O que este conteúdo fez por você?
- Luciano Telo é responsável pela alocação dos ativos, desenvolvimento de fundos e estratégia de investimentos para os clientes do Credit Suisse no Brasil
- Desde que assumiu o cargo de CIO, em setembro do ano passado, o especialista coordenou o aumento de exposição em Bolsas globais. Para isso, foram reduzidas posições em renda fixa e bolsa brasileira nas carteiras
- O banco suíço tem evitado montar grandes posições em dólar, já que o câmbio está muito fora do equilíbrio. Já commodities, varejo eletrônico e segmento de saúde são apostas
Em pouco mais de um ano, o cenário de investimentos no Brasil passou por uma forte transformação. A pandemia da covid-19 provocou uma queda acentuada nos juros básicos da economia, com a Taxa Selic no piso histórico de 2% ao ano, um período dovish que foi interrompido apenas na última reunião do comitê do Banco Central com a alta para 2,75% ao ano. O real também acumulou desvalorização de 22,4% ante o dólar no ano passado e a bolsa de valores fez um movimento em V: saiu do patamar dos 120 mil pontos, caiu para 63 mil e retornou para a pontuação inicial.
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No meio de toda essa turbulência, Luciano Telo assumiu como CIO da divisão de gestão de patrimônio (International Wealth Management Brazil) do banco global Credit Suisse. Desde setembro de 2020, o especialista já implementou algumas mudanças na estratégia. “Começamos gradualmente a adicionar posições globais de bolsa de valores na carteira, tirando de três fontes: renda fixa, principalmente os títulos ligados à inflação, fundos multimercados e de Bolsa Brasil”, diz.
O início da vacinação no País, que adiciona esperança em relação à reabertura econômica, também tem norteado as alocações nas carteiras dos clientes. “O cenário positivo para a bolsa global e brasileira vem da projeção de um segundo semestre de reabertura das economias”, diz Telo. “A perspectiva está completamente ligada ao que esperamos em relação à vacinação.”
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O Credit Suisse tem hoje cerca de R$ 350 bilhões em ativos sob custódia e administração no Brasil e US$ 1,5 trilhão no mundo. Leia a entrevista completa:
E-Investidor – O Brasil passou por muitas turbulências políticas e se tornou o epicentro de pandemia no mundo. Como lidar com esse cenário na hora de fazer a alocação dos ativos?
Luciano Telo – A primeira maneira de lidar com eventos assim é ter mais diversificação, fontes de retorno. Estar não só na Bolsa de um país, mas na de vários países. Segundo ponto é que estamos em um momento muito especial no Brasil e no mundo: os juros estão baixos. Nos EUA, os juros estão em zero e a inflação é perto de 2%. No Brasil, os juros estão em 2,75% e a inflação projetada por nós para o ano está em torno de 5,10%.
O que fizemos foi reduzir a renda fixa por várias razões. Víamos a possibilidade dos juros normalizarem, os juros estavam em um nível muito baixo. Em segundo lugar, tem uma incerteza fiscal no Brasil, isso é um ponto importante para projetar retornos dos ativos brasileiros e ele tem afetado bastante a renda fixa mais longa. Foi por isso que tiramos um pouco do investimento dessa classe de ativo.
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E-Investidor – O início da vacinação mudou a estratégia do Credit Suisse?
Telo – É muito importante a vacinação para a decisão de investimento. Todo esse cenário positivo para a bolsa global e brasileira vem da projeção de um segundo semestre de reabertura das economias. A perspectiva está completamente ligada ao que esperamos em relação à vacinação.
O mercado olha para frente, vê a vacinação evoluindo e alguns casos de outros países que vacinaram mais e tiveram queda de novas infecções. Quanto mais rápido vier a vacinação, mais rápido o mercado projeta que vá abrir a economia, com mais possibilidades de crescimento.
Ao olharmos para os EUA, parece ser uma reabertura rápida. No Brasil, conseguimos projetar, mas tivemos que constantemente atualizar essas projeções. Temos uma visão de que no 4º trimestre poderemos pensar em uma reabertura. Estamos um pouco defasados nesse processo, no auge da pandemia. Até por isso fizemos o movimento de ter mais Bolsa Global e um pouco menos de Brasil nesse momento.
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E-Investidor – Onde está centralizada a alocação no Brasil?
Telo – Para uma carteira de risco médio, em que nós projetamos um retorno de 9% de rentabilidade, dividimos assim: temos hoje 30% dela alocada em bolsa. Mas dessa porcentagem 12% são de bolsa global e 18% de bolsa brasileira.
Outros 20% são investimentos alternativos, em venture capital, por exemplo, empresas que não são listadas em bolsa e que eventualmente podem ir para o mercado de capitais.
A outra metade da carteira usamos em diversos instrumentos: 25% são fundos multimercados e os demais 25% são ativos de renda fixa. Destes, 10% são ligados à inflação e 15% a outros ativos como crédito, posições de menor risco.
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E-Investidor – Muitos bancos globais já entraram no segmento dos criptoativos. As moedas digitais também fazem parte da estratégia do Credit Suisse?
Telo – Ainda está fora do radar, não pretendemos incorporar na carteira.
E-Investidor – Quais setores da Bolsa estão melhor posicionados neste momento? Onde há mais oportunidades ainda este ano?
Telo: Gostamos muito de commodities e temos uma posição grande no segmento, esse é o nosso primeiro bloco. O segundo bloco chamamos de ‘vencedores por estratégia de tecnologia’, ou seja, o pessoal que usa tecnologia para ir bem no varejo, nas vendas on-line. É um grupo resiliente e que gostamos bastante. Projetamos um resultado dessas empresas crescendo muito além da pandemia. Em varejo eletrônico, também temos uma posição grande.
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Além disso, temos algumas posições que gostamos e que são mais estruturais, de longo prazo, como as operadoras de hospitais. Na parte de saúde, temos uma posição relevante.
Esses três principais blocos são o grosso da nossa carteira e, pontualmente, à medida que a pandemia evolui e vemos o potencial de reabertura, podemos colocar algum ativo que se beneficie do processo, como varejo tradicional e bancos, mas em proporção bem menor.
E-Investidor – Como se posicionar em relação ao novo ciclo de alta das commodities?
Telo – Geralmente, quando as commodities estão em alta, o real se aprecia. Neste ano, pela incerteza de pandemia e fiscal o real não tem todo esse benefício, mas normalmente seria uma força pró-real. Levamos em consideração o fato de as commodities estarem em alta como uma força potencial para a moeda brasileira.
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Na parte de seleção de ativos em ações, temos posição em papéis ligados a commodities. Vemos com bons olhos e achamos que isso continua para frente, com uma posição grande.
E-Investidor – Quando o Sr. fala de maiores investimentos em Bolsa Global, o foco são os EUA e a China? Pode detalhar as expectativas em relação a esses mercados?
Telo – Um dos motores da economia global são os EUA e a China. Vou até colocar os EUA à frente da China. Achamos que os EUA terão um desempenho muito destacado, por várias razões, como os pacotes de estímulos fiscais que temos visto e também a velocidade da vacinação lá. A expectativa de reabertura é muito grande. Já a China está fora um pouco dessa discussão da pandemia, não teve nada tão drástico.
Entretanto, os dois países são excelentes mercados. Temos investimentos em Bolsa chinesa e americana, que basicamente foram os mercados que procuramos privilegiar
Para dar um exemplo, tem um fundo chamado Portfolio Future Trends que a gente opera globalmente em uma parceria entre o Credit Suisse da Europa e o Credit Suisse do Brasil. Ele rendeu 34% no ano passado e este ano está rendendo 5,73%. É um desempenho bastante destacado, que consegue realmente trazer grande capital para as carteiras. E esse fundo não tem o benefício de ter o câmbio, nós neutralizamos o efeito do câmbio. Portanto, é um fundo em reais e o retorno é simplesmente do movimento das ações escolhidas.
Mesmo sem diversificar a moeda, só diversificando a fonte de retorno, já é interessante para quem está no Brasil. Quanto mais mercados o investidor estiver, com dinâmicas de crescimento diferente, o desempenho das ações globais vai ser melhor que o desempenho de alguns ativos domésticos.
E-Investidor – Como a depreciação do real afeta os investimentos e a estratégia de alocação?
Telo – É um ponto importantíssimo que temos olhado. Normalmente, ter posições de Bolsa e de câmbio juntas é uma boa combinação para diminuir o risco das carteiras. O mercado fica mais nervoso, o câmbio desvaloriza, e se você tiver uma posição comprada em dólar, você ganha nesses momentos de aversão a risco.
Como o câmbio está muito desvalorizado, muito fora do equilíbrio, temos evitado montar muitas posições em dólar. Fora do Brasil, temos feito todas as alocações protegidas para real, esperando que a subida de juros e redução da incerteza, e eventualmente um segundo semestre com reabertura econômica, possam ajudar o real a estabilizar um pouco mais valorizado. Se isso acontecer, de fato, dá para equilibrar a carteira e ter um pedaço em dólar e em Bolsa.
Fizemos essa diversificação muito mais em regiões geográficas e em ativos, do que em moeda, porque vemos o real mais fraco do que deveria ser o equilíbrio dele. Temos postergado a possibilidade de comprar dólar.
E-Investidor – Até que ponto a nova onda de alta dos juros longos é um problema?
Telo – O principal fator que tem feito com que os juros de longo prazo subam é a incerteza fiscal. Para você ter o controle desse prêmio de risco que é pedido pelos investidores de longo prazo é importante que tenham medidas fiscais, controle de gastos, algo nessa direção. O ponto é: se começam a ter juros de longo prazo muito altos, você começa a ter uma competição com ativos como a Bolsa, um aperto nas condições financeiras.
Por hora nós não temos visto essa interferência tão grande por várias razões, mas a principal delas é que os resultados das empresas têm vindo bem. Esse é um ponto interessante também. Quando olhamos para o resultado das empresas a cada trimestre, temos sempre sido surpreendidos para cima.
Estamos em um ambiente muito favorável a ativos como Bolsa, porque os juros mesmo subindo no Brasil, estão em níveis muito baixos ainda. Se você ficar parado no CDI, terá uma remuneração abaixo da inflação.
Em resumo, não achamos ainda que este nível de juros longos sejam suficientes para ter uma realização grande na Bolsa, mas a parte fiscal é importante. Se começarmos a dar sinais de descontrole fiscal, daqui um tempo pode ser que isso impacte a Bolsa também, não só os juros longos. É importante olhar para os sinais dessa parte de consolidação fiscal no Brasil.
E-Investidor – E quais investimentos se tornam mais interessantes com a Selic em alta?
Telo – Não temos feito posições pré-fixadas, posições mais longas, justamente por conta da incerteza fiscal, mas em algum momento no segundo semestre isso pode ajudar a equilibrar um pouquinho alguns ativos. Teremos juros mais altos e eventualmente a possibilidade de retomar esses investimentos de papéis ligados à inflação. Claro, se já tivermos passado pelo auge da pandemia e com sinais de melhora fiscal, mas já começa a aumentar a atratividade da renda fixa.
Alguns fundos de crédito indexados têm começado a captar recursos. Acho que pode ser um ano bom para fundos de crédito porque, com os juros nominais subindo, existe um spread de crédito em cima disso, e a remuneração começa a fazer mais sentido. Eventualmente fundos de crédito podem ganhar algum espaço. Os juros um pouco mais altos podem segurar também essa excessiva desvalorização do câmbio. Se ficarmos com o real mais ancorado, isso ajuda todos os investimentos no Brasil.
E-Investidor – Em termos de patrimônio por adulto, o Brasil perdeu entre 5 e 7 mil dólares entre janeiro e junho de 2020. Em percentual, a riqueza dos brasileiros foi a que mais mudou nesse período em relação aos outros países do mundo, com queda de 24,4% no período. O que justifica essa queda?
Telo – O principal efeito quando você mede a riqueza é medir em uma base constante. E geralmente se usa o dólar como base constante. Um país com uma desvalorização cambial muito grande, de fato, perde poder de compra em relação ao mundo. O principal efeito é esse, o do câmbio. Em termos de crescimento econômico, o desempenho do Brasil de -4% no ano passado foi menos pior do que se chegou a projetar. Mas foi uma queda de PIB e todos os países que tiveram queda de PIB tiveram queda de riqueza.
E-Investidor – O Credit Suisse reportou que terá um prejuízo de US$ 4,7 bilhões por conta do colapso envolvendo a Archegos Capital. Qual impacto na área de gestão de patrimônio?
Telo – Sendo uma empresa listada em bolsa, o Credit Suisse está fazendo toda divulgação desses dados pelos canais oficiais. Não temos comentários sobre esse assunto. Do nosso lado, de gestão de patrimônio, continuamos a tocar nosso negócio da mesma forma, sem alterações.
E-Investidor – O ambiente político continua interferindo nos mercados. Em uma entrevista recente, o gestor Luis Stuhlberger disse que estava apavorado com com a hipótese de ter um segundo turno entre Bolsonaro e Lula. Já conseguimos pensar em projeções de preço para esse cenário? Qual dos dois candidatos o mercado precifica melhor?
Telo – Não estamos vendo ainda a eleição de 2022 fazendo preço nas carteiras, tem muita coisa para acontecer até lá. A pandemia sendo superada, existem dois efeitos: o primeiro é saber qual o tamanho do gasto fiscal que o Brasil fez esse ano e o quanto vamos ter de recuperar de crescimento, ou seja, o quanto tivemos que ficar fechados.
Uma pandemia que demora mais tempo, tem efeito no preço dos ativos, mas acreditamos que até o final do ano teremos uma reabertura. Antes de 2022 ser uma preocupação, o preço dos ativos deve melhorar. Esse aspecto é mais importante para olharmos este ano do que a eleição.
Depois que passar esse evento, tem outros dois pontos interessantes. Os preços provavelmente estarão em níveis melhores e teremos condição de olhar para 2022 e projetar a nova carteira. E também conforme se desenrolar a pandemia, as chances de cada candidato podem mudar. Logo, não temos colocado preço, até porque não sabemos ainda nem quais candidatos estão postos.
Sem dúvida nenhuma todo ano eleitoral gera muita volatilidade e vamos precisar de posições equilibramos. Eu pretendo entrar ano que vem, por exemplo, com uma posição de câmbio maior do que a que eu tenho hoje. Independentemente de quem vença, antes de chegar no resultado do segundo turno, vai ter oscilação e precisaremos de uma carteira um pouco mais defensiva.