Depois de cair 45,03% e atingir seu pior momento na crise da pandemia da covid-19, no dia 23 de março, o Ibovespa já se valorizou 62,73%, aos 103.444,48 mil pontos – até o fechamento desta segunda-feira (10). Porém, como as perspectivas para economia brasileira ainda não são das melhores, voltou à tona a discussão sobre uma possível bolha na bolsa de valores.
Para efeito de comparação, enquanto o Ibovespa teve alta 30,18% de abril a junho, o Ministério da Economia espera uma queda de 7,5% no Produto Interno Bruto (PIB) no período ante o primeiro trimestre deste ano, que foi negativo em 1,5% em comparação com o quarto trimestre de 2019.
Dados prévios do Indicador de Atividade Econômica (IAE) de junho, divulgado Fundação Getulio Vargas (FGV), mostram um cenário ainda mais tenebroso, com o PIB encolhendo 11,2% no segundo trimestre em comparação com os primeiros três meses do ano.
Se de fato houver uma bolha no mercado financeiro, o risco para os investidores é enorme. Neste caso, os atuais preços dos papéis estariam supervalorizados e seriam corrigidos em algum momento futuro, gerando prejuízo a quem está “comprado” na bolsa.
Mas Gilson Finkelsztain, CEO da B3, rechaça essa teoria. Em entrevista recente organizada pela Federação Brasileira de Bancos (Febraban), o executivo garantiu que há fundamentos que sustentam a alta do Ibovespa mesmo com a forte recessão da economia real.
Finkelsztain lembrou que muitas empresas cujas ações estão em alta hoje são de setores que de alguma maneira até se beneficiaram com o atual cenário, como o e-commerce.“Não vejo os preços de ativos no Brasil refletindo uma irracionalidade”, disse.
Os especialistas do mercado consultados pelo E-Investidor também não acreditam na hipótese de uma bolha na B3. O primeiro argumento dos analistas é que o principal índice da bolsa não está em alta no ano, e sim em queda de 10,55% no agregado desde 1º de janeiro.
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“O Ibovespa estava na casa dos 120 mil pontos no começo do ano e os quatro meses de alta não foram suficientes para recompor as perdas”, afirma Henrique Castro, professor da Escola de Economia de São Paulo (FGV EESP).
Juros baixo e perspectiva positiva
Outro motivo que sustenta a forte valorização da B3, segundo os especialistas, são os recentes cortes na Selic, que a levaram a taxa básica de juros para 2% ao ano, menor nível da história do País. Após a 9ª redução seguida, o retorno real da poupança ao ano passou de vez a ser negativo. A renda fixa também ficou menos atrativa, fazendo muitos investidores migrarem para a Bolsa.
Segundo dados da B3, mais de 1,143 milhão de CPFs de pessoas físicas já haviam entrado na bolsa neste ano até o dia 31 de julho. No total, a bolsa brasileira conta com 2.824.239 pessoas físicas e
30.004 pessoas jurídicas, somando 2.854.243 de CPFs cadastrados.
“Uma parcela importante de pessoas foi para o mercado de capitais em busca de melhores oportunidades e esse movimento leva os preços para cima”, explica André Galhardo, economista-chefe da Análise Econômica Consultoria.
Outra razão que sustenta o argumento é a de que a Bolsa não reflete o presente, e sim o futuro. E as perspectivas são positivas. “O Ibovespa enxerga lá na frente e mostra que se acredita que o pior já ficou para trás”, afirma o economista-chefe da Análise Econômica Consultoria.
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Castro, da FGV, pontua que a visão da B3 é pautada em notícias recentes, que indicam que não ocorrerá uma segunda onda de covid-19. Além disso, a possibilidade de uma vacina contra a doença ficar pronta antes do previsto e a volta do debate sobre reformas e privatizações no País também justificam o momento de alta. “Há expectativa de que as coisas vão melhorar”, diz o professor. “Bolha quer dizer que a alta é irracional e não é isso que acontece. Há fundamentos para a alta mesmo com o descasamento com a economia”, afirma Castro.
Bolsa não está livre de riscos
Mesmo que a valorização da B3 não se caracterize como uma bolha, os analistas salientam que ainda há riscos no mercado e o Ibovespa pode voltar a cair. Apesar disso, os especialistas frisam que esta possível queda não significará que havia uma bolha, apenas que o ânimo não foi correspondido. “Se cair, é por uma questão de frustração de expectativa”, afirma Galhardo.
Castro esclarece que, se houver uma segunda onda de covid-19 ou as reformas e a vacina demorarem para serem concretizadas, ou até mesmo não acontecerem, é provável que os preços caiam novamente. “Uma eventual volta de crise pode destruir a euforia do mercado e trazer grandes perdas”, diz o professor da FGV.
Por isso, os analistas dizem que é de suma importância os investidores terem um portfólio diversificado para, além de buscar uma boa rentabilidade, também se proteger de eventualidades. “As incertezas são muito elevadas, é uma doença que ainda não tem cura e ninguém sabe o que pode acontecer”, comenta Castro.