção de aço global para os próximos 30 anos com a expectativa de queda populacional global. Com isso, o preço médio do minério de ferro pode se manter nos atuais patamares, subir ou até mesmo cair.
Na visão do especialista, para a Vale compor uma carteira previdenciária, o investidor precisará avaliar a presença da empresa no portfólio ano a ano, visto que no decorrer desse tempo a empresa tende a passar por transformações, positivas ou negativas, que podem aumentar ou reduzir a distribuição de proventos.
Paulo Luives, especialista da Valor Investimentos, comenta que o setor oferece o risco da volatilidade do preço do minério no longo prazo. A variação no preço da commodity atrapalha o investidor que busca uma renda contínua e previsível, características de uma carteira de ações previdenciárias. “Se o investidor tiver perfil mais conservador, a Vale não é a empresa ideal para formar um patrimônio que faça renda de aposentadoria via dividendos, porque a volatilidade da commodity provoca variação nas receitas da empresa. O setor elétrico, por exemplo, traz essa previsibilidade, sendo ele o melhor para esse perfil conservador”, diz.
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Ilan Arbetman, analista da Ativa Investimentos, argumenta que para evitar qualquer volatilidade na renda passiva durante a aposentadoria, o investidor deve diversificar os investimentos. Ele recomenda, no mínimo, dez ações na carteira, cada uma delas com 10% de participação.
Todavia, vale lembrar que essa é a diversificação mínima sugerida, sendo possível o investidor comprar mais ações ao ponto da carteira ficar com um peso médio de 4% ou menos por papel – nível de diversificação considerado o ideal pelo analista.
Em suas projeções, Arbetman calcula que a Vale deve lucrar R$ 46,2 bilhões em 2024 e entregar um payout (porcentagem do lucro distribuído na forma de dividendos) de 66,2%. Em números absolutos, tal porcentagem deve representar um pagamento de R$ 6,74 por ação, ou 11% do valor de mercado da companhia em 2024.
Para 2025, ele acredita que a empresa tende a ter um lucro maior, por volta de R$ 52,9 bilhões, mas distribuir menos dividendos. “Isso deve acontecer por causa do acordo de Mariana, que deve tirar parte do lucro que seria destinado aos dividendos para pagar a indenização relacionada à questão ambiental e humana”, diz Arbetman, que estima um payout de 60,1%, ou R$ 7 por ação, para 2025. Sobre este tema, a grande questão é que a Advocacia-Geral da União (AGU) entrou com recurso para tentar bloquear R$ 79,6 bilhões das mineradoras Vale, BHP e Samarco em ação relativa ao desastre ocorrido em novembro de 2015.
Arbetman diz que a alta do dólar também deve influenciar os números da empresa nos próximos trimestres. O especialista da Ativa reforça que a Vale é uma grande exportadora de minério de ferro e de outros metais e, por isso, tende a se beneficiar da alta da moeda americana em relação ao real. O dólar sobe 10,95% no acumulado de 2024 – até o fechamento do pregão da terça-feira (18). No período, a moeda americana foi de R$ 4,85 para R$ 5,43.
“A moeda americana, no entanto, tem se mostrado muito volátil devido às questões fiscais e ao adiamento do corte de juros do banco central americano e, no meu ponto de vista, essa volatilidade é complicada para o investidor que tem em vista o papel para formar a carteira previdenciária. Se o dólar variar em grandes amplitudes em um trimestre, a empresa pode ter variação de receitas e lucro, deixando o ativo mais arriscado”, aponta Arbetman.
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No começo do ano, analistas do mercado financeiro estimavam que o dólar fosse encerrar 2024 em R$ 5, segundo o primeiro Boletim Focus de 2024. Na mais recente pesquisa com o mercado, publicado na segunda-feira (17), a média aponta o dólar cotado a R$ 5,13 ao final do ano. O número significa alta de 2,6% em relação à projeção inicial.
Mesmo com o aumento da expectativa, a estimativa final mostra que o mercado espera uma queda de 5,52% na cotação do dólar em relação ao preço desta última terça-feira (18), quando a moeda atingiu R$ 5,43. É justamente esse sobe e desce que retira a previsibilidade da companhia e afeta a estabilidade de dividendos para o investidor.
Paulo Luives, da Valor Investimentos, também reforça essa ideia. “O dólar alto é bom para a empresa devido às exportações, mas tende a atrapalhar a Vale se ficar instável. É importante ter em mente que o dólar pode impactar o resultado nas linhas receita e lucro. Isso porque essas empresas fazem proteção em dólar, conhecido como head cambial, e a depender de como for, o dólar pode ajudar ou atrapalhar o desempenho”, diz.
No head cambial, a empresa compra contratos de dólar no mercado de derivativos para uma data específica, que dará o direito a ela de vender moeda ao preço acordado na data da compra do contrato. A operação serve como uma proteção, mas caso o valor especificado no início fique muito acima do valor final no vencimento do contrato, em um rali de baixa na cotação, a empresa terá prejuízo na operação.
Se a perspectiva para uma companhia mostra intensa volatilidade, o investidor deve procurar outro setor para garantir a sua aposentadoria?
A resposta para esta pergunta não está nos números, mas na reação da empresa frente às mudanças. Arbetman, da Ativa, lembra que o investidor deve olhar para a companhia e ver o que ela está fazendo para atualizar seu modelo de negócios de forma a manter uma boa lucratividade ao longo dos próximos anos.
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Ele aponta que a Vale se encontra em uma situação um pouco complicada, principalmente em relação à dependência da China, visto que a mineradora tem 50% de suas exportações voltadas para o país asiático, hoje em desaceleração. “A empresa precisaria encontrar novos mercados para absorver sua demanda de minério de ferro, uma tarefa complicada.”
O CFO da Vale, Gustavo Pimenta, disse nos bastidores do evento Esfera Brasil, no dia 7 de junho, que a chegada do carro elétrico e a demanda por minério de ferro vinda de outros países pode suprir a redução do mercado chinês, assolado por uma crise imobiliária. Para ele, a Vale pode manter ou até elevar os patamares de lucratividade, trazendo bons dividendos para o investidor.
O mercado imobiliário chinês, que foi fundamental para o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) do país nos últimos anos, está desacelerando. No entanto, Pimenta destacou que a fabricação do carro elétrico na segunda maior economia do planeta tende a manter o consumo de metais em patamares interessantes. “A China continua com uma boa demanda por aço por causa do carro elétrico. A fabricação de componentes para esse produto exige o aço, o qual possui o minério de ferro como matéria-prima”, disse o executivo, na ocasião.
Para superar o momento atual, Pimenta aponta a possibilidade de a demanda de outros mercados alavancar o preço do minério de ferro. Segundo ele, a redução do consumo de minério de ferro pela China tende a ser mais que compensada por países do Oriente Médio e do Sudeste Asiático. “A Índia pode absorver esse consumo chinês. Nos últimos dez anos, o mercado estimou uma queda no preço do minério de ferro por uma desaceleração da China, eles erraram em 100% dos anos. Todos os anos, o preço seguinte sempre foi mais alto que o do ano anterior”, afirmou.
Os analistas do mercado financeiro apontam que a companhia está se empenhando em diversificar clientes. Um exemplo vem do Oriente Médio, que tende a aumentar a demanda devido à construção de cidades futurísticas na região.
Arbetman, da Ativa Investimentos, lembra que o próprio CEO da Vale disse na quinta-feira (13) que a empresa já vendeu 27 milhões de toneladas de minério de ferro para a região e a meta da companhia é chegar a 67 milhões de toneladas no curto e no médio prazos.
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O analista também cita o carro elétrico. “A Vale vem buscando se atualizar e pode aproveitar as novas indústrias e exportar outros metais, como o níquel e o cobre. Hoje, a maioria da produção da empresa está no minério de ferro, mas a companhia tem apresentado planos de diversificação de receitas, seja pelo minério extraído seja pela região que ela exportará”, aponta.
André Vasconcellos, professor da Trevisan Escola de Negócios, avalia que a Vale vem trazendo melhorias e transformações no seu modelo de negócios para se manter entre as maiores mineradoras do mundo há mais de 20 anos. A empresa planeja expandir sua produção de outros metais ao longo da década: estima crescer a produção de cobre em 181% até 2030, de 320 quilotoneladas (kt, medida equivalente a 1.000 toneladas) em 2024 para 900 kt.
Essa produção deve crescer devido ao projeto Hu’u, na Indonésia, um ativo de classe mundial. Além disso, a Vale segue investindo na exploração de ativos em regiões da América Andina e do leste europeu. Além do cobre, o níquel se tornou outra aposta da Vale para expansão. Para 2024, a empresa tem uma projeção de produção de 160 kt de níquel a até 175 kt, relativamente em linha com a produção de 2023.
Em seu planejamento de perspectivas de negócio para 2024, a companhia diz que busca se tornar líder no fornecimento de níquel na transição para uma matriz energética sustentável. “O principal produto, o níquel Classe 1, nos coloca em uma posição única na medida em que as operações, ambientalmente responsáveis no Atlântico Norte, são consistentes com a transição para uma economia de baixo carbono”, diz a mineradora.
Estima-se que, em 2026, a produção de níquel da Vale fique entre 210 kt e 230 kt, reflexo dos projetos de reposição no Canadá e na Indonésia (Pomalaa e Morowali) e do segundo forno de Onça Puma, no Pará. A partir de 2030, a produção de níquel deverá ficar acima de 300 kt com entrada de projetos como Thompson Ultramafics (Canadá) e Sorowako HPAL (Indonésia).
“A Vale é uma empresa que não fica para trás, a companhia consegue acompanhar e antecipar movimentos no mercado. Nos últimos anos, ela tem feito transformações e aquisições com foco em inovação e melhorias de sua capacidade de produção e vendas”, diz Vasconcellos, da Trevisan.
Na última sexta-feira (14), a Vale reiterou que busca potenciais parceiros para sua plataforma de energia após aquisição de fatia de 45% da Cemig (CMIG4) na Aliança Energia. A Vale afirmou que busca potenciais parceiros para essa plataforma. “O aumento da participação na Aliança Energia é um passo importante para a criação de uma plataforma de energia, que potencialmente contemplará outros ativos do portfólio da Vale”, detalhou a empresa. Para Vasconcellos, a mineradora demonstrou interesse na expansão em novos negócios, justamente para se manter atualizada em um mercado global competitivo.
O consenso dos analistas para saber se o investidor deve ou não comprar a ação da Vale dependerá de três fatores. O primeiro diz respeito ao objetivo do investimento, se a compra serve para buscar lucro no curto e no médio prazos (até um ano). Se esse for o intuito, somente o analista da Levante, João Abdouni, recomenda compra, por achar o dividendo da empresa atrativo.
Mas para o investidor garantir um dividendo yield (rendimento de dividendos) de pelo menos 9%, o valor limite de preço para a ação fica em R$ 61,50 – o cálculo leva em conta o pagamento de R$ 25 bilhões de dividendos. Já se o valor em proventos chegar a R$ 30 bilhões, o preço-teto vai a R$ 73,20.
Por outro lado, os analistas do BTG Pactual estão com recomendação neutra para a Vale em até 12 meses. Eles dizem preferir esperar os resultados dos próximos trimestres para terem uma melhor visão de que a ação “deixou as suas saliências para trás”. Entretanto, confirmam que a dinâmica de lucro da empresa melhorou e que as expectativas dos investidores com a ação no curto prazo parecem melhores. “Ainda temos dificuldade em ver grandes vantagens, mas acreditamos que as ações permanecem descontadas em 4 vezes o Ebitda de 2024 e a empresa deve entregar rendimentos de dividendos mais próximos de 9%”, dizem Leonardo Correa e Caio Greiner, que assinam o relatório do banco.
O BTG estima lucro de US$ 10,38 bilhões para a Vale em 2024, outro de US$ 8,65 bilhões em 2025 e mais um de US$ 8,53 bilhões em 2026. Devido à queda do preço do minério de ferro e à menor demanda da China, o BTG tem recomendação neutra para a Vale nos próximos 12 meses. O preço-alvo para a American Depositary Receipt (ADR, recibos que permitem negociar nos EUA ações de empresas não americanas) cotada em Nova York é de US$ 16, alta de 43,11% na comparação com o fechamento de terça-feira (18), quando a ADR encerrou o pregão cotado a US$ 11,18.
A Ativa também tem recomendação neutra nos próximos 12 meses, com preço-alvo de R$ 75 para a ação negociada na B3 (B3SA3), no Brasil. O preço-alvo equivale a uma potencial alta de 23,63% na comparação com o fechamento de segunda-feira (17), quando a ação encerrou o pregão a R$ 60,66.
Arbetman diz que a empresa não está interessante para o investidor nos próximos 12 meses, visto que há incertezas sobre a sucessão da companhia e as questões de Mariana, que devem reduzir os dividendos em 2025. Por outro lado, para o longo prazo de uma carteira previdenciária, os analistas dizem que a empresa serve para o investidor, desde que ele não tenha medo da volatilidade das commodities.
“Para o longo prazo, a Vale é uma empresa muito interessante. A companhia demonstra que está se atualizando e buscando vender novos produtos para novos clientes. Hoje temos recomendação neutra para os próximos 12 meses, mas se for para uma carteira previdenciária em que há a diversificação e aceitação da volatilidade das commodities, a Vale é uma ótima opção para o investidor”, salienta Arbetman.
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