- Setor aéreo foi um dos mais impactados pela crise do coronavírus, com os papéis das principais empresas listadas na Bolsa, como Gol e Azul, caindo mais de 40% somente no primeiro semestre
- A retomada, porém, está cada vez mais clara com o aumento dos gastos com viagens e dólar enfraquecido. As medidas de preservação de caixa feitas ao longo do primeiro semestre também começam a dar frutos para as aéreas
Um dos setores mais impactados pela crise do coronavírus com certeza foi o aéreo. Com a restrição de circulação e a diminuição de viagens, a Gol (GOLL4) e a Azul (AZUL4) amargam quedas de 49,59% e 65,49% na Bolsa de Valores somente no primeiro semestre de 2020. O ano deve ser o pior da história das aéreas, segundo a Associação Internacional de Transporte Aéreo (IATA).
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Contudo, se o segmento passou por um grave período de incerteza, principalmente entre janeiro e junho, agora a retomada parece estar mais clara do que nunca. De acordo com o relatório Travel Check-in, realizado pela Mastercard, os países que formam a cúpula do G20 já voltaram a gastar com viagens, com o Brasil em 7º lugar no ranking.
“Quando olhamos para a América Latina, o Brasil é o país com a recuperação mais rápida”, diz Khalil de Lima, analista da Reach Capital. “E a retomada vem tanto pela capacidade de assentos ofertados, quanto para a recuperação desses assentos”, afirma.
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Os avanços dos testes com as vacinas do coronavírus também devolvem atratividade para o setor. “Toda vez que sai uma notícia sobre a evolução dos testes relacionadas às vacinas, como a continuação dos estudos com a Astrazeneca, as ações das aéreas são beneficiadas”, diz Flávia Meirelles, analista de research da Ágora Investimentos. “O dólar enfraquecido também favorece, já que essas companhias têm os principais custos em dólar”, diz.
Desde o início de setembro, a moeda norte-americana recuou 3,1% frente ao real. O preço do barril de petróleo Brent, usado para o combustível das aeronaves, também sofreu 12,30% de retração no mês, para US$ 39,71. Esses números representam um alívio nos custos para as empresas aéreas e podem ter contribuído para as altas observadas no acumulado das duas últimas duas semanas, de 19,68% para os papéis da Azul, e 10,45% para as ações da Gol.
Na visão dos especialistas, os papéis são uma boa aposta para o médio e longo prazos. “Temos recomendação de compra para ambos, mas o setor só ficará mais calmo quando efetivamente sair a vacina”, diz Meirelles. A Ágora Investimentos deve rever para cima os preços-alvos das duas ações, antes fixados em R$ 23 para Azul e R$ 24 para Gol, levando em conta as expectativas para dezembro 2021.
Financiamento do BNDES
Tanto a Azul, quanto a Gol, receberam no início da semana propostas de financiamento do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) no valor de R$ 2 bilhões. O objetivo de injeção dos recursos é ajudar as empresas a passarem pela crise do coronavírus.
As propostas foram recebidas de forma positiva pelo mercado. A AZUL4 fechou o pregão de segunda-feira (14) em alta de 6,28%, aos R$ 28,25, enquanto o GOLL4 subiu 7,29%, aos R$ 21,20. Ainda assim, a necessidade de tal medida deve ser avaliada com calma pelas companhias.
“Vemos mês a mês a demanda por viagens aumentar, assim como a posição de caixa da Azul e de Gol, mostrando que ainda tem fôlego”, afirma Meirelles.“Tudo que as companhias fizeram para enxugar custos, como diminuir salários e carga horária de funcionários, a renegociação de dívidas e o adiamento de entrega de aeronaves, está dando certo”, afirma.
Setor é complexo, mas aéreas não são substituíveis
Na visão de Ricardo Campos, gestor da Reach Capital, o setor aéreo é estruturalmente complexo, já que a compra das aeronaves, por exemplo, é feita anos antes da entrega. “A natureza do negócio exige que você tenha uma estimativa de demanda muito à frente, isto é, é necessário prever a oferta de aviões no longo prazo”, diz o especialista.
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Quando os aviões são entregues, entretanto, as condições econômicas podem não ser favoráveis e a quantidade de aeronaves estar acima da demanda. “A Embraer tem projetos de aviões iniciados em 2010 com entrega prevista para 2024”, diz Campos. “Esse é um setor muito difícil de ser operado.”
A dinâmica natural do mercado adiciona riscos aos negócios e, a nível de Brasil, a situação se complica mais ainda pelo fato de as negociações de aeronaves e combustível serem feitas em dólar. A alavancagem, portanto, se torna ainda mais alta para as aéreas brasileiras. Ainda assim, as empresas de transporte aéreo não são facilmente substituíveis e devem contar com o apoio dos próprios credores (como companhias de leasing, que ‘alugam’ aviões e podem confiscá-los em caso de não pagamento) para atravessar períodos turbulentos.
“Se uma Azul ou Gol quebrarem, para quem esses credores irão vender os aviões? É de interesse deles que as aéreas se recuperem e que os acordos tenham sucesso”, afirma Campos.