- Na última terça-feira (18), o Santander divulgou um relatório com foco nos números apresentados pelo Nubank (NUBR33)
- Para o bancão, o retorno sobre o patrimônio líquido (ROE) de 40% reportado na operação brasileira da fintech de David Vélez estaria inflado
- Danielle Lopes, analista da Nord Research, recomenda que os investidores fiquem longe dos papéis do Nubank e aponta para outras distorções que podem ocorrer
Na última terça-feira (18), o Santander divulgou um relatório com foco nos números apresentados pelo Nubank (NUBR33). Para o bancão, o retorno sobre o patrimônio líquido (ROE) de 40% relativo ao quarto trimestre de 2022 reportado na operação brasileira da fintech de David Vélez e Cristina Junqueira estaria inflado, de certa forma.
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Dois dos principais motivos apontados por Henrique Navarro, Arnon Shirazi e Anahy Rios, analistas do Santander, para a situação, são as provisões para inadimplência abaixo do nível ideal, além de uma baixa alocação de capital na subsidiária brasileira, que é responsável por 90% das receitas do “roxinho”.
Santander desconfia dos números do Nubank; entenda
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O capital mais baixo na Nu Brazil ajudaria a impulsionar o ROE, já que o cálculo do índice é feito pela divisão do lucro líquido pelo patrimônio líquido – então, quanto mais baixo o denominador, maior o resultado.
“Achamos estranho que o Nubank tenha alocado apenas um terço de seu capital social para a operação brasileira. Não faz sentido para nós”, afirmam os analistas do Santander. “Acreditamos que seria justo que a operação do Brasil representasse pelo menos 80% (ou US$ 4,0 bilhões) de seu capital alocado.”
Mas o que pensam outros analistas de mercado sobre os números apresentados do Nubank?
Distorções no ROE
Larissa Quaresma, analista da Empiricus Research, possui recomendação “short” há mais de um ano para os BDRs do Nubank – títulos negociados na bolsa brasileira, que seguem a performance das ações do banco no exterior. “Shortear” significa apostar na queda dos papéis, que segundo projeções da casa, deve ceder até os R$ 2,70, ou seja, cerca de 30% abaixo do patamar desta quinta-feira, de R$ 4,08.
Quaresma concorda com o ponto do Santander sobre a baixa alocação de capital na subsidiária brasileira distorcer o ROE para cima – apesar disso não se tratar, vale ressaltar, de uma manipulação contábil. “É uma questão de decisão estratégica de onde alocar o capital levantado no IPO e o efeito contábil que isso gera’, diz a analista.
Na abertura de capital, realizada em dezembro de 2021, o Nubank levantou US$ 2,6 bilhões na abertura de capital. Esse dinheiro foi absorvido pela Nu Holding, que foi o veículo listado, e vai sendo alocado nas subsidiárias conforme a necessidade de investimento. Atualmente, fora a operação no Brasil, existe o Nu Colômbia e México, além das instituições abaixo destas subsidiárias.
Logo, quando o Nubank divulgou o ROE de 40% na operação brasileira, o cálculo considera apenas o patrimônio líquido nesta subsidiária, cuja alocação é de menos de 1/3 do capital social total. “Embora esteja provavelmente esteja em linha com a necessidade do negócio, esta alocação não é compatível com o tamanho da operação brasileira como um todo”, diz Quaresma.
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Danielle Lopes, analista da Nord Research, recomenda que os investidores fiquem longe dos papéis do Nubank e aponta para outras distorções que podem ocorrer no índice de retorno sobre patrimônio líquido.
Somente o fato de a fintech ter reportado um ROE alto, muito acima dos bancos tradicionais, não significa necessariamente perspectiva melhor. Até porque outro ponto que pode distorcer o índice é o lucro. Caso o lucro líquido venha negativo, com um patrimônio líquido também negativo, o cálculo vai desembocar em um resultado positivo.
“Hoje, o lucro do Nubank é muito insignificante em comparação ao tamanho da empresa e do número dos clientes. Todo o mercado tem que ter muito cuidado ao falar de ROE”, afirma Lopes. “O fato de o Santander chamar a atenção para o fato de a empresa não estar dando os devidos pesos para a alocação de capital no Brasil, é uma das formas de mostrar que o negócio não é super rentável (como o ROE mostra).”
Fábio Sobreira, analista chefe e sócio da Harami Research, também concorda com o Santander em relação à distribuição de capital não fazer sentido. “A base de cálculo é importante. Não digo que seja uma manipulação, já que é um balanço gerencial, então dá para movimentar algumas coisas.”
Provisões
O Santander afirma que o Nubank subestima a necessidade de provisão para inadimplência, que deveria estar caminhando para o patamar de 15% a 20%. Entretanto, a fintech tem sua cobertura em cerca de 12%.
Este cuidado maior esperado pelo Santander ocorre em função do perfil da carteira de crédito do Nubank, majoritariamente formada por clientes pessoas físicas, de renda mais baixa. Portanto, mais sujeitas à inadimplência que os clientes de alta renda, que compõem uma boa parcela do portfólio dos bancões. “Isso acende um sinal de alerta muito grande, porque estão reconhecendo provisões como se estivesse em um mercado de alta renda também”, afirma Lopes, da Nord.
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O Nubank também teria mudado a forma de apresentar a inadimplência. Agora, a empresa utiliza a norma contábil IFRS, que instrui o cálculo do provisionamento para perdas de crédito com base na inadimplência de curto prazo (15 a 90 dias). Diferentemente da norma contábil GAAP, cuja linha considerada é a inadimplência de longo prazo (mais de 90 dias), que é o principal indicador de calote do mercado.
“Quando olhamos o índice de inadimplência longo, muitas vezes ele não conversa com o provisionamento feito pelo Nubank, mas é um descasamento temporal”, afirma Quaresma. “Achamos, sim, que poderia ser mais conservadora a cobertura. Contudo, isso tem a ver com a norma contábil escolhida.”
Valuation
Apesar dos pontos elencados pelo Santander, para Lopes e Quaresma, a questão do valuation continua pesando bastante para os papéis. A fintech chegou à Bolsa avaliada em mais de US$ 40 bilhões, ultrapassando o valor de mercado dos bancões tradicionais, mas ainda sem histórico de lucro consistente.
Em outras palavras, para as analistas, mesmo após a queda de mais de 50% desde o IPO, a empresa segue excessivamente cara. “É uma empresa de sucesso, é um negócio que deu certo, mas a maturidade da operação não justifica o valuation. Para valer o que vale hoje, a empresa teria que estar com uma operação muito mais rentável. Esse ROE de 40% deveria ser da holding”, afirma Quaresma.
“Na minha última conta, a empresa teria que crescer mais de 300 vezes o lucro para valer o que vale hoje”, diz Lopes.