Nesse ambiente mais cauteloso, cada gigante do setor passa por um escrutínio renovado: seja pela força dos resultados, pelos riscos regulatórios, pela dependência de nuvem e chips ou pela capacidade de continuar investindo sem pressionar margens.
A seguir, veja como estão posicionadas as principais empresas da corrida global de inteligência artificial (Alphabet, Microsoft, Nvidia, Amazon, Meta, e Apple) e o que explica o movimento de seus papéis em meio ao receio de excessos no setor.
Google (Alphabet)
A Alphabet foi criada em outubro de 2015 como a holding que passa a controlar o Google e diversas empresas-filhas (como Waymo, DeepMind, Verily, entre outras) para dar mais autonomia às unidade de negócio. Nos últimos relatórios, a empresa ultrapassou a marca de US$ 100 bilhões em faturamento em um trimestre, com crescimento impulsionado pela abordagem de inteligência artificial (IA) incorporada em seus produtos principais. Recentemente, a gigante americana ganhou atenção no mercado porque a Berkshire Hathaway de Warren Buffett comprou aproximadamente US$ 4,3 bilhões em ações da Alphabet no terceiro trimestre.
Além disso, a empresa enfrenta e gerencia implicações regulatórias – como no caso antitruste que poderia ter exigido desmembramento – mas que, por ora, preservou suas principais unidades (Chrome, Android, buscas).
Ou seja, trata-se de uma das “Big Techs” que mais se beneficiam da corrida pela IA, com forte presença em anúncios, nuvem, mobilidade autônoma, saúde digital, e que atrai atenção tanto por ganhos como por riscos (regulatórios, de competição, de escala).
Microsoft
Fundada em 1975 por Bill Gates e Paul Allen, a Microsoft deixou de ser apenas a empresa do Windows para se tornar uma das forças centrais da nova corrida global da inteligência artificial. A companhia hoje opera em praticamente todos os segmentos de tecnologia: sistemas operacionais, computação em nuvem, aplicações corporativas, games, hardware e, mais recentemente, infraestrutura massiva de IA. Seu braço de nuvem, o Azure, é o coração dessa estratégia: cresce de forma acelerada, absorve parcerias bilionárias de Unidade de Processamento Gráfico (GPUs) e leva a empresa a uma posição de protagonismo na disputa por capacidade computacional, modelo de IA e escala.
No 1º trimestre do ano fiscal de 2026, encerrado em setembro, a empresa voltou a surpreender Wall Street. O lucro líquido atingiu US$ 27,75 bilhões, alta de 12% na comparação anual. O lucro ajustado por ação subiu para US$ 4,13, bem acima dos US$ 3,67 projetados por analistas. A receita avançou 18%, para US$ 77,7 bilhões, puxada pela Intelligent Cloud – que sozinha saltou 28%, para US$ 30,9 bilhões.
O destaque absoluto foi o Azure e outros serviços de nuvem, com crescimento explosivo de 40% no período. Segundo Amy Hood, CFO da empresa, a performance reflete a “crescente demanda por uma plataforma diferenciada”, reforçando o papel da Microsoft como provedora global de infraestrutura para IA.
Essa força financeira também alimenta a estratégia de expansão internacional. Em setembro, a Microsoft anunciou um aporte de US$ 30 bilhões no Reino Unido até 2028 para pesquisa, data centers e energia voltada a IA, o maior compromisso financeiro da companhia no país. No mesmo período, fechou um megacontrato de US$ 17,4 bilhões com a Nebius, assegurando acesso a GPUs para acelerar operações de nuvem e IA pelos próximos cinco anos, com possibilidade de expansão para US$ 19,4 bilhões. O ritmo agressivo de investimento fez as ações da Nebius dispararem mais de 40% no after hours, enquanto a Microsoft seguia em alta.
A empresa também mantém uma política consistente de retorno ao acionista. O Conselho aprovou dividendo trimestral de US$ 0,91 por ação, um aumento de 10% ante o trimestre anterior. O pagamento será efetuado em 11 dezembro de 2025.
Nvidia
Fundada em 1993 por Jensen Huang, Chris Malachowsky e Curtis Priem, a Nvidia passou de uma fabricante de placas gráficas voltada ao mercado gamer para se tornar a empresa mais estratégica da nova economia da inteligência artificial. Suas GPUs (inicialmente criadas para processar gráficos) provaram ser eficientes para o treinamento e a inferência de modelos avançados de IA. Hoje, a companhia é o principal fornecedor de poder computacional do planeta, domina o mercado de chips de alto desempenho e exerce influência que extrapola o ambiente corporativo, alcançando a geopolítica e a diplomacia tecnológicas.
O desempenho financeiro recente mostra por que a Nvidia se tornou o símbolo máximo dessa revolução. No 3º trimestre fiscal de 2026, a empresa registrou lucro líquido de US$ 31,91 bilhões, salto de 65% em relação ao ano anterior. O lucro por ação ajustado ficou em US$ 1,30, acima da expectativa de analistas. A receita total atingiu US$ 57,01 bilhões, alta de 62% na comparação anual, novamente acima das projeções. Só o segmento de data centers, que concentra a demanda por chips de IA, faturou US$ 51,2 bilhões, crescimento de 66% em um ano.
Todo esse fôlego fez a Nvidia cravar, em outubro de 2025, um marco histórico: tornou-se a primeira empresa do mundo a alcançar US$ 5 trilhões em valor de mercado. O feito foi impulsionado por parcerias estratégicas com OpenAI, Oracle, Nokia e Eli Lilly, e por sua presença crescente em nuvem, saúde, telecomunicações e farmacêuticas. No Brasil, os BDRs NVDC34 acompanharam o movimento e fecharam o dia com alta de quase 3%.
A corrida pelo silício é tão intensa que Jensen Huang, CEO da Nvidia, resumiu o momento em frase que virou manchete: “As vendas do Blackwall estão fora dos gráficos e as GPUs em nuvem estão esgotadas.” Segundo ele, a empresa vive um “ciclo virtuoso da IA”, impulsionada pelo aumento exponencial no treinamento e inferência de modelos.
Mas o mercado desembarcou desse otimismo, a Nvidia hoje (21) lidera as perdas no setor já que investidores ainda têm receio do valuation. Esse movimento ganhou ainda mais força com a leitura do payroll de outubro, que mostrou a criação de 119 mil vagas, ante estimativa de 51 mil, reforçando as incertezas sobre cortes adicionais de juros pelo Federal Reserve (Fed, o Banco Central dos EUA).
Amazon
A Amazon chega ao fim de 2025 em uma posição paradoxal: ao mesmo tempo em que reforça sua dominância global em nuvem, logística e varejo digital – e entrega resultados sólidos -, enfrenta um ambiente regulatório cada vez mais hostil na Europa e uma conjuntura geopolítica que tem pressionado todas as big techs. Para o investidor, entender essa dualidade é essencial: trata-se de uma empresa que combina crescimento de longo prazo com ruídos no curto prazo.
No 3º trimestre de 2025, a companhia superou as expectativas de Wall Street. O lucro líquido avançou 24%, para US$ 14,9 bilhões, enquanto a receita atingiu US$ 165,3 bilhões, alta anual de 12%. O destaque voltou a ser a AWS, que cresceu 16%, mostrando recuperação após um período de desaceleração e reafirmando sua importância como motor de margem e inovação, especialmente no fornecimento de infraestrutura de IA generativa.
O Prime Day também ajudou a impulsionar o varejo digital, assegurando um trimestre robusto. Mesmo assim, as ações chegaram a cair no after market depois do balanço, refletindo a leitura mais conservadora para o fim do ano: a Amazon projeta receita entre US$ 170 bilhões e US$ 176 bilhões no 4T25, abaixo do teto estimado por analistas.
Meta
A Meta atravessa um dos trimestres mais desafiadores de sua história recente, depois de reportar uma queda abrupta de 83% no lucro líquido do 3T25, para US$ 2,71 bilhões – muito abaixo dos US$ 15,7 bilhões do ano anterior. O resultado foi distorcido por uma provisão não recorrente para imposto de renda, que saltou 788% e atingiu US$ 18,9 bilhões, pressionando também o lucro por ação, que ficou em apenas US$ 1,05, distante dos US$ 6,72 projetados por analistas.
Apesar disso, a Meta registrou um salto de 26% na receita, para o recorde de US$ 51,2 bilhões, sustentado pela resiliência do seu ecossistema de aplicativos (Facebook, Instagram, WhatsApp e Threads) e pelo avanço em publicidade digital. Mas o mercado reagiu mal ao aumento dos custos operacionais, que cresceram 32% e chegaram a US$ 30,71 bilhões, além da sinalização de despesas totais entre US$ 116 bilhões e US$ 118 bilhões para 2025. As ações caíram mais de 7% no after hours, refletindo a preocupação com o ritmo de gastos e com uma possível compressão de margens no curto prazo.
O trimestre tenso reacende discussões sobre a estratégia de Mark Zuckerberg e sobre a capacidade da Meta de equilibrar inovação agressiva e disciplina financeira. Nos últimos anos, o CEO tomou decisões que redefiniram o rumo da empresa – algumas extremamente lucrativas, outras marcadas por controvérsia.
Entre elas, o avanço da inteligência artificial como motor de automação publicitária, capaz de substituir parte do trabalho de agências; o fim dos contratos com verificadores independentes e a adoção das Notas da Comunidade; a aposta multibilionária no metaverso como novo ambiente de mídia; a reformulação da segmentação de anúncios após o impacto do caso Cambridge Analytica; e a redução do alcance orgânico de marcas, que transformou a lógica de distribuição nas redes sociais e impulsionou o mercado de publicidade paga.
Essas decisões ajudaram a sustentar um império que faturou mais de US$ 160 bilhões em publicidade em 2024, mas abriram debates sobre moderação, privacidade e poder das plataformas no ecossistema digital.
Mesmo sob pressão, a Meta conseguiu escapar das fortes perdas que atingiram o grupo das “7 Magníficas” após o choque causado pelo lançamento da IA chinesa DeepSeek, que derrubou US$ 643 bilhões em valor de mercado das principais big techs americanas. Enquanto Nvidia, Alphabet e Microsoft sofreram quedas bilionárias, Meta, Apple e Amazon registraram ganhos modestos no pregão – um alívio momentâneo em meio ao clima de aversão a risco.
Ainda assim, o episódio expôs o tamanho da competição no setor de IA e levantou questionamentos sobre os investimentos trilionários das gigantes para sustentar sua infraestrutura tecnológica. Com um cenário global mais volátil, tensões geopolíticas elevadas e investidores cada vez mais sensíveis a custos, o desempenho da Meta nos próximos trimestres será decisivo para mostrar se a atual estratégia de Zuckerberg entrega retorno compatível com o nível de risco assumido, ou se ajustes profundos serão necessários.
Apple
A Apple enfrenta pressões externas que têm pesado sobre o desempenho das ações e sobre a confiança de parte dos grandes investidores. O caso mais emblemático é o da Berkshire Hathaway, que voltou a reduzir sua posição na companhia no terceiro trimestre, uma decisão simbólica por ser o último relatório de Warren Buffett à frente do conglomerado após 60 anos de gestão.
A fatia da Berkshire na Apple caiu de 280 milhões para 238,2 milhões de ações, movimento que consolida a venda de quase três quartos dos papéis que Buffett chegou a acumular no auge da aposta na gigante de Cupertino.
Ainda assim, a Apple segue como o ativo mais relevante da carteira, com 22,7% de participação, enquanto a Berkshire abriu uma nova posição bilionária de US$ 4,3 bilhões na Alphabet, que agora representa 1,6% do portfólio. A decisão reforça a rotação parcial de Buffett entre big techs e reacende debates sobre o estágio de maturidade da Apple frente a rivais mais agressivas em IA.
A saída gradual da Berkshire não foi o único movimento de desinvestimento recente envolvendo a companhia. O presidente do Conselho da Apple, Arthur Levinson, vendeu mais de US$ 20 milhões em ações no fim de agosto, reduzindo parte da exposição que mantém desde 2001 – quando comprou papéis a meros US$ 0,29.
Após a operação, Levinson ainda detém mais de 4 milhões de ações avaliadas em cerca de US$ 976 milhões, além de posições indiretas em nome da esposa. As vendas chamaram atenção porque ocorrem em um ano em que o papel ficou atrás do S&P 500, acumulando queda de 4,3% enquanto o índice subiu 11%. Analistas atribuem o desempenho mais fraco da ação à combinação de incertezas tarifárias, atrasos na implementação de novos recursos de IA e um clima mais cauteloso entre investidores institucionais.
Apesar das pressões externas, a Apple entregou resultados trimestrais sólidos que mostram resiliência da operação. No terceiro trimestre fiscal, a companhia registrou receita de US$ 94,04 bilhões, superando com folga os US$ 89,30 bilhões esperados. O lucro líquido chegou a US$ 23,43 bilhões, e o lucro ajustado por ação, de US$ 1,57, também bateu as estimativas.
A receita com iPhones avançou 13% e alcançou US$ 44,5 bilhões, movimento que foi parcialmente impulsionado por consumidores norte-americanos que anteciparam compras antes da aplicação de novas tarifas. Na China, um mercado historicamente sensível para a Apple, as vendas somaram US$ 15,37 bilhões no período, indicando recuperação após meses de volatilidade.
Mas os ventos contrários seguem no radar. A Apple já projeta custos de tarifas de US$ 1,1 bilhão entre julho e setembro, contra US$ 800 milhões no trimestre anterior – uma pressão que, segundo Tim Cook, CEO da Apple, deve desacelerar o ritmo de crescimento das vendas. O CFO Kevan Parekh afirmou que cerca de um sexto do aumento recente na demanda do iPhone veio de compras antecipadas por medo de preços mais altos. A empresa, portanto, prevê crescimento anual de receita de apenas um dígito.
No front regulatório, a maçã obteve um alívio parcial no processo antitruste da Google: o juiz Amit Metha determinou medidas para mitigar o monopólio da Alphabet na busca, mas não proibiu os pagamentos bilionários feitos à Apple para manter o Google como buscador padrão, uma decisão que preserva um dos acordos mais lucrativos da indústria de tecnologia.