Interpretando dados que abalam o mercado

Rafael Paschoarelli é professor de finanças da FEA/USP e do Insper e diretor do ComDinheiro.
Twitter: @RafaelPaschoare

Escreve mensalmente, às sextas-feiras

Rafael Paschoarelli

Quem vai aproveitar as oportunidades da crise?

Crise é almoço grátis para todos os brasileiros que tenham dinheiro para investir

Quem mais vai se aproveitar desta crise são os “suspeitos” de sempre: os investidores com capital disponível para novas alocações (Foto: Edson de Souza Nascimento/Shutterstock)
  • A situação econômica brasileira nesta reta final de 2021 se deteriorou consideravelmente
  • Quem vai se aproveitar financeiramente de mais esta crise econômica e de confiança que se instalou no Brasil?

A situação econômica brasileira nesta reta final de 2021 se deteriorou consideravelmente. Creio que nem os mais pessimistas poderiam imaginar aumento tão abrupto da inflação e das taxas de juros futuras. Deixo para os economistas as explicações do que nos fez chegar a este ponto.

O que desejo discutir neste espaço de debate de ideias são as oportunidades surgidas diante da crise que vivemos e as maneiras de aproveitá-las.

A primeira dúvida que surge é: quem vai se aproveitar financeiramente de mais esta crise econômica e de confiança que se instalou no Brasil?

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Ora, quem mais vai se aproveitar desta crise são os “suspeitos” de sempre: os investidores com capital disponível para novas alocações.

Estas novas alocações podem ser em renda fixa que prometem “gordos” juros reais e, muitos deles, com a possibilidade de 100% de isenção no imposto de renda sobre os rendimentos. É almoço grátis! Almoço grátis a ser aproveitado por todos os brasileiros que tenham dinheiro para investir. Sim, a crise é mais um elemento de concentração de riqueza.

O mais interessante para os investidores é que não é necessário tomar risco de bolsa para garantir rendimentos nominais próximos a 12% ao ano ou juros reais acima de 5% ao ano e por largos prazos de tempo.

Usando a força mais poderosa do universo, isto é, os juros compostos, uma aplicação a taxa pré-fixada de 12% a.a. por cinco anos em título público federal produz incríveis 76% de rendimento nominal bruto no período e com risco soberano.

Ainda usando a força dos juros compostos, uma aplicação IPCA+5% a.a. em título público federal promete rendimento real bruto de impostos de incríveis 27,6% no período de cinco anos. Tente verificar em qual outro país do mundo é possível travar um ganho 5% a.a. acima da inflação investindo em títulos públicos. O Brasil é realmente o País das oportunidades! Grandes oportunidades para quem tem dinheiro!

Neste aspecto, nós brasileiros somos mais “abençoados” que os americanos que têm que se contentar com rendimentos pífios quando eles compras títulos públicos emitidos pelo governo americano. É interessante notar que os americanos pessoa física também tem à sua disposição o seu Tesouro Direto (www.treasurydirect.gov). Lá um título vencendo em cinco anos (Treasury Note) promete “incríveis” 0,99% a.a. Nós brasileiros conseguimos ganhar em menos de um ano o que os americanos levariam  cinco anos para ganhar! O pequeno “detalhe” é que os americanos ganharão em dólar e nós brasileiros em reais.

Agora um contraponto: os defensores da renda variável argumentarão que uma ação pode render muito mais que as taxas de renda fixa e em muito menos tempo. Eu respondo dizendo que a ação também pode render muito menos e em ainda menos tempo.

Há de se colocar em perspectiva o fator risco. Investir em título público é incrivelmente mais seguro que comprar uma ação, seja ela qual for. Se alguém quiser colocar em xeque este conceito, primeiro mude todos os textos dos melhores livros de finanças do mundo e também retire o prêmio Nobel do William Sharpe.

Isto não significa que os investidores com apetite para a renda variável não tenham
oportunidades: muitos papéis de bolsa se encontram com preços bastante descontados.

Mas, não basta que a ação (ou carteira de ações) renda acima da taxa básica de juros. Tem que render mais de modo a compensar o risco incorrido. Este rendimento “a mais” que a renda variável teria que render acima de uma renda fixa (um título público, por exemplo) é o prêmio pelo risco. No mercado americano, pode-se assumir um prêmio de risco para se investir no índice de bolsa na casa de 7% ao ano. Isto é, o investidor deveria exigir 7% a.a. de retorno acima da renda fixa para se sentir compensado por ter colocado seu dinheiro numa carteira de ações bem diversificada.

Sob a perspectiva de prêmio de risco, pondere quanto um investimento em bolsa deveria render para compensar o prêmio de risco. Leve em consideração que é possível comprar títulos públicos federais que garantem taxas nominais de dois dígitos para aqueles investidores que ficarem até o vencimento.

Como se tudo isso não fosse suficiente, a renda fixa ainda oferece alternativas isentas de imposto de renda tais como as debêntures incentivadas, as LCIs, as LCAs, os CRIs e os CRAs.

Se por um lado estes títulos prometem rendimento isento de imposto de renda por outro, os investidores passam a correr o risco de crédito dado que são títulos são crédito privado. Isto é, são títulos emitidos por empresas (no caso das debêntures, CRIs e CRAs) ou por bancos (no caso de LCIs e LCAs).

É muito tentador comprar uma LCI ou LCA emitida por bancos sólidos prometendo IPCA+4% a.a. ou IPCA+5% a.a. e, além de tudo, isento de impostos!

Em resumo, as oportunidades criadas pela crise que vivemos são inúmeras.
O aspecto negativo que eu enxergo é que quem mais vai se aproveitar dessas oportunidades são os indivíduos com dinheiro sobrando, parcela ínfima da sociedade brasileira.

Some a isso o elevado fardo para a sociedade como um todo pelo fato de o governo pagar mais juros para continuar financiado muitos gastos e poucos investimentos.