- As ações do Nubank superaram, na última semana, os US$ 9 pela primeira vez desde o IPO, em dezembro de 2021
- Os dois anos do roxinho na Bolsa foram marcados por uma reviravolta que vai da desvalorização acentuada dos papéis à retomada da confiança do mercado no futuro da empresa
- Analistas explicam o que mudou de lá para cá e apontam motivos por trás do otimismo com o Nubank
“Daqui cinco anos, a gente se fala”. A declaração de David Vélez, fundador e CEO do Nubank (ROXO34), foi dada em um encontro com jornalistas no Fórum Econômico Mundial de 2022, em Davos, e repercutiu no mercado. À época, os papéis da instituição financeira eram cotados a menos da metade dos US$ 9 a que foram precificados na oferta pública de ações (IPO) da companhia, que levou mais de 7,5 milhões de clientes da instituição para a Bolsa de Nova York (NYSE) em dezembro de 2021.
Leia também
A queda das ações refletia uma combinação de fatores macro e microeconômicos, ilustrando a crescente desconfiança de analistas com o banco, que ainda não havia se provado lucrativo, mas foi precificado como a maior instituição financeira da América Latina. E foi assim que o Nubank permaneceu durante os seus primeiros dois anos na Bolsa.
Mas Vélez estava certo. Não foram necessários cinco anos para analistas de mercado mudarem a sua percepção em relação à companhia e, na última semana, as ações do NU voltaram a ser negociadas a US$ 9 pela primeira vez em dois anos.
Publicidade
Invista em oportunidades que combinam com seus objetivos. Faça seu cadastro na Ágora Investimentos
“Foi emblemático o fato da ação ter superado os US$ 9 da listagem pela primeira vez. E a mudança foi tão brutal na percepção do mercado porque a companhia provou ao longo do ano passado que ela não só é um modelo de negócios rentável, como é muito rentável”, afirma Larissa Quaresma, analista da Empiricus Research.
Primeiros lucros do Nubank
O roxinho atingiu o “break even”, termo utilizado para se referir ao momento de equilíbrio da sua empresa, ou seja, quando custos e despesas operacionais se igualam à receita, no terceiro trimestre de 2022, quando surpreendeu o mercado com um lucro líquido de US$ 7,8 milhões. Com aumento na base de clientes e o uso de mais serviços do banco digital por correntistas, a fintech registrou naquele trimestre uma receita recorde de US$ 1,3 bilhão, um salto de 171% em um ano.
O desempenho foi emblemático: não só revertia os prejuízos nos trimestres anteriores, como marcou o início de uma nova leva de resultados positivos e acima do consenso de mercado para a instituição.
"No início do ano passado, pouquíssima gente esperava que o Nubank fosse dar um lucro líquido consolidado na casa de 25% ou 30%, como ele está entregando hoje, na margem. E esse era o ponto de interrogação do mercado quando a empresa veio ao IPO", destaca Quaresma. "Quando uma empresa não dá lucro e tem um valor de mercado de centenas de bilhões de reais, é muito difícil justificar. Agora, tendo uma linha final positiva e muito positiva, com vários milhões de dólares de lucro, começa a ter um certo fundamento que dá sustentação para esse valuation (valor da empresa)."
Muito popular entre a população de classes mais baixas no País, o banco conseguiu manter a disciplina de custos e ampliar a receita por cliente, mesmo em um período de alta da inadimplência. Mais um ponto que jogou a favor da mudança na avaliação do mercado, explica José Daronco, analista na Suno Research.
"O banco tem uma carteira de crédito mais arrojada, focada principalmente em dois produtos: cartão de crédito e crédito pessoal. Ambos são muito focados nos clientes de mais baixa renda. Com isso, os juros são mais elevados, mas a inadimplência também é", diz. "Mesmo assim, o banco conseguiu manter uma inadimplência controlada, o que foi muito positivo."
O papel do macro na recuperação do Nubank
Os primeiros meses do Nubank na bolsa não foram fáceis para as ações da companhia. Além da desconfiança do mercado, que após o IPO passou a entender que aquele valuation de 2021 estava muito elevado para uma empresa que ainda não havia se provado lucrativa, uma componente macroeconômica jogava contra o investimento em ações, especialmente as techs.
Publicidade
O roxinho chegou à NYSE em dezembro de 2021, apenas três meses antes do Federal Reserve (Fed), o banco central americano, iniciar o ciclo de altas que levaria a taxa de juros dos Estados Unidos ao maior patamar em duas décadas, os atuais 5,25% a 5,5% ao ano. Em seu primeiro ano na bolsa, as ações do Nubank caíram mais de 50%.
"Os papéis caíram bastante por conta do timing do IPO. Foi um momento bem ruim que machucou muito os players tech e de crescimento que é o caso do Nubank", diz Leonardo Piovesan, CNPI e analista fundamentalista da Quantzed.
O ano de 2023, no entanto, marcou a reversão desse cenário. Depois de atingir um pico em outubro do ano passado, as taxas dos Treasuries, os títulos do Tesouro americano, voltaram a cair à medida que o Fed deu sinais de que a atividade econômica dos EUA se mostrava sob controle e a instituição poderia iniciar os cortes de juros já em 2024. Essa percepção levou investidores globais a uma onda de apetite a risco, impulsionando papéis que tinham sido muito amassados nos anos anteriores – foi essa mesma notícia que levou o Ibovespa ao recorde histórico, como explicamos aqui.
Com isso, a NU subiu 104,67% no acumulado de 2023. "A retomada das ações se deu por esses dois motivos", destaca Piovesan. "Tanto por uma melhora desse ciclo monetário dos EUA, que é muito positivo para essas empresas de crescimento, cuja maior parte do valor está na perpetuidade, quanto pelo fato do banco estar consecutivamente divulgando resultados acima do consenso. O mercado tem premiado a empresa por conta disso."
A melhora do cenário trouxe a NU de volta à casa dos US$ 9. Um levantamento feito por Einar Rivero, diretor da Elos Ayta Consultoria e colunista do E-Investidor, mostra que a instituição financeira está mais próxima do que nunca do valuation alcançado no IPO, de US$ 54 bilhões. No dia 13 de janeiro, as ações do Nubank valiam US$ 9,10 e o banco tinha um valor de mercado de US$ 44 bi – o maior em dois anos.
Desafios no radar, novos e antigos
O Nubank já se tornou uma companhia lucrativa e assim deve continuar, de acordo com os especialistas, mas ainda há pontos de alerta no caminho. O desafio de tornar a base de clientes rentável, que é apontado por analistas desde o início, ainda segue no radar.
Publicidade
"O banco já tem uma base de clientes relevante, que conseguiu por meio de marketing, conta gratuita e uma marca muito forte, agora precisa conseguir monetizar esse cliente. Isso já tem mostrado alguns resultados, mas seria o principal desafio", destaca Leonardo Piovesan, da Quantzed.
Na visão de Larissa Quaresma, da Empiricus, a missão do NU também passa por se tornar o principal banco de seus clientes – de perfil mais jovem e de tíquete mais baixo – quando eles tiverem renda maior. "Essa é uma dificuldade estratégica, temos esse ponto de interrogação em relação à tese. Se o Nubank vai continuar sendo a instituição financeira preferida ou se esse cliente vai partir para algo mais associado à alta renda quando enriquecer."
Esse é um ponto também no radar da instituição. É o que Livia Chanes, líder das operações do Nubank no Brasil, chamou de "principalidade" nesta entrevista concedida ao E-Investidor em outubro de 2023. O desafio da instituição, segundo ela, não é atrair mais clientes de alta renda, mas sim se tornar a prioridade deste público.
Apesar do otimismo que paira sobre os ativos do roxinho, a instituição ainda não convenceu o mercado como um todo. Para o BTG Pactual, o valuation muito esticado deixa pouco espaços para erros, fazendo o banco manter a recomendação neutra para a NU.
O Santander, que tem recomendação de venda dos papéis, vê ainda outros riscos no radar da fintech, em meio a um cenário econômico desfavorável que pode adiar o crescimento e um impacto potencial do risco regulatório. Na visão do banco, alguns "sinais de alerta" começaram a piscar no terceiro trimestre de 2023 do Nubank.
"Se o financiamento não crescer em linha com o crescimento da carteira de empréstimos; os NPL continuam a se deteriorar; empréstimos concentrados em categorias de crédito de alto risco; pouca visibilidade sobre quando/se as operações fora do Brasil se tornará rentável; e as mudanças em curso na metodologia contábil", dizem os analistas do banco, em relatório.
Publicidade