Com a privatização da Sabesp (SBSP3), o setor de saneamento atraiu olhares nas últimas semanas. Por se tratar de um serviço essencial para a economia brasileira, com fornecimento de água e tratamento de esgoto, o investidor pode esperar receitas mais perenes e dividendos robustos. No entanto, com nova política de distribuição de proventos, fica a dúvida se a Sabesp oferece a melhor opção para quem busca viver de renda com os dividendos de empresas saneamento ou se suas concorrentes – Sanepar (SAPR11) e Copasa (CSMG3) – merecem a preferência do investidor.
Leia também
A Sabesp atua no setor de saneamento básico no Estado de São Paulo, a maior potência econômica do Brasil. Segundo Bruno Oliveira, analista CNPI do Projeto Vida de Acionista, por se encontrar presente nesta região, a companhia tem avanços relevantes nas metas do marco de saneamento sobre tratamento de água e esgoto. A empresa também está bem consolidada e, portanto, não deve entrar em fortes ciclos de investimento bilionários nos próximos anos. “Não tem mais para onde expandir sua rede ou se tem é muito pouco. Então, se existir algum investimento, ele tende a ser menor”, pontua o analista.
A Sabesp anunciou recentemente uma nova política de dividendos, condicionada à privatização, que deve entrar em vigor a partir de 2026 e pode elevar as distribuições até 100% do lucro, mas depende do fator de universalização (Fator U) – métrica que determina o quanto as metas definidas no marco de saneamento para uma região estão sendo cumpridas. O ideal é que o fator U seja zero: quanto maior ele for, significa que há pontos ainda a serem melhorados na região.
- Como era antes? Atualmente, a política de dividendos da Sabesp limita a distribuição de dividendos a 25% do lucro líquido do exercício social enquanto a empresa não atinge a universalização do saneamento dos munícipios atendidos.
- Como ficará? Considerando que o fator U seja zero, a Sabesp teria em 2026 e 2027 um payout (parcela do lucro destinada a proventos) de até 50%. Para 2028 e 2029, o payout poderia subir para 75% do lucro líquido. E a partir de 2030, a companhia distribuiria 100% do seu lucro em proventos.
Além do Fator U em nível zero, outro requisito que a companhia precisaria respeitar para alcançar estes payouts vem uma alavancagem financeira abaixo ou igual a 3,25 vezes, explica Oliveira.
O que acontece com dividendos se a Sabesp falhar na universalização
Segundo o profissional do Projeto Vida de Acionista, o payout da Sabesp poder ser penalizado caso o fator U seja diferente de zero, chegando até mesmo a recuar de 100% para o mínimo de 25%. O analista cita algumas premissas, como vemos abaixo:
Caso o Fator de Universalização seja maior que 0% e menor/igual que 1%:
– Em 2026 e 2027: payout será de 40%;
Publicidade
– Em 2028 e 2029: payout será de 60%;
– A partir de 2030: payout será de 80%;
Mas se o Fator de Universalização for maior que 1% e menor/igual que 2%:
– Em 2026 e 2027: payout será de 30%;
– Em 2028 e 2029: payout será de 45%;
– A partir de 2030: payout será de 60%;
E, finalmente, se o Fator de Universalização for maior que 2%:
– Em 2026 e 2027: payout será de 25%;
– Em 2028 e 2029: payout será de 25%;
Publicidade
– A partir de 2030: payout será de 25%;
Embora o fator de universalização possa representar um risco para a companhia, Oliveira enxerga também como uma vantagem, pois mesmo que o investidor seja penalizado com um payout menor, a medida estimula uma rápida resposta da empresa. Na visão do analista, vira um mecanismo de qualidade. “Não tende a ser cumulativo. Se acontecer um deslize, eles são obrigados a corrigir. Isso passa uma percepção de perenidade”, avalia Oliveira. Ele reforça que a nova política de dividendos vai exigir mais dos executivos para que a Sabesp consiga se tornar um negócio muito rentável.
Outra vantagem, segundo Oliveira, está no fato de que a empresa possui dados operacionais mais interessantes do que as concorrentes Sanepar e Copasa. Além disso, está posicionada em uma região estratégica, o Estado de São Paulo. “Essa disposição geográfica é uma vantagem competitiva e irreplicável que traz segurança ao investidor”, diz o analista. Além disso, com menos investimentos pela frente, a companhia também estaria inclinada a pagar mais dividendos.
Já entre as desvantagens, Oliveira avalia que a ação da companhia está cara. Para ele, o preço-teto para o investidor entrar em SBSP3 fica em R$ 40, até que a nova política de dividendos se concretize. Atualmente o papel custa cerca de R$ 83 – na última sexta-feira, o papel da Sabesp encerrou o pregão a R$ 83,15 – e nesta segunda a ação cai 0,88%, cotada a R$ 82,42.
Evolução dos dividendos da Sabesp nos últimos cinco anos
SBSP3 | Dividend yield | Dividendo por ação | Payout |
2024 parcial | 1,74% | R$ 1,44 | 27,35% |
2023 | 2,77% | R$ 1,28 | 24,75% |
2022 | 2,04% | R$ 0,94 | 20,64% |
2021 | 0,93% | R$ 0,40 | 11,79% |
2020 | 3,27% | R$ 1,38 | 96,68% |
2019 | 2,44% | R$ 1,16 | 23,52% |
Fonte: Comdinheiro
Sanepar: dividendo extraordinário à vista?
A Sanepar fornece saneamento básico para o Estado do Paraná. Ela presta serviço para 345 cidades paranaenses e para o município de Porto União, em Santa Catarina. Sergio Biz, analista focado em dividendos e sócio do GuiaInvest, lembra que a Sanepar costuma fechar contratos de concessão longos, cerca de 30 anos, o que traz uma previsibilidade maior para a empresa. “Geralmente, o tipo de reajuste nas tarifas acompanha a inflação ao longo do tempo”, destaca o analista do GuiaInvest.
Observando a sua política de dividendos, Biz cita que a Sanepar estabelece uma distribuição mínima obrigatória de 25% do lucro líquido ajustado. A companhia, no entanto, poderá distribuir um dividendo adicional de até mais 25% do lucro líquido.
- 20 ações fora do radar pagam bons dividendos; veja quais são e se vale investir
A Sanepar costuma anunciar proventos semestralmente, mas os pagamentos ocorrem apenas no ano fiscal seguinte, geralmente no mês de junho. A demora da companhia em remunerar os seus acionistas tem sido um empecilho que reduziu sua atratividade no mercado. “Percebo que entre os investidores pessoa física já existe uma preferência pela Copasa, dado que ela paga trimestralmente os acionistas”, comenta Luan Alves, analista-chefe da VG Research.
Os fundamentos da Sanepar, entretanto, oferecem vantagens de investimento. Alves cita os contratos de longo prazo que a companhia possui com as prefeituras, que na visão dele oferecem resiliência e previsibilidade sobre a geração de caixa. Outra vantagem diz respeito à companhia pertencer a um setor perene, que mesmo em momentos de crise econômica ainda existirá demanda por uso de água e tratamento de esgoto. “Isso faz com que a empresa tenha uma certa perenidade sobre o seu balanço e seus resultados operacionais”, comenta Alves.
Publicidade
O analista da VG Research também acredita que a Sanepar seja a empresa mais eficiente do setor. Ele lembra que nos rankings promovidos por reguladores sobre as cidades com melhor qualidade no saneamento básico, municípios atendidos pela Sanepar tendem a se destacar entre os melhores, tais como Curitiba e Maringá. “É a empresa mais eficiente do setor, com a melhor qualidade dos serviços e a mais barata quando observamos os seus múltiplos”, pontua Alves.
A ação da Sanepar está cotada a R$ 5,47 nesta segunda (15).
Dividendos extraordinários da companhia paranaense
Além destas vantagens, Oliveira, do Projeto Vida de Acionista, lembra que a Sanepar pode receber um precatório (tipo de dívida que a Fazenda Pública é obrigada a pagar após condenação judicial) de R$ 3,9 bilhões. Este valor representaria quase a metade do valor de mercado da companhia, de R$ 8,18 bilhões.
Segundo Oliveira, o montante não recorrente depende de aprovação da Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2025, mas poderia entrar na empresa em 2025 ou 2026 se transformando em dividendos extraordinários. Oliveira destaca ainda que se aprovado, a companhia poderia fazer uso de um empréstimo no mercado, cedendo o direito de recebimento do precatório, para ter valores na conta de forma mais rápida.
Já entre os pontos negativos, Oliveira lembra o imbróglio envolvendo a concessão da cidade de Maringá, que é uma das três mais importantes em termos de receita da empresa. Segundo o analista, se a Sanepar perder esse contrato poderia verificar uma redução na sua receita. “Por causa do tamanho, teriam que ser várias cidades menores para compensar o contrato. Mas talvez nessa expansão não haja rentabilidade”, alerta Oliveira.
- Dividendos fartos: as 17 empresas que mais enchem o bolso do acionista
Outro risco, segundo Alves, envolve o arcabouço regulatório do setor. Ele lembra que no passado a companhia já teve reajustes tarifários congelados por causa de reeleição de governadores. A falta de reajuste acabou afetando as receitas da empresa e prejudicando investidores. Ele, no entanto, destaca que a governança tem melhorado nos últimos anos.
Além desse risco, há também a necessidade de racionamento de água por conta de falta de chuvas na região, embora o analista descarte este cenário para os próximos dois anos. Segundo Alves, a Sanepar precisa que os reservatórios estejam a um nível saudável superior a 30% para continuar oferecendo os serviços de distribuição de água de forma plena.
Publicidade
Alves projeta um dividend yield (retorno em dividendos) de 7% para os próximos 12 meses e em 2025. Já Biz, do Guia Invest, espera dividendos de 6,5% para 2024 e 2025. As projeções podem mudar caso haja recebimento do precatório.
Evolução dos dividendos da Sanepar nos últimos cinco anos
SAPR11 | Dividend yield | Dividendo por ação | Payout |
2024 parcial | 5,68% | R$ 1,50 | 40,91% |
2023 | 15,08% | R$ 1,52 | 49,22% |
2022 | 8,29% | R$ 1,51 | 39,60% |
2021 | 5,49% | R$ 1,09 | 40,55% |
2020 | 3,48% | R$ 0,99 | 46% |
2019 | 4,95% | R$ 4,30 | 40,13% |
Fonte: Comdinheiro
Copasa: superando a Selic com dividendos
Da mesma forma que as concorrentes, a Copasa trabalha com serviços de água e esgoto, mas no Estado de Minas Gerais. Contudo, ela não atua em todos os municípios e divide a região com empresas privadas. A duração dos contratos, em média, gira em torno de 15 anos.
Segundo Alves, a eficiência da Copasa acaba sendo menor do que a da Sanepar. A companhia tem duas operações: a do centro-sul acaba tendo uma eficiência maior, enquanto a que fica na região norte tem que ser bancada por meio de subsídio, porque costuma trazer prejuízo. Mas a partir de 2018, no governo de Romeu Zema (Novo), a companhia passou por uma reformulação na administração que resultou em ganho de eficiência, crescimento do preço da ação e que alterou a política de dividendos da companhia. A partir de então a Copasa se tornou mais atrativa para o mercado, diz Alves.
Daniel Nigri, analista e fundador da Dica de Hoje Research, explica que a Copasa paga dividendos trimestrais e que, pela sua política, remunerou os acionistas com 50% do lucro líquido nos últimos anos. A companhia também paga dividendos extraordinários, desde que seu endividamento esteja abaixo de duas vezes o seu lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização (Ebitda).
Entre as vantagens de investir na Copasa, Alves destaca o fato de que a companhia pagar dividendos elevados e superar em retornos a Sabesp e a Sanepar. E deve permanecer assim pelo menos até 2026. “Para quem quer um retorno rápido em dividendos hoje é a melhor opção do saneamento básico”, afirma o analista. Outra vantagem é que a companhia tem espaço para ser privatizada, o que permitiria que as ações tenham uma rápida valorização e destravamento do seu preço, saltando para o patamar de R$ 40.
Nigri cita entre as oportunidades de investir em Copasa o fato de que a companhia tem feito investimentos, por conta do novo marco de saneamento, e a tendência é de que os reajustes tarifários nos próximos dez anos superem a inflação. Além disso, a empresa está aumentando o número de trabalhadores na rede de esgoto, o que pode aumentar em 2% a 2,5% por ano as novas ligações de esgoto, elevando também as tarifas.
Os riscos da Copasa
Já entre os riscos, Alves cita o de federalização da companhia – ou seja passar o controle para o governo federal –, que poderia alterar a política de remuneração ao acionista e comprometer o pagamento de dividendos. As ações também poderiam cair até o patamar de R$ 10 se a possibilidade se concretizasse, segundo o analista.
Para Nigri, contudo, tal movimento não seria o fim do mundo, dado que o governo federal também precisa de dividendos para se auxiliar nas contas públicas.
Publicidade
Outro risco, segundo Alves, seria o racionamento hídrico diante de falta de chuvas, embora não seja um cenário esperado nos próximos 12 a 24 meses.
- Confira também: Veja 8 ações que pagam dividendos acima da Selic de 10,50%
Nos últimos 12 meses, com um dividend yield de 17,44%, a Copasa já vem pagando acima do que a taxa básica de juros e pode ser que supere a Selic nos próximos meses, de acordo com os analistas. No primeiro semestre, a companhia teve um retorno em dividendos de 10,01%.
A projeção de Alves é que a empresa tenha um dividend yield de 9% nos próximos 12 meses e chegue a 10% em 2025. Para Nigri, a expectativa é de dividendos de 8% nos próximos 12 meses, apenas com pagamentos regulares. Já se a companhia continuar pagando dividendos extraordinários, o dividend yield saltaria para entre 11,5% e 12%.
A ação da Copasa está cotada a R$ 20,56 nesta segunda (15).
Evolução dos dividendos da Copasa nos últimos cinco anos
CSMG3 | Dividend yield | Dividendo por ação | Payout |
2024 parcial | 13,33% | R$ 2,89 | 121% |
2023 | 15,60% | R$ 2,89 | 79,53% |
2022 | 2,93% | R$ 0,38 | 17,28% |
2021 | 6,37% | R$ 0,94 | 66,45% |
2020 | 16,76% | R$ 2,79 | 129,46% |
2019 | 2,76% | R$ 1,73 | 28,94% |
Fonte: Comdinheiro
Qual é a melhor ação de saneamento para ganhar dividendos?
Questionados sobre qual seria a melhor alternativa para quem busca dividendos no curto e no médio prazos, Oliveira, Biz e Alves apontaram a Sanepar. Já Nigri escolheu a Copasa.
Levantamento de consenso de mercado feito pelo TradeMap para o E-Investidor revela a preferência de outros bancos e corretoras que acompanham os papéis.
- De 11 instituições que acompanham Sabesp (SBSP3), 9 recomendam compra e 2 a classificam como manter (neutro). O preço-alvo médio projetado para 2024 é de R$ 95,42 e o dividend yield médio esperado, de 1,99%.
- Na Copasa (CSMG3), de 10 bancos, corretoras e casas de análise que tem cobertura para a ação, 2 recomendam compra e 8 dizem para o investidor manter o papel. O preço-alvo médio é de R$ 22,50 para este ano e o retorno em dividendos médio projetado chega a 14,59%.
- Já na Sanepar (SAPR11), de seis recomendações totais, todas indicavam manter o papel e nenhuma recomendava a compra. O preço-alvo médio é de R$ 27,92 e o dividend yield médio para 2024, de 6,91%.
Ainda para o investidor de dividendos de empresas de saneamento, nenhuma instituição indicava a venda das ações de Sabesp, Copasa e Sanepar.